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re-nhau-nhau - trimensário humorístico

O Re-nhau-nhau foi um trimensário humorístico madeirense, centrado na caracterização do Zé Povinho da Madeira, estereótipo que teve grande importância e um papel relevante no sucesso deste periódico. O jornal saiu pela primeira vez com um número especial no dia 16 de dezembro de 1929, sendo o primeiro número datado de 20 de dezembro desse mesmo ano. O último número, por sua vez, tem a data de 20 de dezembro de 1977. O Re-nhau-nhau surge numa época de “apagada e vil tristeza”. A imprensa existente nesta época estava na dependência dos poderes económico, político e religioso. Os jornais de maior projeção no arquipélago pertenciam aos grandes senhores da terra ou à instituição religiosa. O Re-nhau-nhau surge num contexto histórico difícil, devido à implantação no país de uma férrea ditadura que iria condicionar decisivamente a livre expressão e cercear a liberdade de imprensa, criando a censura prévia e uma polícia política que coartava a liberdade de pensamento, assim como todas as iniciativas jornalísticas que surgiriam. O Re-nhau-nhau surge com esta significativa e corajosa justificação: “Os nossos irrequietos e verdes anos, o nosso inconformismo, não se compadeciam com o estagnamento jornalistico da nossa terra com a brandura das suas críticas” (“Editorial”, Re-nhau-nhau, 29 dez. 1929, 1). Enquanto jornal satírico, iria colocar em evidência esta situação de dependência em que vivia a imprensa regional, sendo portador duma mensagem nova, imbuído de ideais e valores desconhecidos na sociedade madeirense. Era um jornal que pretendia viver exclusivamente das receitas provenientes da sua venda ao público e do recurso a alguma publicidade. A caricatura era então uma arte pouco conhecida na Madeira e o Re-nhau-nhau, revelando-a na Ilha, alforriou-a, emparelhando, assim, por mérito próprio, ao lado das Belas Artes. Das suas oficinas saíram as primeiras gravuras que ilustraram todos os jornais diários madeirenses. Foi aqui que se desenvolveu e aperfeiçoou o sistema da gravura em linolito, que mais tarde todos os jornais madeirenses utilizaram. A ideia surgiu numa noite, junto a uma esquina da R. da Ribeira de S. João, que dá para a Trav. das Violetas, quando Gonçalves Preto, João Miguel e Eduardo Nunes discutiram “a possibilidade de fazerem um semanário humurístico, mas feito com um humurismo (sic) tal que fosse capaz de fazer o indígena morrer de riso, desopilhando o figado e regiões adjacentes” (“Editorial”, Re-nhau-nhau, 21 dez. 1936, 1). Começaram logo a fazer contas, fantasiando os fabulosos lucros que lhes traria um jornal de quatro páginas, idealizando-o recheado de anúncios pagos a peso de ouro. Mas, infelizmente, apenas oito anos passados desde o dia que deu à luz este jornal, estes mesmos homens constatavam que “Proventos deixa-nos Re-nhau-nhau o suficiente para contrairmos as nossas dívidas...” (Ibid.), pois tudo o que recebiam se destinava à tipografia. Arrumadas as ideias e resolvidos os problemas que dificultavam a saída do jornal, o primeiro número surge a 16 de dezembro de 1929, um número especial, onde estes jovens apresentam as ideias mestras do seu projeto: publicar um trimensário humorístico, ilustrado com caricaturas, que sairia aos dias 10, 20 e 30 de cada mês. Este número especial caricatura alguns jovens da “Briosa” – os académicos do Liceu Nacional do Funchal – e também os colaboradores iniciais do Re-nhau-nhau. No desenho de capa do número assinalado como especial, e sob o título “Dedicado Aos Briosos da Briosa Academia”, são apresentados dois estudantes de capa e batina estudantil, naquele tempo um hábito muito em voga mesmo para estudantes liceais, que fora introduzido nos liceus nos finais do séc. XIX e vigoraria até 1939; são eles Teixeira Jardim, presidente da Academia, e Liberato Ribeiro, presidente da Executiva. A seguir surge o subtítulo: “Re-nhau-nhau ao dar os primeiros ares da sua graça, dedica este número especial de miaus a todos os futuros Pais da Pátria em geral, e às suas noivas em particular...” (Re-nhau-nhau, 16 dez. 1929, 1). Mas o seu programa só nos é apresentado no n.º 1, com a justificação de que: “Re-nhau-nhau, ao miar pela primeira vez, neste número dedicado à Briosa, deveria como é costume, fazer a sua apresentação oficial. Como agora porém, se não pode brincar com a tropa e muito menos com os oficiais, vai esta apresentação particular, ficando reservada a apresentação solene para o nosso segundo numero” (Re-nhau-nhau, 16 dez. 1929), que saíria dali a quatro dias, exactamente, no dia 20 de dezembro. Logo na segunda página, num artigo assinado por “Gonçalves de côr ausente”, com o título “In principio erat verbum”, Gonçalves Preto explica a configuração do jornal: “No principio era o verbo! E o verbo se fez carne, e a carne se fez homem, e o homem se fez jornalista. E no principio o jornalista contentava-se apenas com o verbo de encher... colunas. Mas hoje tudo mudou e só o verbo não basta; são precisas as gravuras. Daí a razão do nosso jornal aparecer ilustrado por ilustres ilustradores, que nos honram com as suas ilustrações” . Advertia, ainda, que não aceitariam a colaboração de jornalistas consagrados, “porque estamos na verdura da mocidade e não admitimos os maduros” (GONÇALVES DE CÔR AUSENTE, Re-nhau-nhau, 20 dez. 1929, 2). O cabeçalho do periódico é da autoria de Roberto Cunha, também conhecido pela alcunha de “Terrique”: compõe-se de um gato, de rabo hirto, acossado por uma mão coberta de luva, que o incita a rugir, significando, talvez, o ferir ou arranhar, mas com... luva. O rugido que sai da sua boca é o título do trimensário Re-nhau-nhau. O felino, apoiado nas duas patas traseiras e com as duas da frente levantadas, prepara-se para atacar a sua presa, assumindo a sua posição característica de ataque, encolhendo-se e preparando-se para saltar. Este cabeçalho que se mantém sem alteração até ao último dia da existência do jornal foi o seu ex-libris. De acordo com um dos colaboradores, Manuel Peres (Pinto da Silva), este cabeçalho foi gravado pela primeira vez no Porto, num famoso gravador dessa cidade. As dificuldades em colocar nos escaparates um jornal desta dimensão eram enormes. Estes jovens, entre os 17 e os 24 anos – Gonçalves Preto, João Miguel, Roberto Cunha, Manuel Peres, Gualberto Malho Rodrigues e José Cardoso –, meteram mãos à obra e levantaram um jornal que duraria 48 anos, tantos quantos o regime durante o qual nasceu e cresceu: “sem nunca se ter afastado da sua orientação inicial, tem vindo pela vida fora, com um sorriso ou com uma ironia, sacudir a monotonia sórdida do nosso burgo, como unica nota de vida numa cidade morta” (Re-nhau-nhau, 21 dez. 1935). O Re-nhau-nhau veio assim a constituir um ponto de encontro e de confluência de ideias, um espaço de diálogo e de debate onde outros jovens talentosos se juntaram àqueles, como os redatores Noé Pestana e João França, os caricaturistas Ivo Ferreira, Teixeira Cabral, Alírio Sequeira, Ramon Fernandes, João Rosa, Júlio e Paulo Sá Brás, os gravadores Mendonça, Agostinho, Semeão Gomes (Lico) e Bernardo, e ainda os ilustradores continentais Natalino, Quim e Abel Aragão Teixeira. Estes serão presenças assíduas até um determinado momento, mas a partir de certa altura cada um segue o rumo da sua vida e muitos abandonam o jornal. Esses são substituídos por outros jovens de grande talento e valor, que darão qualidade e vida ao jornal até 1977. A publicação deste jornal causou algum alvoroço na cidade, pois as pessoas não estavam habituadas às novas metodologias usadas por estes jovens irreverentes, que vinham revolucionar o jornalismo da praça, e teciam considerações pejorativas em torno do jornal e dos seus criadores, destinando-lhe um fim precoce. Enganaram-se estes profetas da desgraça, pois o jornal acabou sendo o mais popular entre o povo madeirense e continuou por muitos e bons anos. Abordando os assuntos de forma caricatural, com a sua pontinha de sátira, conseguiram, com o seu riso, fazer aquilo que competia aos jornais sérios: divulgar os problemas de maior interesse para a Madeira, comentar as coisas que não estavam feitas ou a decorrer como deveriam, sugerindo aquilo que, no seu entender, constituiria melhor solução para os problemas da terra. Em resumo: “Aplaudindo quando nos parece de justiça e ironizando sempre que é necessário, temos vivido durante estes […] anos”. Muitas das sugestões preconizadas por estes jovens foram aceites, o que prova as boas intenções de que estava imbuído o jornal: “Re-nhau-nhau tem sido, desde o seu principio, o único periódico que pugna, sinceramente, pelas causas de interesse retintamente madeirense” (Re-nhau-nhau, 21 dez. 1936). O tamanho do jornal era de 33,5 cm de comprimento por 25 cm de largura. Estas medidas permaneceram sem alteração até 1940, mas iriam alterar-se para outras um pouco maiores na déc. de 60. O preço, no início da sua publicação, era de 1$50, baixando para 1$00 (uma pataca, como apregoavam), a partir do n.º 73 de 4 de fevereiro de 1932, continuando assim durante bastante tempo. Seria um preço razoável para a época e para o tipo de jornal que era o Re-nhau-nhau, pois era o mesmo preço do café no Golden Gate. O periódico compunha-se de uma primeira página, ¾ da qual eram preenchidos com uma moldura ilustrada de algum acontecimento importante na Região, na fórmula já experimentada em outros jornais do género no continente, e uma contracapa caricaturada a toda a página. Como jornal humorístico, não tinha secções regulares, persistindo algumas mais tempo do que outras. Durante algum tempo, foram permanentes as seguintes secções: “Jazz Band”, onde se comentavam os faits divers madeirenses; “Zaz Paz Traz” e “Bchi-Bchi”, espaços de poesia; “Politiquices”, secção onde se analisavam, humoristicamente, os acontecimentos políticos da Região; “Fitas e Teatradas”, espaço dedicado à crítica cinematográfica, teatral e restante atividade artística madeirense. Outros espaços existiram no Re-nhau-nhau, que eram oferecidos a alguns jovens de valor, que aí publicavam os seus textos em prosa ou em verso. Este periódico sofreu ligeiras alterações de direção e administração a partir da morte de João Miguel e de Gonçalves Preto. Em 1959, com a morte de João Miguel, a administração passou para os seus herdeiros, e a partir de 1971, com o falecimento de Gonçalves Preto, a direção passou para Maria Mendonça, que por motivo de grave doença o abandonou, algum tempo depois, em favor de Gil Gomes. Um homem em particular foi responsável pelo êxito do Re-nhau-nhau. Referimo-nos a Pedro Alberto Gonçalves Preto, que nasceu no dia 7 de setembro de 1907, na freguesia da Sé, no Funchal, filho de Francisco M. de Freitas Gonçalves Preto, advogado, homem ligado à República na Madeira, e de Sofia Amélia Figueira Gonçalves Preto. Desempenhou o cargo de diretor até à sua morte, dedicando grande parte da sua vida ao jornal, por vezes mesmo em precárias condições de saúde; ao seu cuidado tinha a grande maioria das secções do trimensário: “Jazz Band”, “Fitas e Teatradas”, “Zaz Paz Traz”, “Politiquices”, etc. Segundo alguns colaboradores do Re-nhau-nhau, houve vezes em que Gonçalves Preto o escreveu sozinho, do princípio ao fim. Usava, nas suas brincadeiras jornalísticas, os pseudónimos Gonçalves de Côr Ausente, Preto e Branco (quando escrevia a meias com João Miguel) ou simplesmente Preto. Faleceu no Hospital dos Marmeleiros, no Funchal, no dia 15 de maio de 1971.   Emanuel Janes (atualizado a 17.12.2017) artigos relacionados: pedro, alberto gonçalves periódicos literários (sécs. XIX e XX) nau sem rumo atlântico, revista

Literatura Sociedade e Comunicação Social

nunes, diocleciano francisco de assis

Professor e poeta, nasceu na freguesia de Santa Maria Maior, Funchal, a 4 de outubro de 1928, desconhecendo-se o local e a data do seu falecimento. Era filho do Enf.º José Francisco Nunes e de Beatriz Adelaide Freitas Nunes. Estudou, a partir de 1940, no Liceu Jaime Moniz, no Funchal, formando-se como professor primário e diretor de colégio. Foi professor do ensino oficial e do particular, nomeadamente no curso de férias da Escola de Enfermagem de São José de Cluny. Lecionou também em Luanda, Angola, onde pertenceu ao quadro docente oficial. No âmbito da educação, fundou ainda, na Radiodifusão do Funchal, o programa “Meia-Hora dos Estudantes”, nele proferindo várias palestras. Para além do ensino, também se dedicou à escrita, principalmente à poesia. As suas primeiras publicações, crónicas e poemas tiveram lugar na revista Presente, na qual foi ainda responsável pela secção “Cartas para Longe”. Colaborou depois no Jornal da Madeira, na Página dos Estudantes, de que foi cofundador, n’A Madeira Nova, no Almanaque Madeirense, na revista Pérola do Atlântico, do Porto, e também em vários jornais da colónia madeirense em New Bedford e em Fall River, nos EUA. Por fim, colaborou no Intransigente, de Benguela, n’O Comércio de Angola e na revista Ensino, igualmente de Angola. Assinava os seus textos como Assis Nunes, usando, por vezes, o pseudónimo Guido de Monte Cristo. É autor do estudo A Criança – Sua Revelação perante a Sociedade e a Escola, editado como folheto pela Página dos Estudantes. Segundo Luís Marino, em Musa Insular, terá deixado inédita uma vasta bibliografia: Primeiros Versos, Combate, Temas Incompletos, Pecados, África, Quando o Vento Uivar dos Montes, Ao Céu Subiu Uma Estrela, Inveja e O Deputado. Na referida obra de Marino, pode ser apreciado o seu longo poema encomiástico “Tributo à Ilha”, cuja classificação oscila entre a ode, a elegia e a canção. Obras de Diocleciano Francisco de Assis Nunes: A Criança – Sua Revelação perante a Sociedade e a Escola.   António José Borges (atualizado a 03.03.2018) artigos relacionados: poetas liceu / escola secindária jaime moniz arte na educação formação de professores

História da Educação Literatura

nunes, cesário joão

Jornalista, poeta e escritor, nasceu na freguesia de São Gonçalo, no Ribeiro Seco, a 6 de maio de 1905, desconhecendo-se a data e o local do seu falecimento. Era filho de Manuel Francisco Nunes e de Virgínia Cândida Gomes Nunes. Casou-se com Maria Elisa Nunes, filha de José Fernandes de Gouveia e de Olívia da Natividade Fernandes de Gouveia, com quem teve uma filha, Irene Maria José Nunes da Costa. Era debuxador de bordados da Madeira de profissão, sendo os seus trabalhos considerados ainda hoje autênticas obras de arte. No entanto, assumiu-se como um homem multifacetado, dedicando-se igualmente à escrita jornalística e literária, quer em prosa, quer em poema. Assinava os seus textos literários não só com o seu nome, Cesário Nunes, mas com vários pseudónimos, como Ene, João Verdades e Falco. Sob o pseudónimo João Verdades, foi premiado nos jogos florais da Madeira organizados pelo Ateneu Comercial do Funchal em 1946, ganhando o 2.º lugar pelo conto “A Aguardente” e uma menção honrosa pelo conto infantil “O Aparo de Ouro”. No âmbito da sua atividade jornalística, foi correspondente do Comércio do Porto, periódico no qual desempenhou também a função de redator; na Madeira, foi delegado regional do jornal A Cidade, de Lisboa, e colaborou nas publicações periódicas Diário de Notícias, Eco do Funchal, Madeira Nova, Voz da Madeira e Diário da Madeira, entre outras. Nesta última, desempenhou a função de redator-principal a partir de maio de 1961 e manteve, entre outras, as secções “Gis na Parede” – com início a 27 de maio de 1972 e com grande sucesso junto do público, graças a um humor e a uma ironia refinados –, tal como “Ventos Ilhéus” e “Ardósia do Mundo”, ambas iniciadas a 19 de fevereiro de 1966. Enquanto jornalista, esteve envolvido em vários casos importantes da época, nomeadamente na chamada “questão Hinton”, ligada ao monopólio do fabrico de açúcar e álcool, que deu origem a um dos principais debates que animou a política e a opinião pública antes e durante a Primeira República. Na sua obra Política Sacarina (1940), um estudo sobre a economia insular, Cesário Nunes documentou referida situação, asseverando: “Em Portugal nenhuma questão económica atingiu tão alta preponderância e trouxe então grandes embaraços legislativos às entidades governativas como o problema sacarino da Madeira” (VIEIRA, 2004, 173). O facto de os textos que escreveu neste contexto serem citados em vários processos mostra bem a importância da sua opinião. Esteve também envolvido nos principais casos políticos do seu tempo, nomeadamente na Revolta da Madeira, sendo, nessa medida, seu um dos depoimentos que integram o livro A Revolta da Madeira – 1931 (1994). Em 1975, Cesário Nunes foi detido na sequência de uma carta que escreveu para o Diário da Madeira. No Jornal da Madeira do dia 16 de maio de 1975, pode ler-se um comunicado do quartel-general do Comando Territorial Independente da Madeira, com data de 15 de maio de 1975, que dá conta de que, a 10 de maio de 1975, haviam sido publicados no Diário da Madeira três artigos, bem como uma carta inserta na secção “Correio da Madeira”, que denotavam tendências contrárias à unidade nacional, motivo pelo qual haviam sido detidos os seus autores: Cesário Nunes, autor da carta, António de Castro Jorge, M. Macedo de Faria e Manuel Rodrigues. Para além da já referida obra Política Sacarina, estudo dedicado a António de Oliveira Salazar que consiste no primeiro número dos Cadernos Madeirenses, César Nunes é também autor do opúsculo História das Tábuas da Calheta. Um Novo Machim, publicado no Catálogo Coletivo de Bibliotecas da Madeira. Consta que terá destruído inéditos seus, num momento de revolta para com as injustiças e ingratidões de que foi alvo. Nestes, incluir-se-ia um livro de contos com o título Galeria, que teria prefácio do escritor Ferreira de Castro. Desconhece-se se uma obra em dois volumes intitulada Encruzilhada, que tinha em preparação, chegou efetivamente a ser publicada. Na obra Musa Insular, de Luís Marino, constam dois poemas que permitem aferir a sua qualidade poética. São eles “Conselhos”, poema de estrofe única dedicado à sua filha, e o soneto – modelo poético praticado abundantemente entre os poetas madeirenses – “Lágrimas”. Obras de Cesário João Nunes: “Conselhos”; “Lágrimas”; Política Sacarina (1940); História das Tábuas da Calheta. Um Novo Machim (1944). António José Borges (atualizado a 03.03.2018)   artigos relacionados: jorge, antónio vitorino castro república periódicos literários (sécs. XIX e XX) poetas  

Literatura

nóbrega, januário justiniano de

Escritor, poeta e jornalista. Consta que deixou vasta produção poética de elevado valor. A sua obra póstuma Visita de Sua Majestade a Imperatriz do Brazil, viúva, Duquesa de Bragança, à Ilha da Madeira, e Fundação do Hospício da Sereníssima Princesa D. Maria Amélia foi editada em 1867, na Madeira. Palavras-chave: Escritor; Poeta; Jornalista. Nasceu no Funchal a 25 de fevereiro de 1826 e faleceu a 28 de julho de 1866. Foi escriturário da administração do concelho do Funchal desde 30 de junho de 1837 e tornou-se 3.º escrivão da mesma administração a 8 de janeiro de 1857. Apesar de apenas possuir pouco mais do que a instrução primária, revelou-se um dos melhores jornalistas do seu tempo e tinha especial aptidão para a escrita literária, tornando-se reconhecido também como poeta. Persistem dúvidas sobre as reais circunstâncias que envolveram a sua morte: terá perecido como vítima de queda de uma rocha à beira-mar, ou, na verdade, terá existido suicídio derivado de uma suposta alienação mental, numa altura em que tinha preparado uma coletânea de poemas para publicar. Consta que deixou vasta produção poética de elevado valor, cuja localização se desconhece. Escreveu alguns artigos políticos, bastante reconhecidos pela sua qualidade e rigor, tendo colaborado nomeadamente nos periódicos O Funchalense, A Folha, Campo Neutro, Flor do Oceano, Estudo, e no Semanário Oficial, que dirigiu. Há registo de colaboração sua nas obras Flores da Madeira e Álbum Madeirense. O mais importante e copioso repositório de informações, elementos e notícias que interessam à história do arquipélago da Madeira encontra-se no arquivo da Câmara Municipal do Funchal, que contém muitos e valiosos documentos, sobretudo dos sécs. XV, XVI e XVII. Alguns deles foram publicados por Álvaro Rodrigues de Azevedo nas suas anotações às Saudades da Terra, de Gaspar Frutuoso. Entre os escritos que se extraviaram, está um que, tendo sido entregue ao governador José Silvestre Ribeiro, vem mencionado num artigo intitulado “Ilha da Madeira e seu Arquipélago”, do Dicionário Universal Português, nos seguintes termos: “Semelhantemente aconteceu com o manuscrito de uma obra histórico-estatística da Ilha da Madeira do malogrado e talentoso escritor madeirense Januário Justiniano de Nóbrega, a este pago pelo cofre da Câmara do Funchal, e portanto a esta pertencente […]” (ALBUQUERQUE, 1982). Consta que certas partes deste manuscrito ficaram na posse de Rodrigues de Azevedo. A sua obra póstuma, Visita de Sua Majestade a Imperatriz do Brazil, Viuva, Duquesa de Bragança, á Ilha da Madeira, e Fundação do Hospicio da Serenissima Princesa D. Maria Amelia, que se encontra no Arquivo Municipal do Funchal e na Biblioteca Municipal do Funchal, foi editada por Júlio da Silva Carvalho, na Typografia da Flor do Oceano. Silva Carvalho assinou o prefácio. Na Biblioteca Municipal do Funchal encontram-se, de Justiniano de Nóbrega, a Reimpressão das Rimas de Francisco Álvares de Nóbrega, sem editor, publicada no Funchal, segundo consta por volta de 1850, sem capa nem folha de rosto; e, em coautoria, Flores Agrestes. Poesias de João F. d´Oliveira e Januario J. de Nobrega, com edição no Funchal, pela Typografia Funchalense, em 1860. A segunda parte desta obra nunca foi publicada, porque Januário de Nóbrega, num acesso de loucura, destruiu as poesias e outros escritos que possuía, especialmente as peças inéditas. Luís Marino transcreveu, na sua obra Musa Insular, o longo e esteticamente cuidado poema “Apelido de Zargo”, composto por 15 estrofes de sextilhas, e que se serve, a abrir, de uma epígrafe de Cordeiro retirada da História Insulana, de tendência moralista: “Crescerá mais a fidalguia que começa em obras próprias, para os seus descendentes, do que a que só se jacta da dos descendentes, já alheia” (MARINO, 1959). Obras de Januário Justiniano de Nóbrega: Reimpressão das Rimas de Francisco Álvares de Nóbrega (1850?); Flores Agrestes. Poesias de João F. d´Oliveira e Januario J. de Nobrega (1860); Visita de Sua Majestade a Imperatriz do Brazil, Viuva, Duquesa de Bragança, á Ilha da Madeira, e Fundação do Hospicio da Serenissima Princesa D. Maria Amelia (1867); “Apelido de Zargo” (s.d.).   António José Borges (atualizado a 03.03.2018)   artigos relacionados: frutuoso, gaspar azevedo, álvaro rodrigues de poetas nunes, cesário joão

Literatura

nunes, eduardo fernandes

Eduardo Fernandes Nunes nasceu na freguesia de São Roque, Funchal, a 14 de setembro de 1910. Filho de António Fernandes Nunes e de Maria Matilde Fernandes Nunes, frequentou a Escola Industrial e Comercial de António Augusto de Aguiar e, mais tarde, o liceu do Funchal. Desce cedo, revelou uma grande vocação para a escrita, o que o tornou mais tarde um reconhecido jornalista, não só na Madeira, como também no território continental português e até no Brasil. Iniciou a carreira em 1937, no Diário da Madeira, com o qual colaborou até à suspensão deste matutino. Enquanto jornalista deste diário publicou várias novelas e livros inéditos, como o romance Porto Santo – Da Terra e do Mar, Do Amor e da Madeira e Embriagues, Crónicas Dialogadas. Foi correspondente no Funchal de vários jornais nacionais como O Século e o Primeiro de Janeiro, da agência internacional “The Associated Press”, em Nova Iorque, e ainda das revistas Flama e Cinematógrafo. Eduardo Nunes, como assinava, enquanto escritor/novelista, publicou contos e crónicas, mas foi na reportagem que se destacou com A Virgem de Fátima na Madeira, uma obra a que chamou “a reportagem das reportagens” e que lhe valeu a bênção apostólica do Papa Pio XII, em carta que lhe foi dirigida pelo cardeal G. B. Montini, secretário de Estado do Vaticano (NUNES, 1952, 2). A Virgem de Fátima na Madeira, editada em 1948, com prefácio de Feliciano Soares, testemunha o acontecimento cuja “inconcebível grandeza não podia ficar dispersa nas colunas dos jornais ou nas fotos dos repórteres fotográficos” (Id., Ibid., 4). A reportagem que compõe o livro teve por base, na sua continuidade cronológica, as descrições dos jornais diários Diário de Noticias e O Jornal, tendo sido toda ela, porém, e para o efeito, refundida. Com este “arranjo”, Eduardo Nunes pretendeu abarcar tudo o que foi publicado em data própria, mantendo na forma contextual o “sabor da hora” em que o facto foi vivido. Na sua obra destacam-se ainda textos em prosa como A Levada do Norte, mas o mais relevante é Porque me Orgulho de Ser Madeirense, publicado em 1951, com segunda edição em 1954. Ao longo das 125 páginas deste livro o autor revela e enaltece vários aspetos da ilha da Madeira, desde a sua descoberta no contexto da epopeia portuguesa dos Descobrimentos até à paisagem, aos costumes, ao folclore e às romarias. Além destas obras, publicou ainda a reportagem ilustrada “Levada Central da Calheta”, em 1953, e, no mesmo ano, “Central Salazar – opúsculo documentário ilustrado”. Em 28 de agosto de 1954, publicou a primeira crónica de viagem “Rumo ao Brasil”, na qual narra, no Diário de Notícias da Madeira, a viagem que fez desde o Funchal até ao Rio de Janeiro. Ao longo dos meses seguintes, escreve sobre as comemorações do 4.º centenário de São Paulo, cidade onde testemunha a inauguração, a 21 de agosto, do parque urbano de Ibirapuera. Eduardo Nunes pertenceu à direção do Clube Desportivo Nacional, onde exerceu funções de secretário-geral. Desempenhou o mesmo cargo na Associação de Jornalistas da Madeira, e foi ainda secretário da delegação, no Funchal, do Sindicato Nacional dos Jornalistas. Morreu em Lisboa no dia 4 de abril de 1957, vítima de cancro.   Obras de Eduardo Fernandes Nunes: A Virgem de Fátima na Madeira: Reportagem (1948); Porque me Orgulho de Ser Madeirense (1951); “Levada Central da Calheta” (1953); “Central Salazar” (1953); “Crónica de Viajem, Rumo ao Brasil” (1954); A Levada do Norte; Porto Santo – Da Terra e do Mar, Do Amor e da Madeira e Embriagues, Crónicas Dialogadas.   António José Macedo Ferreira (atualizado a 03.03.2018)

Literatura

moçambique

A mais antiga referência que existe sobre a região de Moçambique está relacionada com o açúcar da ilha da Madeira, pois foi com conservas madeirenses que Vasco da Gama, aquando da sua primeira viagem, presenteou o xeque de Moçambique. Isto aconteceu porque os Portugueses sabiam que aquelas conservas seriam presentes muito apreciados no mundo islâmico. Este foi um episódio que marcou o início das relações da Ilha com aquela região de África e que, ao longo dos tempos, permitiu outras oportunidades. No séc. XVI, em 1588, o primeiro bispo nomeado para o Japão, o Jesuíta madeirense Sebastião de Morais, faleceu em Moçambique, quando seguia de viagem para tomar posse do bispado. António de Abreu, do Arco da Calheta, andou pelo Oriente desde 1511 e prestou serviços importantes à Coroa. Em 1526, quando foi nomeado capitão-mor de Malaca, foi obrigado a invernar em Moçambique. Na centúria seguinte, em 1642, Francisco Fernandez Furna, dedicado ao tráfico de escravos, criou uma empresa para o comércio em Moçambique, na Índia e na China. Depois, foi muito importante, no cimentar das relações de Moçambique com a Madeira, a presença de madeirenses ilustres nesse terriório, e.g. Aires de Ornelas (1866-1930), D. Manuel Ferreira Cabral (1918-1981), e D. Teodósio Clemente Gouveia (1889-1962): o primeiro como governador-geral de Moçambique (de 1896 a 1906), o segundo como arcebispo de Moçambique (de 1936 a 1962) e o terceiro como bispo da Beira (de 1967 a 1971). É necessário ainda assinalar a passagem pelo Funchal, em viagem de retorno, do Maj. Joaquim Mouzinho de Albuquerque, que desempenhava o cargo de comissário régio em Moçambique. À sua chegada ao Funchal, a 7 de dezembro de 1897, foi muito saudado, com um jantar no Palácio de S. Lourenço e com um espetáculo de música e iluminações no Jardim Municipal. Partiu para Lisboa, no dia 12 de dezembro. É precisamente durante o período do governador natural da Camacha que surgiram dados sobre o movimento de emigrantes, assinalando-se, entre 1872 e 1915, através dos registos de passaporte, a intenção de 391 madeirenses emigrarem para Moçambique. Destes, apenas um manifestou concretamente o seu destino final – a Beira; pensa-se que os demais se dirigiam à então Lourenço Marques (posterior Maputo) e que, depois, se decidiram por outros destinos. Outros faziam de Lourenço Marques uma escala para entrarem na África do Sul, como foi o caso de Joe Berardo, que em 1963 aportou em Moçambique, e de outros que tentavam, desta forma, escapar à Guerra Colonial. Para o período de 1930 a 1948, existem dados sobre a emigração de madeirenses para Moçambique, através da documentação do arquivo da Agência Ferraz. Por aqui, sabe-se que saíram 122 madeirenses. Outras fontes indicam que, em 1935, saíram 226 madeirenses e que, num período de 10 anos, Moçambique recebeu 389 emigrantes da Ilha. O grupo associado à Agência Ferraz fixou-se maioritariamente na capital, e apenas 24 seguiram para outros destinos, e.g. Beira, Manhiça, João Belo, Vila Cabral, Quelimane, Ressano Garcia, Namaacha, São Jerónimo/Magude, Malhadugene. A proveniência destes também é maioritariamente da Calheta, com particular incidência para a freguesia do Estreito da Calheta, da qual partiram 33 madeirenses, representando 31 % das diversas freguesias do concelho, donde saíram 75 moradores. Se se considerar o perfil destes emigrantes, constata-se que foram maioritariamente ligados à terra, pois 49,2 % foram identificados, em termos profissionais, como agricultores e lavradores. Também havia indivíduos de outros ofícios (pedreiro, carpinteiro, padeiro, moleiro, mestre de obras, trabalhador) e de outras atividades (empregada doméstica, empregado de comércio, proprietário, construtor civil, estudante, funcionário público, comerciante). Atente-se que a Madeira podia ser também uma etapa para chegar aos altos cargos de administração em Moçambique, tendo-se verificado isto no caso de António Manuel de Castro e Mendonça, que foi governador da Ilha, de São Paulo, e, entre 1809 e 1812, de Moçambique. O mesmo sucederia com Gabriel Teixeira e Sebastião Xavier Botelho, que, da Madeira, passou para idênticas funções em Moçambique. Este grupo de madeirenses que saíram para Moçambique foi oriundo de diversas freguesias do Funchal (Santo António, São Martinho, São Gonçalo, Santa Maria Maior, São Pedro, Santa Luzia, Sé) e rurais (Estreito e Arco da Calheta, Calheta, São Vicente, Paul do Mar, Porto Moniz, Fajã da Ovelha, Ribeira da Janela, Prazeres, Santana, Gaula, Ponta de Sol, Madalena do Mar, Porto Santo, Ponta do Pargo, Porto da Cruz). O grupo mais numeroso, com 134 madeirenses (34 %), era proveniente do Estreito da Calheta. Deve-se ainda referir a emigração forçada, com a pena de degredo, que aconteceu em algumas situações. Em 1828, houve o degredo de Luiz Pimenta de Aguiar, por razões políticas, nunca regressando à Ilha. Seguiu-se o P.e João Rodrigues Pestana, da Calheta, em 1886. Em 1887, assinalou-se o degredo de João Reinolds, do Porto Santo.   Os registos históricos documentaram muitos madeirenses que se dirigiram para Moçambique e tiveram um papel de relevo na colónia, e.g. militares, médicos e funcionários do Estado. O Com. João Inocêncio Camacho de Freitas, que foi governador civil da Madeira entre 1951 e 1969, procedeu a levantamentos hidrográficos em Moçambique. Outros, de que ficaram notícias, foram: Aires Ferreira Sousa (1867-1947); Alexandre José Sarsfield (1856-1926); Alfredo França Dória Nóbrega (1897-1979); Álvaro de Sousa Drumond Borges (n. 1897); António Américo da Costa Pereira (1879-1922); António Avelino Afonso (1872-1964); António Félix Pita Júnior (1895-1951); Cândido Augusto Pereira (1892-1956); Daniel Pereira Pestana (1824-1906); Elmano de Freitas Moura (n. 1932); Emanuel da Paz Correia Aguiar (n. 1940); Francisco Silvestre Varela (1883-1963); Gabriel Maurício Teixeira (1897-1973); Jacinto Ferreira Rodrigues Baptista (1883-1936); Jacinto Sebastião Spínola (1881-1951); Jaime de Campos Ramalho (1873-1935); Jaime Martinho Ferreira Leal (1888-1962); João António de Bianchi (1884-1969); João de Freitas Alves (1926-1998); João de Silvério Caldeira; João Gomes de Abreu (1888-1958); João Inocêncio Camacho de Freitas (1899-1969); Joaquim do Espírito Santo Mota de Vasconcelos (1902-1976); Jordão Abel Rodrigues (1880-1956); Jorge Teófilo Jardim Bulher (n. 1926); Jorge de Almada Schiappa de Azevedo (1905-1972); José Afonso (n. 1912); José Almada (1888-1979); José Carlos de Vasconcelos (1878-1933); José de Freitas Soares (n. 1908); José Gonçalves Costa (1899-1967); José Gonçalves Costa (1899-1968); José J. Ferreira; José Joaquim de Freitas Ferraz (n. 1821); Leonel Câmara (n. 1923); Lúcio Tolentino da Costa (1870-1939); Luís Camacho Barbeito (1902-1971); Luís Vieira de Castro (1921-1984); Manuel de Sousa Brazão (1884-1923); Manuel Ferreira Rosa (n. 1898); Manuel Gonçalves Alegria (1919-1977); Manuel Leovegildo Rodrigues (1881-1959); Manuel Simão Rodrigues (n. 1932); Manuel Teodoro dos Ramos (n. 1925); Nicolau António de Sousa Drumond Borges (n. 1923); Teófilo de Andrade Rodrigues (1912-1980); Tomás de Jose Basto Machado (n. 1913); Tomás José Basto Machado (n. 1913); Vasco da Gama Andrade Rodrigues (n. 1909); Vasco da Gama Pestana (n. 1907); Vasco da Gama Rodrigues (1888-1977). Por fim, a testemunhar a influência e presença de madeirenses em Lourenço Marques, destaca-se, naquela cidade, uma casa típica da Madeira.   Alberto Vieira (atualizado a 24.02.2018)

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