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As primeiras bibliotecas de que temos notícia na Madeira estão intimamente ligadas às instituições de ensino, estando estas, por sua vez, dependentes da religião e Igreja Católicas e situadas em espaços como o da Sé, as grandes igrejas, os conventos, os recolhimentos e determinadas escolas paroquiais. É provável que também existissem bibliotecas em casas nobres, onde assessoravam professores particulares que aí ensinavam. O Seminário Diocesano do Funchal, instituído em 1566, e o Colégio de S. João Evangelista, fundado no Funchal em 1570 pela Companhia de Jesus, que hegemonizou o ensino na Ilha (conhecido depois como o Colégio dos Jesuítas, onde foi instalada a Reitoria da Universidade da Madeira (UMa)), criaram as suas bibliotecas, conforme afirma Alice Mendonça: “Encontramos na Madeira algumas instituições como o Paço Episcopal, a Sé, o Seminário e os vários Conventos do Funchal que possuíam as suas próprias livrarias, dotadas de livreiros e encadernadores e na transição entre os sécs. XVII e XVIII” (MENDONÇA, 2006, 85). Nos primórdios da colonização, as bibliotecas (livrarias) existentes na Madeira estavam incluídas e anexadas ao sistema de ensino e de aprendizagem assegurado pela Igreja, sendo a Companhia de Jesus, através do Colégio dos Jesuítas, a expressão desse domínio. Em 1759, por ordem do marquês de Pombal, são reformadas as ordens religiosas e concretiza-se a expulsão dos Jesuítas, seguindo-se a confiscação dos seus bens, depois integrados na Fazenda Régia. Nesta sequência de factos marcantes da era pombalina, as escolas anexas às ordens religiosas e as que seguiam a doutrina e o método jesuíticos tiveram, paulatinamente, de aderir ao ideário pombalino e iluminista. Refere a mesma autora que, em 1772, ao criar um novo imposto – o Subsídio Literário –, no reino e nas ilhas dos Açores e da Madeira, o marquês de Pombal pretendia atingir o objetivo de anular o poder do ensino dos Jesuítas e transferi-lo para a competência do Estado. O imposto começa a ser cobrado em 1775, financiando as aulas de Ler, de Escrever e de Contar, de Gramática Latina, de Língua Grega, de Retórica e de Filosofia, que, com o devir do tempo, são lecionadas na igreja de São João Evangelista do Colégio do Funchal e, em 1789, passam a acumular com as aulas do Seminário. As cadeiras de Ler, de Escrever e de Contar são também lecionadas em Santa Cruz, São Vicente, Machico, Porto Santo, Calheta, Campanário, Ribeira Brava e Ponta do Sol. As cadeiras mencionadas e lecionadas eram acompanhadas das bibliografias adequadas, tendo as bibliotecas do Colégio dos Jesuítas (com ou sem os Jesuítas), do Seminário e dos conventos existentes assumido papéis determinantes nesse contexto. De acordo com o Elucidário Madeirense, os acervos das bibliotecas (livrarias) dos conventos, extintos por decreto de 28 de maio de 1834, foram incorporados na Biblioteca Municipal do Funchal (BMF) em 1863. A instituição do ensino superior ocorreu na Madeira no séc. XIX, através da antiga Escola Médico-Cirúrgica do Funchal, fundada em 1816 (mas só oficialmente criada em 1836, iniciando atividade no ano seguinte) e encerrada em 1910. Localizada no antigo Colégio dos Jesuítas, a sua biblioteca era rica, constituída por “mais de duas mil obras”, que foram depois transferidas para a BMF (COSTA et al., 1992, 21). O perfil do seu acervo diz respeito à gestão hospitalar, anatomia, farmacologia, cirurgia e mais assuntos relacionados com a saúde, a medicina, as curandices e outros, tendo muitos destes livros sido oferecidos pelo Dr. Nathaniel Lister, médico inglês. Os regimes liberal e republicano deram ênfase à instrução escolar, mas, regra geral, privilegiaram o livro único, pelo que as bibliotecas escolares eram desnecessárias. Em 1819, Joseph Phelps, comerciante de origem britânica que se fixou na Madeira e construiu a firma vinícola Phelps Page & Co., dedicou-se, também, a promover a instrução dos madeirenses, criando a Escola Lancasteriana, com o apoio de sua mulher, Elisabeth Phelps. A Ir. Mary Wilson, que chegou à ilha da Madeira em 1881, como enfermeira de uma doente britânica, dedicou-se posteriormente à catequese das crianças, aos doentes e à educação da juventude, formando, nos finais do séc. XIX e princípios do séc. XX, várias escolas no Porto Santo, no Arco de São Jorge, em Santana, no Santo da Serra, em Machico e em Câmara de Lobos. Em 1838, o médico Robert Kalley dedicou-se ao ensino primário, atividade que manteve durante os 10 anos seguintes. É presumível que estas escolas, cujo método de ensino não se identificava com o método nacional, tivessem beneficiado de pequenos fundos documentais para apoiar a aprendizagem dos alunos. O Elucidário Madeirense refere a existência da Biblioteca do Seminário Episcopal, cujo acervo era constituído por obras de Teologia, originárias na sua maior parte, a partir de 1788, do então recém-extinto Colégio dos Jesuítas. As bibliotecas escolares As bibliotecas escolares do séc. XX foram o espelho da realidade do ensino e da aprendizagem no país. Numa escola que privilegiava a memória, em que o professor omnipotente e enciclopédico debitava as aulas e os alunos escreviam os apontamentos/palavras ditas pelo professor, as bibliotecas escolares não faziam grande sentido, constituindo o livro único, os apontamentos e as sebentas o acervo destas. E se nalgumas escolas existiam bibliotecas, estas eram o elo mais fraco da gestão escolar, uma vez que beneficiavam de um espaço inadequado, ficando, regra geral, ancoradas num vão de escada ou numa sala imprópria e exígua, sem pessoal adequado; raramente possuíam máquina fotocopiadora (os alunos utilizavam a máquina fotocopiadora de outros serviços) e o professor responsável pela biblioteca era, regra geral, um professor que sofria de problemas de saúde (não podia ouvir ruídos nem levantar-se, porque as maleitas da doença não o permitiam). Aos alunos, era-lhes exigido somente que reproduzissem as ideias, os conceitos e o saber do professor. Existia uma correspondência entre o ensino, o sector empresarial e o funcionalismo público, em que a linha de montagem não exigia inovação e criatividade. Neste contexto, não fazia sentido o Estado empenhar-se e investir nas bibliotecas escolares e voltadas para a cidadania, tanto mais que a Fundação Calouste Gulbenkian desempenhava o papel de Ministério da Cultura, e antes dela as bibliotecas conventuais e dos seminários, como já referido, cumpriam a função da promoção do livro, da leitura e do conhecimento. Com a instauração do regime democrático, em 1974, e com a conquista da autonomia regional, em 1976, o ensino e a aprendizagem abrem-se a novas teorias e novos modelos já praticados na maioria dos países europeus e noutros cantos do mundo. Refiram-se alguns momentos mais relevantes deste processo, como o novo quadro legislativo sobre o ensino, assente na lei n.º 46/86 – Lei de Bases do Sistema Educativo, em que a biblioteca escolar passa a preencher um espaço central, com valor, ocupando o segundo lugar no capítulo dos recursos educativos. Outros diplomas se lhe seguem, e, em 2005, a nova versão consolidada, a lei n.º 49/2005, de 30 de agosto, mantém a mesma posição das bibliotecas escolares como recursos educativos privilegiados, a exigirem especial atenção. Associam-se-lhes o Manifesto da Biblioteca Escolar, de 1999, atualizado sucessivamente, e as Directrizes para Bibliotecas Escolares, de 2006, documentos publicados pela IFLA/UNESCO, com o primeiro a definir a biblioteca escolar como um recurso que fornece informação, permite a construção do conhecimento e desenvolve nos alunos competências que servirão para a aprendizagem ao longo da vida e da cidadania. Para além destes, existem diversos documentos vinculativos internacionais e nacionais, bem como inúmeras instituições, que se dedicam à investigação e ao estudo da nova biblioteca escolar, considerando-a importante para que crianças, os jovens e os adolescentes desenvolvam o gosto pela leitura e a imaginação. Em Portugal, a Rede de Bibliotecas Escolares (RBE), lançada em 1996, e o Plano Nacional de Leitura são, igualmente, projetos que devem ser considerados relevantes. Com a introdução destas novas medidas, a realidade do ensino altera-se radicalmente: o professor passa a ser considerado um agente educativo com novas competências (orientador, professor, investigador, monitor) e o aluno um agente ativo que, mantendo a função memória, procura também outras competências (aprender, comunicar, conhecer, partilhar, ser), recorrendo, para o efeito, a informação na biblioteca, nas mediatecas escolares e nas bases de dados que correm nas redes virtuais. As bibliotecas escolares passam, assim, a ser o coração da escola, um “direito irrenunciável” (ITURBE, 1998, 11), sendo através delas que a informação de apoio ao ensino corre transversalmente na escola. A literatura e os projetos curriculares e educativos valorizam o papel do professor bibliotecário e do bibliotecário escolar, que, em conjunto, orientam o aluno no processo de pesquisa da informação e na metodologia a aplicar nos seus trabalhos individuais ou em grupo, anulando o “aluno Wikipédia”. A informação e o conhecimento passam a ser as máquinas inorgânicas e imateriais que vieram substituir as máquinas da linha de montagem. Nasce o aluno e o trabalhador do conhecimento. Tal como refere Jean Piaget, o conhecimento não é estático, é construído através de um processo que está sempre em devir. Lev Vygotsky defende que os alunos constroem o conhecimento individualmente e em simultâneo com os outros. A educação deixa de ser monocultural e linear e privilegia a educação intercultural. Jürgen Habermas propõe a razão crítica, argumentativa, reflexiva, prática e teórica, em lugar da razão acrítica e estática. Esta literatura e legislação simbolizam uma visão pró-ativa e regeneradora para a biblioteca escolar, que colabora na nova aprendizagem, centrada no aluno, sendo para ele que tudo e todos convergem. A Região Autónoma da Madeira (RAM) formou os seus assistentes especialistas no âmbito das bibliotecas, e em 2006/2007 foi criada na UMa a pós-graduação em Ciências Documentais (Arquivo, Biblioteca e Documentação), com o intuito de formar o número suficiente de bibliotecários para garantir a modernização das suas bibliotecas. De entre as inúmeras bibliotecas escolares da Região (veja-se o portal da Biblioteca Pública Regional da Madeira (BPRM), o Órgão Coordenador do Programa da RBE na RAM, e o portal da Secretaria Regional da Educação e Recursos Humanos (SRERH)), salientam-se duas, pré e pós-autonomia: a do então Liceu Jaime Moniz e a da Escola Industrial e Comercial do Funchal. A Biblioteca da Escola Secundária Jaime Moniz O antigo Liceu do Funchal data originalmente de 12 de setembro de 1837, tendo dado origem, em 1919, ao Liceu Jaime Moniz. Mudou diversas vezes de instalações, mas o edifício onde existia no começo do séc. xxi foi inaugurado a 28 de maio de 1946 e compreendia a biblioteca escolar, sendo, portanto, uma construção do Estado Novo. Em 1980, passa a designar-se Escola Secundária Jaime Moniz. A biblioteca da Escola Jaime Moniz situa-se no 3.º andar da Escola Secundária Jaime Moniz. Foi herdeira do espólio do Liceu do Funchal, que incluía o livro antigo e deu origem ao Fundo Antigo, composto por um total de 632 monografias, de que se destaca uma obra de Ovídio datada de 1725 e intitulada Metamorphoseon Libri XV: Expurgati. O acervo da biblioteca do antigo Liceu constitui um espólio que caracterizou o ensino no arquipélago e as interações sociais e culturais relevantes durante os sécs. XIX e XX, tendo sido, por razões de conservação, colocado à guarda da BPRM, através de um protocolo celebrado entre as duas instituições. Com o advento das tecnologias da informação e comunicação (TIC), a biblioteca modernizou-se, aderindo ao programa PORBASE (Base Nacional de Dados Bibliográficos) e beneficiando das redes computacionais para acesso à Internet. Em 2015, encontravam-se registados 37.867 títulos na base de dados, e estavam referenciados 55.478 nos livros de registos da biblioteca, havendo ainda espólio por indexar. A biblioteca integrava também uma hemeroteca e uma coleção de jornais. Continuamente enriquecida com a doação de livros por parte dos professores, destacavam-se as doações efetuadas pelos familiares da Dr.ª Margarina Morna e do Dr. Jorge Pestana, antigos professores da escola, que contribuíram para o enriquecimento da biblioteca. Quer o fundo antigo, quer o fundo geral podem ser consultados no site da BPRM. O universo de utilizadores da biblioteca é constituído por alunos, professores e funcionários da escola, investigadores e alunos do ensino secundário em geral, que têm ao seu dispor vários serviços. Assim, nas primeiras décs. do séc. XXI, para além da consulta e do empréstimo de livros, a biblioteca facultava apoio pedagógico aos alunos na realização de trabalhos de pesquisa, promovia concursos nos âmbitos da leitura e da escrita, com a colaboração da BPRM e de outras entidades, e organizava conferências. Promovia ainda outros momentos de aprendizagem, com a colaboração de professores e alunos, sobre conteúdos programáticos e realizava exposições variadas e outras atividades ligadas ao quotidiano escolar. Os recursos humanos eram todos qualificados e a coordenação da biblioteca era da responsabilidade de professores. A Biblioteca da Escola Secundária de Francisco Franco A Escola Secundária de Francisco Franco foi construída em 1958, sendo então denominada Escola Industrial e Comercial do Funchal. É uma construção do Estado Novo, pelo que a sua arquitetura obedece ao ideário político e educativo desse período. A 11 de janeiro de 1979, o Governo Regional da Madeira (GRM) decreta que a escola deverá ter como patrono uma figura ilustre da região, passando a chamar-se Escola Secundária de Francisco Franco, em homenagem ao escultor madeirense. Construída igualmente em 1958, a ampla biblioteca desta escola tinha, em 2015, um acervo de cerca de 12.000 unidades documentais, 700 revistas e 600 unidades de material não livro (MNL) (DVD, CD áudio e CD-ROM), cujo perfil estava virado para o apoio ao ensino e à aprendizagem. A Sala Dr. Vasco Mendes, criada em homenagem à memória desse antigo professor da escola, valorizou o acervo e as atividades letivas: as obras aqui expostas constituem o espólio do antigo docente e da sua família, que, através da filha, Maria da Luz S. Pereira Mendes, doou este acervo à biblioteca. A escola não se alheou do paradigma informático, que favoreceu naturalmente a biblioteca, permitindo a coabitação dos dois ambientes: o clássico e o neomoderno. Contava com uma ampla sala de leitura, uma videoteca, uma mediateca, uma ludoteca e um polo cultural, onde se realizavam diversas atividades, dentre as quais se destacavam o espaço de leitura, recitais de poesia, debates e encontros culturais. Aqui, os professores podiam também lecionar as suas aulas, uma vez que se tratava de um espaço integrado na biblioteca, beneficiando da utilização de fontes impressas e eletrónicas. De acordo com as normas gerais de utilização, os alunos podiam realizar as seguintes atividades: pesquisar em documento livro (papel) ou documento virtual (Internet); estudar; fotocopiar documentos consultados; requisitar livros para leitura domiciliária; ler a imprensa diária regional; consultar revistas de especialidade; digitalizar documentos; visionar filmes e jogar. Para o tratamento técnico da informação, a Classificação Decimal Universal (CDU) era o único instrumento utilizado para o sistema de cotagem, permitindo distribuir o acervo em regime misto no acesso às estantes. Esta era a única biblioteca escolar que, em 2015, tinha no seu quadro de pessoal não docente um técnico superior com formação pós-graduada na área das ciências documentais, três assistentes técnicos com formação no âmbito de biblioteca e documentação, e dois professores coordenadores. A informação corria transversalmente na escola através do seu site oficial. Restantes bibliotecas escolares: pós-autonomia Segundo informação proveniente da SREHR, entre 2012 e 2013 existiam na RAM os seguintes totais de estabelecimentos de ensino, distribuídos pelos níveis de escolaridade em vigor: no ensino público, 142, e no ensino privado, 65. A maioria destes estabelecimentos de ensino foi construída depois de 1976. Sobre estes, pode afirmar-se o seguinte, para o período indicado: 1) Todas as escolas do ensino público dos 2.º e 3.º ciclos e secundárias, sem exceção, beneficiavam de bibliotecas escolares; 2) Todas as escolas do ensino básico do 1.º ciclo, as creches, os estabelecimentos de ensino pré-escolar e os infantários possuíam uma sala (se não no próprio espaço, pelo menos em espaço anexo), que dava origem à ludoteca, com materiais diversos que contribuíam para desenvolver e compreender a leitura, a imaginação e o desenvolvimento de competências cognitivas das crianças e dos jovens, com atividades que iam desde a promoção da leitura à realização de trabalhos lúdicos e manuais, nomeadamente palestras com o apoio de um animador de biblioteca, que assegurava entre duas a três horas de atividades semanais com todas as turmas da escola. Este cenário era semelhante ao ensino particular. No entanto, não se tratava, tecnicamente, de bibliotecas, dado que não estavam organizadas de acordo com os princípios das ciências documentais e tecnológicas; 3) Os estabelecimentos de ensino beneficiavam de rede computacional, que se estendia à biblioteca escolar ou aos espaços anexos; 4) As bibliotecas escolares, tecnicamente assumidas como bibliotecas, beneficiavam de pessoal qualificado no domínio das ciências documentais; eram geridas por uma equipa de professores coordenadores, que faziam interagir o programa da biblioteca com os curricula. Baú de Leitura O Baú de Leitura foi um projeto escolar implementado na RAM em 2001, cujo objetivo principal era promover hábitos de leitura e de escrita junto dos alunos de todos os níveis de ensino. Cada escola possuía um baú de livros que, mensalmente, ia de escola em escola, sendo alvo de atividades de animação da leitura durante a permanência em cada escola. Juntamente com os livros, um kit com propostas lúdicas concebido por cada dinamizador permitia a partilha de atividades; este kit tinha como missão implementar o gosto pela leitura nas crianças e nos jovens e promover o intercâmbio entre bibliotecas escolares. Todos os estabelecimentos de ensino público e privado do pré-escolar, do 1.º, 2.º, 3.º ciclos e do secundário podiam beneficiar deste projeto, razão pela qual algumas escolas do pré-escolar, os infantários, as creches e as EB1 não possuíam bibliotecas escolares tecnicamente organizadas. Contudo, o projeto podia ser dinamizado pelos animadores socioculturais de biblioteca, professores, educadores de infância e técnicos bibliotecários, que desenvolviam diversas atividades de natureza lúdica relacionadas com o livro, das quais se mencionam as mais frequentes: tertúlias literárias, atividades de escrita criativa, investigação temática, dramatizações, gincanas, concursos, visitas de estudo, intercâmbios culturais, atividades de expressão artística e plástica, visionamento de filmes, audição de histórias, encontro de escritores e comemorações de efemérides. A sede de coordenação do projeto situava-se na Escola Básica e Secundária da Calheta, sob a tutela da SREHR. No caso do 1.º ciclo/PE, o Baú de Leitura era coordenado por um coordenador geral e pelos coordenadores concelhios. Ao nível das escolas do 2.º e 3.º ciclos e do secundário, o projeto era coordenado por duas coordenadoras gerais. As bibliotecas infanto-juvenis: O Jardim e a Biblioteca de Educação Permanente A Árvore A 5 de maio de 1979, foi inaugurada no concelho do Funchal a biblioteca infantil, sendo esta a primeira biblioteca da Rede de Bibliotecas Infanto-Juvenis (RBIJ) O Jardim, designação que a passa a identificar a partir de 1982. Já a 31 de março do mesmo ano havia sido inaugurado um atelier de leitura infantil e lançada uma experiência museológica de campo que esteve na génese da referida rede de bibliotecas. Maria Margarida Macedo Silva foi a fundadora e diretora deste projeto. Profissional competente, inovadora e criativa, construiu uma obra muito avançada para uma realidade ainda atrasada do ponto de vista dos hábitos de leitura e culturais, lançando sementes que cresceram nas crianças que tiveram acesso às bibliotecas O Jardim e às suas atividades informativa e formativa. Para Margarida Silva, a leitura promovia o pensamento, a reflexão, o espírito crítico e a metacognição, princípios orientadores da nova escola, na qual as bibliotecas deveriam funcionar como autênticos laboratórios dessa aprendizagem. Criada em 1979, a RBIJ é resultado da ausência das bibliotecas escolares, tanto mais que, à data, a RAM não beneficiava de uma rede suficiente de infraestrutura escolar. Assim, as bibliotecas infanto-juvenis O Jardim foram bibliotecas escolares criadas fora do espaço físico da escola, que se mantiveram ao longo de cerca de 16 anos. Existiu um projeto para a criação de uma biblioteca infanto-juvenil O Jardim na ilha de Jersey, mas que nunca foi concretizado. A RBIJ teve o seu termo entre 1993 e 1995, tendo o seu acervo sido incorporado nas bibliotecas das escolas então construídas. Apresenta-se uma tabela com as bibliotecas que constituíram a rede infanto-juvenil O Jardim. [table id=76 /] As bibliotecas da rede O Jardim tinham uma agenda de formação exigente e planificada, que envolvia docentes do ensino primário, estagiários(as) do Magistério Primário, educadoras de infância e de outros níveis de escolaridade, bem como discentes da Escola de Magistério Primário. Apresentam-se alguns exemplos das agendas de trabalho da RBIJ O Jardim e da Biblioteca A Árvore, de que falaremos adiante: criação de clubes de leitura, dedicados a escritores portugueses; momentos de poesia e musicais; encontros com a Região, seguidos de debate; criação do projeto Fazendo Artes na Alfabetização, com recurso à linguagem dos cartazes, à confeção de grelhas para enriquecimento de vocabulário, à utilização da “roda de palavras” e do teatro de bonecas, passando pela construção e organização de ficheiros de alfabetização e ficheiros de leitores; iniciação de leitores na investigação literária e jornalística; criação de uma oficina de artesanato e de bonecos e realização de teatro de mesa para conhecer Gil Vicente; exposições; e a criação do Museu do Livro Escolar, passando por debates com autores madeirenses. No que diz respeito à educação permanente, refere Margarida Silva que “os meses de férias foram os mais produtivos, e estamos certos de que preenchendo tempos livres, sob este aspeto informal, abrimos pistas à juventude madeirense para uma Educação Permanente” (SILVA, 1999, 123). As atividades eram executadas com a participação dos bibliotecários como animadores, trabalhando em grupo. Porém, a RBIJ O Jardim tornou-se insuficiente para os utentes de uma faixa etária superior, pelo que em 1982 é criada a Biblioteca de Educação Permanente A Árvore, que funcionou paredes meias com O Jardim de Santo António, numa linha interdisciplinar e de partilha entre a escola e a comunidade, como refere Margarida Silva: “Se ‘O Jardim’ Biblioteca Infantil é um complemento da Escola (não o seu substituto), a ‘A Árvore’, Centro de Educação Permanente, não substitui os cursos de alfabetização, apenas constitui uma forte motivação fazendo a ligação Escola-Comunidade” (Id., Ibid., 37-38). A biblioteca A Árvore seguiu os conceitos da UNESCO no que diz respeito à Educação Permanente, depois designada por “educação ao longo da vida”. A Biblioteca da Escola do Magistério Primário Criada em 1943, a Biblioteca da Escola do Magistério Primário era constituída por um acervo cujo perfil convergia para o ensino e aprendizagem dos futuros professores do ensino primário. Totalizava 4.193 unidades documentais, de acordo com o livro de registos, sendo o pedagogo Jean Piaget o autor de eleição. A Biblioteca da Escola Superior de Educação A Escola Superior de Educação, criada a 12 de novembro de 1985, funcionou no antigo Colégio dos Jesuítas, tendo a sua biblioteca herdado o acervo da biblioteca da antiga Escola do Magistério Primário, que totalizou 4.175 unidades documentais, de acordo com o livro de registo. A sua extinção ocorreu em 1989, através do dec.-lei n.º 391/89, de 9 de novembro, e o seu acervo foi integrado na Biblioteca da UMa. A Biblioteca da Universidade da Madeira (UMa) A Biblioteca da UMa foi fundada aquando da criação da mesma Universidade, em 1988, pelo dec.-lei n.º 319-A, de 13 de setembro desse ano. Correspondia a um espaço físico lacónico cujo acervo era constituído pelos acervos das escolas que estiveram na génese da Universidade: o da Escola do Magistério Primário (com 4.193 unidades documentais), o da Escola Superior de Educação (com 4.175) e o das extensões universitárias (cujo acervo totalizava 4.020 unidades). O acervo era orientado para os âmbitos científicos das Ciências da Educação e das Políticas de Ensino e da Aprendizagem, num total de cerca de 12.378 unidades documentais, e encontrava-se verdadeiramente desatualizado e empobrecido face às novas teorias que emergiam nos referidos domínios científicos, não satisfazendo as necessidades informacionais dos cursos que iam sendo desenhados e consolidados na nova estrutura de ensino superior. Além disso, os recursos humanos afetos à biblioteca eram reduzidos, com horários descontínuos, desadaptados aos diplomas laborais em vigor e destituídos de qualificações, características que deram origem a uma biblioteca doméstica, empírica, personalizada e estagnada cientificamente. Em 1992-1993, ano em que a Biblioteca da UMa integrou recursos humanos qualificados, surgiu um novo lema, baseado na máxima “Transformar tudo e todos”. Formar e reconverter recursos humanos, atualizar o acervo, disponibilizá-lo em regime de livre acesso e tratá-lo, em termos técnicos e informáticos, de acordo com normas internacionais que permitissem a transferência da informação sem obstáculos – o que culminou com a construção do catálogo informatizado, através do programa Mini Micro CDS/ISIS (PORBASE) –, aceder à Internet (em 1993), desenvolver as figuras do empréstimo domiciliário e do EIB (Empréstimo Inter-Bibliotecas, nacional e internacional – foi aberto um canal com The British Library) e cooperar com a Biblioteca Nacional de Portugal (BNP), com vista a alimentar o catálogo bibliográfico nacional (PORBASE) e integrá-lo no universo dos seus cooperantes, foram os objetivos que alimentaram a nova visão, concretizados com sucesso. A transformação foi acompanhada pelo Grupo de Docentes para a Biblioteca, e esta recebeu a designação de Centro de Documentação e Informação. A partir de setembro de 1997, quando a Biblioteca da UMa beneficiou de um espaço físico mais adequado no edifício universitário do Campus da Penteada, ao desenvolvimento científico, técnico e cultural que contribuiu para o inevitável progresso da tríade ensino/aprendizagem/investigação, correspondeu um novo lema: “Integrar e flexibilizar tudo e todos”. Atualizar as metodologias documental e informática, modernizar a sala de leitura, dotando-a de rede local e de computadores que permitissem ao utilizador realizar as suas pesquisas, agilizar processos documentais e assegurar uma abordagem mais flexível com o utilizador interno e a abertura à sociedade civil foram metas atingidas com êxito. A biblioteca assumiu várias designações, em conformidade com as alterações dos seus estatutos: Centro de Documentação e Informação, em 1993; Serviços de Documentação e Informação, em 1996; Sector de Documentação e Arquivo, Unidade de Documentação Arquivo, em 2008; e, em 2013, Unidade de Biblioteca e Arquivo. Com o lema: “Informar para formar rumo à cognição, à criação do conhecimento”, a entrada no séc. XXI conduziu à criação de uma biblioteca verdadeiramente científica, em que os acervos (documental e digital) se foram construindo em interação com os professores e investigadores da academia, relação que representou o ícone de uma nova cultura organizacional e informacional, onde todos participavam e assumiam a responsabilidade da adequação dos acervos aos curricula lecionados na UMa e ao ideal europeu, razão pela qual se lhe associou o acervo do Centro de Documentação Europeia (CDE). A reestruturação do lema reforçou a implementação de uma atitude informacional orientada para a academia e exógena a ela, isto é, tanto para o utilizador interno, como para o externo. Em 2014, o acervo documental, em suporte papel, totalizava 121.216 unidades documentais, distribuído pelas seguintes coleções: 59.000 monografias; 27.842 fascículos de publicações periódicas; 6612 MNL (cassetes, disquetes, CD-ROM e DVD); 3822 trabalhos académicos (dissertações de mestrado e teses de doutoramento); 6552 monografias CDE; 16.038 publicações periódicas CDE e 1350 MNL CDE – total adquirido por via da compra e raramente por via da oferta; e a coleção digital, que continha milhares de documentos digitais de carácter científico. Os utilizadores da biblioteca eram constituídos maioritariamente pelos elementos da academia, concretamente pelos utilizadores internos: alunos, professores, investigadores e funcionários. Estimava-se em cerca de 3000 os utilizadores inscritos na unidade de biblioteca, número que correspondia à população da academia. Simultaneamente, a biblioteca estava aberta a utilizadores externos, distribuídos essencialmente por investigadores, mestrandos, doutorandos e população em geral, que procurava neste sector informação científica, em particular a digital e o serviço de EIB, para desenvolver os seus trabalhos de investigação. Em 2013, a Biblioteca da UMa contava com 11 profissionais qualificados no âmbito das ciências documentais: um doutorado neste âmbito; um mestre no âmbito da gestão do marketing; um técnico superior bibliotecário; três assistentes especialistas qualificados, com o curso de biblioteca, arquivo e documentação; dois assistentes administrativos; e três assistentes operacionais. O apoio informático era fornecido pelos serviços informáticos da UMa. Nos anos anteriores, diversos alunos haviam tido funções na biblioteca, tendo dois deles, da área da engenharia informática, ficado nos quadros de pessoal. A adesão às bases de dados científicas, tais como a Web of Knowledge, ocorreu em 2002; à Biblioteca do Conhecimento Online (B-On), que contém cerca de 17.500 títulos de publicações periódicas de reconhecido mérito científico internacional, em 2006; à Plataforma DeGóis e às bases de dados científicas SPORTDiscus e JSTOR, em 2009. A Biblioteca aderiu ao projeto de acesso aberto comunitário (Digital Repository Infrastructure Vision for European Research (DRIVER), depois OpenAIRE) também em 2009, com o Repositório Institucional da UMa (designado DigitUMa), em maio de 2010; ao Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP), também em 2010; e o acesso à eLibraryUSA, em 2013. Os diversos links direcionados para os catálogos e bases de dados nacionais e internacionais eram as mais proeminentes bases de dados do acervo digital. Em maio de 2010, o DigitUMa foi integrado no RCAAP, sustentado pelos princípios do Open Access Initiative, contando com centenas de milhares de documentos científicos (digitais) produzidos nas academias portuguesas. Constituído pelos repositórios ou bibliotecas digitais das universidades públicas portuguesas, e na qualidade de repositório nacional, o RCAAP seguiu as diretrizes técnicas do projeto DRIVER, depois assumido por OpenAIRE, repositório europeu fundado pela Comissão Europeia que tem como principal objetivo a reunião num só acesso livre de toda a produção científica europeia, alimentada pelos repositórios nacionais e/ou institucionais. O paradigma clássico de comunicar a investigação, um modelo contraditório, moroso, caro e individualista, deu origem a outro paradigma, assente em princípios que privilegiam a divulgação do conhecimento científico produzido nas universidades, à escala global, e através da Internet, de acordo com o movimento internacional conhecido por Open Acess Initiative (OAI), ou Acesso Livre ao Conhecimento (AL), ou Open Access (OA), que se concretiza na disponibilização livre na Internet de cópias gratuitas da produção cientifica avaliada por pares (peer-reviewed), bem como de relatórios técnicos, dissertações de mestrado, teses de doutoramento e outros documentos de trabalho. Em síntese, os documentos existentes no DigitUMa tornaram-se passiveis de ser pesquisados e consultados a nível nacional no RCAAP e a nível europeu no OpenAIRE. Deste modo, a europeização/internacionalização/webização da UMa foi afirmada à escala global, através do depósito dos conteúdos científicos produzidos pelos professores/investigadores, discentes e funcionários da UMa. Até 2006, os recursos documentais foram tecnicamente tratados no ambiente PORBASE 5, adquirido à BNP. Este software tornou-se inadequado, uma vez que não era interoperável com os softwares da UMa, atrasando as mais diversas exigências qualitativas da gestão organizacional da informação. Nesse ano, a Biblioteca passou a beneficiar de uma plataforma informática integrada, interoperativa e escalável, adquirida com o apoio de fundos comunitários, expressão máxima da sua webização. Dois softwares constituíram a referida plataforma: o Aleph, responsável pela gestão integrada da documentação e que interage com os diversos interfaces existentes na academia, deu origem ao catálogo informatizado e integrado, conhecido por BibUMa. O segundo software, designado por Digitool, foi o responsável pela gestão de conteúdos académicos ou científicos, tendo desenvolvido o DigitUMa. Em maio de 2010, o Digitool foi substituído pelo software DSPACE, em regime de open source. Os softwares utilizados são idênticos aos das bibliotecas universitárias portuguesas e de inúmeras bibliotecas universitárias internacionais, permitindo a adesão da Biblioteca da UMa ao grupo USE.pt, grupo no qual as bibliotecas universitárias portuguesas têm assento. Em 2015, a FCCN/FCT (Fundação para a Computação Científica Nacional, da Fundação para a Ciência e a Tecnologia) era a fundação portuguesa que reunia as bibliotecas portuguesas, entre as quais a Biblioteca da UMa, concretizando projetos avançados no âmbito das TIC, da política do OAI em 2002 e de programas financeiros europeus, entre outros, e projetando as bibliotecas universitárias portuguesas à escala global. Enquanto a PORBASE, sediada na BNP, projetou, em 1993, a biblioteca para Portugal, o OAI, em 2002, e a FCCN/FCT e a USE.pt, em 2013, projetaram-na para o mundo webizado. A Biblioteca oferecia os seguintes serviços: técnicos, digital (gestão das bases de dados) e de referência (incluindo a gestão do catalogo, o atendimento, a sala de leitura, os empréstimos, o marketing documental – que compreendia a formação de utilizadores nas unidades curriculares e na própria Biblioteca, uma formação muito solicitada pelos docentes, uma vez que incide no Processo de Pesquisa de Informação no catálogo e nas bases de dados mais relevantes; visitas de estudo de alunos das mais diversas escolas da RAM e de grupos de cidadãos; a realização de um workshop anual; lançamentos de livros; diversos seminários; e agenda cultural). Os empréstimos (domiciliário, permanente e interbibliotecas) eram realizados pelo serviço de referência, juntamente com o serviço digital. Todos os documentos podiam ser objeto de empréstimo, com exceção das publicações periódicas e das obras de referência, podendo também o utilizador externo beneficiar do empréstimo domiciliário. Os produtos que a Biblioteca disponibilizava eram os seguintes: BibUMa, DigitUMa, B-On, Web of Knowledge, RCAAP, OpenAire, a eLibraryUSA, ColCat (Catálogo Coletivo, que permite a pesquisa integrada), PORBASE, Facebook e Webpage, que ofereciam aos membros da academia inúmera informação científica, técnica e cultural. Se em 1992-1993, a Biblioteca beneficiou da ligação à rede computacional, que permitiu o acesso à Internet; em 2006, a rede sem fios expandiu-se na UMa, em particular na Biblioteca. A fácil usabilidade dos computadores portáteis pelos utilizadores na Sala de Leitura desenvolveu a interação entre as fontes eletrónicas e as fontes impressas. Podemos concluir que a Unidade de Biblioteca estava em condições de acompanhar o progresso científico promovido na UMa e de atuar como espaço transversal de informação científica, técnica e cultural na academia, sendo um dos epicentros da Universidade e uma biblioteca científica na RAM. Era igualmente uma porta aberta para o exterior e para a sociedade científica. Essa era a contribuição da Biblioteca da UMa para a RAM e para a sociedade de economias de informação e do conhecimento, sustentadas pelos fundamentos filosóficos da razão comunicativa, argumentativa e crítica de Jürgen Habermas. A Biblioteca do Centro de Estudos de História do Atlântico (CEHA) As instalações do CEHA, situadas na R. das Mercês, no Funchal, desde 1 de outubro de 2009, permitiram oferecer serviços à população madeirense, bem como aos estudiosos nacionais e estrangeiros que visitam este Centro. A biblioteca do CEHA tem fundos documentais próprios, que se formaram através do intercâmbio com diversas instituições. Em 2013, contava com um total de 1121 livros e 111 publicações periódicas, enquanto a biblioteca de Alberto Vieira, fundo documental doado ao Centro em 2010, registava um total de 4846 livros e 317 publicações periódicas. A biblioteca e o fundo documental de Alberto Vieira contemplavam bibliografia especializada sobre a história da Madeira e demais ilhas do mundo, com especial destaque para o espaço Atlântico (Madeira, Açores, Canárias, Cabo Verde, São Tomé e Santa Catarina), com fundos especiais, em diversas línguas, sobre a história da escravatura, da ciência e técnica, da autonomia, do açúcar e do vinho. Em 2015, previa-se que a biblioteca do CEHA não tardasse a ficar totalmente disponível em formato digital; parte do acervo de história da Madeira já se encontrava disponível. O CEHA disponibilizava ainda um conjunto de publicações para empréstimo domiciliário, no total de 653 títulos. O acesso ao catálogo fazia-se através da BPRM. A Biblioteca do Conservatório – Escola das Artes Eng.º Luiz Peter Clode A biblioteca do Conservatório – Escola das Artes Eng.º Luiz Peter Clode localiza-se no 1.º andar do edifício do Conservatório. A avaliar pelo registo no livro de tombo, o livro mais antigo nela depositado datava de maio de 1957, embora se encontrassem diversos exemplares integrados com datas anteriores, sem que se soubesse exatamente quando. Presume-se, assim, que a Biblioteca foi criada por volta de 1957, tendo tido o primeiro funcionário com a categoria de bibliotecário/catalogador em 1978. Em 2015, esta biblioteca não dispunha de acervo em suporte digital. O catálogo foi concebido no programa Access da Microsoft, mas estava nesta data a ser construído no ambiente PORBASE, com o apoio da BPRM. Teria 4859 obras em geral e 5787 partituras, algumas do séc. XIX. O seu acervo fazia desta biblioteca uma biblioteca escolar e simultaneamente uma biblioteca especializada em obras musicais. Os seus utilizadores eram os alunos, professores e funcionários do Conservatório, encarregados de educação e outros familiares dos alunos. A Biblioteca estava também aberta à comunidade em geral, sendo frequentada por leitores (por vezes estrangeiros) que necessitavam de consultar partituras, utilizadores da UMa e outros interessados em música. Segundo o site do Conservatório, anexa à biblioteca, funcionava a mediateca, que dispunha de 8700 CD, 59 DVD, 50 vídeos e cerca de 3000 LP, aquisições feitas pela escola e através de doações de particulares, das quais uma das mais valiosas foi a de John Ranalow. A sala possuía uma aparelhagem áudio, que permitia aos alunos a audição e gravação de música, e de uma televisão, para visionamento de documentários musicais. A biblioteca contava com uma responsável, mestre em Ciências da Informação e Documentação, vertente de Biblioteconomia, e um funcionário do Conservatório, que zelava pela abertura do espaço. A Biblioteca da Direção de Serviços de Educação Artística e Multimédia (DSEAM) Criada em setembro de 2004, a biblioteca da DSEAM tinha um total de acervo em papel de cerca de 22.000 documentos, dos quais aproximadamente 18.500 já estavam, em 2015, catalogados em Catwin e disponibilizados na rede PORBASE (cooperante efetivo) e no seu site. Com aproximadamente 250 utilizadores registados, os principais utentes eram os professores, educadores, investigadores e colaboradores da própria DSEAM e alunos universitários. Os serviços que oferecia à comunidade eram: documentação especializada em música (teoria e prática), educação e artes, embora tivesse um catálogo razoável nas áreas de literatura, ciências sociais e história; biblioteca online (catálogo), onde se incluíam aproximadamente 4000 documentos digitais; e portal de recursos digital, incluindo os mesmos 4000 documentos (disponibilizados em Pacwin, mas também no Portal de Recursos Educação Artística). A biblioteca contava com pessoal com formações de curta duração na BN e no Arquivo Regional da Madeira (ARM); um dos colaboradores tinha realizado um estágio no Centro de Estudos Musicológicos da BN. Em 2015, esta equipa era coordenada pelo Dr. Paulo Esteireiro, que também estagiara no Centro de Estudos Musicológicos, em contexto curricular da Universidade Nova de Lisboa, e frequentara várias ações de formação na BN, nas áreas da indexação, catalogação e Catwin. A biblioteca tinha o maior número de documentação musical manuscrita (partituras) catalogada na Madeira (4400 partituras históricas). As partituras históricas madeirenses estavam organizadas em aproximadamente 15 coleções, de acordo com a sua proveniência. A biblioteca tinha partituras de bandas filarmónicas, orquestras e grupos de bandolins, orquestras de salão e de igreja, música vocal sacra variada, música para piano, música para viola, etc. Para além disso, dispunha também de um extenso acervo na área do vídeo e áudio (CD). O Centro de Informação e Documentação (CID) O CID, integrado, em 2015, no Departamento de Ciência e Recursos Naturais da Câmara Municipal do Funchal (CMF), era composto por dois núcleos documentais: a Biblioteca Professor Luiz Saldanha da Estação de Biologia Marinha do Funchal, e a Biblioteca do Museu de História Natural do Funchal (MHNF). A Biblioteca Professor Luiz Saldanha da Estação de Biologia Marinha do Funchal deve a sua designação à figura deste professor e oceanógrafo de prestígio internacional, que doou à Biblioteca o seu espólio científico, para servir de apoio à investigação. Foi criada a 28 de setembro de 1999, integrada na Estação de Biologia Marinha do Funchal. Encontravam-se depositados na Biblioteca Professor Luiz Saldanha três espólios ou acervos de elevada relevância para a comunidade científica, a saber: o espólio Professor Günther Edmund Maul, composto por monografias (algumas delas com uma certa raridade), revistas, correspondência científica, relatos de viagens, manuscritos, etc., alargando-se a todas as áreas da história natural; o espólio Professor Luiz Vieira Caldas Saldanha, composto por monografias, revistas, correspondência científica, desenhos, postais, etc. (grande parte do espólio cobre as áreas da biologia marinha, oceanografia e ictiologia); e o espólio Professor Doutor Armando Almeida, composto essencialmente por trabalhos científicos abrangendo áreas das ciências do mar, concretamente ecologia costeira e ictiologia. A partir de 1933, o segundo núcleo documental formou a Biblioteca do Museu de História Natural do Funchal, que está em contacto permanente com outras bibliotecas, centros de documentação de universidades e outras instituições científicas em todo o mundo, com o objetivo de trocar e divulgar informações, enriquecendo assim o seu património cultural científico. O engrandecimento do acervo documental desta biblioteca efetuava-se de três formas: compra, oferta e permuta. Esta última era feita através da edição de duas publicações científicas, o Boletim do Museu Municipal do Funchal e o Suplemento do Boletim do Museu Municipal do Funchal, que contêm trabalhos científicos de grande relevo nas diversas áreas da história natural da Macaronésia. Para além destes, publicava ainda a revista Bocagiana, destinada não só à descrição de espécies novas, mas também à divulgação de artigos carenciados de publicação urgente. Estas revistas eram distribuídas gratuitamente a diversas instituições de investigação científica, universidades e bibliotecas a nível mundial. Em 2015, os utilizadores do CID eram essencialmente estudantes do nível secundário e superior, docentes e investigadores. O acesso era livre, podendo os utilizadores (internos e externos) consultar as bibliotecas de acordo com a área de interesse, quer na Biblioteca da Estação Biologia Marinha do Funchal, quer na Biblioteca do MHNF. O total do acervo do CID correspondia, nesta altura, a aproximadamente 13.000 documentos (monografias, revistas e MNL). Para além do suporte em papel, o Centro assegurava ainda o acesso eletrónico em suporte digital. Duas bases de dados permitiam o acesso aos documentais digitais: Prisma (módulo de catalogação e gestão de monografias e de publicações em série) e Procite/Endnote. O CID facultava o acesso à informação de carácter científico e técnico da Biblioteca da Estação de Biologia Marinha do Funchal, nas áreas, em particular, da biologia marinha, oceanografia e pesca, e da Biblioteca do MHNF nas restantes áreas, como biologia terrestre, história natural da Macaronésia e geologia. Estimava-se que muito em breve o Centro estaria disponível para prestar o serviço de empréstimo interbibliotecas. Contava com acesso eletrónico à informação científica em linha, ou através de suporte digital, e a consulta do catálogo bibliográfico. O CID beneficiava de recursos humanos qualificados no âmbito das ciências documentais. O Centro de Documentação da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira (ALRAM) O Centro de Documentação da ALRAM foi criado, em simultâneo com o edifício da Assembleia, a 4 de dezembro de 1987, designando-se, à época, biblioteca da Assembleia Legislativa Regional. Em 2015, era composto por dois sectores – o arquivo e a biblioteca, de acordo com a estrutura orgânica da ALRAM – e assumia a designação de Centro de Documentação, ao qual competia: a) recolher, organizar, tratar, armazenar e difundir a informação nacional e estrangeira nas várias áreas do conhecimento; b) produzir e difundir cadernos de informação, ou outros produtos, adequados aos temas em apreciação nos vários órgãos da ALRAM; c) recolher, selecionar, tratar e conservar todos os documentos referentes aos deputados e a atos e factos da ALRAM; d) recolher, registar, catalogar, indexar e zelar pela conservação de todas as espécies do espólio documental da ALRAM; e) prestar informações sobre a bibliografia e documentação existentes no acervo e facultar o respetivo acesso, nos termos do regulamento interno; f) promover e colaborar em atividades de divulgação do património documental e propor a edição e difusão de publicações com interesse para a ALRAM e as que respeitam à história do Parlamento, em estreita colaboração com o Departamento de Relações Externas e para a Comunicação Social; g) gerir o acervo e o funcionamento da biblioteca da ALRAM; h) organizar e assegurar a manutenção do Arquivo Histórico-Parlamentar e o arquivo corrente de todos os serviços da ALRAM. O seu acervo era, nesta data, constituído pela produção documental que resulta das atividades legislativas, por coleções de monografias, publicações periódicas e bases de dados, cujos perfis se adequam às atividades parlamentares. O Centro de Documentação beneficiava de pessoal qualificado, conferindo qualidade ao tratamento e à disseminação da informação legislativa e parlamentar. As Administrações Pública e Local, os Laboratórios e os Museus Nas Secretarias Regionais do GRM existiam, em 2015, centros de documentação e informação que beneficiavam de núcleos documentais ao serviço dos seus funcionários. Os laboratórios existentes na RAM, que têm assegurado estudos relevantes para a Região (a saber: o Laboratório Regional de Engenharia Civil, o Laboratório de Metrologia da Madeira Dr. José Agostinho Gomes Pereira de Gouveia, o Laboratório de Saúde Pública, o Laboratório Regional de Controlo de Qualidade da Água, entre outros), bem como os museus e o Jardim Botânico da Madeira, beneficiavam, nesta data, de bibliotecas, algumas com núcleos documentais antigos, ricos e variados, que apoiavam e valorizavam as atividades dos seus funcionários que se dedicavam à investigação. O Centro de Documentação Europeia (CDE) (UMa) O CDE (específico e não completo) foi alojado na Biblioteca da UMa em 1995, altura em que a Universidade se lançou a uma candidatura comunitária para a sua aquisição. A UMa forneceu o espaço físico, o pessoal qualificado e as ferramentas informáticas, desde o hardware ao software, enquanto a UE, através da Comissão Europeia e da representação da Comissão Europeia em Portugal, forneceu o acervo documental, quer em suporte papel, quer em suporte digital. O Centro tinha por objetivo divulgar o ideário comunitário junto da academia, razão pela qual se realizavam eventos e inúmeras exposições nesse âmbito. Em 2015, o seu acervo estava estimado em 23.940 unidades (cujas referências se encontravam no catálogo da Biblioteca da UMa), distribuído pelas seguintes tipologias documentais: 6552 monografias, 16.038 fascículos de publicações periódicas, 1359 unidades de MNL. Estavam também disponíveis milhares de documentos digitais, que podiam ser acedidos através do portal da Europa. A Biblioteca de Assuntos Europeus – Casa da Europa da Madeira Integrada na Casa da Europa da Madeira, o seu acervo era constituído por publicações de carácter específico relacionadas com questões europeias, quer em suporte papel, quer em suporte digital, através das bases de dados que a UE colocava ao dispor do cidadão. O Centro de Informação Europe Direct A RAM beneficiava de um Centro de Informação Europe Direct Madeira (CIED Madeira), criado em 2013 e localizado no Edifício Casa da Cultura, na freguesia de Câmara de Lobos. O Centro dependia hierarquicamente da representação da Comissão Europeia em Portugal e destinava-se à população em geral. Relativamente ao seu acervo, contava com 196 unidades, em atualização em 2015, distribuídas por: 103 publicações; 27 revistas/newsletters; 46 panfletos/brochuras; e 20 cartazes/posters. Era objetivo do CIED Madeira prestar um serviço de proximidade adaptado às necessidades locais/regionais, permitindo ao público em geral obter informações, orientações, assistência e respostas a perguntas sobre a UE no que respeita ao seu funcionamento, prioridades, legislação, políticas, programas e possibilidades de financiamento, mas também, e fundamentalmente, aos seus direitos enquanto cidadãos europeus. O Centro disponibilizava igualmente na sua sede um conjunto de publicações sobre as mais diversas temáticas de intervenção da UE. O CIED Madeira organizava sessões informativas para o público em geral, e em particular para as escolas da área de abrangência do Centro e para alunos das diversas faixas etárias. Nestas sessões, eram tratados temas de interesse que iam ao encontro de possíveis necessidades de informação sobre a UE, de carácter mais geral ou mais específico, consoante os objetivos da ação. As apresentações para o público escolar tentavam, através de jogos e da distribuição de material publicado pela UE, estimular o interesse para as questões europeias. A Biblioteca da Direção Regional de Juventude e Desporto (DRJD) O Ponto Jovem, nome pelo qual foi designada a biblioteca da DRJD, foi criado a 15 de março de 2013 na sequência da integração do sector da juventude na DRJD, criada pelo dec. reg. regional n.º 14/2012/M, de 26 de junho. Este espaço já tinha tido outras denominações, sucessivamente alteradas de acordo com as restruturações orgânicas dos serviços. Sendo o grosso dos seus utilizadores os jovens e o público em geral, a biblioteca oferecia os seguintes serviços à comunidade: espaço para consulta e leitura de documentação; espaço multimédia (Loja de Juventude), onde os utilizadores tinham ao seu dispor a rede sem fios gratuita, 12 postos com computadores e posto braile equipado com linha e impressora braile, para utilizadores invisuais; espaço para utilização de equipamento informático pelo utilizador; espaço para realização de trabalhos individuais e/ou em grupo; balcão de informação, no qual eram prestados os seguintes serviços: prestação de informações em áreas de interesse juvenil; divulgação de atividades, eventos e classificados de interesse juvenil; obtenção e renovação do Cartão Jovem; e o Ponto Oficial de bookcrossing. Além destes serviços, a biblioteca facultava igualmente à comunidade o acesso aos conteúdos em suporte digital disponibilizados na Internet, através dos postos existentes no espaço, bem como aos conteúdos em suporte papel, disponíveis no local para consulta presencial. O total do acervo em suporte papel era, em 2015, de cerca de 1500 títulos. A coleção de monografias estava distribuída pelos seguintes assuntos: ciências sociais; desporto; geografia; história (da arte, do mundo, de Portugal e da Madeira); literatura (infantil, juvenil e portuguesa); e obras de referência para consulta (dicionários e enciclopédias). A coleção de publicações periódicas era constituída pelos seguintes títulos: Jornal da Madeira; Revista Demografia Federada; Revista Flor de Lis; Revista Islenha; agendas culturais de diversos municípios do país; e revistas em braile (Visão, Visão Júnior e Ativa). Os recursos humanos afetos à Biblioteca eram constituídos, nesta data, por duas técnicas de biblioteca e documentação. A Teatroteca Fernando Augusto Inaugurada a 30 de novembro de 2005, a Teatroteca Fernando Augusto – Biblioteca de Teatro, no Funchal, reunia o espólio recolhido pelo TEF Companhia de Teatro (Teatro Experimental do Funchal), e a biblioteca de teatro de Élvio Camacho, com cerca de 1500 livros do acervo pessoal do encenador e dramaturgo Fernando Augusto, doado ao ator. A Teatroteca estava aberta a todos os leitores, artistas e grupos de teatro interessados na matéria. A Biblioteca John dos Passos O Centro Cultural John dos Passos foi inaugurado em setembro de 2004, na Ponta do Sol, contando com duas secções ou unidades documentais: a Biblioteca John dos Passos e a Sala Dr. John Randolph dos Passos (reservados). Compostas, em 2015, por cerca de 5500 livros, estas duas secções/unidades documentais tinham um catálogo presencial. A Biblioteca era de acesso livre e o seu fundo documental variado, quer a nível temático, quer a nível da nacionalidade dos autores, não sendo composto apenas pelas obras de John dos Passos, mas também por bibliografia estrangeira, nacional e regional (monografias, publicações periódicas, cartazes e material multimédia). Contudo, o acervo mais importante encontrava-se na sala de reservados e reunia a obra deste escritor norte-americano de ascendência madeirense, traduzida em 18 línguas, e ainda alguns estudos sobre a sua vida e obra. De acesso restrito, esta sala era reservada aos estudiosos que pretendessem pesquisar e investigar a vida e obra do escritor, que, em português, contava com traduções de oito dos seus livros: Três Soldados; Manhattan Transfer; Paralelo 42; 1919; Dinheiro Graúdo; Aventuras de um Jovem; Fadado para Vencer; Os Melhores Tempos: uma Biografia não Oficial e Portugal: Três Séculos de Expansão e Descobrimentos. A Biblioteca John dos Passos possuía, à data, os seguintes serviços: serviço de referência; serviço de apoio à investigação (referente à vida e obra de John dos Passos); serviços educativos; serviço de empréstimo; e serviço de fotocópias. Para além de prestar serviço à camada estudantil, servia também docentes, investigadores e população em geral. Ao longo do ano, realizavam-se diversas atividades dirigidas aos alunos das escolas do concelho da Ponta do Sol, tais como: a hora do conto; peddy-papers; visitas guiadas em português e inglês; exposições temáticas; seminários; conferências; celebração de efemérides; e elaboração de material didático, entre outras atividades. As Bibliotecas Itinerantes e Fixas da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) As bibliotecas itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) surgiram em 1953 com a criação (da iniciativa de Branquinho da Fonseca, bibliotecário-arquivista e escritor) de uma biblioteca circulante no Museu-Biblioteca Condes de Castro Guimarães, em Cascais, que tinha por objetivo cobrir o território nacional e arquipelágico com as bibliotecas circulantes. Contudo, foi em 1958 que a FCG criou o Serviço de Bibliotecas Itinerantes (SBI), pelo mesmo Branquinho da Fonseca, que permaneceu no SBI até 1974, ano da sua morte. Nesse ano, foram colocadas em circulação 15 bibliotecas itinerantes na região de Lisboa e litoral. Portugal vivia uma conjuntura politicamente desmotivada para a promoção da leitura, do livro, do ensino e da aprendizagem, privilégio dos segmentos populacionais mais abastados de então. Era difícil promover a leitura junto das populações isoladas e pobres e reduzir os índices de incultura e de analfabetismo que caracterizavam o país, incluindo a população do arquipélago da Madeira. A solução passou pela utilização de serviços móveis, ou seja, pela utilização de uma carrinha, que transportava os núcleos documentais das bibliotecas itinerantes, com cerca de 2000 livros, em estantes de regime de acesso aberto, privilegiando a figura do empréstimo domiciliário e a gratuitidade do mesmo e levando mais longe as ideias e o saber. As estantes destas carrinhas tinham a seguinte disposição: as prateleiras de baixo estavam reservadas aos livros infantis; as do meio à literatura, ficção e biografias; e as de cima aos livros menos pedidos (filosofia, poesia e ciências). Nelas trabalhavam dois funcionários: o auxiliar e o encarregado e responsável pela biblioteca. A FCG criou parcerias com as autarquias, no sentido de partilha das obrigações: o fornecimento do acervo bibliográfico, o biblio-carro, o pagamento dos honorários do pessoal, o combustível, as despesas de manutenção e conservação e outras ficavam a expensas da FCG, enquanto as autarquias concediam instalações para o depósito dos livros e contribuíam com despesas pontuais, ou seja, o apoio logístico. As bibliotecas itinerantes não satisfaziam as exigências de utilizadores mais letrados, com grau mais elevado de exigência intelectual e cultural, pelo que foi necessário complementá-las, na déc. de 60, com outra tipologia de biblioteca: as fixas. Em 1963, a Madeira beneficiou da primeira biblioteca itinerante, com sede no Funchal. No arquivo da FCG, não existe documentação sobre a criação e a extinção da maior parte das bibliotecas que fizeram parte das redes de bibliotecas criadas pela Fundação. Contudo, através das datas-limite da documentação existente e do livro publicado pela FCG no seu 25.º aniversário, em 1983, bem como do Boletim Cultural, n.º 2 de 1984, deduz-se a existência das seguintes bibliotecas itinerantes no arquipélago: [table id=77 /] Na déc. de 70 do séc. XX, o projeto do SBI tornou-se insustentável no âmbito da gestão financeira da FCG, e em 1972 a Fundação chegou a tentar concluir a rede de bibliotecas itinerantes e fixas, ideia reforçada após o 25 de Abril de 1974. Contudo, entre 1981 e 1996, David Mourão Ferreira deu novo impulso à animação da leitura e à difusão literária e cultural, privilegiando atividades que garantissem maior rentabilidade intelectual e cultural: exposições, debates, encontros com autores, leitura de contos e poesia, lançamento de livros e de novos autores, entre outras atividades. O SBI foi reestruturado e, em 1983, passou a designar-se Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas da FCG (SBIF). O arquipélago da Madeira passou então a contar com as seguintes bibliotecas fixas: [table id=78 /] A estas acrescentamos ainda os postos de leitura criados nos bairros sociais:  a Biblioteca Municipal Calouste Gulbenkian – Penteada (1988) e a Biblioteca Municipal Calouste Gulbenkian – Nazaré (1989). Assim, de acordo com as diferentes tipologias, a FCG criou no Arquipélago da Madeira um total de: 3 bibliotecas itinerantes; 11 bibliotecas fixas; e diversos postos de leitura nos bairros e complexos sociais acima referidos. É de destacar a Biblioteca Fixa n.º 48, no Funchal, inaugurada a 10 de julho de 1964 (data que não está de acordo com a data do quadro fornecido pela FCG, que refere 1961), que estava localizada no edifício da CMF, onde permaneceu até 1985. Até 1987, a Biblioteca funcionou provisoriamente no Teatro Municipal Baltazar Dias. De 1987 a 1995, mudou de instalações para o edifício da R. Elias Garcia. Após este período, regressou ao Teatro Municipal Baltazar Dias até 2011, ano em que a documentação começou a ser incorporada na BMF e na nova Biblioteca de Santo António do Funchal. A promoção do livro e da leitura através da rede de bibliotecas itinerantes, e mais tarde das bibliotecas fixas, durante o regime salazarista foi uma iniciativa arrojada mas coerente, que transformou a FCG no “Ministério da Cultura” português, que incluía o arquipélago da Madeira. As bibliotecas itinerantes não transportavam somente livros, mas promoviam a leitura, o nascimento de ideias e do saber, motivando a aprendizagem da leitura em muitos cidadãos iletrados. As bibliotecas fixas funcionaram como bibliotecas públicas, tendo como público-alvo o cidadão mais letrado que procurava informação e conhecimento. Em suma, as bibliotecas da FCG promoveram uma verdadeira revolução cultural, uma vez que tudo é transportável, incluído o conhecimento. Em 1987, o Programa Nacional de Leitura Pública, que tinha por objetivo criar e desenvolver bibliotecas públicas modernas e adequadas às linhas orientadoras do Manifesto da UNESCO sobre as Bibliotecas Públicas, terá debilitado o serviço e objetivos do SBIF da FCG. Contudo, em 1993, este é reestruturado e adaptado à nova temporalidade, passando a designar-se Serviço de Bibliotecas e Apoio à Leitura (SBAL), que em 2002 foi completamente extinto. O acervo das bibliotecas fixas foi integrado nas bibliotecas municipais que foram sendo criadas em todos os municípios. A Biblioteca do Hospital Dr. Nélio Mendonça A biblioteca do Hospital Dr. Nélio Mendonça, no Funchal, surgiu três anos após a inauguração do Hospital, em 1976, e ficou localizada no piso 0 do mesmo. Tratava-se de uma biblioteca tradicional especializada na área da Saúde, tendo como principal objetivo auxiliar o trabalho de pesquisa dos profissionais de saúde da instituição e servir um vasto leque de utentes: médicos, enfermeiros, investigadores, técnicos de saúde, alunos de pré e pós-graduação em Medicina e Enfermagem, administradores e gestores hospitalares. Até 2013, esta biblioteca disponibilizava os seguintes serviços: leitura e empréstimo; referência e pesquisa de informação; difusão de informação; e sala multimédia. Integrada no espaço da biblioteca, existia uma sala polivalente destinada a conferências, reuniões e cerimónias oficiais, entre outros eventos. Eram competências da Biblioteca: apoiar proativamente todas as especialidades do Serviço de Saúde da RAM, E.P.E (SESARAM); promover uma maior acessibilidade à informação, apoiando e formando o utilizador; cooperar em redes e projetos através de métodos e tecnologias de informação utilizados universalmente pela biblioteconomia; gerir aquisições e atualizações dos recursos bibliográficos, preferencialmente eletrónicos (bases de dados, ejournals, ebooks); promover uma correta política de aquisições de recursos bibliográficos para o SESARAM, procedendo à avaliação de propostas de aquisição, avaliando a pertinência dos recursos e fazendo prospeção de mercado de fornecedores, para obtenção da melhor relação custo/qualidade; e apoiar e promover a produção científica e a divulgação da informação. À data, o seu acervo bibliográfico era composto por: obras de referência (cerca de 50 exemplares); monografias (cerca de 200 livros); e publicações periódicas, na sua maioria técnicas e científicas (mais de 200 títulos de revistas registados online). A partir de 2009, a Biblioteca adquiriu maioritariamente publicações periódicas com acesso online, que, desde 2013, disponibilizou juntamente com o acesso à base de dados online. A Biblioteca contava com pessoal qualificado: gestão e coordenação da Biblioteca: diretor do serviço de formação e investigação do SESARAM, E.P.E.; responsabilidade técnica da Biblioteca: técnico superior do SESARAM, E.P.E.; assistente Técnica com formação na área das bibliotecas; assistente técnica de apoio administrativo à Biblioteca. A Biblioteca Pública Regional da Madeira (BPRM) A pintora Sara Maria de Portugal da Silveira Henriques de Freitas foi fundadora e primeira diretora da então sala de documentação contemporânea, inaugurada em 1979, no edifício seria posteriormente instalada igualmente a Direção Regional dos Assuntos Culturais (DRAC), com o objetivo de prestar apoio educativo às extensões universitárias criadas na RAM com o processo da autonomia. Em 2003, foi instituída oficialmente a BPRM, sucedendo à biblioteca de documentação contemporânea, pelo dec. reg. regional n.º 14/2003/M, de 23 de maio (Orgânica da SRTC). Alicerce conceptual da BPRM foi o conjunto de disposições legais que a tornaram beneficiária do depósito obrigatório de todas as obras publicadas no país, nomeadamente por força do dec.-lei n.º 74/82, de 3 de março. Esta instituição fez inicialmente parte da DRAC, passando, a 19 de junho de 2007, passa para a tutela da Secretaria Regional de Educação e Cultura (SREC), onde se manteve até 2011. A 9 de novembro desse ano, mudou novamente para a tutela do Turismo, com a nova designação de Secretaria Regional da Cultura, Turismo e Transportes (SRCTT). Em 2009, a BPRM comemorou 30 anos de serviço público, instituindo o dia 26 de outubro como seu dia. Por força da port. n.º 50/2016, de 19 de fevereiro, que define a orgânica da Direção Regional da Cultura, a BPRM e o ARM foram fundidos numa só entidade, que passou a ser designada por Arquivo Regional e Biblioteca Pública da Madeira (ABM). O ABM – a Biblioteca – foi criado como um espaço com diferentes ambientes e acervos, espaço de cultura, conhecimento, lazer e informação, aberto a todos os cidadãos. Tinha por objetivos: tratar, conservar e divulgar os seus diferentes acervos de cultura, nomeadamente o acervo bibliográfico do Depósito Legal; preservar e divulgar a língua e cultura portuguesas a diferentes públicos; e promover o livro, a leitura, a informação e o conhecimento. Com o objetivo de ser a mais completa biblioteca da RAM, tinha como valores: inovação, transparência, ética, responsabilidade e melhoria contínua; equidade no tratamento, abertura e disponibilidade à diferença; adequação e rapidez de resposta; e cultura de projetos. O ABM – a Biblioteca – era, na RAM, a instituição pública empenhada na conservação do património documental, o que advém do estatuto de recetora do Depósito Legal, que lhe permite receber da BNP pelo menos um exemplar de todas as publicações editadas em Portugal, acrescentando-lhe a característica de pró-especializada em diversas áreas temáticas. O facto de ser beneficiária do Depósito Legal potenciou a sua missão e alargou os seus objetivos, especialmente perante a RAM e os madeirenses, na preservação da sua história, língua e cultura. Foi a partir de 1982 que a Biblioteca se constituiu mais fortemente como fonte de informação científica e técnica e assumiu definitivamente o seu perfil patrimonial, com a responsabilidade de preservar e divulgar a produção documental de origem intelectual, nacional e regional. A Biblioteca era também depositária do acervo bibliográfico da biblioteca da Escola Secundária Jaime Moniz, disponibilizado online em catálogo para consulta através da colaboração do ABM. Relativamente ao seu acervo, estima-se que, em 2015, o total fosse de mais de 294.405 documentos, com um crescimento anual de 10%: 192.649 exemplares de monografias (correspondentes a 172.676 títulos) e 121.729 exemplares de publicações periódicas (correspondentes a 4088 títulos). A maior parte dos fundos documentais era contemporânea e generalista, embora possuísse algumas coleções de obras mais antigas. Os fundos documentais eram: fundo geral – monografias e periódicos; Reservados – livros raros, primeiras edições, documentos em mau estado de conservação; iconográfico – mapas, cartazes, postais; cartografia – mapas, séries cartográficas, atlas; leitura para deficientes visuais – recursos braile e recursos áudio; multimédia – DVD, CD, CD-ROM; fundo local – memória local e coletiva da RAM. A aquisição dos documentos era feita principalmente através do Depósito Legal, mas também por compra ou por oferta de particulares e instituições da administração pública. Destes, destacava-se a biblioteca Mário Sardinha, pelo valor e a raridade das espécies bibliográficas, assim como as bibliotecas da escritora Carmo Rodrigues e de Fátima Dionísio e Avelino Costa, e a biblioteca António Montes, acervo importante por integrar um número considerável de títulos que completaram as coleções anteriores à criação da Biblioteca. A maior doação particular foi a da biblioteca Rebelo Quintal (2013). António Rebelo Quintal (1931-2013) reuniu, ao longo de anos, milhares de livros e revistas, constituindo principalmente uma grande biblioteca jurídica, considerada por muitos a melhor da RAM e provavelmente uma das melhores do país. Alguns dos referidos documentos foram oferecidos por distintas personalidades, mas a maior parte foi adquirida em livrarias nacionais e estrangeiras. O ABM é o órgão coordenador da Rede de Bibliotecas Públicas da RAM, pelo dec. leg. regional n.º 15/2002/M, de 22 de agosto, e pelo dec. reg. n.º 10/2002/M, de 13 de março, e é o órgão coordenador do Programa da Rede de Bibliotecas Escolares, de acordo com o Programa da RBE (Gabinete RBE do Ministério da Cultura). Até à instalação e ao desenvolvimento de bibliotecas municipais no âmbito da Rede Regional de Bibliotecas Públicas (RRBP), a então BPRM disponibilizou às escolas de todos os graus de ensino da Região consultoria técnica nas áreas de arquitetura (no caso de escolas em construção ou com áreas em reconstrução e adaptação), mobiliário, fundos documentais e tratamento técnico documental. A Rede Regional de Bibliotecas Públicas (RRBP) A 24 de fevereiro de 2002, foi celebrado um protocolo entre o Instituto Português do Livro e das Bibliotecas (IPLB) e a Direção Regional dos Assuntos Culturais (DRAC), da Secretaria Regional de Turismo e Cultura (SRTC) da RAM, no sentido de estabelecer a cooperação técnica e financeira entre estas entidades para a conceção e o desenvolvimento de uma rede de bibliotecas públicas na Região e, assim, concretizar a extensão da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas à Madeira, num total de 11 concelhos. A RRBP da RAM foi criada pelo dec. leg. regional n.º 15/2002/M, de 13 de agosto, e regulamentada pelo dec. leg. regional n.º 10/2003/M. Entretanto, fruto do trabalho conjunto entre o IPLB e a DRAC, foi definido um programa-base destinado a regular e orientar as candidaturas dos municípios, que foi apresentado oficialmente a 3 de novembro de 2003, data que correspondeu à abertura do período para a apresentação das candidaturas por parte dos municípios. Foram cinco os municípios a apresentar candidatura: Funchal, Machico, Câmara de Lobos, Porto Moniz e São Vicente, tendo sido selecionados os quatro primeiros. No caso de Machico, a obra das novas instalações da biblioteca já se encontrava concluída, pelo que não seria comparticipada pelo IPLB: o município concorreria apenas a apoios para aquisição de mobiliário e equipamento, fundos documentais e informatização. As quatro candidaturas aprovadas foram homologadas pelo secretário regional do Turismo e Cultura a 11 de novembro de 2004. O passo seguinte consistiu na assinatura de um protocolo de intenções entre os municípios com as candidaturas aprovadas, a DRAC e o IPLB, protocolo exigido pelo Instituto de Fundos Comunitários (IFC) para aprovar as candidaturas das autarquias a financiamento comunitário. Os protocolos de intenções foram celebrados a 8 de novembro de 2006, exceto no caso de Machico, assinado a 8 de março de 2007. Relativamente ao investimento a realizar, foi definido que a comparticipação do IPLB seria de 30% (em todas a rubricas: obra, equipamento, fundos documentais e informatização) dos custos definidos como elegíveis e que o IFC teria a comparticipação de 70%. A Biblioteca Municipal de Machico foi inaugurada a 3 de março de 2008 e a Biblioteca Municipal de Câmara de Lobos a 3 de maio de 2009. O processo de candidatura da BMF foi encerrado por inviabilidade de reabilitação ou construção de um novo espaço. O Porto Moniz não pôde avançar com a construção do edifício por falta de verbas. Ao abrigo do protocolo DRAC/municípios, a BPRM continuou a prestar apoio especializado na área da biblioteconomia aos municípios que o solicitem.   A Biblioteca de Culturas Estrangeiras (unidade integrada no ABM) Integrada no ABM, e tutelada pela DRAC (atual Direção Regional da Cultura) desde 2011, a Biblioteca de Culturas Estrangeiras constituiu-se uma instituição pública regional que conta com o apoio das embaixadas dos países representados. O projeto para esta biblioteca tinha o intuito de proporcionar, especialmente aos estudantes, uma informação mais profunda e de fácil acesso a outras culturas. A recetividade e o envolvimento dos consulados e das embaixadas revelaram excelentes resultados. Criada em 1987, na sequência da doação de uma coleção de livros pelo Governo da Venezuela à RAM, a Biblioteca marcou o início de um espaço que iria envolver outros países num projeto posteriormente denominado Biblioteca de Culturas Estrangeiras, o qual foi aprovado em 1993, tendo recebido, desde então, personalidades de destaque na área da política, das letras, da história, das ciências e das artes. Com um acervo que resulta essencialmente de doações, englobava em 22015 várias salas de leitura: as salas Simón Bolívar, American Culture Corner, Zwanayo, Sir Winston Churchill, France, Deutschland e Italia. Além dos livros em língua estrangeira das salas mencionadas, a Biblioteca possuía também uma vasta coleção de livros em russo, norueguês, finlandês e sueco. Do seu acervo fazeiam parte monografias, publicações periódicas, material multimédia e cartazes pertencentes às diversas salas de leitura, e com informação cultural, histórica e literária dos diferentes países representados. A Biblioteca tinha como principais objetivos promover ações de carácter cultural, tendo em vista a divulgação das culturas dos países representados. Deste modo, pretendia alargar a outras culturas um valor acrescido à cultura da RAM, educar e informar, proporcionando também, especialmente aos estudantes, um profundo e fácil acesso a informação de outras culturas. Todos os núcleos existentes na Biblioteca abrangiam as diversas áreas do conhecimento, tendo cada sala o seu catálogo organizado segundo autor/título/assunto, seguindo as normas da CDU e da Dewey Decimal Classification. Embora a Biblioteca fosse na sua maioria consultada por estrangeiros, residentes ou visitantes da RAM, os seus leitores eram também alunos e professores de escolas (1.º, 2.º e 3.º ciclos e secundário), estudantes universitários, das áreas de línguas e culturas estrangeiras, e o leitor madeirense. A Biblioteca dispunha de vários serviços: leitura presencial; empréstimo domiciliário; serviço de referência e informação; acesso à Internet; relações públicas e dinamização cultural; serviço de fotocópias; acesso ao catálogo presencial e online e ao fundo de documentos reservados.   A Biblioteca Municipal do Funchal (BMF) A 13 de janeiro de 1838, foi criada a BMF por deliberação camarária, sob a presidência de Sérvulo Drumond de Meneses, ocupando à época uma sala na CMF. A 19 de setembro de 1929, a Biblioteca muda de instalações para o Palácio de S. Pedro, no Funchal. Em agosto de 2009, muda novamente de instalações, desta feita para um piso do Edifício 2000, situado na Av. Calouste Gulbenkian, sem que tivesse beneficiado do programa da RRBP da RAM. Dos seus bibliotecários mais importantes até 2015, merecem destaque Carlos Azevedo de Meneses, que trabalhou na Biblioteca até à sua morte, aos 65 anos, e Adolfo César de Noronha, mais tarde nomeado diretor, o grande impulsionador não só da biblioteca, mas também do museu. Os recursos humanos da BMF possuíam, em 2015, qualificações adequadas ao desempenho documental e tecnológico. Assim, além de organizar, preservar, conservar e divulgar a herança pública que constitui o acervo desta biblioteca, a BMF tinha como missão: facilitar o acesso à informação de forma igualitária e democrática; ser um suporte para a educação e investigação quer a nível individual, quer a nível de instituições; oferecer meios e serviços destinados a satisfazer as necessidades individuais, educativas e de investigação dos utilizadores; fornecer a informação de forma célere e eficaz, recorrendo para o efeito às TIC; e cooperar, sempre que possível, com outras organizações. As atividades mais relevantes para os munícipes passavam pela Hora do Conto, e as conferências e visitas guiadas à BMF. O seu acervo contava, a esta data, com cerca de 300.000 obras, algumas do séc. XIX, incidindo sobre a história, geografia, biologia e outras vertentes do conhecimento relativas à ilha da Madeira. Quanto aos periódicos, possuía 95 títulos de jornais regionais desde 1821, dentre os quais se destacavam A Aurora Litteraria, A Chronica, A Cruz: Semanário Catholico, A Discussão e O Patriota Funchalense. Havia coleções que se destacavam: a coleção Hinton; as coleções de William e Alfredo Reid; a coleção de obras sobre a ilha da Madeira; e a coleção do historiador Joel Serrão. Na coleção digital, incluía-se o Diário de Notícias desde 1900 a 1922, cerca de 300 digitalizações de monografias de temática Madeira e outras que se encontravam em mau estado de conservação. Segundo o Elucidário Madeirense, a BMF incluiria no seu acervo a coleção da Escola Médico-Cirúrgica do Funchal; ao longo dos anos, todavia, esta coleção dispersou-se e em 2015 a Biblioteca ainda não a reunira na globalidade. Beneficiou do acervo da biblioteca fixa da FCG n.º 48, do Funchal, cujo acervo foi incorporado na BMF e na Biblioteca de Santo António do Funchal. A BMF tinha sob a sua alçada as bibliotecas dos bairros da Penteada, inaugurada em 1988, e da Nazaré, em 1989, que pertenceram à FCG, e a biblioteca de Santo António, inaugurada a 6 de julho de 2013. A BMF foi depositária de uma coleção verdadeiramente madeirense, rica e heterogénea, quer em monografias, quer em jornais (possuindo, e.g., um título de um jornal insular datado de 1821, após a revolução liberal).   A Biblioteca Municipal da Calheta  Inaugurada em 1996, a Biblioteca Municipal da Calheta – Casa das Mudas foi construída tendo por base a biblioteca fixa n.º 75 da FCG, Casa da Cultura, instalada na Calheta desde 1973 (a FCG refere a data de 1980) até 2002, ano em que se torna uma unidade orgânica da Câmara Municipal da Calheta, beneficiando do apoio e do empenho financeiro desta. A Biblioteca é constituída por três pólos de leitura, assim distribuídos: pólo do Arco da Calheta (1991), depois designado por Biblioteca Municipal do Arco da Calheta; pólo do Paul do Mar (2001), depois designado por Biblioteca Municipal do Paul do Mar; e pólo do Jardim do Mar (2002), depois designado por Biblioteca Municipal do Jardim do Mar. Em 2015, o seu acervo em suporte papel estava estimado em 9000 obras e o MNL era constituído por 76 DVD, 7 jogos e 2 CD. Os serviços e os produtos prestados eram disponibilizados aos utilizadores pelo bibliotecário, dentro do espaço da Biblioteca. Para além da oferta de obras nas diversas áreas do saber, contava com uma área de leitura/estudo, equipada com ligação sem fios.   A Biblioteca Municipal de Câmara de Lobos A Biblioteca Municipal de Câmara de Lobos, uma biblioteca pública, municipal, do tipo BM2, possuía em 2015 dois pólos de leitura: um no Estreito de Câmara de Lobos e outro no Curral das Freiras. Desde meados da déc. de 60 até 1980, Câmara de Lobos recebeu com periodicidade mensal a biblioteca itinerante da FCG. Numa parceria entre a FCG e a Câmara Municipal (a FCG fornecia os equipamentos e materiais e a Câmara os recursos humanos e o espaço), a 1 de outubro de 1980 abriu a biblioteca fixa n.º 12, no Lg. do Poço, mudando de instalações, em 2004, para a Casa da Cultura de Câmara de Lobos. As negociações com o ex-IPLB para a instalação de uma nova biblioteca, virada para o futuro e para a comunidade, resultaram na inauguração, a 3 de maio de 2009, da nova Biblioteca, o único projeto de raiz aprovado na RAM no âmbito da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas. Este novo espaço passou a ser a base da rede de bibliotecas do concelho e a base técnica, orientada para a uniformização dos serviços e para a informatização de todos os dados referentes ao fundo documental a nível central, que, posteriormente, se distribui pelos polos do Estreito de Câmara de Lobos (que começou, de igual modo, como uma biblioteca fixa da FCG, em 1982, e passou para um novo edifício em 2006) e do Curral das Freiras (aberto em 2010). A rede de bibliotecas do concelho de Câmara de Lobos possuía, em 2015, mais de 35.000 documentos em papel, cerca de 500 documentos sonoros, mais 1500 documentos audiovisuais e 200 CD-ROM.   A Biblioteca Municipal de Machico Em 1964, com o apoio da FCG, foi instalada uma biblioteca nos paços do concelho da Câmara Municipal de Machico, no salão do 1.º andar. A 14 de setembro de 1964, foi inaugurada a biblioteca fixa n.º 74 da FCG, embora a biblioteca itinerante da FCG de São Vicente servisse, também, a população deste concelho. Anos passados, e para responder às necessidades dos leitores, a Biblioteca foi transferida para uma maior área da Câmara. Assim, a 3 de março de 2008 é inaugurada a Biblioteca Municipal de Machico no Edifício Fórum Machico, passando a contar com um espaço digno ao serviço de toda a comunidade. O município concorreu ao programa da RRBP (IPLP/DRAC) apenas para apoios à aquisição de mobiliário e equipamento, fundos documentais e informatização. Em 2015, a Biblioteca disponibilizava cerca de 18.500 livros para todas as idades, distribuídos em regime de livre acesso às estantes. Existia uma coleção de livros que se encontrava resguardada, cujo interesse residia sobretudo na área da literatura e dos estudos literários portugueses, que exigia um pedido de pesquisa aos técnicos. Para além dos livros, a Biblioteca contava também com MNL, em particular CD de todo o género de música, filmes vários e CD-ROM (num total de cerca de 50 unidades), sobre muitas áreas do conhecimento, promovendo aos munícipes o empréstimo domiciliário, serviços de fotocópias, digitalização de documentos, atividades de promoção de leitura, entre outros. Em 2013, foi inaugurada uma extensão desta Biblioteca no Museu da Baleia.   A Biblioteca Municipal da Ponta do Sol Criada em 1963 a partir da biblioteca fixa n.º 77 da FCG, cujo acervo absorveu, a Biblioteca Municipal da Ponta do Sol era um serviço público que tinha por finalidade facilitar o acesso à cultura, à informação, à educação e ao lazer, contribuindo para elevar o nível cultural e a qualidade de vida dos madeirenses. Como centro de recursos educativos, a Biblioteca tem como principais objetivos: estimular o gosto pela leitura e fomentar a compreensão do mundo; criar condições para a fruição da criação literária, científica e artística, proporcionando o desenvolvimento da capacidade crítica do indivíduo; conservar, valorizar, promover e difundir o património escrito, em especial o respeitante ao fundo local, o qual irá contribuir para o reforço da identidade cultural da região; e difundir documentação e informação útil e atualizada, em diversos suportes e relativa às várias áreas do saber, satisfazendo, assim, as necessidades dos utilizadores e dos diferentes grupos sociais.   A Biblioteca Municipal do Porto Moniz A Biblioteca Municipal do Porto Moniz foi inaugurada a 22 de julho de 1988 e instalada na sede da Câmara Municipal, no rés-do-chão. Anteriormente, ocupava um espaço no edifício onde estava instalada a antiga Câmara. O município de Porto Moniz beneficiou da biblioteca fixa n.º 83 da FCG, instalada por volta de 1964, que foi a base da Biblioteca Municipal, que contou com o apoio financeiro da Câmara; esta candidatou-se ao programa da RRBP, mas não foi possível avançar com a construção do edifício por falta de verbas. Em 2015, o seu acervo estava estimado num total de 10.474 volumes, sendo composto por monografias e revistas que se enquadravam no perfil do utilizador do município. O empréstimo de livros, a leitura de revistas, o apoio aos leitores e a existência de terminais informáticos com ligação à Internet eram os principais serviços e produtos que a Biblioteca oferecia à comunidade de utilizadores.   A Biblioteca Municipal do Porto Santo A Biblioteca Municipal do Porto Santo teve a sua génese na biblioteca da FCG n.º 78, criada em 1960 (data que não está de acordo com a data fornecida pela FCG; 1964 é a data mais provável) e desativada em 2003, e esteve instalada, de 1960 a 1990, no rés-do-chão da Câmara Municipal do Porto Santo. Em 1990, passou outro edifício da Câmara até 1994, ano em que transita para um antigo quartel do exército, até 1998. Neste ano, regressa ao segundo espaço da Câmara Municipal, que não foi construído de raiz, nem beneficiou do apoio financeiro da RRBP, mas apenas do apoio financeiro camarário. A Biblioteca dispunha, em 2015, um acervo em papel de 23.545 exemplares, distribuído por monografias, publicações periódicas, vídeos, CD-ROM e DVD. Não possuía catálogo online, mas promovia as leituras domiciliárias e presenciais. Para além disso, realizava eventos culturais, tais como: hora do conto; palestras e conferências; lançamento de livros; concursos, entre outros. Os seus utilizadores eram sobretudo turistas, alguns investigadores e estudantes.   A Biblioteca Municipal da Ribeira Brava A Biblioteca Municipal da Ribeira Brava teve a sua génese na biblioteca fixa da FCG n.º 82, inaugurada a 30 de setembro de 1964 e desativada em 2003. A construção da Biblioteca foi possível graças à sensibilidade para as questões da cultura e da literacia dos representantes autárquicos. Totalmente remodelada e inaugurada a 20 de novembro de 2001, a Biblioteca Municipal possuía em 2015 um acervo de obras e documentos em suporte papel no total de 15.694, disponível a todos os munícipes. Os serviços que prestava aos leitores eram: leitura de monografias e das publicações de diários e jornais; acesso a computadores e rede sem fios; exposições e atividades culturais de apoio à educação e promoção do desenvolvimento cultural do concelho.   A Biblioteca Municipal de Santa Cruz A Biblioteca Municipal de Santa Cruz teve por base a biblioteca fixa n.º 73 da FCG, a segunda biblioteca fixa de que a Madeira beneficiou e a primeira num concelho rural, inaugurada em julho de 1964 e instalada no edifício do Tribunal, tendo mudado de espaço físico diversas vezes. Em 1991, com o apoio da Câmara Municipal de Santa Cruz, e não do programa financeiro da Rede de Leitura Pública, foi inaugurado um edifício para a Biblioteca na Q.ta do Revoredo. Em 2015, a Biblioteca prestava um serviço inteiramente gratuito, com livre acesso às estantes, quer para leitura presencial, quer domiciliária, e tinha ao dispor dos utilizadores um considerável fundo bibliográfico, constituído por livros e diários regionais, entre outros, estimado em cerca de 20.000 unidades. Em 2000, a FCG entregou a biblioteca à Câmara Municipal, aumentando o seu acervo. As suas instalações incluíam, à data, a receção, uma sala infanto-juvenil, duas salas abertas ao público adulto e ainda um anfiteatro ao ar livre, espaços que convidavam à leitura e à realização de eventos.   A Biblioteca Municipal de Santana A Biblioteca Municipal de Santana teve a sua génese na biblioteca fixa da FCG n.º 76, fundada por volta de 1964 e desativada em 2010, cujo acervo foi incorporado na Biblioteca com o empenho financeiro da Câmara Municipal de Santana. Em 1997, o edifício da Câmara foi alvo de um projeto de ampliação, que não beneficiou do programa financeiro da Rede de Leitura Pública, e se revelou uma obra de cariz moderno, que incluiu a construção do salão nobre e da Biblioteca Municipal; esta última começou a funcionar, em janeiro de 2010, nas instalações da Casa da Cultura de Santana. O seu acervo era constituído, em 2015, por documentos em suporte papel, e estimado em 18.000 títulos, distribuídos por monografias, publicações periódicas e MNL.   A Biblioteca Municipal de São Vicente Inaugurada em 1986, a Biblioteca Municipal de São Vicente ocupou um espaço no edifício da Câmara Municipal de São Vicente, sendo um serviço cultural da Câmara que não beneficiou do programa financeiro da Rede de Leitura Pública. Nasceu da biblioteca itinerante BI50 e da biblioteca fixa FCG n.º 175, designada Biblioteca Municipal Calouste Gulbenkian de São Vicente, inaugurada a 22 de janeiro de 1987 e desativada em 2002. A FCG doou os seus acervos ao município, ou seja, à Biblioteca Municipal, que em 2013 contava com um total de 21.998 unidades em suporte papel e 12.724 unidades em suporte digital. A Biblioteca disponibilizava diversos serviços e produtos aos munícipes: a consulta de um vasto número de documentos, impressos e multimédia, para além de empréstimo domiciliário, quer de livros quer de documentos audiovisuais, e serviço grátis de fotocópias. Disponibilizava ainda outros apoios, nomeadamente: serviço na área da animação cultural, procurando dar respostas às necessidades de informação, cultura, lazer e educação a todos os munícipes; aconselhamento à leitura e apoio a trabalhos escolares, apoiando também, quando solicitadas, as bibliotecas escolares. No concelho de São Vicente, ficavam situadas a Biblioteca Municipal de Boaventura, pertencente à Casa do Povo de Boaventura, e a Biblioteca Municipal da Ponta Delgada, pertencente à Casa do Povo da Ponta Delgada, servindo ambas as respetivas populações locais.     Iolanda Silva (atualizado a 25.02.2017)    

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convento de são francisco do funchal

O mais importante e interventivo Convento na vida geral da Madeira sempre foi o de S. Francisco do Funchal, com profundas raízes locais e, ao mesmo tempo, com um especial sentido de liberdade imediatista, que criou inúmeros problemas às autoridades instituídas. Os Franciscanos acompanharam os primeiros povoadores em 1420, e foi-lhes depois entregue a assistência espiritual nos primeiros anos do povoamento. Dez anos depois, por volta de 1430, estava na Madeira Fr. Rogério, então também acompanhado de frades de origem castelhana, galega e biscainha que, segundo Fr. Manuel da Esperança, bem podiam encher de conventos toda a Ilha, se ela tivesse povoações nas quais se sustentassem. Acrescenta ainda o cronista que tal não teria acontecido de imediato, pois “vinham fugidos do mundo e não podiam (ou não queriam) ver gente”. Assim, “encovados pela serra, conversavam só com Deus, pretendendo imitar o rigor da penitência” (ESPERANÇA, 1666, 670-671). Foi com esse espírito que os Franciscanos se instalaram num eremitério com a invocação de S. João Baptista, cerca de 10 anos depois, por volta de 1440, como viria a escrever, mais tarde, Fr. Nuno Cão (c. 1460-1530/1531), vigário do Funchal, em sentença de 1499: “que haveria ora sessenta anos” que ali se tinham fixado (ANTT, Cabido da Sé do Funchal, avulsos, mç. 11, n.º 1). O eremitério era na margem direita do ribeiro de S. João, no Funchal, e teria quase uma dezena de irmãos leigos, tendo tido como guardião Fr. Pedro das Covas ou Fr. Pedro Mourão, “homem velho e de muita autoridade” (SILVA, 1946, 163). Os Franciscanos da província de Portugal só em 1450 conseguiram autorização, pela bula Iniunctum Nobis, de 28 de abril desse ano, do Papa Nicolau V para manterem um eremitério na Madeira, que já teriam erguido sem qualquer beneplácito. Convento de São Francisco. Arquivo Rui Carita   Convento de São Francisco. (pormenor) Arquivo Rui Carita   A comunidade madeirense foi entregue ao vigário provincial dos observantes portugueses, mas, como haveria de referir o vigário do Funchal, os Franciscanos que à “ilha iam habitar e morar, iam de passada a ver o mundo, cada um por sua arte e não faziam assento” definitivo, correndo “para as outras ilhas de baixo (as Canárias, em princípio), como caminhantes” (ANTT, Cabido da Sé do Funchal, mç. 11, n.º 1). Essa situação e a interferência das outras comunidades provinciais ibéricas acabaram por levar os Franciscanos a sair da Madeira, em 1459, então nove elementos, dois padres e sete leigos, vindo a instalar-se, por ordem real, no futuro Convento de Xabregas, em Lisboa, sob o padroado da condessa da Atouguia. No continente, e depois do falecimento do infante D. Henrique, em 1460, os principais das Ordens de S. Francisco e de Cristo procuraram um entendimento e, por certo, uma delimitação de campos de ação. Encontrado esse acordo, regressaram os Franciscanos à Ilha, embora somente quatro do grupo que havia saído em 1459, voltando a ocupar o pequeno Hospício de S. João, por volta de 1464. Os Franciscanos voltaram sob a direção de Fr. Rodrigo de Arruda, homem de certa influência junto do geral da Ordem, em Roma, e que fora já provincial em Portugal, além de manter relações pessoais de amizade com o segundo capitão donatário do Funchal, João Gonçalves da Câmara (1414-1501). Referiu o Cón. Jerónimo Dias Leite (c. 1537-c. 1593) e transcreve Gaspar Frutuoso (c. 1522-c. 1591) que, tendo os Franciscanos acompanhado o Cap. João Gonçalves Zarco (c. 1390-1471), este lhes deu agasalho no Funchal, numas casas em lugar ermo, de onde depois se transferiram para o edifício que construíram “em baixo na vila […], nuns chãos e terras defronte de Santa Catarina, além da ribeira” (FRUTUOSO, 1968, 86). Foi, assim, na sua primeira residência, a pequena capela de S. João Batista, ou de S. João da Ribeira, que se vieram a instalar, de novo, em 1464, e que, pouco tempo depois, teria breve de autorização do Papa Sisto IV, de 1476. Entretanto, Fr. Rodrigo de Arruda, logo que chegou ao Funchal, aproveitando as boas disposições dos habitantes e a autorização que já possuía, tratou de levantar um novo convento no centro da povoação. Os Franciscanos achavam o sítio em São João da Ribeira impróprio para a sua instalação, “escondido no meio da ribeira e tão distante do povo para o serviço dele, nas confissões e sermões, e noutros ministérios da alma”, ainda acrescentando as Saudades da Terra que a causa da mudança, para além de que “o lugar era ermo”, era que um frade, “por induzimento do Demónio, que sempre urde semelhantes teias”, se tinha ali enforcado, havendo assim necessidade de encontrar outro sítio (Id., Ibid., 85). O terreno escolhido foi um que pertencera a Clara Esteves, que em testamento o havia vinculado a um seu parente, o então escudeiro João do Porto, cedendo os religiosos, em troca, o Hospício de S. João, menos a capela, tendo tudo sido autorizado pela infanta D. Beatriz, como tutora de seu filho, o duque D. Diogo, grão-mestre da Ordem de Cristo, a quem a Ilha pertencia. A instalação no Funchal deve datar de 1473, como se pode ler na lápide sepulcral dos fundadores, Luís Álvares da Costa e seu filho, Francisco Álvares da Costa, provedor da Fazenda, igualmente o ano do testamento de Clara Esteves, de 1 de janeiro, que já deixava ao Convento, por certo ainda à comunidade de S. João da Ribeira, 2000 réis, uma peça de pardo para vestuário e 30 varas de burel para vestes. Laje sepulcral dos fundadores. 1473. Arquivo Rui Carita As instalações do novo Convento progrediram rapidamente, já tendo guardião em 1476, Fr. Rodrigo Contendas, tendo-se ali registado, em finais de 1482, o célebre milagre com a imagem de um crucifixo. Segundo a tradição, esta imagem, que “falava algumas vezes” com Helena Gonçalves da Câmara, filha de Zarco, aos pés de cujo altar foi depois sepultada, teria realizado um milagre, a 26 de dezembro de 1482. Nesse dia, pregando então o P.e Fr. Rodrigo, viu D. Helena o “braço direito do dito crucifixo derribado fora da cruz, todo ao lado do corpo”, milagre depois autenticado pelo bispo D. Fr. Loureço de Távora (1566-1629), a 24 de outubro de 1615 (BNP, IGRAPRF, 1775, fls. 85-88). O Convento passou logo a usufruir dos privilégios gerais concedidos por D. Afonso V, em 2 de abril de 1459, em que se isentava os Franciscanos do pagamento de fintas, taxas e tributos, como a sisa e a dízima, a “portagem costumada de peão”, o vinho, a carne e o pescado. O longo documento de isenção refere ainda aquilo que comprassem para seu mantimento, “para seus vestidos e necessidades”, materiais que comprassem para reparação dos mosteiros e casas, tais como pedra, cal, areia, madeira, pregadura, tabuado, cavalgaduras e animais de carga, “com seus aparelhos, que para servidão comprarem”, “posto que os tornem a vender”, etc. O mesmo se passava com as coisas que lhes fossem dadas ou deixadas, “que eles possuir não possam, e quaisquer joias e ornamentos” que comprassem ou lhes vendessem para os serviços divinos, assim como vestimentas, capas, livros, imagens e quaisquer outras coisas “que para isso pertencerem” (ABM, Câmara Municipal do Funchal, avulsos, mç. 1, n.º 4). As obras da primeira fase do Convento foram, assim, iniciadas em 1474, e o Convento já se encontrava habitado por volta de 1487, numa primeira fase das obras. Gaspar Vaz, que fora para a Madeira em 1539, por ordem de D. João III, em carta de 20 de maio de 1542 dá conta ao Rei das obras que, nessa altura, decorriam no Convento de S. Francisco, ordenadas pelo visitador da Ordem, Fr. Nuno, que, “por o mosteiro de S. Francisco estar mal remediado de dormitório, ordenou uma obra mui formosa e honrada, a saber: dormitório novo e debaixo refeitório com seu peio”, ou seja, uma fonte de água (ANTT, Corpo Cronológico, pt. i, mç. 72, doc. 9). O visitador que ordenara estas obras era também um pregador de grande fama e fora angariar fundos para as obras necessárias ao Convento do Funchal, e reformar igualmente os restantes Conventos franciscanos locais, que, após terem formado uma província autónoma, por bula de Sisto IV, de 1477, tinham voltado a depender da província de Portugal, por bula de Inocêncio VIII, em 1488. O Convento veio a ser sucessivamente ampliado, logo a partir de 1550, quando beneficiou de um legado de D. Maria de Atouguia, filha do provedor Francisco Álvares da Costa, que, falecendo solteira, a 11 de fevereiro desse ano, deixou uma pensão para missas por sua alma e para aquisição da cerca. Nos anos seguintes, era ampliada a igreja, sendo sagrada a 14 de março de 1554 pelo bispo castelhano D. Sancho Trujillo, que, passando pela Ilha vindo das Canárias, ali passou algum tempo. Este bispo castelhano pretendeu depois, inclusivamente, ser titular do bispado do Funchal, quando era bispo de pleno direito D. Fr. Gaspar do Casal (1510-1584), embora o mesmo nunca se tenha deslocado ao Funchal, tendo sido depois, em 1557, bispo de Leiria e, em 1579, de Coimbra. O Convento já possuía importantes adegas em 1566, conforme consta do saque corsário de outubro desse ano, onde alguns dos huguenotes franceses estiveram alojados e se teriam embebedado. Aliás, alguns dos frades do Convento de S. Francisco teriam sido dos poucos habitantes da cidade que afrontaram as forças francesas, por indicação do comissário, Fr. Baltasar Curado, na rua da Carreira, tendo à frente Fr. Álvaro de Miranda, que em Mazagão se havia notabilizado contra os mouros, mas ali foi morto, tal como cinco dos frades que o acompanhavam. No interior do Convento, ainda seria morto o sacristão, o P.e Fr. Rodrigo de Portalegre, que ali tinha ficado a esconder o tesouro com o vigário Fr. João dos Reis. O vigário, entretanto descoberto na sua cela, veio a escapar à morte por ter revelado o esconderijo das pratas do Convento. A cerca e o claustro de S. Francisco serviram depois para o enterramento das cerca de 300 vítimas do saque dos corsários franceses. Henrique Henriques de Noronha (1667-1730), mais tarde, por volta de 1722, escreve que os 10 Franciscanos mortos durante o saque de 3 de outubro foram sepultados no chamado “capítulo velho”, “debaixo de uma só campa”, seguindo as informações de Fr. Manuel da Esperança (ESPERANÇA, 1666, 684). O cronista acha serem muitos corpos para uma só sepultura, embora entenda que ali foi sepultado, pelo menos, Fr. Álvaro de Miranda, por determinação de seu irmão João Mendes de Miranda, porque da família do instituidor da capela daquele capítulo, ou seja, Simão Acciauoli (c. 1480-1544). Os Franciscanos mortos tinham sido, para além de Fr. Álvaro de Miranda e de Fr. Rodrigo de Portalegre, que refere como Rodrigo de Santiago, já mencionados, ainda Fr. Inácio de Leiria, Fr. Pedro de Eça, Fr. Pantaleão, Fr. Manuel da Cruz, Fr. Custódio Corista, Fr. Simão Corista e Fr. Francisco Cartaxo, assim como Fr. Gaspar “Terceiro”, um irmão donato, ou seja, que ainda não havia professado, embora já de alguma idade, por certo, que “pasmou e de pasmo morreu” (NORONHA, 1996, 240).   Planta da cidade 1570. Arquivo Rui Carita   Planta da cidade e Convento 1567. Arquivo Rui Carita Na armada de socorro de uma semana e pouco depois, provavelmente teria vindo o mestre das obras reais Mateus Fernandes (III) (c. 1530-1595), que levantou uma planta da cidade, aproximadamente entre 1567 e 1570, onde se percebem as dimensões e a forma geral do Convento de S. Francisco. O edifício ocupava cerca de metade do posterior jardim municipal, dando sobre a rua dessa evocação nos começos do séc. XXI e ocupando a igreja o limite sul do jardim, com o adro lateral a avançar para a Av. Arriaga. A igreja parece já apresentar planta em cruz latina, com o braço sul do transepto saliente, tal como parece ter tido nártex nessa época, indicado com um ponteado para a colunata, como se encontra marcado para os claustros. O dormitório, sob o qual se encontrava o refeitório, deveria ficar para norte, e a cerca envolvia o Convento pelo norte e poente, prolongando-se até ao que é, nos começos do séc. XXI, a R. Conselheiro José Silvestre Ribeiro e ocupando a Av. Arriga quase até à R. das Fontes, tendo o teatro municipal sido levantado no antigo espaço da cerca do Convento. Registam depois as Saudades da Terra, entre 1585 e 1590, que, naquela altura, estava fundado um Mosteiro de S. Francisco da observância, “de boas oficinas, como um dos mais nobres e graves do reino” que os Franciscanos tinham em Portugal, em que sempre estavam perto de 50 frades (FRUTUOSO, 1968, 114). A grande mobilidade social dos Franciscanos é patente depois no recenseamento de 1598, “tirado pelos róis das confissões”, onde se refere o Mosteiro de S. Francisco, “que geralmente tem quarenta religiosos” (BGUC, cód. 210, fl. 30), o que é perfeitamente indicativo de que, mesmo pelos róis de confissões, era impossível assegurar um número concreto. A igreja era “muito grande e lustrosa”, segundo escreveu Frutuoso, especialmente após a ampliação levada a cabo pelo P.e Fr. Diogo Nabo, “guardião dela e comissário de toda a ilha”. Havia então oito capelas “muito ricas” e dois altares, que pensamos serem os colaterais, para além da capela-mor. Diziam missa “uma hora ante manhã”, onde concorria muito povo, dando muitas esmolas na portaria e tendo o púlpito sempre três a quatro pregadores. A cerca era muito grande, com “água de levadas”, com que regavam muita hortaliça “de couves murcianas, beringelas e cardos”, e tinham pomar com “árvores de espinho”, palmeiras, ciprestes, pereiras, romeiras “e toda a frescura que se pode ter de frutas e ervas cheirosas”, sem se ter necessidade das de fora. Na cerca, também tinham muitas uvas e, como a população era “gente de tanta caridade”, no verão juntavam de esmolas trinta pipas de vinho (Id., Ibid., 114).                     Pormenor de planta da cidade. Arquivo Rui Carita     Pormenor de planta da cidade. Arquivo Rui Carita A cerca do Convento de S. Francisco do Funchal, confrontando para poente com o solar de D. Mécia, como ficou depois conhecido, ficaria no final do século seguinte ligada a uma das mais célebres ocorrências de então. Este solar fora levantado, em princípio, por João de Ornelas de Magalhães, alcaide da fortaleza do Funchal por nomeação de 14 de maio de 1555, pois já figura na planta da cidade, dos anos de 1567 a 1570, e ostenta no portal exterior as armas desta família. O acidente ocorreu a 7 de março de 1695: encontrando-se D. Mécia de Vasconcelos na janela do seu solar, foi atingida por um tiro disparado por um Franciscano na cerca do Convento. Regista o termo de óbito do cura da Sé, o P.e Francisco de Bettencourt e Sá, que certo religioso de S. Francisco, “natural desta ilha”, para matar um francelho que estava pousado em uma árvore, lhe fez um tiro de espingarda e, disparando-a, deu “um perdigoto na testa por cima do olho” de D. Mécia, de tal sorte “que perdeu os sentidos e o juízo”, falecendo pouco depois (ABM, Sé, Óbitos, liv. 9, fl. 24). Certidão do Guardião do Convento de São Francisco. 1619. Arquivo Rui Carita Com a concentração de inúmeras capelas vinculadas às principais famílias insulares, muitas das quais com sepultura no Convento de S. Francisco, a comunidade adquiriu uma notável influência na vida económica e social insular, não deixando o edifício de crescer nos anos seguintes. O primeiro problema foi o dos testamentos e do usufruto dos legados dos mesmos e, depois, o da impossibilidade de, a curto prazo, cumprir muitos desses legados pios, logo nos meados do séc. XVI, especialmente pela enormidade de missas a celebrar “enquanto o mundo for mundo”, como por vezes se registou. A questão do elevado número de missas, estando muitas já em atraso, levou o prelado, nos finais desse século, a ter de solicitar autorização de Roma para o seu perdão (ABM, Juízo da Provedoria de Resíduos e Capelas, t. 3, 608-608v.). Depois, foi a progressiva centralização do poder nos sécs. XVII e XVIII, quer régio quer eclesiástico, aspeto relativamente ao qual os membros desta comunidade, com a sua tradicional liberdade de movimentos e de costumes, e a sua facilidade de palavra, não ofereciam especial vocação de subordinação. Os problemas com os legados testamentários ocorreram logo em meados do séc. XVI, colocando em oposição o cabido da Sé do Funchal e os Franciscanos. Queixaram-se, então, os membros do cabido a D. João III, “por descargo de suas consciências”, em carta de 22 de maio de 1550, das formas fraudulentas dos frades do Convento de S. Francisco “no fazer dos testamentos”. Contam que, tendo falecido um mês antes “um certo doutor físico de uma prosternação”, o mesmo fora visitado e “importunado”, quando acamado, por um padre que então servia de guardião do Convento, de nome Fr. António de Leiria, conseguindo que o mesmo fizesse testamento a favor do Convento. Escrevem os elementos do cabido que o testamento em questão “foi feito de tal maneira, que tendo ele perto de trezentos mil réis de fazenda, sem sua mulher viva e com três filhas para casar, despendeu em legados para o mosteiro, missa e ofícios, sessenta mil réis”. O enfermo ainda recuperou e pediu para ser revisto o testamento, mas tendo perdido a fala (embora acenasse a cabeça), os Franciscanos não aceitaram a alteração. Pedindo para ser enterrado na Sé, dado dali ser freguês, e vindo o corpo, os Franciscanos foram buscar “o defunto com a tumba”, que levaram para S. Francisco, não atendendo a “excomunhões” (ANTT, Corpo Cronológico, pt. i, mç. 84, doc. 59), nem ao provisor, deão e cabido que ali estavam. Os elementos do cabido queixam-se ainda de que os Franciscanos “usurpavam a jurisdição do arcebispado”, utilizando inibitórias do Dr. Luís de Alarcão, “como juiz apostólico com comissão do Núncio”, para mudarem o vigário da vila da Calheta, “desta jurisdição, que servia como ouvidor pedâneo pelo cabido”. Remata a missiva: “E porque isto é em grande prejuízo do Seu padroado, lho fazemos saber”, para se tomarem as devidas providências (Id., Ibid.). Assinam todos os membros do cabido, mas não consta que se tivessem tomado especiais providências contra os Franciscanos. No final do episcopado de D. Luís Figueiredo de Lemos (1544-1608), a 31 de outubro de 1607, reprovava-se o procedimento de alguns oradores franciscanos, que pregavam “paixões e escândalos esquecidos da obrigação do seu ofício”. Determinou assim o bispo que não fossem admitidos ao púlpito da Sé sem a sua expressa comissão e licença, tendo comunicado inclusivamente à hierarquia da Ordem as atitudes inconvenientes de Fr. António de Pádua, enquanto pregador na Catedral (ANTT, Cabido da Sé do Funchal, mç. 6, n.º 19). Mais tarde, nas Constituições Sinodais do seu sucessor, de 14 de junho de 1615, o assunto voltava a ser recomendado ao comissário do Convento de S. Francisco do Funchal, alertando-o para que recrutasse pregadores experientes e sabedores, que soubessem atrair os fiéis, caso contrário o prelado reservava-se no direito de prover o lugar a pessoas mais competentes. O assunto, no entanto, atravessaria todo o séc. XVII e passaria ao seguinte. As questões com os Franciscanos ocorreram essencialmente por duas ordens de razões. A primeira, ligada à nova custódia de S. Tiago Menor da ilha da Madeira, determinada por patente do geral da Ordem, em 5 de junho de 1683, e confirmada por Inocêncio XI, a 30 de junho de 1683, pela qual os Conventos da Madeira voltaram a ser separados da província de Portugal. A situação foi sancionada por resolução régia de 6 de maio de 1688, ficando a nova custódia sob proteção régia, por alvará de 23 de janeiro de 1689, que colocava o Convento de S.ta Clara na dependência do custódio do Convento de S. Francisco. A situação levou a confrontos entre os frades e as freiras, com interferências dos primeiros nas eleições e na organização interna do Convento das Clarissas, que muito “escandalizavam” a população. O assunto já levara a um alerta do príncipe regente D. Pedro para o Gov. João de Saldanha da Gama, em 1673 (ABM, Câmara Municipal do Funchal, liv. 1215, fl. 63), mas também tocava ao prelado, que envidou esforços no sentido de serenar os ânimos entre as duas comunidades seráficas. A segunda razão dos problemas com os Franciscanos envolvia, periodicamente, as violentas e inoportunas pregações na Sé, cujo púlpito lhes estava atribuído, pelas quais eram inclusivamente pagos, mas que se afastavam por vezes bastante da contenção a que deviam obedecer. O assunto voltaria a agudizar-se poucos anos depois, sendo objeto de acórdão do cabido, de 16 de janeiro de 1684, onde se refere “que o púlpito não era lugar de despiques”, a propósito da contenda pessoal, e perfeitamente privada, entre dois pregadores franciscanos, os padres Fr. Raul de Santo António e Fr. Manuel de Santo Inácio, que aproveitaram os seus sermões para, do púlpito da Sé, fazerem ataques mútuos (ANTT, Cabido da Sé do Funchal, liv. 3, fls. 32ss.). O cabido decidiu a suspensão dos Franciscanos, voltando a advertir o padre comissário do Funchal para, no prazo de 15 dias, enviar à Catedral religiosos de “melhor talento” de outros Conventos. Insistia o cabido que, caso contrário, preencheria o lugar de pregador “em sujeitos, que com mais exemplo e aproveitamento dos ouvintes, pregassem a palavra de Deus” (Ibid., fls. 47ss.). Os avançados anos do prelado e, muito especialmente, o desgaste sofrido com os problemas em que se viu envolvido com os Franciscanos, e outros, como a censura régia pela excomunhão lançada sobre o governador, que prendera, sem sua autorização, o deão da Sé, Pedro Moreira (c. 1600-1674), fizeram com que, depois de uma breve enfermidade, D. Fr. Gabriel de Almeida (c. 1600-1674) falecesse no Funchal, a 13 de julho de 1674, com pouco mais de dois anos de episcopado. Mais tarde, também a tradicional mobilidade da comunidade franciscana era alvo de provisões do Desembargo do Paço, de 24 de setembro de 1718 e de 21 de outubro de 1729, determinando-se que se deveria notificar os capitães dos navios e os respetivos cônsules, para que não levassem “religioso algum” sem expressa licença dos seus prelados, ou seja, dos superiores dos conventos, “sob pena pecuniária e de prisão”. O segundo diploma, dirigido ao custódio provincial, especifica inclusivamente que faltar ao cumprimento daquela provisão implicava a pena de cem mil réis “para os cativos” no Norte de África e um mês de cadeia (BNP, IGRAPRF, 1775, 88v.). Mas os Franciscanos eram “uma força da natureza” e, pouco tempo depois, o governador e capitão-general Francisco Pedro de Mendonça Gorjão, a 21 de junho de 1738, queixava-se para o secretário de Estado, em Lisboa, da fuga da Madeira de Fr. Álvaro de São Luís (AHU, Conselho Ultramarino, Madeira, doc. 45). O Convento de S. Francisco do Funchal, no entanto, ocupou um importante papel na história da Madeira ao longo de todo o Antigo Regime. A igreja do Convento era o verdadeiro panteão de grande parte das mais antigas famílias do arquipélago, e nas suas Confrarias tinham assento não só os principais membros dessas famílias, como os quadros superiores da Ilha, incluindo governador, bispo e provedor da Fazenda, aspeto que persistiu inclusivamente até à extinção do Convento. Em 1722, Henrique Henriques de Noronha descreve o Convento, começando pela cerca e claustro, afirmando que tem um chafariz no meio “e um asseado jardim”, para o qual davam as varandas, sustentadas por colunas “de cantaria fina”. Para o claustro davam a sacristia e as casas da Confraria da Senhora da Soledade e dos Irmãos Terceiros, “ambas custosamente asseadas”, a última, em princípio, dedicada depois a Nossa Senhora da Conceição (NORONHA, 1996, 234). Refere o cronista que o Convento deveria ter, pelos seus estatutos, 50 religiosos, mas tinha então muitos mais. A igreja era de uma só nave, com quatro altares de cada lado da nave, dois colaterais e altar-mor, referindo Noronha que, em tempos, o cadeiral tinha ficado na capela-mor, mas que o removera Fr. Diogo Nabo antes de 1554, ampliando então aquela capela e passando a entrada principal para a fachada sul, devendo o cadeiral do coro ter passado para o fundo da nave, a poente. O altar-mor tinha “nobre retábulo”, já dotado de tribuna, e a mesma estava “coberta por excelente pintura do Santo Patriarca” (Id., Ibid., 236) dos Franciscanos, cuja pintura não sobreviveu. Toda a igreja fora azulejada em 1632, incluindo a capela-mor, onde tinham sepultura os religiosos, como era hábito nas casas franciscanas, tendo as armas dos Costa nas paredes e, ao centro, a sepultura dos fundadores Luís Álvares da Costa e Francisco Álvares da Costa, com a indicação da data de 1473, coberta por laje de brecha calcária da serra da Arrábida, que se encontra no cemitério de S. Martinho. O altar colateral do lado do evangelho era dedicado a St.o António “de Pádua, imagem milagrosa” (Id., Ibid.), como se podia constatar, segundo o cronista, pelos inúmeros votos mandados pintar e colocados na parede junto do mesmo altar. Fora fundado por Rui Gonçalves de Velosa, filho único de Gonçalo Anes Veloso, escudeiro do infante D. Fernando e fundador do Hospital e capela de S. Bartolomeu. O fundador deste altar encontrava-se sepultado aos pés do mesmo, com sua mulher Leonor Dória. No altar colateral do lado da epístola, dedicada às Almas Santas, onde figurava o Senhor do Milagre, “que representando estar morto tem a boca aberta, como quem fala”, encontrava-se sepultada, em frente, D. Helena Gonçalves da Câmara, filha de Zarco, que fora mulher de Martim Mendes de Vasconcelos, o Velho. Ao seu lado, e numa laje flamenga, com “lâminas de bronze” e uma figura feminina a rezar, estava sepultada Joana Valente, “devota das Chagas de Cristo” (Id., Ibid., 236-237), que fora a primeira mulher do terceiro capitão do Funchal, Simão Gonçalves da Câmara (1463-1530). Distribuídas pela nave da igreja, do lado do evangelho, encontrava-se a capela do Espírito Santo, depois também dos mártires de Marrocos, que fora fundada por D. Maria de Bettencourt (c. 1430-1491), mulher de Rui Gonçalves da Câmara (c. 1430-1497), mas cujo marido que não estava ali sepultado, dado ser capitão da ilha de São Miguel, nos Açores. Na parede lateral, estava um brasão com o leão de negro e rampante, armado de vermelho, dos Bettencourt, a “agarrar” uma flor-de-lis, símbolo da ligação desta linhagem à família real de França. Seguia-se a capela de N.a S.ra dos Anjos, mandada edificar por Manuel de Amil (1509-1585), filho do bacharel João Fernandes de Amil (c. 1460-c. 1520), que fora o primeiro provedor da misericórdia do Funchal. A terceira capela do lado do evangelho era dedicada a S. João Batista, tendo sido fundada pela família Mondragão e da qual era então administrador Francisco Luís de Vasconcelos Bettencourt Machado (1644-1717), pai da célebre morgada D. Guiomar Madalena de Vilhena (1705-1789). A última capela era dedicada a S. Diogo, “que antigamente se chamou de Santiago” e fora instituída por Lourenço da Gama Pereira (c. 1521-1604), que ali se encontrava sepultado com a primeira mulher, Águeda Teixeira, e a segunda, Isabel de Mondragão. O instituidor era irmão do célebre António da Gama Pereira (1520-1595), desembargador do Paço na época de Filipe II de Castela, e que “dispôs as ordenações do reino” (NORONHA, 1996, 238-239) as famosas Ordenações Filipinas, terminadas e aprovadas em 1595, embora só editadas em 1603, elaboradas em colaboração com Damião de Aguiar e Jorge Cabedo de Vasconcelos, que Noronha não cita. Rainha Santa Isabel. 1640. Arquivo Rui Carita A primeira capela do lado da epístola devia corresponder ao inicial braço do transepto, sendo citada como “maior que as demais, custosamente ornada e com porta travessa para o adro”. Era dedicada à Rainha S.ta Isabel e encontrava-se entregue aos Irmãos Terceiros de S. Francisco, “e ali têm enterro os que querem” (Id., Ibid.). Desta capela deve restar a magnífica imagem da Rainha Santa, que a tradição dá como proveniente do Convento da Encarnação, mas que tem muito mais probabilidades de ser desta capela, até porque desde os inícios do séc. XX se encontrava no Museu Municipal, onde podia ter chegado pelos Irmãos Terceiros, antes de ter figurado no antigo Museu da Cidade nos inícios da déc. de 80 do séc. XX. Seguia-se a capela de N.a S.ra da Conceição, “imagem de grande devoção”, onde existiam as sepulturas de António da Silva Madeira e de Jerónimo Pires do Canto, que, por se terem extinguido os herdeiros, ficara devoluta para o Convento. A terceira capela era de N.a S.ra da Encarnação, fora instituída por Diogo de Barcelos e passara depois para Jerónimo Vieira da Costa. A quarta capela era de N.a S.ra da Graça e tinha sido edificada por João Gomes da Ilha (c. 1430-1495), o Trovador, pajem do livro do infante D. Henrique, e que passou depois ao seu filho Bárbaro Gomes Ferreira (c. 1460-1544), que fora vedor das obras da Sé. Por baixo desta capela ainda havia outra, mais pequena, “a qual edificaram de moderno” (Id., Ibid.) os irmãos da Confraria de S. Benedito, no dizer do cronista, pelo que seria capela levantada já nos inícios do séc. XVIII. Esta devoção era, em Portugal e no Brasil, geralmente dos escravos forros, havendo uma imagem deste frade na capela do Corpo Santo, mas não se conhecendo qualquer documentação a esse respeito para o Funchal. À volta dos claustros ainda existiam mais capelas, a começar pela levantada no chamado “capítulo velho” por Simão Acciauoli, dedicada a Nossa Senhora da Piedade, “que é de excelente pintura”, no dizer do cronista, que só teve idêntica referência para a pintura do retábulo-mor. No “capítulo novo” ficava a capela da Virgem Santíssima e, anteriormente, dos mártires de Marrocos, que, segundo a tradição, teriam passado depois para a capela do Espírito Santo, instituída por Maria de Bettencourt. Nesta capela tinham os religiosos “a sua aula, decentemente ornada”, e igualmente muitas “sepulturas nobres, cujos donos dizem os seus letreiros”. No andar superior ainda existiam mais capelas, como a de N.a S.ra da Estrela e, com especial destaque, “outra que chamam” de N.a S.ra da Escada, ou do Poço, com “imagem de muita devoção” (Id., Ibid., 241), curiosamente uma imagem, muito provavelmente flamenga, em pedra, o que, até por razões de transporte, não é comum. Na passagem dos claustros para a portaria ainda ficava a capela de N.a S.ra da Piedade, acerca da qual havia crentes que afirmaram “que a viram chorar” e, na sua sequência, a capela de S. Caetano. Na portaria havia a capela do Senhor Crucificado e, da parte de fora, outra capela de S. João Batista, “cuja imagem se tirou do mar, misteriosamente”. Igualmente da porta de fora da portaria e pegada com esta estava a capela de N.a S.ra de Jerusalém, “edificada com as próprias medidas do Santo Sepulcro”, seguindo-se logo outra capela da Virgem da Piedade, “onde concorre a todas as horas muita gente”. O mesmo se passava com a capela das Almas, que lhe ficava contígua, sendo “as suas paredes interiores cobertas artificiosamente de ossos e caveiras organizados” (Id., Ibid.). A capela dos Ossos dos Franciscanos do Funchal resistiu à reconstrução dos finais do séc. XVIII, sendo referida na Viagem à Cochinchina do botânico e pintor sir John Barrow (1764-1848), em 1792 e 1793, sendo inclusivamente representada em litografia colorida na edição de 1806 (BARROW, 1806, 37A). Apresenta retábulo ao gosto dos finais do séc. XVII e inícios do séc. XVIII, com pintura de S. Miguel das Almas e duas grandes imagens sobre a mesa do altar, uma das quais parece ser de S. Sebastião. As paredes e o teto encontravam-se totalmente revestidos de caveiras enquadradas por ossos longos, talvez tíbias ou perónios, sobre lambril pintado ou revestido a azulejos. A vida do Convento de S. Francisco foi de alguma forma contida na vigência do bispo jacobeu D. Fr. Manuel Coutinho (1673-1742), freire da Ordem de Cristo, que chegou ao Funchal a 22 de junho de 1725, não se registando nesse episcopado especiais problemas. Dos poucos livros deste Convento que chegaram aos nossos dias consta o Livro das Patentes, iniciado em 1732 por Fr. Jorge dos Serafins, que fora examinador e definidor das custódias açorianas franciscanas e então custódio provincial da de S. Tiago Menor da ilha da Madeira. Das várias provisões lançadas pelo custódio provincial, a primeira aborda o inteiro cumprimento da celebração das missas a que os Franciscanos se encontravam obrigados, incluindo as do dia de finados, no qual deveriam dizer missa “pelas benditas almas do Purgatório”, assunto que os “reverendos prelados locais, respeitando a indigência dos conventos”, descuravam, inclusivamente deixando que alguns clérigos pobres cobrassem dinheiro pelas mesmas, em nome individual da alma encomendada, o que se proibia terminantemente a partir do dia 1 de novembro seguinte, pois essas missas eram em nome “das almas de todos os finados defuntos” (ANTT, Conventos, Convento de São Francisco do Funchal, liv. 1, fl. 7). A segunda provisão aborda o inveterado costume de muitos Franciscanos divulgarem “fora de portas” o que se passava no Convento, tal como as possíveis culpas de uns e de outros. O assunto já teria ido a capítulo e, em “nome do crédito dos religiosos desta Santa Custódia”, Fr. Jorge dos Serafins ameaçava com “pena de excomunhão maior, ipso facto incurrenda” todo aquele que revelasse a seculares, a religiosos de outra Ordem e a religiosas “defeito algum de seus irmãos” de que se pudesse atribuir culpa grave. Nessa sequência, advertia igualmente os padres pregadores e confessores que deveriam renovar as suas patentes 15 dias antes de as mesmas findarem, ou seja, no final do ano. As patentes deveriam ser entregues ao seu secretário, o P.e Fr. João de Santa Rosa, para serem avaliadas, o mesmo se passando com os novos padres que, no último capítulo, tinham sido instituídos “confessores de seculares”, e que até ao final de dezembro se deveriam pôr “expeditos para fazerem o seu exame”. Tendo tido conhecimento da falta de inúmeros livros nas várias livrarias dos Conventos da custódia, assunto que lembrara aos vários responsáveis e sobre o qual inclusivamente o Santo Padre já se pronunciara, listava vários dos livros em falta e voltava a ameaçar com pena de excomunhão os infratores (Id., Ibid., fol. 8). Com o novo bispo do Funchal, D. Fr. João do Nascimento (c. 1690-1753), que chegou à Ilha a 5 de setembro de 1741, a situação de início ainda teve outra cobertura, pois o prelado era Franciscano e vinha acompanhado de dois padres pregadores, igualmente “frades menores”, para o ajudarem na sua missão: Fr. Lourenço de Santa Maria e Fr. João do Sacramento. O novo bispo e os padres pregadores recolheram-se durante 12 dias no Convento de S. Francisco do Funchal, pelo que D. Fr. João do Nascimento só tomou posse da Diocese a 17 desse mês. De imediato, fez publicar uma carta pastoral, tal como fizera o seu antecessor, especialmente dedicada à “reforma dos costumes, à extirpação de abusos, restauração, perfeição e esplendor do culto divino”, assim como outra, dirigida ao cabido da Sé, introduzindo algumas modificações nos serviços do culto ali realizados (APEF, cx. 122, doc. 3, fls. 21v.-22v.). Ao longo do seu episcopado, no entanto, reacenderam-se alguns problemas, com situações que já vinham do anterior, como a demência do P.e Fr. João de São José Ferraz, cuja interdição foi solicitada pelo procurador-geral da custódia da ilha da Madeira, o P.e Fr. José da Conceição, em 1748, ou os incidentes relacionados com a expulsão da ilha de dois franciscanos, Fr. João de São José e Fr. José do Rosário, em 1755. Por vezes, era ao contrário, como em 1753, quando o custódio provincial, então Fr. José de Santa Maria, solicitou aos visitadores da mesma custódia no continente que obrigassem três religiosos do Funchal, que se encontravam em Lisboa, a regressar ao Convento, dado já ter expirado há muito o prazo da licença que lhes fora concedida. O controlo das instâncias superiores apertou-se ao longo do séc. XVIII, acusando os visitadores quase sempre os Franciscanos de “relaxados”, quer na forma como se comportavam dentro do Convento, quer em relação às eleições, aos seus deveres, etc., como se queixa em carta do Funchal, de 28 de maio de 1753, o visitador Fr. José da Natividade ao ministro Diogo de Mendonça Corte Real, enviando, inclusivamente, uma representação do custódio provincial Fr. José de Santa Maria (AHU, Conselho Ultramarino, Madeira, doc. 13). Os problemas envolviam mesmo a atividade exterior dos Franciscanos, como se queixa depois o Gov. João António de Sá Pereira (1719-1804), futuro barão de Alverca, em ofício de 21 de novembro de 1768, a respeito de um caso contrabando de tabaco, envolvendo o guardião do Convento, Fr. António de São Guilherme. O Convento de S. Francisco do Funchal, no entanto, ultrapassou sempre os pontuais problemas em que se foram envolvendo alguns dos seus membros, pois manteve-se, até à sua extinção, graças à capacidade de intervenção dos Franciscanos e à força das suas Confrarias, como um dos mais importantes centros de decisão políticos e económicos da Madeira. Assim, embora o gabinete pombalino tenha decretado a restrição de entradas nos conventos, com a subida ao trono de D. Maria I, em março de 1777, e o afastamento do marquês de Pombal, logo se envidaram esforços para ultrapassar a situação, sendo autorizada a entrada de 12 noviços por ano no Convento de S. Francisco do Funchal. Em carta datada do Convento do Funchal, de 8 de junho de 1777, o vigário custódio provincial Fr. Manuel de São José acusava a receção da autorização régia e agradecia. O Convento devia ter por essa data cerca de 100 religiosos, entre padres professos, leigos e noviços. A documentação das suas Confrarias, na maior parte, não chegou aos nossos dias, mas mesmo numa altura de franca recessão desse tipo de atividades, como no consulado pombalino, sucederam-se as iniciativas desse género. Por petição de 23 de março de 1765, e.g., o morgado João José de Bettencourt de Vasconcelos (1715-1766), familiar do Santo Ofício e administrador da capela de S. João Batista da igreja de S. Francisco, encabeçava uma lista dos principais proprietários madeirenses para fundarem uma nova Confraria de Nossa Senhora dos Anjos, Mãe dos Homens, e de S. José, Rei dos Homens. A petição era dirigida a Fr. António da Encarnação, vigário custódio da província, e incluía inúmeros eclesiásticos, como os padres doutores António José de Vasconcelos, João Henriques de Aragão e Manuel José da Rosa, Domingos João Alves da Silva Barreto, o Cap. António Vogado Teles de Meneses e os importantes comerciantes Pedro Jorge Monteiro, José João Veríssimo e José Fayan, entre outros. Os estatutos da Confraria seriam aprovados a 15 de fevereiro de 1767, e, tendo já falecido o promotor, era eleito como prefeito da mesma o então governador e capitão-general José Correia de Sá, enviado à Madeira para a extinção da Companhia de Jesus, que assina juntamente com o secretário António João Spínola de Macedo, para além dos outros membros da mesa. O documento é ainda reconhecido a 5 de março seguinte, pelo tabelião de notas Bartolomeu Fernandes e por Domingos Afonso Barroso, provedor da Fazenda. A aprovação do Rei D. José ocorreu a 27 de outubro seguinte e foi registada no Funchal a 23 de abril de 1769, tendo sido eleito para prefeito o então governador e capitão-general João António de Sá Pereira, servindo de secretário o padre genealogista José Francisco de Carvalhal Esmeraldo e Câmara, filho do morgado Aires de Ornelas de Vasconcelos e depois fidalgo-capelão, por nomeação de 5 de fevereiro de 1782. Armas de Mouzinho de Albuquerque. Arquivo Rui Carita A importância das Confrarias do Convento de S. Francisco está ainda patente na confraria de N.ª S.ra da Soledade, que, nos finais do séc. XVIII, assumiu a tradição de integrar sempre como irmãos o governador da Madeira e a mulher, quando o acompanhava, elaborando artísticas folhas aguareladas com as armas dos mesmos. A tradição manteve-se até à extinção do Convento, sendo a última folha dedicada ao prefeito liberal e governador militar Luís da Silva Mouzinho de Albuquerque (1792-1846) – e D. Ana de Mascarenhas de Ataíde –, que, a 14 de março de 1835, entrou como “irmão protetor e presidente da confraria”, “prometendo não só guardar as obrigações do Compromisso, mas também promover o aumento Espiritual, e temporal da mesma Confraria” (ARM, Governo Civil, liv. 235, fl. 71). Seria Mouzinho de Albuquerque, no entanto, como prefeito da província, poucos meses depois, em agosto desse ano, a determinar as instruções para a extinção do Convento e, logicamente, da Confraria da Soledade. Os elementos chegados até nós não nos permitem uma avaliação mínima da vida económica dos Franciscanos do Funchal. Os livros das Confrarias são muito escassos e os de “receita e despesa” quase inexistentes. A vida do Convento não se afastava, no entanto, da dos conventos de S. Bernardino de Câmara de Lobos ou da Piedade de Santa Cruz, mas era mais complexa, dado o maior número de frades e, também, dada a sociedade urbana e a classe social que serviam e onde se inseriam. Existem dois livros de sacristia de “Registos de Missa” que dão uma pálida ideia do movimento do Convento, que celebrava semanalmente, nos finais do séc. XVIII, quase 100 missas, enquanto S. Bernardino, na mesma época, e.g., celebrava entre 20 e 30, embora os preços fossem semelhantes: na generalidade, entre $200 e $300 réis a missa. Na primeira semana do mês de agosto de 1797, v.g., celebraram-se 85 missas, sendo 7 pelas obrigações do Convento, 19 pelas obras pias, 34 pelas capelas, 5 pelas Confrarias e 2 pelos frades. Houve ainda uma celebrada na Festa do Ilhéu, provavelmente a festa de Nossa Senhora da Conceição, e que deve ter custado 1$500 réis, dado envolver a deslocação, e 15 missas dos “ofícios de frade e de grade”, que é possível que correspondam às missas em que é dada a comunhão aos fiéis na grade. Somente foram contabilizadas 14 a $200 réis, sendo as restantes das obrigações gerais do Convento, rendendo o conjunto 4$300 réis. Celebraram missa nessa semana 23 religiosos, incluindo o custódio provincial, o guardião, “o mais digno”, etc., tendo o domingo 20 missas, o maior número, rondando as 10 a 12 nos restantes dias da semana (ANTT, Convento de São Francisco do Funchal, liv. 2, fl. 1). Na semana seguinte, a segunda semana de agosto de 1797, os números foram semelhantes, celebrando-se 95 missas, com um “noturno das Almas”, obrigação do Convento, em princípio, porque não contabilizado, rendendo nove missas a $300 réis e outras seis a $200, num montante de 3$900 réis (Ibid., fl. 1v.). Na terceira semana, celebraram-se 79 missas, uma com “com festa na Fortaleza”, que deve ser a de S. Lourenço e que deve ter rendido $800 réis, embora tenha havido outra, não especificada, que rendeu 450, contabilizando-se, com mais cinco missas a $300, duas a $250 e nove a $200, 5$050 réis (Ibid., fl. 2). Nos inícios do séc. XIX, os preços subiram em relação ao século anterior, passando as missas a render entre $300 e $500 réis, pelo que, embora não havendo um significativo decréscimo no número geral das mesmas, deu-se um franco aumento do montante global cobrado. Na quarta semana de julho de 1809, e.g., celebraram-se 87 missas, entre as quais umas de obrigação do Convento e 52 de grade, 1 a 1$000 réis e 51 a $400 réis, somando 21$400 réis, montante muito acima do cobrado semanalmente nos finais do século anterior. Para os anos seguintes, existem informações gerais da vida económica do Convento, entre 1809 e 1832, correspondendo, assim, sensivelmente à fase final da vida do Convento. A descrição do tipo de missas é mais sucinta, deixando de se referir as missas das Confrarias, provavelmente incluídas nas capelas, e aumentando o preço das mesmas, cobrando-se no mínimo 400 réis por missa. Os totais semanais passaram a rondar os 20$000 réis e, por mês, as missas renderam à sacristia quantias acima dos 80$000 réis. Para estes anos, as despesas gerais do Convento não se afastam especialmente, e.g., das do de S. Bernardino de Câmara de Lobos. No mês de julho de 1809, o Convento teve uma receita de 360$800 e uma despesa de 287$720. O Convento já vinha com um saldo positivo do ano anterior, “de alsas”, como se dizia, de 1808$236, ficando então com 1881$316, como certificam o guardião, Fr. Matias de S. Boaventura, o síndico, Pedro de Santa Ana, os discretos Fr. Manuel da Piedade, Fr. Januário das Chagas de São Francisco, Fr. António de São Joaquim e Fr. António de N.ª S.ª das Dores (Ibid., liv. 5, fl. 2). Tal como nos restantes conventos franciscanos masculinos, as principais receitas vinham das missas e cerimónias realizadas fora do Convento e da venda de hábitos de burel e hábitos de saial, com o pormenor de tanto se terem vendido os de saial para enterro de homens, como os de burel para enterro de mulheres, o que até então não se tinha verificado. Os preços também são muito mais altos que os praticados em S. Bernardino nos finais do século anterior: entre 3$000 a 6$000 réis, em S. Francisco, não incluindo, em princípio, acompanhamento. Por “um hábito de burel e três religiosos, a seiscentos réis cada, para Sabina, da freguesia de São Martinho”, e.g., só cobraram 4$800 réis, e por um hábito de saial para João Paulo Medina, sem referir acompanhamento, cobraram 6$000. Os Franciscanos cobraram 9$400 réis “por merecido” dos religiosos que tinham ido à festa da Visitação na misericórdia do Funchal, 18$000 pela novena e procissão do Carmo e mais 10$000 pelas matinas da dita festa. Nas despesas desse mês entrou essencialmente a aquisição de carne de vaca, que custou mais de 100$000 réis, tal como peixe, bacalhau, azeite, manteiga, queijos, toucinho, presunto, azeitonas, sal, milho, semilhas, couves, feijão, chá, açúcar, etc. Algumas aquisições vinham de fora, como as cebolas, compradas no Caniço, que tiveram um acréscimo de 2$000 réis, “pelo frete, carreto e pagamento do moço que tirou as cebolas do Caniço”. Nesse mês também se adquiriu cerveja e sabão, tal como se pagou $400 réis para amolar as navalhas de barba do irmão leigo Fr. José das Mercês. Também se adquiriram umas rodas para o relógio, que custaram 1$000 réis, tal como se pagou $400 pela montagem das mesmas e ao moço António de Aguiar seis meses e 20 dias, a 3$000 réis por mês, o que somou 20$000 (Ibid., liv. 5, fls. 1v.-2). A partir dos inícios do séc. XVIII, com a oficialização da custódia, tinha passado a Fazenda Real a tomar a seu cargo a manutenção destes edifícios e a assumir a reconstrução do Convento de S. Francisco do Funchal, dado o templo primitivo ser considerado acanhado e modesto. As obras do Convento tiveram início por volta de 1750, data do reenvio para o Funchal da planta efetuada pelo mestre das obras reais Domingos Rodrigues Martins (c. 1710-1781), já devidamente corrigida, para o que D. João V tinha atribuído a valiosa esmola de 20.000 cruzados (ANTT, Provedoria e Junta…, liv. 973, fl. 112v.). O edifício teria então passado por várias ampliações, até para suportar a população de 100 religiosos, com admissão de 12 noviços em cada ano, autorizada a partir de junho de 1777. Em julho de 1780, deve-se ter inaugurado uma parte da construção, dado ter-se exumado, em 1880, uma inscrição alusiva a D. Maria I, ao Papa Pio VI e ao P.e Fr. Bernardo. A inscrição teria sido depositada no arquivo municipal, mas, segundo os autores do Elucidário, algumas décadas depois tinha desaparecido. No entanto, entre agosto e setembro já não havia dinheiro para continuar as obras, pedindo o principal do Convento a deslocação ao Brasil de dois irmãos leigos, para ali recolherem esmolas, certificando o velho mestre das obras reais, Domingos Rodrigues Martins, a 19 de outubro desse ano, para a corte de Lisboa, que as obras ainda continuavam. No ano seguinte, voltou a haver pedidos de subsídios para as obras, requerendo os Franciscanos inclusivamente o edifício do extinto Colégio dos Jesuítas, dadas as obras e os vários cursos que lecionavam então em S. Francisco, motivando a troca de cartas entre o secretário de Estado Martinho de Melo e Castro e o bispo do Funchal D. Gaspar Afonso da Costa Brandão (1710-1784), em 9 de agosto e 6 de novembro de 1781. Nesta sequência, igualmente requereu Fr. Manuel de São Boaventura “as sobras do subsídio literário e do almoxarifado” do Funchal, para se continuar a construção do novo Convento (AHU, Conselho Ultramarino, Madeira, docs. 588 e 599). A 10 de fevereiro de 1782, as obras passaram por novas alterações; o mestre das obras reais José António Vila Vicêncio (c. 1720-1794) refere alterações de custo. Face às dificuldades de obtenção de pedra, as obras e correriam o risco de parar, pois o pedreiro de Câmara de Lobos encarregado de a fornecer faltara ao ajuste. Alvitra-se, então, o trabalho das companhias de ordenança no retirar da pedra da pedreira, entendido como uma esmola das mesmas para os Franciscanos, o que foi autorizado pelo governador a 30 de agosto desse ano (ABM, Governo Civil, liv. 520, fl. 104). O Convento esteve assim em obras durante todo o final do séc. XVIII, possivelmente sob uma desastrosa administração, pelo que nunca chegou a ser acabada a enorme igreja, até à extinção dos conventos nos meados do séc. XIX, o que levou à sua demolição. Em 1834, no âmbito da reforma geral eclesiástica empreendida pelo ministro e secretário de Estado Joaquim António de Aguiar, que ficou conhecido como “mata-frades”, executada pela Comissão da Reforma Geral do Clero (1833-1837), pelo decreto de 30 de maio, foram extintos todos os conventos, mosteiros, colégios, hospícios e casas de religiosos de todas as ordens religiosas. A extinção do Convento de S. Francisco do Funchal foi acionada pelo prefeito Luís da Silva Mouzinho de Albuquerque, em agosto de 1835, em articulação com Diogo Teles de Meneses (1788-1872), provedor da Alfândega (ABM, Alfândega do Funchal, liv. 675), tendo decorrido sem especiais dificuldades e quase sem qualquer interferência da autoridade religiosa. O Convento de S. Francisco do Funchal foi desocupado por forças militares a 9 de agosto de 1834 e, pouco mais de 15 dias depois, a 27 de agosto, o prefeito mandava o provedor da Alfândega do Funchal tomar conta do edifício. Dado não terem ocorrido problemas, nesse mesmo dia 27 de agosto, o prefeito enviava para o provedor do concelho do Funchal, Manuel de Santana e Vasconcelos (1798-1851), instruções precisas sobre a execução do decreto de 30 de maio sobre a extinção dos conventos, para que tal se efetuasse nos restantes conventos do concelho do Funchal. As instruções determinavam que se deveria fazer o inventário dos bens do Convento em causa, entregando-se ao representante do cabido da Sé do Funchal as alfaias religiosas, os paramentos, “ornatos dos templos e utensílios de culto”. As imagens e as cruzes, porém, deveriam permanecer onde estivessem. As igrejas deveriam ser fechadas, ficando as chaves à disposição do prefeito, mas na posse do provedor do concelho, que elaboraria, entretanto, uma relação dos religiosos de cada convento. No espaço de um mês, os religiosos deveriam apresentar-se na prefeitura, com uma relação testemunhável, para que se verificasse se teriam direito à pensão anual para a sua sustentação, prevista no artigo 4.º do decreto de 30 de maio anterior. Luís Mouzinho de Albuquerque recomendava que a diligência deveria ser feita com “a mais escrupulosa atenção”, em que tudo fosse praticado com a maior “circunspeção, prudência e urbanidade”, para que de maneira alguma houvesse lugar a “escândalos dos povos ou pretexto à maledicência” (VERÍSSIMO, 2002, 69-77). As imagens e muitas das pinturas, entretanto, foram transferidas para outros locais, como a imagem do Senhor do Milagre do Convento de S. Francisco, que teria falado algumas vezes com Helena Gonçalves da Câmara – razão pela qual recebeu essa designação –, e que foi transferida para a Sé, inclusivamente com o diadema e o lampadário de prata, a 11 de março de 1835, assim como outras alfaias, pelo menos entre 1848 e 1850, na vigência do governador civil José Silvestre Ribeiro (1807-1891), para a igreja do Colégio do Funchal, que nesses anos foi reabilitada e entregue à Diocese. A transferência das pinturas e imagens que ainda restavam nas instalações do Convento para a igreja do antigo Colégio dos Jesuítas deve datar de fevereiro de 1847, tendo sido acordada entre o governador e o bispo D. José Xavier de Cerveira e Sousa (1797-1862), quando se preparou a instalação, em S. Francisco, do Asilo de Mendicidade do Funchal, com cerca de 400 indigentes, cuja administração foi entregue ao prelado e cuja inauguração se fez a 27 de março desse ano (MENESES, 1848, 25-30 e 50-54). Algumas das telas existentes nesta igreja, como parte da coleção mariana da sacristia, senão mesmo toda, a tela dos mártires de Marrocos, a de Nossa Senhora do Pópulo, etc., pertenceram, por certo, ao Convento de S. Francisco, pois não fazem parte dos sucessivos inventários do Colégio, podendo a tela de N.ª S.ra da Porciúncula ter vindo da capela do Hospício da Ribeira Brava ou também de S. Francisco. O mesmo deve ter acontecido com algumas imagens, como a de S. Luís, Rei de França, em barro, aparentemente de produção regional, que se encontra na sacristia do Colégio, e o conjunto de imagens de roca, que se encontram no Museu de Arte Sacra do Funchal. O mesmo se teria passado com o conjunto de bustos relicários dos mártires de Marrocos, que foram descobertos quase emparedados na torre do Colégio e que igualmente transitaram para aquele Museu. Outra parte do espólio do Convento de S. Francisco transitou para o Convento de S.ta Clara, como foi o caso dos dois grandes painéis de azulejos de S. Francisco e de S.ta Clara, de oficinas de Lisboa (1740-1760), posteriormente remontados na portaria daquele Convento. No coro de baixo de S.ta Clara, algumas das pinturas que decoram as paredes laterais, segundo a tradição, terão vindo também de S. Francisco. A maioria das pratas, entretanto, fora arrecadada na Alfândega, e, em 28 de maio de 1836, elas seguiram para a Casa da Moeda de Lisboa, onde o antigo prefeito da Madeira fora provedor. Sem especial explicação, somente em virtude da portaria de 9 de junho de 1886, os livros do Convento de S. Francisco foram entregues à repartição da Fazenda do Funchal, sendo posteriormente incorporados na Torre do Tombo, juntamente com os da Provedoria e Junta da Real Fazenda do Funchal, mas não os que estavam no Governo Civil, que passaram, depois, ao Arquivo Regional da Madeira, nem a biblioteca, que deve ter recolhido ao paço episcopal e ao Seminário, peregrinando e perdendo-se pelos vários locais por que quer o paço, quer o seminário foram passando, assim se explicando que quase nada da importante documentação bibliográfica ali guardada tenha chegado até nós. O edifício foi logo disputado pelos novos poderes liberais instituídos, como a Câmara Municipal do Funchal, que o requereu e o recebeu por decreto de 7 de novembro de 1844, para construção, nesse espaço, de um amplo edifício destinado à instalação da nova Câmara Municipal e dos tribunais judiciais, mas a situação de instabilidade política retardou o projeto. O concurso público para apresentação de um projeto só se veio a realizar em 1864 e, a 11 de março de 1866, saía da Sé do Funchal “um luzido cortejo” presidido pelo bispo do Funchal, D. Patrício Xavier de Moura (1859-1872), que fora bispo de Cabo Verde, cortejo onde se incorporaram as autoridades superiores do distrito, procedendo ao lançamento da primeira pedra do novo conjunto de edifícios, que não passou da primeira pedra (SILVA e MENESES, 1998, I, 313). [caption id="attachment_14397" align="alignleft" width="199"] Convento de São Francisco. Arquivo Rui Carita.[/caption] [caption id="attachment_14394" align="alignleft" width="226"] Demolição do Convento de São Francisco[/caption] Nos anos seguintes, os edifícios do velho Convento arruinavam-se progressivamente, mas só devem ter sido demolidos nos inícios da déc. de 70, pois restam algumas fotografias do conjunto, ainda parcialmente de pé. Nos anos seguintes, parte da cerca foi dando origem aos novos arruamentos, depois as ruas Hermenegildo Capelo, Serpa Pinto e Conselheiro José Silvestre Ribeiro, e, por volta de 1880, ao jardim municipal e ao teatro municipal. Do conjunto edificado parecem só restar o brasão de armas nacionais e franciscanas, no canto sudeste do jardim, e o chafariz da cerca do Convento, que nos inícios do séc. XIX já estava na vizinha praça da Constituição, então passeio público, servindo de base ao conjunto do largo do Chafariz, cuja pilastra superior parece ter sido encomendada para o monumento à Constituição de 1820 – chegando ao Funchal depois da abolição da mesma, nunca chegou a ser montada no monumento, cuja base também já havia sido demolida.   Rui Carita (atualizado a 01.03.2017)

Arquitetura Educação Património Religiões

laboratório de genética humana

O Laboratório de Genética Humana (LGH) é uma unidade de investigação, na área da genética humana, da Universidade da Madeira. Foi fundado em 2001, com o objetivo de dotar a Região de um laboratório no qual fosse possível a realização de testes genéticos para apoio à população madeirense. Desde a sua criação, o laboratório foi dirigido pelo seu fundador, o Prof. Doutor António Brehm, investigador e docente na Universidade da Madeira. A partir desta data, passou a ser possível realizar na Madeira muitos testes genéticos que eram realizados apenas em território continental. É o caso dos testes de paternidade, dos testes para a deteção de anomalias genéticas e de testes de patologias diversas. O LGH tem duas linhas de atuação: investigação e prestação de serviços. Assim, como resultado de um protocolo estabelecido com o Instituto Nacional de Medicina Legal, o LGH presta serviços na área de genética forense e, em articulação com o serviço de saúde da Região Autónoma da Madeira, nomeadamente com o Hospital Central do Funchal (Hospitais) realiza testes genéticos para diagnóstico precoce de malformações congénitas em fetos humanos com apenas 10 semanas de gestação.   Ana Londral (atualizado a 11.02.2017)

Biologia Terrestre Educação

clima e meteorologia

O arquipélago da Madeira situa-se na região subtropical do Atlântico oriental, centrado aproximadamente a 32 ° 45 ’ de latitude norte e 17 ° 00 ’ de longitude oeste, a cerca de 900 km de Portugal continental (Sagres) e dos Açores (Santa Maria). É formado pelas ilhas da Madeira e de Porto Santo, com áreas da ordem dos 730 km2 e 23 km2, respetivamente, e pelos ilhéus das Desertas e das Selvagens, estes últimos a cerca de 300 km a sul da Madeira. A orografia é bastante acidentada, com as formações de maior altitude na parte oriental (pico Ruivo, com 1862 m) e na parte ocidental (planalto do Paul da Serra, com altitude da ordem dos 1300 m). De acordo com a classificação climática de Köppen-Geiger, as ilhas da Madeira e de Porto Santo apresentam clima temperado húmido, com zonas de verão seco e quente e outras zonas de verão seco e suave, dependendo da proximidade ao mar, da exposição solar e principalmente da altitude. Em intervalos de tempo regulares, com base em instrumentos específicos, é feita no arquipélago a observação à superfície dos principais descritores meteorológicos, designadamente a pressão atmosférica, o vento, a temperatura e a humidade relativa do ar. A respetiva difusão sincronizada aos níveis regional, nacional e internacional constitui a informação primária para a descrição do tempo presente e, por acumulação sucessiva, do conhecimento do clima. As primeiras observações meteorológicas à superfície, executadas com regularidade e de forma continuada no Funchal remontam a meados do séc. XIX, tendo sido executadas até meados do séc. XX no Palácio de S. Lourenço, e posteriormente no sítio dos Louros, na orla costeira leste da cidade, onde foi instalado o Observatório Meteorológico do Funchal. Graças à observação regular efetuada, no mínimo diariamente, às 09.00 h, estava disponível, em 2015, uma série longa de dados para o Funchal, o que permitia conhecer, e.g., a variação da temperatura média do ar e da quantidade de precipitação dos 151 anos anteriores e da temperatura da água do mar à superfície dos 65 anos anteriores, executada no porto do Funchal. Fig. 1 – Gráfico com a média anual da temperatura do ar à superfície, registada no Funchal entre 1865 e 2015 (151 anos) (Palácio de S. Lourenço e sítio dos Louros); e a média anual da temperatura da água do mar registada na Pontinha entre 1951 e 2015 (65 anos). Fonte dos dados: Instituto do Mar e da Atmosfera. Dos registos anuais, destaca-se a subida da média anual da temperatura do ar a partir do início dos anos 70 do séc. XX. Desde 1971 até 2015, a temperatura média anual subiu cerca de 2,2 °C, o que corresponde a um valor médio da ordem de 0,5 °C por década. No entanto, entre 1996 e 2015, período em que as observações foram feitas sempre com o mesmo equipamento, devidamente calibrado, verificou-se que a temperatura do ar subiu cerca de 0,3 °C, o que corresponde a um valor da ordem de 0,15 °C por década, tendo a subida sido mais acentuada entre 1996 e 2004 (8 anos) do que entre 2005 e 2015 (11 anos). À semelhança da temperatura média do ar, a temperatura média da água do mar começou a subir no início da déc. de 70 do século XX, embora de forma menos significativa entre 1995 e 2015. Desde o início da déc. de 70, a diferença entre a temperatura média do ar e da água do mar variou entre 1,3 °C e 0,5 °C, embora nos últimos anos do intervalo essa diferença se tenha mantido próxima dos 0,5 °C. Entre 1995 e 2015, a temperatura média anual do ar variou entre 20,0 °C e 20,4 °C, e a temperatura da água do mar entre 20,4 °C e 21,1 °C. Fig. 2 – Gráfico com a evolução da precipitação média anual registada no Funchal entre 1865 e 2015, desde 1865 no Palácio de S. Lourenço e desde 1951 no sítio dos Louros (Observatório Meteorológico do Funchal). Fonte dos dados: Instituto do Mar e da Atmosfera. A partir de uma análise simples da fig. 2, conclui-se que a quantidade de precipitação apresenta variabilidade interanual significativa. No 65 anos que medeiam entre o momento em que começou a haver registos no Observatório Meteorológico do Funchal e 2015, a precipitação anual mais baixa foi registada em 2015 (299,5 mm), correspondendo ainda ao quarto valor mais baixo desde 1865 (em 151 anos). O maior valor da quantidade de precipitação anual ocorreu em 2010 (1477 mm) e um valor próximo deste foi registado em 1895 (1420 mm). Entre 2010 e 2015, registou-se o maior período de anos consecutivos com os valores mais baixos da quantidade de precipitação no Funchal. Rede de observação A rede meteorológica do Funchal começou a ser construída em meados dos anos 30 do séc. XX, com a instalação de vários postos meteorológicos. Nos anos 50, a rede meteorológica era constituída por 15 postos, tendo 7 sido desativados durante a déc. de 80; restaram as estações do Funchal (1865), do Areeiro (1936), de Santana (1937), do Porto Santo (1939), do Lugar de Baixo (1941), do Santo da Serra (1942), da Bica da Cana (1950) e de Santa Cruz/Aeroporto (1958). No acompanhamento da modernização tecnológica registada particularmente durante a déc. de 80 do séc. XX, iniciou-se em 1995 a modernização da rede meteorológica do arquipélago da Madeira, com a instalação de duas estações meteorológicas automáticas em Porto Santo/Aeroporto (78 m) e no Funchal/Observatório (58 m); em 2002, foram instaladas cinco estações: Funchal/Lido (25 m), São Jorge (257 m), Chão do Areeiro (1590 m), Lugar de Baixo (40 m) e Ponta do Pargo (298 m); em 2009, e para reforçar a melhoria da previsão meteorológica, foram ainda instaladas duas estações automáticas no Caniçal/Ponta de São Lourenço (133 m) e nas Achadas da Cruz/Lombo da Terça (931 m). Posteriormente, e após o violento temporal de 20 de fevereiro de 2010, reconheceu-se a necessidade de aumentar a densidade de estações, pelo que foram instaladas, em finais de 2010, mais cinco estações automáticas em Quinta Grande (580 m), São Vicente (97 m), Santana (380 m), Bica da Cana (1560 m) Santo da Serra (660 m), tendo as três últimas substituído as estações clássicas existentes, das quais havia apenas uma observação diária, às 09.00 h. Posteriormente, e para completar a rede planeada em 2010, foram instaladas, em 2013, uma estação no Pico do Areeiro (1799 m), e em 2014 três estações: Porto Moniz (35 m), Pico Alto (1118 m) e Santa Cruz/Aeroporto (58 m), aqui para substituir a estação clássica. Estas 18 estações estão equipadas com instrumentos de observação da temperatura e humidade relativa do ar, precipitação e radiação solar global, estando 12 – Funchal/Observatório, Funchal/Lido, São Jorge, Areeiro, Lugar de Baixo, Ponta do Pargo, Caniçal/Ponta de São Lourenço, Santo da Serra, Porto Moniz, Pico Alto, Santa Cruz/Aeroporto e Porto Santo/Aeroporto – equipadas com instrumentos de medição do vento. Três destas estações estão ainda equipadas com instrumentos de medição da pressão atmosférica: Funchal/Observatório, Santa Cruz/Aeroporto e Porto Santo/Aeroporto. Assim, para a Madeira, a densidade de estações meteorológicas é da ordem de uma estação por cada 45 km2 para a temperatura e humidade relativa do ar e radiação solar global, e uma estação por 65 km2 para o vento. Para ilustração, apresenta-se na fig. 3 a distribuição e a localização das estações meteorológicas no arquipélago da Madeira, em 2015. Fig. 3 – Mapa com a distribuição e localização das estações meteorológicas no Arquipélago da Madeira em 2015. A redução na densidade de estações decidida para o arquipélago da Madeira resultou, em particular, da necessidade de melhoria da vigilância meteorológica, sentida após vários episódios de tempo rigoroso, em particular associados a precipitação forte, registados a partir do início de 2009, dos quais se apresentam alguns mais significativos: 27 fevereiro 2009: Funchal 82,7 mm/Areeiro 145,1 mm; 18 de dezembro de 2009: Funchal 36,7 mm/Areeiro 130,1 mm; 2 de fevereiro de 2010: Funchal 42,5 mm/Areeiro 184,7 mm; 20 de fevereiro: Funchal 144,3 mm/Areeiro 389,6 mm; 21 de outubro de 2010: Funchal 82,7 mm/Areeiro 147,0 mm; 26 de novembro de 2010: Funchal 155,1 mm, tendo sido o maior valor diário registado desde sempre/Areeiro 185,2 mm; 28 de dezembro de 2010: Funchal 50,7 mm/Areeiro 95,7 mm; 26 de janeiro de 2011: Funchal 103,4 mm/Areeiro 321,0 mm; 30 de outubro de 2012: Funchal 55,7 mm/Areeiro 258,1 mm; 6 de novembro de 2012: Funchal 19,3 mm/Areeiro 201,1 mm; 3 de março de 2013: Funchal 40,9 mm/Areeiro 274,4 mm; e muitos outros episódios em toda a ilha da Madeira, sendo de registar também os da Ribeira da Janela no dia 5 de novembro de 2012: 186 mm no Lombo da Terça/Porto Moniz; e de Porto da Cruz a 29 de novembro de 2013: 325 mm no Santo da Serra durante dois dias.   Fig. 4.1 – Fotografia de balão meteorológico com radiossonda. A rede de observação no arquipélago da Madeira inclui ainda um sistema de radiossondagens para observação da pressão atmosférica, do vento, da temperatura e da humidade relativa do ar, desde a superfície até cerca de 30 km de altitude, recorrendo ao lançamento de balão com radiossonda (fig. 4.1), executado uma vez por dias às 12.00 h, e ainda quatro estações de tempo presente, instaladas no Funchal/Observatório Meteorológico, em Chão do Areeiro, Pico do Areeiro e São Jorge, para observação da visibilidade horizontal e identificação do tipo de meteoros (chuva, chuvisco, granizo, saraiva e neve).   Fig. 4.2 – Estação meteorológica automática, em teste no Observatório Meteorológico do Funchal, para ser instalada nas Selvagens. Para completar a rede do arquipélago da Madeira, foi instalada uma estação meteorológica automática nas ilhas Selvagens no verão de 2016 (fig. 4.2), a qual permitirá essencialmente acompanhar a evolução de sistemas meteorológicos que se formem a sul da Madeira, para além de que os dados registados nestes ilhéus permitirão o estudo do clima local e o apoio de estudos científicos nos domínios dos ecossistemas locais.     Condições meteorológicas caraterísticas na região da Madeira Fig. 5.1 – Imagem de aproximação de superfície frontal fria As condições meteorológicas predominantes na região do arquipélago da Madeira são principalmente determinadas pela intensidade e localização do anticiclone dos Açores e pelas perturbações da superfície frontal polar que se fazem sentir especialmente de novembro a março, quando se deslocam do Atlântico Norte em direção à Europa, vindas de oeste. Durante o inverno, o anticiclone dos Açores está geralmente deslocado para sul da sua posição média, a sudoeste dos Açores. Importantes também na determinação das condições meteorológicas nesta época do ano são as depressões frontais que se deslocam sobre o Atlântico, que dão origem à aproximação e passagem de superfícies frontais, em particular de superfícies frontais frias (fig. 5.1), mais frequentes e mais ativas do que as superfícies frontais quentes, as quais dão origem a grande nebulosidade, chuva e aguaceiros por vezes fortes, em particular nas zonas montanhosas, e a ventos fortes dos quadrantes de sul. Fig. 5.2 – Imagem de localização do anticiclone dos Açores em dia de verão. Durante o verão, o anticiclone dos Açores, desloca-se frequentemente para nordeste relativamente à sua posição média anual, a sudoeste dos Açores, fortalece-se e estende-se com uma crista de altas pressões, que atinge o Nordeste da Europa (fig. 5.2). Fig. 5.3 – Imagem de depressão estacionária centrada entre Portugal Continental e os arquipélagos dos Açores e da Madeira. Também de outubro a março, estabelecem-se por vezes, entre a Península Ibérica, os Açores e a Madeira, depressões frias estacionárias que afetam as condições meteorológicas nesta região e podem permanecer cerca de uma semana, dando origem, na região da Madeira, a grande nebulosidade com ocorrência de períodos de chuva ou aguaceiros por vezes fortes (fig. 5.3). Importantes são também as situações em que se observa um anticiclone muito desenvolvido, centrado a norte da latitude da Madeira, e orientado na direção oeste-leste, por vezes associado a baixas pressões sobre o continente africano, e em que a região da Madeira é atingida por vento de leste, muito quente e seco, vindo do deserto do Sahara, com poeira fina que dá origem a bruma. Nesta situação, a temperatura do ar na Madeira pode chegar aos 35 °C e a humidade relativa do ar descer para valores da ordem de 5 % nas regiões montanhosas. O clima da Madeira Para a caraterização do clima da Madeira, recorreu-se à classificação climática de Köppen-Geiger, a qual divide os climas em cinco grandes grupos, identificados por letras maiúsculas, e na qual o arquipélago da Madeira se integra no grupo [C], definido como clima temperado húmido. Para cada grande grupo, o tipo de clima é ainda especificado através de uma letra minúscula que refere o regime da precipitação, que para o arquipélago da Madeira, definido como húmido, é [s]; e uma segunda letra minúscula, que está relacionada com a temperatura média mensal, que para o arquipélago da Madeira é [a] ou [b], correspondendo a verão seco e quente (VSQ) ou verão seco e suave (VSS). No fig. 6, apresenta-se a metodologia utilizada com os limites relativos às temperaturas e precipitações mensais, de acordo com a classificação climática de Köppen-Geiger. [table id=88 /] Recorrendo à série de dados de 1971-2000 (30 anos), em particular às normais climatológicas, da temperatura do ar e da precipitação média mensal, para as estações do Funchal (costa sul, 58 m), do Areeiro (montanha, 1590 m), de Santana (costa norte, 380 m) e da ilha de Porto Santo (78 m), representadas graficamente na fig. 7, e aplicando a classificação de Köppen-Geiger, temos para o Funchal e para Porto Santo clima do tipo Csa (temperado húmido com verão seco e quente) e para o Areeiro e Santana clima do tipo Csb (temperado húmido com verão seco e suave). Fig. 7 – Gráficos com a temperatura do ar e a precipitação média mensal no período de 1971-2000, registadas nas estações meteorológicas do Funchal (58 m), do Areeiro (1590 m), de Santana (380 m) e de Porto Santo (78 m). Aplicando a mesma classificação para as estações que se apresentam na fig. 8, com séries de dados de cinco anos (2011-2015), verifica-se que no Funchal (58 m), no Lugar de Baixo (40 m), na Ponta do Pargo (298 m), em São Vicente (97 m), no Caniçal (133 m) e em Porto Santo (78 m) o clima é Csa (temperado húmido com verão seco e quente) e nas estações de Quinta Grande (580 m), São Jorge (257 m), Santana (380 m), Santo da Serra (660 m), Areeiro (1590 m), Bica da Cana (1560 m) e Lombo da Terça (931 m) o clima é do tipo Csb (temperado húmido com verão seco e suave). [table id=89 /] Legenda: H – Altitude T1 – Temperatura média do ar do mês mais frio I1 – Grupo climático R1 – Precipitação no mês mais seco R2 – Precipitação no mês mais chuvoso I2 – Indicador de tipo T2 – Temperatura média do ar do mês mais quente I3 – Indicador de subtipo TC – Tipo de clima Csa – Clima temperado húmido com verão seco e quente Csb – Clima temperado húmido com verão seco e suave   Na fig. 9 apresenta-se de forma gráfica, para nove das estações indicadas na fig. 8, os valores médios mensais da temperatura do ar e da precipitação para o período 2011-2015. Fig. 9 – Gráficos com a temperatura do ar e a precipitação média mensal no período de 2011-2015, registadas nas estações meteorológicas de São Vicente (97 m), São Jorge (257 m), Ponta do Pargo (295 m), Bica da Cana (1560 m), Santana (340 m), Lugar de Baixo (40 m), Funchal (58 m), Caniçal (133 m) e Porto Santo (78 m). Dos resultados anteriores, conclui-se que, para além da latitude, os fatores determinantes do clima da Madeira são a altitude e a proximidade ao mar. Assim, toda a faixa costeira sul até à cota de 500 m (a avaliar pelos valores da Quinta Grande), a faixa costeira norte até à cota de 100 m, aproximadamente (a avaliar pelos valores de São Vicente e de São Jorge), e o Porto Santo apresentam clima temperado húmido com verão seco e quente, e as restantes regiões clima temperado húmido com verão seco e suave. Resumo de apuramentos estatísticos (1971-2000) A fim de se conhecer com mais detalhe a variação dos vários parâmetros climáticos, apresenta-se uma descrição dos apuramentos estatísticos, também conhecidos por normais, para o período 1971-2000, relativos às estações do Funchal (58 m, costa sul), do Areeiro (1590 m, montanha), de Santana (380 m, costa norte) e do Porto Santo (78 m). (Todos estes dados foram recolhidos no Instituto do Mar e da Atmosfera.)   Temperatura do ar Nas regiões costeiras da ilha da Madeira e em Porto Santo, a temperatura mínima do ar raramente desce abaixo de 10 °C no inverno e a temperatura máxima poucas vezes ultrapassa 30 °C no verão. No entanto, nas terras altas da ilha da Madeira, consideradas acima dos 1000 m, observam-se com frequência valores da temperatura mínima do ar inferiores a 0 ºC. A região do Lugar de Baixo, na vertente sul, a jusante dos ventos dominantes, é a mais quente da ilha da Madeira. Os valores médios anuais da temperatura do ar na ilha da Madeira são maiores na costa sul do que na costa norte e diminuem para o interior da ilha, com a altitude. A temperatura média anual é de 19,0 °C no Funchal (58m), 8,8 °C no Areeiro (1590 m), 15,5 °C em Santana e 18,6 °C na ilha de Porto Santo (78 m). A temperatura média mensal varia pouco ao longo do ano, sendo maior no verão – 22,6 °C no Funchal, 14,3 °C no Areeiro, 19,0 °C em Santana e 22,5 °C em Porto Santo – e menor no inverno: 16,1 °C no Funchal, 4,9 °C no Areeiro, 12,8 °C em Santana e 15,6 °C em Porto Santo. As amplitudes térmicas diárias são pequenas, com valores médios mensais que variam de 5,7 °C a 6,5 °C no Funchal, de 5,9 °C a 8,5 °C no Areeiro, de 4,8 °C a 6,2 °C em Santana e de 4,8 °C a 6,1 °C em Porto Santo. O número médio de dias de verão, definidos como dias em que a temperatura máxima do ar é superior ou igual a 25 °C, é de 72 no Funchal, 7 no Areeiro, 7 em Santana e 39 no Porto Santo; o número de noites tropicais, ou seja, dias de temperatura mínima do ar superior ou igual a 20 °C, é de 28 no Funchal, 1 no Areeiro, 1 em Santana e 37 em Porto Santo. Os dias quentes, com temperatura máxima do ar superior ou igual a 30 °C, podem ser registados tanto nas regiões costeiras como nas regiões montanhosas da ilha da Madeira e também em Porto Santo, mas são bastante reduzidos; em média, inferiores a um dia por ano. As temperaturas máximas absolutas registadas foram 38,5 °C no Funchal, 30,6 °C no Areeiro, 34,1 °C em Santana e 35,3 °C em Porto Santo; e as temperaturas mínimas absolutas foram 7,4 °C no Funchal, -7,0 °C no Areeiro, 5,1 °C em Santana e 6,4 °C no Porto Santo. O número médio de dias do ano com temperatura mínima inferior a 0 ºC é praticamente nulo, exceto no Areeiro onde é de cerca de 40 dias. Precipitação De todos os elementos climáticos, a precipitação é a que apresenta maior variabilidade, existindo um contraste significativo entre a vertente norte e as zonas mais altas, onde ocorrem valores muito elevados de precipitação, e a vertente sul e o Porto Santo, com valores baixos de precipitação. No inverno, a precipitação ultrapassa os 1000 mm nas zonas mais altas, enquanto na costa sul é inferior a 300 mm. Nos meses de verão, a quantidade de precipitação varia entre os 150 mm nas zonas mais altas e menos de 50 mm na costa sul da ilha. O facto de chover mais na parte norte da Madeira durante o verão está claramente associado à direção dominante do vento do quadrante norte nesta estação do ano, e ao facto de a precipitação ser essencialmente de origem orográfica. Os valores médios anuais da precipitação na ilha da Madeira são maiores na costa norte do que na costa sul, aumentando com a altitude, sendo em regra maiores nas encostas voltadas a norte do que nas encostas voltadas a sul para regiões da mesma altitude. Os valores variam de 596 mm no Funchal a 2620 mm no Areeiro, com 1383 mm em Santana. No Porto Santo, o valor médio anual da quantidade de precipitação é 361 mm. Os valores médios mensais da quantidade de precipitação variam muito durante o ano, sendo os meses de outubro a março os mais chuvosos, com valor médio mensal mais elevado nos meses de novembro a janeiro. As maiores quantidades de precipitação diárias variam de local para local, desde o máximo de 215,0 mm no Areeiro, passando por 194,0 mm em Santana, até aos 97,7 mm no Funchal; em Porto Santo, o maior valor diário registado foi 73,0 mm. O número médio anual de dias em que a quantidade da precipitação é igual ou superior a 10 mm é máximo no Areeiro (70) e mínimo em Porto Santo (9), sendo 19 dias no Funchal e 40 dias em Santana. A assimetria norte-sul do número anual de dias com precipitação (≥0,1 mm) é muito significativa. Com efeito, na região do Funchal e noutros pontos da costa sul, ocorrem menos de 90 dias com precipitação por ano, enquanto na costa norte se observam mais de 150 dias por ano. Por outro lado, nas zonas mais altas registam-se mais de 200 dias por ano com precipitação, dos quais mais de 70 são dias com precipitação elevada, superior a 10 mm. Insolação A insolação (número de horas diárias de exposição solar) mensal varia durante o ano com bastante regularidade, Fig. 10 – Gráfico da insolação mensal no Funchal, no Areeiro e em Porto Santo.Fonte dos dados: Instituto do Mar e da Atmosfera. tendo o valor mínimo em dezembro: 134 h no Funchal, 102 h no Areeiro e 133 h na Ilha de Porto Santo. O máximo mensal é 231 h em agosto no Funchal, 241 h em agosto no Porto Santo e 285 h em julho no Areeiro. A insolação apresenta uma ligeira descida em junho no Funchal e em Porto Santo, mas que não se observa no Areeiro. A insolação mensal média tem assim, para o Funchal e para Porto Santo, uma distribuição bimodal, com máximos em maio e em agosto (fig. 10). Anualmente, o Porto Santo totalizou, neste período, 2157 h de sol e o Funchal 2057 h, estando o maior número de horas de sol em Porto Santo associado à menor orografia, que não favorece tão fortemente a formação de nebulosidade local. O Areeiro totaliza 2053 h de insolação, apresentando uma amplitude mensal de 183 h; o Funchal, com um número anual de horas de sol quase igual ao do Areeiro, tem uma amplitude mensal de 96 h. O número anual de dias sem insolação é de 11 no Funchal, 9 em Porto Santo e 42 no Areeiro; para este valor, contribui essencialmente o número de dias com muita nebulosidade que se registam nos meses de outubro a março. Evaporação (mm) Os valores médios mensais da evaporação nas regiões costeiras da ilha da Madeira e em Porto Santo variam pouco e com bastante regularidade durante o ano. Em geral, os máximos ocorrem em julho e agosto. A quantidade média anual de evaporação é maior em Porto Santo, com 1423 mm, seguindo-se, por ordem decrescente, na ilha da Madeira, o Funchal, com 1109 mm, o Areeiro, com 970 mm, e Santana, com 753 mm. A amplitude mensal é de 23 mm no Funchal, 117 mm no Areeiro, 19 mm em Santana e 36 mm em Porto Santo, sendo de concluir que a evaporação é máxima nas regiões montanhosas.   Humidade relativa do ar A humidade relativa do ar é em regra maior na costa norte do que na costa sul da ilha da Madeira, sendo a variabilidade mensal maior nas regiões montanhosas. Fig. 11 – Gráfico dos valores médios mensais da humanidade relativa do ar no Funchal, no Areeiro e em Porto Santo.Fonte dos dados: Instituto do Mar e da Atmosfera.   Nas regiões costeiras da ilha da Madeira, os valores médios mensais da humidade relativa do ar apresentam pequena variação durante o ano, sendo menores no inverno do que no verão. Com efeito, o mês mais seco é abril no Funchal, com 69 %, e fevereiro e março em Santana, com 80 %. No Areeiro, os valores médios são mais altos no inverno, 85 %, do que no verão, 64 %. Também na ilha de Porto Santo a humidade relativa é maior no inverno, com 80 %, sendo nos meses de abril a julho da ordem dos 76 %. Na fig. 11, apresentam-se os valores médios mensais da humidade relativa do ar no Funchal, no Areeiro e em Porto Santo.   Vento O regime anual do vento é diferente na costa norte e na costa sul da ilha da Madeira, sendo os ventos predominantes de NE (10 %) e SW (10 %) no Funchal, de NE (38 %) no Areeiro, de WNW (14 %) e SE (10 %) em Santana/São Jorge, e de N (20 %) em Porto Santo. A frequência de calma é de 13,4 % no Funchal, 1,7 % no Areeiro, 4,0 % em Santana/São Jorge, e 2,3 % no Porto Santo. As rajadas superiores a 40 km/h ocorrem no Funchal com frequência de 1 % e muito raramente são registadas rajadas superiores a 70 km/h. Rajadas superiores a 70 km/h são registadas no Areeiro em 5 % das observações, em Santana/São Jorge em 0,6 % das observações e em Porto Santo em 0,2 %. Entre 1995 e 2015, a maior rajada do vento no Funchal foi de 86 km/h, em março de 2010; no Areeiro, foi de 160 km/h, em Santana/São Jorge, de 159 km/h e em Porto Santo, de 104 km/h, todas no mês de fevereiro de 2010. Assinale-se que os ventos fortes e muito fortes a que por vezes correspondem temporais, particularmente nas terras altas da Madeira e em Porto Santo, estão associados normalmente aos valores mais baixos da pressão atmosférica que em regra ocorrem entre novembro e março.   Temperatura da água do mar Os valores médios mensais da temperatura da água do mar à superfície variam com regularidade durante o ano. Os valores máximos ocorrem em agosto ou em setembro e os mínimos em fevereiro ou março. A temperatura média mensal é relativamente alta ao longo do ano, variando entre 17,8 °C em março e 23,3 °C em setembro no Funchal, e entre 17,3 °C em fevereiro e março e 22,4 °C em setembro no Porto Santo. A temperatura média anual é 20,2 °C no Funchal e 19,5 °C em Porto Santo. A amplitude média da variação mensal é 5,5 °C no Funchal e 5,1 °C em Porto Santo. Os valores observados na região raramente descem abaixo dos 15 °C e raramente ultrapassam os 25 °C.   Ondulação A ondulação na região da Madeira é geralmente fraca ou moderada, com rumos predominantes de NW a NE, exceto junto ao litoral sul da ilha da Madeira, em que predominam rumos de SE a SW. As situações que ocorrem mais frequentemente nos meses de inverno, e que correspondem à ocorrência de depressões no Atlântico Norte em latitudes entre 35° e 55° N, conduzem à geração de ondulação do quadrante NW na região da Madeira. A ondulação do quadrante NE é proveniente, em geral, de áreas de geração localizadas no bordo SE do anticiclone dos Açores, quando este se estende sobre a Europa Ocidental. Durante os meses de verão, cresce a importância desta situação relativamente à anterior, quer pela localização habitual nestes meses do anticiclone dos Açores, quer pelo menor número de depressões a atravessar o Atlântico Norte a latitudes suficientemente baixas para que a ondulação por elas provocada atinja a Madeira.   Pressão atmosférica Os valores da pressão atmosférica ao nível da estação apresentam diferenças quase constantes de local para local, resultantes das diferenças de altitude. Os valores médios mensais reduzidos ao nível médio do mar, registados no Funchal e em Porto Santo, variam pouco durante o ano – 3 hPa no Funchal e 3,3 hPa no Porto Santo –, sendo maiores no inverno e no verão, com diferença de cerca de 1 hPa, e menores na primavera e no outono. A variabilidade interanual dos valores médios mensais nos vários anos é maior durante o inverno e menor durante o verão: 15,0 hPa em janeiro e fevereiro e 2,4 hPa em agosto. Os valores mínimos ao nível médio do mar observados em anos recentes foram 985,9 hPa no Funchal, em 20 de fevereiro de 2004, e 985,8 hPa em Porto Santo, em 4 de março de 2013; os valores máximos foram 1037,2 hPa no Funchal, em 1 de janeiro de 2007, e 1039,3 hPa, em 25 de Janeiro de 2014, em Porto Santo.   Trovoada, granizo, neve e nevoeiro O número de dias com trovoada é de 7 no Funchal, 4 no Areeiro, 4 em Santana e 5 em Porto Santo, sendo a frequência maior no outono e na primavera. O número de dias com precipitação de granizo e saraiva é de 1 no Funchal, 14 no Areeiro, 2 em Santana e inferior a 1 no Porto Santo; a frequência é maior desde meados do outono até à primavera. O número médio de dias do ano com precipitação de neve e com geada é praticamente nulo na Madeira, exceto no Areeiro, em que são registados 7 e 16 dias, respetivamente, com maior frequência em janeiro e março. O número de dias com nevoeiro tem valores desde 1 no Funchal e em Porto Santo, 8 em Santana e 227 no Areeiro, sendo pouco nítida a variação ao longo do ano. É muito nítida e acentuada a variação em altitude. Victor Prior (atualizado a 29.01.2017)

Física, Química e Engenharia Geologia Ciências do Mar

psicologia na educação especial

Em 1978, na sequência da política de regionalização dos serviços, foi criado o Centro Regional de Educação Especial (CREE), no qual foram integrados os estabelecimentos de ensino para deficientes auditivos, visuais e intelectuais. Entre 1965 e 1978, o apoio a crianças e jovens que frequentavam os estabelecimentos de ensino para crianças e jovens com deficiências da audição e da fala, intelectual e visual funcionava na dependência de um serviço nacional, o Instituto de Assistência aos Menores, posteriormente integrado no Instituto da Família e Ação Social. Nessa altura, as crianças e jovens deficientes eram apoiados, na área da psicologia, pelo Centro de Observação e Orientação Médico Pedagógico, cujos técnicos se deslocavam à Região Autónoma da Madeira (RAM), sob a orientação do Dr. Bairrão Ruivo. Foi em 1980 que o CREE contou com o primeiro psicólogo nos seus quadros. A 7 de abril do ano seguinte, foi criada a Direção Regional de Educação Especial (DREE), que imprimiu uma nova dinâmica no apoio às crianças e jovens com deficiência da Região. Na sua orgânica, integrou, pela primeira vez, um Serviço de Psicologia, com a função de “apoiar os Serviços Técnicos de Educação, incumbindo-lhe a observação, o diagnóstico e a orientação psicopedagógica dos educandos e futuros utentes, em colaboração com outras valências e serviços”. Em 1984, com a reestruturação do Governo da RAM, a DREE, que até então constituía um departamento da Secretaria Regional dos Assuntos Sociais, foi integrada na Secretaria Regional de Educação, privilegiando-se, nesta nova fase, a interação entre todos os graus de ensino e estabelecimentos de ensino regular. A designação “Direção Regional de Educação Especial e Reabilitação” (DREER) surgiu em 1997, no decreto regulamentar regional n.º 13-A/97, de 15 de julho, estabelecendo a criação e descentralização de vários serviços de atendimento às crianças e jovens com necessidades educativas especiais. A necessidade de integrar psicólogos nas equipas multidisciplinares que entretanto se foram constituindo na DREER tornou-se cada vez mais notória na déc. de 90, período ao longo do qual o número de psicólogos admitidos duplicou. Aos poucos, os psicólogos foram-se afirmando como um grupo profissional indispensável na resposta psicopedagógica às crianças e jovens com necessidades educativas especiais. Com a alteração da estrutura orgânica da Direção Regional de Educação Especial e Reabilitação, aprovada pelo despacho n.º 103/2005, é criada, em setembro de 2005, a Divisão de Psicologia, que em novembro de 2008 passa a designar-se Divisão de Psicologia e Orientação Vocacional (DPOV), dirigida por um psicólogo, chefe de divisão. A existência desta divisão na orgânica da DREER possibilitou uma forte coesão e identidade socioprofissional, bem como uma resposta consistente e atualizada em termos técnico-científicos, tornando-se uma referência para outros psicólogos da RAM. Com cerca de 40 psicólogos, alguns dos quais a exercerem funções de coordenação e direção, a DPOV tinha por missão “garantir a intervenção psicológica junto dos alunos / utentes dos diferentes serviços técnicos de educação e de reabilitação profissional e programas ocupacionais, em colaboração com a família e comunidade, contribuindo para o seu equilíbrio sócio emocional”. A sua atuação regia-se pelos princípios e orientações subjacentes ao Código Deontológico da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP), de onde se destacavam valores como respeito pela dignidade e direitos da pessoa, competência, responsabilidade e integridade. A DPOV apresentavaas seguintes atribuições e competências: “a) Observar, diagnosticar e orientar os educandos e futuros utentes com vista à adaptação ou reeducação escolar, profissional e social, consoante as características individuais, disfunções ou perturbações; b) Prestar apoio psicoterapêutico, nos casos em que apresentem perturbações emocionais e comportamentais resultantes de deficiência ou de sobredotação; c) Acompanhar e supervisionar a intervenção protagonizada pelos elementos desta área afetos aos diferentes serviços da DREER”. A intervenção do psicólogo da DPOV era muito versátil pela variedade de áreas, faixas etárias e serviços que apoiava. O psicólogo intervinha desde a idade precoce (0-6 anos), junto de alunos com necessidades educativas especiais a frequentar os 1.º, 2.º e 3.º ciclos até à idade jovem e adulta; a sua atuação abrangia o domínio sensorial (audição e visão), o domínio cognitivo e da aprendizagem (deficiência intelectual, dificuldades intelectuais, dificuldades de aprendizagem específicas e perturbação da linguagem e da fala), o domínio motor (perturbações das aptidões motoras e problemas motores/neuromotores), o domínio cognitivo, motor e/ou sensorial (multideficiência), o domínio da comunicação, relação e afetivo-emocional (perturbação da relação e comunicação, perturbações do espectro do autismo e perturbações emocionais ou comportamentais graves) e outras condições não enquadradas nos domínios anteriores, tais como atraso global de desenvolvimento, défice de atenção com ou sem hiperatividade e sobredotação. O psicólogo tinha uma participação ativa nas equipas multidisciplinares dos vários serviços técnicos de educação especial e reabilitação (Serviços Técnicos de Educação, Centros de Apoio Psicopedagógicos e Centros de Atividade Ocupacionais, Serviço Técnico de Integração e Formação Profissional, entre outros) e trabalhava não só com o aluno/utente, mas também com os pais/tutores, professores e demais agentes comunitários, em prol do desenvolvimento educativo, socioprofissional e pessoal. Deste modo, contribuía para o desenvolvimento da própria instituição escolar ou ocupacional e da comunidade. Na avaliação multidisciplinar, o psicólogo assume um papel importante na elegibilidade de crianças, jovens e adultos com necessidades especiais. A sua atuação, pautada por uma intervenção mais próxima da abordagem ecológica e de respostas inclusivas, centradas no eixo preventivo, estava orientada no sentido de promover as potencialidades das crianças e jovens com necessidades especiais, procurando minimizar as suas diferenças e maximizar as suas capacidades, facilitando, assim, a sua inserção nos vários contextos e promovendo, em alguns casos, a sua transição para a vida ativa. Muitas vezes, o recurso ao apoio psicológico visava promover o processo de aprendizagem e integração social do aluno, em virtude de, em muitos casos, às necessidades especiais estarem associados problemas emocionais ou, até, perturbações psicopatológicas, os quais exponenciam as dificuldades de aprendizagem e integração. A intervenção do psicólogo contemplava, por vezes, uma vertente clínica/terapêutica. O psicólogo da DREER desempenhava, igualmente, funções de formação de novos psicólogos, nomeadamente através da orientação de estágios profissionais promovidos pela OPP e pelo Instituto de Emprego da Madeira, e colaboração na orientação de estágios curriculares dos finalistas do Mestrado em Psicologia da Educação da Universidade da Madeira; da colaboração na supervisão clínica e educacional dos estágios; da participação no ensino da unidade curricular de Psicologia da Educação, da licenciatura em Psicologia da Universidade da Madeira – a saber, através da intervenção em painéis em que era abordado o papel do psicólogo nos diferentes contextos educativos e da receção de alunos para contacto direto com a praxis do psicólogo na educação especial. A prática do psicólogo contemplava ainda atividades de pesquisa e investigação e a utilização dos respetivos resultados na prática educacional. Bibliog.: AGUIAR, E., “História do apoio à deficiência na RAM”, Educação Especial, n.º 30, 1985, pp. 11-25; dec. reg. n.º 13/81, de 23 de junho; dec. reg. n.º 12/84, de 22 de novembro; dec. reg. regional n.º 13-A/97, de 15 de julho; desp. n.º 5/78, de 5 de abril; desp. n.º 103/2005. Líria Maria Jardim Fernandes Luísa Valentina Teixeira de Mendonça Correia (atualizado a 03.02.2017)

Ciências da Saúde Educação História da Educação

praias

Na Madeira, praia é muitas vezes sinónimo de calhau; a maioria é pedregosa, sendo muito raras as de areia: a Prainha, na freguesia do Caniçal, perto da Ponta de São Lourenço, de areia preta, e as do Porto Santo, de areia fina e amarela. Fernando Augusto da Silva atesta que “já disse alguém que na Madeira não havia praias, talvez pela circunstância de não serem de areia e terem uma limitada extensão. Com efeito as desta ilha, excetuando a da Prainha no Caniçal, são formadas de pequenas pedras ou calhaus rolados e de escuro basalto, tendo todas elas um aspeto sombrio e um piso difícil e incómodo” (SILVA, 1984, II,300). As principais praias da Madeira são as seguintes: Prainha, Caniçal, Machico, Seixo, Santa Cruz, Porto Novo, Reis Magos, Funchal, Formosa, Câmara de Lobos, Ribeira Brava, Lugar de Baixo, Madalena do Mar, Calheta e Paul do Mar, Porto do Moniz, São Vicente, Fajã da Areia, Ponta Delgada, São Jorge e Porto da Cruz. No Porto Santo, onde as praias são todas de areia amarela, temos as praias do Penedo, do Cabeço, da Calheta, da Fontinha e das Pedras Pretas. No Funchal, devemos referir a existência de uma extensa praia de calhau entre as três ribeiras aí existentes, que deixou de estar visível em toda a extensão da baía devido à construção da Av. do Mar, de iniciativa do então presidente da Câmara, Fernão de Ornelas. Em memória dessa praia, ficou na toponímia da cidade a R. da Praia. A ideia que os insulares fazem do mar e das suas praias e enseadas abertas mudou no séc. XX, pois estas foram durante muito tempo pensadas de acordo com a facilidade no embarque e desembarque para os locais e forasteiros, mas também como ameaça, por causa da possibilidade de intrusos externos, nomeadamente piratas e corsários. Neste último caso, revelam-se um obstáculo às condições de defesa e segurança das populações, havendo necessidade de as prover de fortificações e de meios de vigilância. Esta imagem das praias madeirenses é veiculada por Paulo Dias de Almeida. Assim, ao referir-se à praia Formosa, observa: “Ao Oeste da cidade a pouco mais de meia légua, há a magnífica Praia Formosa, muito favorável a um desembarque” (CARITA, 1982, 59). Desta, já em finais do séc. XVI, dissera Gaspar Frutuoso: “Dobrando esta ponta, foram dar em uma formosa praia que, pela formosura e assento dela, lhe pôs nome a Praia Formosa.” E assim se chama “por não haver outra semelhante em toda a ilha, que terá como um quarto de légua de areia” (FRUTUOSO, 1979, 48, 117). Quanto à Ribeira Brava, “o porto é muito mau e raras vezes se encontra bom mar para desembarcar. A praia é de um calhau muito grosso, com algumas pedras e só os barcos ali costumados encalham sem risco pois a sua construção é própria para essa qualidade de praias. É costume ali carregar os barcos encalhados e depois de carregados, deitá-los ao mar, esperando a vaga, e isto muitas vezes com o risco de se alagarem” (CARITA, 1982, 61). A Madalena, por sua vez, que foi “estabelecida ao lado da Ribeira da Madalena em um plano à borda do mar, tem uma excelente praia e uma magnífica fonte à borda da maré, onde as embarcações fazem aguada” (Id., Ibid., 64). Paulo Dias de Almeida refere que “toda a Ilha da Madeira é cortada de imensas ribeiras e ribeiros, a maior parte delas só muito caudalosas no Inverno, formada de altas montanhas precipitadas e enormes rochedos descobertos. Todas as praias são de calhau miúdo, algumas de calhau muito grosso e só quando se acabam as grandes levadias, aparecem pequenas praias de areia preta, que com as enchentes e vazantes das marés, se desfazem, tomando a primeira forma de calhau” (Id., Ibid., 51). Não devemos esquecer que a tradição dos banhos de mar e a valorização da época balnear recentes começou em meados do séc. XX. Durante muito tempo, os interditos feitos pela Igreja Católica à revelação do corpo e os interditos previstos nas posturas municipais sobre os banhos na praia e nas ribeiras do Funchal, Machico e Porto Santo não permitiram a sua vulgarização. Assim, de acordo com a postura da Câmara Municipal do Funchal de 26 de julho de 1839, “estava proibido aos funchalenses o banho de mar nus”, só se permitindo em calças ou camisa, “até abaixo do joelho”, sujeitando-se os seus infratores a uma pesada coima de mil réis. Mesmo em épocas anteriores, referem-se banhos no calhau da cidade em corpo nu, mas as medidas iam no sentido da sua proibição, pois já em 1609 há notícias de que “no calhau fronteiro desta cidade de dia se despiam muita gente e nadavam e depois disto saíam do mar nus e despidos o que davam muito escândalo a muita gente e mulheres que vissem da banda do mar em seus balcões. Acordaram os ditos oficiais se lançasse pregão por esta cidade que nenhuma pessoa de qualquer qualidade de dez anos para cima se dispa a nadar de dia, de São Lázaro até ao Corpo Santo” (RIBEIRO, s.d. , 20). Por diversas vezes, na primeira metade do séc. XIX, chegam à Câmara reclamações sobre os banhos que se faziam no Calhau. Além disso, em 1850, o administrador do concelho do Funchal avisava João Hollway, proprietário de uma hospedaria, para informar os seus clientes da postura camarária que proibia os banhos nus, entre as 06.00 h e o anoitecer, pois qualquer banho deveria ser feito com o corpo vestido “desde os ombros até aos joelhos” (Id., Ibid., 21). Já nas Posturas do Funchal de 1912, o título 6.º é dedicado aos banhos, apresentando a postura proibitiva dos banhos em corpo nu; permitidos eram apenas os banhos em que “a camisola ou vestimenta que se deve usar abrangerá o corpo desde o pescoço até acima dos joelhos”. Consta, porém, que os primeiros que se banharam nas águas límpidas da Ilha foram João Gonçalves Zarco e seus companheiros, quando, em 1420, foram obrigados a procurar refúgio nas águas refrescantes do mar, de maneira a escapar ao calor infernal do incêndio que deflagrou na floresta da Ilha. Segundo Cadamosto, estiveram no mar “mergulhados até à garganta dois dias e duas noites, sem comer nem beber, pois que de outra maneira teriam morrido” (ARAGÃO, 1981, 36). Mas este banho foi em conformidade com a lei, com todas as vestes que traziam no corpo. Em 1850 referia-se nos anais do município da ilha do Porto Santo que as suas praias eram favoráveis aos banhos de mar, mas que não atraíam forasteiros por falta de condições, estando os naturais limitados pelas posturas. Na verdade, a sua revelação como estância balnear é do séc. XX. Desta forma, a indicação de Giulio Landi, cerca de 1530, deverá ser entendida de acordo com a época. Assim, ao referir-se ao norte da Ilha, realça: “E esta parte não é menos deleitosa do que útil pois as praias e os lugares cobertos de bosques, muitas vezes, dão enormíssimo prazer. Aqui costumam os habitantes descansar em qualquer momento quando lhes apetece, ir à praia ou alimentar-se de laticínios. [...] No meio da Ilha, onde os madeirenses costumam ter as suas vivendas e propriedades, gozam-se, em qualquer época, ares muito temperados” (Id., Ibid., 84). Em meados do séc. XX, assistimos a uma valorização da área costeira da Ilha como estância balnear, com piscinas e praias artificiais de areia, como no caso da praia em Machico, inaugurada a 29 de setembro de 2010, e na Calheta, em que a praia feita com areia importada de Marrocos foi inaugurada em 2004 e as suas areias repostas em 2008. Por outro lado, a oferta em termos de serviço balnear na ilha da Madeira contempla uma diversidade de piscinas públicas e privadas. Os hotéis e pousadas, maioritariamente junto à costa, são servidos por piscinas com água salgada; nos demais também encontramos piscinas de água doce. Um dos mais antigos complexos balneários adscritos aos hotéis é o do Hotel Reid’s com espaço apropriado a banhos de mar desde 1908. A par disso, há que considerar a oferta camarária de serviços balneários na Barreirinha e no Lido. Os primeiros acessos à Barreirinha foram construídos em 1939, enquanto as piscinas do Lido são de 1932. Estes tradicionais espaços balneários são complementados, depois, por intervenções do Governo regional, no Gorgulho, na Ponta Gorda, na Ribeira Brava, na Ribeira do Faial, no Caniçal, na Baía dos Juncos e em São Vicente, em 2004. A Madeira oferece um complexo vasto de praias e complexos balneários que se estende a toda a costa da Ilha, de norte a sul. São Martinho é o espaço mais importante da estância balnear madeirense, associada aos forasteiros ou aos locais. No passado, existiram vários projetos de valorização da orla marítima, surgindo, em 1921, um plano de ideias para a praia Formosa que a pretendia transformar numa praia de banhos e diversões. Primeiro, surgiram as piscinas do Lido, um marco do verão madeirense. Em 1932, foi desenhado o projeto de uma piscina pública para banhos e exercícios de natação na zona do Gorgulho. A construção hoteleira das últimas décadas do séc. XX incidiu nesta área, transformando-a numa zona privilegiada da cidade. Em 1982, o complexo balnear do Lido foi melhorado, e, em 1993, aberto o passeio público marítimo, mas o Lido foi destruído em 2010 e o complexo fechado ao público, sendo reaberto em março de 2016. A área ganhou então maior dimensão, graças à política municipal de valorização da orla marítima com diversos espaços balneares e uma promenade, a que se juntaram clubes privados como o Clube Naval do Funchal e o Clube de Turismo. No Porto Santo manifesta-se, de forma imponente, o extenso areal dourado, que fez desta ilha um lugar aprazível para os banhos de mar, tornando-se por isso na estância balnear dos madeirenses. Note-se que nos Anais do Município, datados de 1862, é já referida a atração dos estrangeiros pelas praias e seus efeitos terapêuticos. Nas primeiras décadas do séc. XXI, a frente mar do arquipélago mereceu uma valorização pouco comum no quotidiano madeirense, com a construção de diversas infraestruturas de apoio ao acesso ao mar, que permitiram o prolongamento da época balnear durante o ano inteiro.   Alberto Vieira (atualizado a 03.02.2017)

Geologia