almeida, januário correia de

28 Jan 2021 por "Rui Carita"
História Militar História Política e Institucional Personalidades

A apresentação no Funchal do Gov. Januário Correia de Almeida (1829-1901) ocorreu nas vésperas da cerimónia de aclamação do rei D. Luís, ainda determinada pelo anterior governador civil do Funchal, 2.º conde de Farrobo, mas que já não se encontrava na Madeira. O novo governador era engenheiro civil e militar, tendo deixado um interessante conjunto de Obras Públicas em Cabo Verde, mas poucos meses depois retirava-se para o continente e não regressaria à Madeira, aceitando o congénere lugar em Braga.

Palavras-chave: Aclamação Régia; Engenheiros militares; Obras Públicas; Partidos políticos.

 

Januário Correia de Almeida. Arquivo Rui Carita. Januário Correia de Almeida. Arquivo Rui Carita.

A apresentação no Funchal do Gov. Januário Correia de Almeida encontra-se ligada a uma das muitas histórias picarescas da política madeirense dos meados do séc. XIX. Nos inícios de janeiro de 1862, a Câmara Municipal do Funchal assumia as festas para a aclamação do Rei D. Luís (1838-1889), em moldes semelhantes ao acontecido anos antes com D. Pedro V (1837-1861) – sinal de que o governador civil do Funchal, 2.º conde de Farrobo (1823-1882) (Farrobo, 2.º conde de), já não se encontrava na Madeira, enviando o impresso o então presidente da Câmara, Marceliano Ribeiro de Mendonça (1805-1866). Embora o mesmo impresso informe que fora o governador civil do distrito a marcar o dia 20 de janeiro para “a grande festividade da inauguração do Reinado” de Sua Majestade “O Senhor Dom Luís Primeiro”, nem o governador nem o secretário-geral deviam estar na Madeira, saindo o “préstito para a aclamação do Nosso Augusto Senhor” dos Paços do Concelho “pelas 11 horas da manhã” em direção à Sé do Funchal (ABM, Alfândega do Funchal, liv. 679, impr. 14 jan. 1862), sem qualquer outra informação sobre o acompanhamento.

Saindo o conde de Farrobo para Lisboa, foi nomeado (ou nomeou-se) governador interino o administrador do porto santo, João de santana e Vasconcelos, membro influente local do Partido Regenerador. A sua receção no Funchal foi organizada pelos familiares, futuros viscondes das Nogueiras (Nogueiras, viscondes das), nessa noite, com um baile em S. Lourenço, na sequência das festas ali também dadas pelo conde de Farrobo e dentro da tradição de três dias de festas oficiais (previstos para os dias 18, 19 e 20), para no último dia ser então aclamado o Rei D. Luís. Decorria a receção em S. Lourenço, na noite de 18 de janeiro, quando entrou na baía do Funchal a embarcação que trazia o novo governador. Houve o prudente cuidado de não interromper a Festa, guardando-se para o dia seguinte a entrada oficial de Januário Correia de Almeida, o futuro visconde de S. Januário em S. Lourenço; mas a oposição não deixou de fazer correr que o governador interino se preocupara de tal modo com a administração “que nem o tempo chegara para dormir enquanto ela durou” (SILVA e MENESES, I, 1998, 51), pois só durou a noite em que decorreu o baile.

O novo governador era filho do homónimo Januário Correia de Almeida (c. 1805-1835), tesoureiro-geral da Armada, e de sua mulher, Bárbara Luísa dos Santos Pinto (c. 1800-1860), tendo nascido em Paço de Arcos, a 31 de março de 1829. Seguindo a carreira militar, assentou praça no Batalhão de Caçadores n.º 2, a 4 de novembro de 1842, e, passando depois a frequentar a Escola do Exército, foi promovido a alferes de Cavalaria, a 22 de dezembro de 1846. Frequentou a seguir a Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra, onde se bacharelou em Matemática e em Filosofia, voltando à Escola do Exército, graduado no posto de tenente, concluindo o curso do Estado-Maior em 1856, como engenheiro civil e militar. No ano seguinte, seria nomeado diretor das Obras Públicas de Cabo Verde, percorrendo todas as ilhas do arquipélago e deslocando-se inclusivamente à costa da Guiné, de cuja estadia editaria em Lisboa um pequeno trabalho: Um Mês na Guiné. Em 1860, já com o posto de capitão, seria nomeado governador interino de Cabo Verde, deixando uma obra muito interessante como engenheiro, e.g. o cais do Porto da Praia e o liceu daquela cidade, na ilha de Santiago, bem como as alfândegas do Mindelo, em São Vicente, e de São Filipe, na ilha do Fogo.

Regressaria ao continente em 1860, terminada a sua comissão de serviço de três anos, e, no início de 1862, seria nomeado governador da Madeira. O decreto de nomeação data de 15 de janeiro, tendo tomado posse a 19 seguinte, o que foi de uma rapidez inédita para a época sendo por essa razão que não era esperado no Funchal. Entretanto, havia sido nomeado novo secretário-geral para o governo civil do Funchal, António Lopes Barbosa de Albuquerque, que, por circular impressa em S. Lourenço, comunica às autoridades locais, pelo decreto de 8 de janeiro desse ano, a exoneração do 2.º conde de Farrobo e do ex-secretário-geral, António Correia Herédia (1822-1899) (Herédia, António Correia) – e, pelo mesmo decreto, a sua nomeação para o lugar deste último. Na data de 19 de janeiro de 1862, foi distribuída nova circular a informar que o Gov. Januário Correia de Almeida tomara posse nesse dia. Seria então o novo governador a presidir às cerimónias de aclamação do Rei D. Luís, assistido pelo novo secretário-geral, António Lopes Barbosa de Albuquerque.

O Gov. Januário Correia de Almeida começou por solicitar às autoridades insulares elementos para elaborar o seu relatório para o Governo de Lisboa, que deveria seguir no início de cada ano civil, e que o seu antecessor não chegara a enviar. Em fevereiro nomeava o diretor da Alfândega, Diogo Teles de Meneses (1788-1872), posteriormente visconde Teles de Meneses (Teles de Meneses, visconde), para a presidência de uma comissão encarregada de propor medidas com vista à elaboração de um decreto sobre fiscalização marítima, mas logo em julho comunicava que, tendo de se ausentar para o reino, “com a devida autorização” de Sua Majestade, deixava em funções o secretário-geral António Lopes Barbosa de Albuquerque (ABM, Alfândega do Funchal, liv. 679, of. 19 jul. 1862). É provável que a deslocação ao continente tivesse a ver com o falecimento da mãe, que ocorre nesse mesmo ano; contudo, acabaria por não voltar à Madeira, pois seria, também nesse ano, nomeado governador civil de Braga.

Tendo deixado um interessante conjunto de obras públicas em Cabo Verde, nada se conhece na Madeira da sua intervenção nessa área, nem sequer vistorias ou pedidos de informação a esse respeito. Não deixa de ser estranha a posição do Gov. Januário Correia de Almeida, uma vez que era homem do Partido Regenerador do também engenheiro civil e militar António Maria Fontes Pereira de Melo (1819-1887), filho do então governador de Cabo Verde, que ao passar pela Madeira em outubro de 1848 não deixara de ir ver as obras da Levada do Rabaçal, quando ali trabalhava o capitão Tibério Augusto Blanc (c. 1810-1875).

Pensa-se que data da sua vigência como governador a revisão da nova divisão concelhia e paroquial, de que se conhecem, depois, alguns acertos. No dia 11 de setembro de 1862, e.g., após vários incidentes e peripécias, fez o secretário-geral do distrito, António Lopes Barbosa de Albuquerque, servindo de governador civil, reunir na Casa dos Romeiros do Santo da Serra representantes das câmaras municipais de Machico e Santa Cruz, administradores do concelho, diversos funcionários públicos e outras pessoas de representação; e foi nesse local que se assentou definitivamente a nova divisão, tendo deste modo terminado as reclamações e os protestos que duma e doutra parte se levantavam. O secretário-geral António Lopes Barbosa de Albuquerque, que entre maio e setembro de 1865 seria governador civil de Faro, também não estaria muito mais tempo na Madeira, pois em janeiro de 1863 tomava posse desse lugar Jacinto António Perdigão (Perdigão, Jacinto António), jurisconsulto que mais tarde haveria de ganhar alguma nomeada no continente e que ocupou assim o lugar de governador interino e, posteriormente, o de efetivo.

Januário Correia de Almeida, entretanto membro do Partido Progressista (Partido Progressista), sairia da Madeira para idêntico lugar em Braga e, em fevereiro de 1864, era comissário régio em Vila Real e, depois, oficial às ordens do Rei D. Luís. Seria governador-geral da Índia em 1870, de onde passou a Macau e Timor, tendo sido ministro plenipotenciário na China, no Japão e no Sião. Regressando a Lisboa em 1875, seria um dos fundadores da sociedade de Geografia de Lisboa, à frente da qual teria uma ação francamente notável. Foi ainda, em 1878, encarregado de negócios junto de várias repúblicas da América do Sul e teve, depois, as pastas da Marinha e Ultramar e da Guerra, sendo barão por decreto de 10 de novembro de 1886 e conde pelo de 27 abril de 1889, desconhecendo-se a data do decreto de visconde. Foi promovido a general-de-brigada a 30 de junho de 1893 e a general-de-divisão a 13 de maio de 1896. Nesse ano de 1896, foi-lhe confiado o comando da 1.ª Divisão Militar, tendo sido ainda comandante do Estado-Maior e da Escola do Exército. Faleceu em Paço de Arcos, onde havia nascido, a 27 de maio de 1901.

Obras de Januário Correia de Almeida: Um Mês na Guiné (1859).

 

Rui Carita

(atualizado a 13.11.2016)

Bibliog.: manuscrita: ABM, Alfândega do Funchal, liv. 679; impressa: CARITA, Rui, História da Madeira, 7.º vol., Funchal, SRE, 2008; MESNIER, Pedro Gastão, Viagem de S.ª Ex.ª o Sr. Visconde de S. Januário, Governador-Geral da Índia Portuguesa às Praças do Norte, Bombaim, Damão, Dio, Praganá, Surate, etc., Nova Goa, Imprensa Nacional, 1875; SILVA, Fernando Augusto da e MENESES, Carlos Azevedo de, Elucidário Madeirense, 3 vols., Funchal, DRAC, 1998.

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