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teive, belchior de

Último filho varão de Gaspar de Teive e de Ana de Brito e neto de Diogo de Teive, que instituiu o morgado dos Teives, uma família nobre da Ribeira Brava, Belchior de Teive nasceu no Funchal. Em 1608, contraiu matrimónio com D. Mariana Telo de Gusmão, filha de Pedro Telo de Gusmão, alcaide-mor de Sevilha, e de Mariana Ponce de Leão. O casal teve sete filhos: Gaspar de Teive Telo e Gusmão, Fernando de Teive, Pedro de Teive, Duarte de Teive, Filipa de Teive, Ana de Teive e Gusmão e Antónia de Teive. Desconhecem-se os aspetos potencialmente interessantes da infância e juventude de Teive que, em 1581, era lente da Universidade de Salamanca, regendo uma das cadeiras da faculdade de direito, embora não saibamos onde e em que data se formou. Henrique Henriques de Noronha, no seu Nobiliário Genealógico, informou que fora lente em Salamanca aos 26 anos, o que não é corroborado por nenhuma outra fonte. Mais tarde, exerceu, em Coimbra, o magistério universitário, que abandonou em 1607, para servir Filipe III. Logo nesse ano, ao serviço do monarca, esteve em Portugal como superintendente geral da fazenda pública. Recorde-se que, em 1599, se havia formado uma junta de arbítrios ou junta da fazenda castelhana – que estava acima do conselho da fazenda – e, possivelmente, no ano seguinte, outra para Portugal. Teive esteve totalmente ao serviço de Castela e de Filipe III de quem foi conselheiro privado, adiantado de Castela, cargo que correspondia ao de governador general da armada e superintendente dos ofícios da armada. Também desempenhou funções na magistratura, nomeadamente como alcaide do crime da chancelaria de Valladolid e presidente da casa dos alcaides. Foi genealogista e deixou inédita uma genealogia da casa de Lerma. Morreu em 1622.   Isabel Drumond Braga (atualizado a 09.12.2017)

Personalidades

teixeira, tristão (vaz)

(finais do séc. XIII – c. 1470) Tristão Teixeira, também conhecido por Tristão da Ilha, de ascendência documentalmente desconhecida, foi companheiro de Zarco e primeiro capitão do donatário de Machico. Dele diz Noronha que “Viveo 80 anos, governou 50 e faleceu em Silves em 1470” (NORONHA, 1994, 38) o que, mesmo que não certificado por documentos, não deve andar longe da verdade, na medida em que o faz chegar à Madeira por volta dos 30 anos, idade compatível com a atribuição da capitania, antecedida de um passado como escudeiro do Infante D. Henrique e participante na tomada de Ceuta e no cerco de Tânger onde foi armado cavaleiro pelo mesmo Infante (BARROS, 1552, Déc. I, Lº I, cap. III, 33). Segundo Azurara, que considera Tristão Teixeira “homem assaz ardido mas não tão nobre (…) como João Gonçalvez” depois do descerco de Ceuta, os dois cavaleiros ofereceram os seus serviços ao Infante, pois eram “homens mancebos e pera muyto”, e consideravam que o seu tempo era mal-empregado se não “trabalhassem alguma cousa per seus corpos” (AZURARA, 1841, 388 e 385). Assim, encomendou-lhes o Infante a tarefa de demandarem terras da Guiné, para o que lhes forneceu uma barca, a qual, por ter encontrado vento contrário, veio dar ao Porto Santo, onde os cavaleiros ficaram por alguns dias, após o que regressaram ao reino. Na segunda viagem que fizeram àquela zona do atlântico, Zarco e Teixeira dirigiram-se à Madeira a cujo reconhecimento procederam. A maior ilha do arquipélago foi, então, dividida em duas porções, uma das quais, com sede em Machico ficou à responsabilidade de Tristão Teixeira. A 8 de maio de 1440, por carta do Infante D. Henrique, a administração do território que ia “desde alem do rio do Caniço até à Ponta do Tristão” é doada a Tristão Teixeira sob a forma de capitania, legitimando-se, assim, uma situação preexistente (MH., vol. XIV, doc. 71). Este mesmo documento será, posteriormente, em 1452, reconfirmado por D. Afonso V (M. H., vol. XIV, doc. 109). Se pouco se sabe da ação do capitão à frente dos destinos do seu território, há, por outro lado, informação de ter participado em outras viagens marítimas, narradas por Azurara que, em 1445 integra o capitão de Machico, bem como Garcia Homem, genro de Zarco, numa armada que escalou a Madeira a caminho das costas de África. Essa armada deteve-se em Canárias, a tentar obter “alguma presa” para serviço do Infante, o que, não tendo sido possível, determinou o regresso de algumas caravelas, entre as quais as duas idas da Madeira (AZURARA, 1841, 414). Um outro registo documental que respeita à vida de Tristão Teixeira é o do perdão que D. Afonso V lhe outorga, em razão de o capitão ter claramente excedido a sua jurisdição, quando mandara “talhar membro” a Diogo Barradas, homem degredado do reino que acolhera em sua casa e violara uma filha sua. Barradas apresentou queixa ao rei, na sequência do que o capitão teria sido preso e degredado para S. Tomé (FRUTUOSO, 2008, 116). Uns anos depois, em 1452, porém, mediante o pagamento de uma quantia avultada, o monarca deliberou perdoá-lo, após o que ainda governou a capitania por vários anos (AZURARA, vol. IX, doc. 117). Do seu falecimento, sabe-se que ocorreu no Algarve em data que será, eventualmente, próxima da já apontada.   Cristina Trindade Paulo Perneta (atualizado a 07.12.2017)

História Política e Institucional Personalidades

teixeira, irineu novita

Irineu Novita Teixeira. Foto: arquivo pessoal do autor Nascido no Funchal a 9 de agosto de 1915, foi um filósofo, geógrafo e urbanista madeirense. Fez a formação primária num colégio interno na Parede, Cascais. Voltou posteriormente à ilha da Madeira, onde frequenta o Liceu do Funchal, na época situado na R. do Bispo. Aí conclui a sua formação secundária, sendo colega e amigo de contemporâneos como o poeta Florival dos Passos e o ator Virgílio Teixeira. Após concluir os estudos secundários na Ilha, regressa ao continente, matriculando-se na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, onde faz as primeiras cadeiras do curso de geografia. No seio dessa comunidade académica frequenta várias tertúlias e trava conhecimento com figuras como Álvaro Cunhal e Bento de Jesus Caraça (seu professor), que muito o influenciam, levando-o a interessar-se pelas temáticas sociais e pela política. Com o objetivo de se formar como engenheiro geógrafo, ruma à faculdade de engenharia do Porto. Após o falecimento do seu pai, em 1938, e tendo de gerir imediatamente os negócios familiares na vila da Ponta do Sol, retorna à Madeira sem concluir as duas cadeiras que lhe faltavam para se licenciar como engenheiro geógrafo, nunca abandonando, no entanto, um profundo interesse pelas temáticas do urbanismo e do ordenamento do território. Depois de um ano a ordenar e a gerir negócios familiares, em 1939 imigra para o Brasil, de onde era originária a sua mãe e onde tinha toda a família materna. Nesse país interessa-se e adere ao Movimento Georgista Brasileiro, que aí divulgava as ideias de transformação social de Henry George (1839-1897), filósofo norte-americano que advogava a reforma da sociedade por via do acesso à terra e do estabelecimento de um imposto único sobre as propriedades territoriais. Tornou-se amigo de Monteiro Lobato (1882-1948), fundador do dito movimento, envolvendo-se também nas várias campanhas levadas a cabo por ele. Após a morte de Monteiro Lobato, afasta-se do movimento, desiludido com a falta de interesse dos novos responsáveis pelas questões urbanísticas. Inicia então, entre finais de 1948 e inícios de 1949, a sua própria campanha por um novo tipo de urbanismo e de cidade. Em tal campanha baseia-se não só na sua experiência formativa e vivencial como geógrafo e empresário agrícola, mas também nas ideias georgistas e na obra do urbanista futurista espanhol Arturo Soria y Mata (1844-1920), que propunha uma cidade linear, ao longo dos caminhos de ferro e das estradas, unindo inextricavelmente campo e cidade e naturalizando o meio urbano. Durante muitos anos expandiu e aprofundou a sua campanha, colaborando em jornais e revistas e editando opúsculos, defendendo a existência de uma agricultura urbana nas cidades já existentes e interessando-se ainda pela promoção e “empoderamento” das mulheres no seio das sociedades, bem como pela erradicação da pobreza por meio do livre acesso à terra e à agricultura. Em 1964, após o advento da ditadura militar no Brasil, as condições para desenvolver o seu trabalho tornam-se mais difíceis, sendo-lhe vedada, em virtude da censura militar, a colaboração em periódicos. Aproveita para viajar bastante pelo Brasil, visitando comunidades agrícolas comunitaristas e universidades várias. Na Baía, fica amigo do filósofo Agostinho da Silva, com o qual se corresponderá posteriormente. Em 1971, regressa a Portugal. Inicia colaboração em periódicos regionais como o Diário de Notícias, o Eco do Funchal e o Templário, iniciando depois do 25 de Abril uma colaboração semanal no Jornal da Madeira que durou vários anos. Colabora também em periódicos nacionais como o jornal A Batalha e a revista Singularidades. No Funchal, expõe gravuras e modelos visuais relativos às suas propostas em hotéis e locais privados, sendo entrevistado pelo Diário de Notícias. Corresponde-se igualmente com personalidades como o filósofo Agostinho da Silva, o arquiteto urbanista Gonçalo Ribeiro Teles, o urbanista canadiano Louis Antoine Dernui e o ex-presidente da Assembleia da República António de Almeida Santos. Com o intuito de aprofundar e divulgar as suas ideias, viaja pelo mundo, percorrendo a Espanha, a Alemanha, os EUA e o Canadá, onde participa em simpósios e grupos de trabalho e de estudo, visita correspondentes e consulta arquivos e bibliotecas. Na sua atividade cívica foi ainda membro fundador do extinto Partido da Solidariedade Nacional e membro da Federação Mundial de Estudos do Futuro (WFSF). Cessando a sua colaboração regular no Jornal da Madeira em finais dos anos 90, continua a estudar, pesquisar e escrever sobre um novo modelo de cidade e sobre o futuro da civilização até à sua morte, deixando uma obra extensa, em grande parte inédita. Morreu no Funchal, a 15 de dezembro de 2009. O seu espólio e acervo foram entregues ao Arquivo Regional da Madeira em 3 de fevereiro de 2010.   Miguel Santos (atualizado a 09.12.2017)

Personalidades

souza, ernesto wenceslau de (e. tarolo)

Ernesto Wenceslau de Souza nasceu no Funchal a 28 de setembro de 1879. Tipógrafo de profissão, colaborou em diversa imprensa regional como nos títulos Cruz, Esperança, Voz do Operário e Direito. Escreveu o Poema Anti-Puniceo, obra publicada no Funchal, em 1904, que dedicou ao poeta madeirense Alfredo França e que continha poemas de temática essencialmente amorosa, selecionando um destinatário feminino, como se percebe por alguns dos títulos como “Às almas puras”, “À minha noiva”, “A uma rapariga do campo”, “Resposta da minha vizinha” ou “A uma rapariga morena”. Utilizava uma linguagem simples, embora com recurso a estereótipos frequentes na época. As estrofes são sobretudo quadras e quintilhas e os versos decassilábicos. O seu protagonismo no universo da cultura madeirense atinge o seu auge ao assumir a responsabilidade editorial do jornal A Pátria, hebdomadário literário publicado nos anos de 1906 e 1907, com uma breve interrupção no início deste ano. Assim, comprometia-se, no primeiro editorial, de 15 de abril de 1906, intitulado “A Pátria”, a desenvolver o meio acanhado da literatura na Madeira, e exaltava, em simultâneo, a singularidade da “Pérola do Oceano”, “ninho de amores e fonte de poesia, que certamente não terá rival, tanto no clima como na sua população, que é meiga e dócil” (A Pátria, 15 abr. 1906, 1). Este jornal literário pretendia igualmente concretizar o objetivo de dar voz aos que se iniciavam nos caminhos da literatura e, por outro lado, prestar tributo aos que se destacavam nas letras, nomeadamente a escritoras madeirenses. É visível também o propósito de divulgação cultural e literária, evidenciado através de artigos sobre personalidades culturais de índole nacional e não apenas madeirense, bem como de textos de reflexão sobre temas como a educação. Ernesto Wenceslau de Souza assinava frequentemente os seus trabalhos como E. Tarolo, nome pelo qual ficou conhecido no âmbito da sua intervenção literária e cultural. Faleceu no Hospício da Princesa D. Amélia a 25 de dezembro de 1913.   Obras de Ernesto Wenceslau de Souza: Poema Anti-Puniceo, (1904).   Carla Ferreira (atualizado a 09.12.2017)

Personalidades

fischer, sebastian

Sebastian Fischer foi um médico de clínica geral e investigador científico que viveu algum tempo na Madeira, durante o séc. XIX  e realizou estudos sobre o arquipélago madeirense na área da zoologia. Nasceu a 10 de novembro de 1806, em Munique, onde veio a falecer, a 8 de outubro de 1871. Em 1846, casou-se com Augusta Mulzer, que faleceu em janeiro de 1849. Em abril desse mesmo ano casou-se, em segundas núpcias, com Johanna Behse. Teve seis filhos, um do primeiro casamento e cinco do segundo enlace, dois dos quais sobreviveram apenas alguns meses. Após terminar os estudos, em 1830, na Univ. Ludwig-Maximilian, em Munique, foi para o Egito, onde permaneceu cerca de 10 anos. Durante esse tempo, esteve a trabalhar como médico de regimento no Exército egípcio, tendo participado, em 1835-1836, como chefe dos serviços de saúde, na expedição egípcia contra Hejaz. Foi ainda professor de Anatomia e Cirurgia na escola de medicina de Abu-Zabel. Foi nomeado chefe do corpo médico do exército e exerceu, até 1841, o cargo de diretor do Hospital Central Militar em Kasr El-Aini. De 1843 a 1853, em São Petersburgo, assumiu as funções de médico particular de Maximilian Eugen Joseph Napoleon, duque de Leuchtenberg (1806-1852). Sebastian Fischer acompanhou o duque em quase todas as suas viagens, durante o tempo em que esteve ao seu serviço. Foi numa dessas jornadas, em 1849, que o médico bávaro chegou à Madeira, Ilha que o duque procurara para fins terapêuticos. A fragata da marinha russa Kamtchatka fundeou no Funchal no dia 23 de agosto, mas os passageiros só puderam desembarcar quatro dias depois, devido a o navio ter estado de quarentena (SILVA e MENESES, 1998, 234-235). Na Madeira, S. Fischer permaneceu até 1850 e, como cientista especializado em entomostráceos (uma subclasse dos crustáceos de corpo mole e geralmente parasitas, que inclui os copépodes, as pulgas-de-água, os ostracodes, os trilobites, as cracas e os percebes), realizou investigações na área da zoologia, publicando depois o livro Ueber Entomostraken Madeiras (Munique) e o estudo “Beiträge zur Kenntniss der Entomostraceen”, em Abhandlungen der Mathematisch-Physikatischen Classe der Königlich Bayerischen Akademie der Wissenschaften (Munique). Após a morte do duque, em 1853, Fischer voltou para Munique, onde viveu até ao final da sua vida, dedicando o seu tempo à medicina e às investigações sobre os entomostráceos, tendo sido nomeadas em sua honra as espécies Paradoxostoma fischeri (descrita por Sars em 1866), Loxocorniculum fischeri (descrita por Brady em 1869) e Cypris fischeri (descrita por Lilljeborg em 1883). S. Fischer foi membro da Imperial Society of Naturalists of Moscow; da Academy of Sciences of St. Petersburg, membro correspondente da Royal Bavarian Academy of Sciences e da Royal Bavarian Botanical Society. Entre as suas contribuições para a ciência incluem-se a descrição de 1 novo género (Paradoxostoma Fischer, 1855) e de 31 novas espécies. Da sua vasta bibliografia fazem parte vários estudos científicos, publicados em revistas especializadas e em volume. Obras de Sebastian Fischer: Ueber Entomostraken Madeiras (1855); “Beiträge zur Kenntniss der Entomostraceen” (1860).     Sílvia Gomes (atualizado a 07.12.2017)

Personalidades Biologia Terrestre Ciências da Saúde

modelo regional de organização das escolas de ensino não superior

Buscar a origem da vontade regional em afirmar um modelo próprio de organização de escolas é assistir à implementação do dec.-lei n.º 115-A/98, de 4 de maio (que aprovou, ao tempo, o modelo estatal de autonomia, administração e gestão das escolas de ensino não superior), mas sobretudo constatar que esta ocorre num momento crucial que decorre das revisões da Constituição da República Portuguesa (CRP), que vieram crescentemente alargar o âmbito das competências das regiões autónomas portuguesas. Foram elas, sobretudo, a revisão constitucional de 1989, na qual houve a preocupação de aprofundar os poderes legislativos regionais, admitindo-se mesmo a possibilidade de as leis regionais não terem de respeitar as leis gerais da República (através do instituto das autorizações legislativas regionais), e a revisão constitucional de 1997, mais importante, com o crescimento da autonomia regional através da inclusão, no texto constitucional, das matérias de interesse específico regional, bem como a clarificação do exercício de algumas das suas competências; isto além da articulação das leis regionais com os princípios fundamentais das leis gerais da República. Mas também se poderá aditar uma “convicção [política], crescentemente assumida na Madeira e na área da Educação, em aprofundar, consequência dos 20 anos de experiência do decreto-lei n.º 364/79 e das matérias transferidas nesta área” (ALVES, 2012, 150), uma vontade, sobretudo de política educativa regional, que cresce e se afirma de forma inelutável. O marco relevante para compreender este impulso radica no desp. n.º 29/98, de 4 de junho, do secretário regional de Educação. Este despacho determina, tendo como norma habilitante o dec.-lei n.º 364/79 e a consagração competencial regional na supervisão da área organizativa e do funcionamento das escolas, manter o regime de funcionamento das escolas da Madeira constante do instrumento legal anterior ao dec.-lei n.º 115-A/98; i.e., condicionando a aplicação deste decreto do Estado ao território da Madeira, que se continuará a reger, assim, ao nível do funcionamento das escolas, pelo dec.-lei n.º 769-A/76, enquanto não for publicado um modelo regional de organização e funcionamento das escolas. De resto, esta convicção assumida no citado despacho alicerça-se no programa do VII Governo regional da Madeira (GRM), com mandato entre 1997 e 2000, que, na área da educação, dispunha como objetivo: “Assegurar, em termos jurídico-legislativos, a introdução a nível regional, de novos mecanismos de gestão e administração escolar” (Programa do VII Governo Regional, 1997-2000, 14). Todo este processo de vontade de não aplicar o modelo do Estado (dec.-lei n.º 115-A/98) à organização e ao funcionamento das escolas da Madeira por, em contraposição, se pretender ensaiar as competências constitucionais e legais ao dispor da Região tem como marco deveras assinalável o envio da proposta de decreto legislativo regional, pelo GRM (resolução n.º 1159/98, aprovada em plenário do GRM, de 7 de setembro de 1998), para a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira (ALRAM), em virtude de este ser um ato de natureza legislativa, e para este poder ser aprovado nos termos do arts. 227.º, n.º 1, al. a) e 228.º, al. o) da CRP, conjugados com o art. 37.º do Estatuto Político-administrativo definitivo da Madeira (lei n.º 130/99, de 21 de agosto). Após conveniente tramitação parlamentar, a referida proposta veio a ser aprovada e publicada como dec. leg. regional n.º 4/2000/M, de 31 de janeiro, detendo a designação de “Regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos de educação e de ensino públicos da Região Autónoma da Madeira”, marcando aquilo que se poderá considerar, definitivamente, como a consagração de um modelo regional de organização das escolas da Madeira. O regime previsto neste decreto legislativo viria, no entanto, a ter uma aplicação, nas escolas da Madeira, não imediata nem simultânea, dado o momento da sua entrada em vigor (o ano letivo já se encontrava a decorrer), e fundamentalmente pelo facto de o decreto ter ficado, desde a sua aprovação, condicionado pelo pedido de fiscalização sucessiva abstrata de algumas das suas normas (solicitado pelo ministro da República, que terá mesmo vetado o decreto legislativo, aprovado inicialmente em sessão plenária da ALRAM de 28 de julho de 1999). Na realidade, tendo o ministro da República de assinar por força constitucional (art. 233.º da CP) – já que o mesmo foi reconfirmado na íntegra por maioria absoluta dos deputados em funções –, este recorreu às suas competências constitucionais e suscitou a fiscalização sucessiva abstrata junto do Tribunal Constitucional (TC). Por determinação administrativa, através do desp. n.º 26/2000, do secretário regional de Educação, de 25 de maio (difundido junto das escolas da Madeira através de ofício circular da Direção Regional de Administração e Pessoal, da Secretaria Regional de Educação, n.º 21/2000, de 29 de maio de 2000), foi mandado aplicar o modelo regional, exclusivamente no ano escolar 2000/2001, apenas a duas escolas, as escolas básicas dos 2.º e 3.º ciclos do Caniçal e do 3.º ciclo do Funchal (extinta), e mantido o regime de prorrogação da experiência pedagógica (na altura ao abrigo do dec.-lei n.º 172/91, de 10 de maio) da Escola Secundária de Francisco Franco, permanecendo as restantes escolas abrangidas pelo regime constante do dec.-lei n.º 769-A/76, de 23 de outubro. Acresce, todavia, que a aplicação plena do regime constante do dec. leg. regional n.º 4/2000/M viria também a ficar limitada, no ano seguinte, pelo atraso nas tomadas de posse dos membros dos órgãos de gestão das escolas, o que motivou uma determinação administrativa em prorrogar, por desp. n.º 30/2001, de 22 de agosto (do subsequente secretário regional de Educação, do VIII GRM – 2000-2004), até à tomada de posse dos novos membros dos órgãos de gestão das escolas, os mandatos dos seus atuais membros e o respetivo regime legal de funcionamento das escolas, que se regiam, como se viu, pelo dec.-lei n.º 769-A/76. Marcado por todo este circunstancialismo, o dec. leg. regional n.º 4/2000/M acabou por surgir na sua plenitude a partir do ano escolar de 2001/2002 (ainda que na pendência da assinalada fiscalização sucessiva de constitucionalidade junto do TC) como afirmação plena das competências estatutárias da Madeira, na área da educação e, simultaneamente, como vontade de implementar um modelo regional que, não escondendo a sua referência ao modelo do Estado, fosse no entanto diferente e adequado à realidade regional. Pelo ac. n.º 161/2003 – proc. n.º 64/2000, de 6 de maio de 2003 –, o TC viria a concluir (no contexto do pedido de fiscalização sucessiva) que, apesar de os poderes das regiões autónomas integrarem o poder de desenvolver as leis de bases, em função do interesse específico das regiões em matérias não reservadas à competência da Assembleia da República (AR), a Lei de Bases do Sistema de Ensino estaria, todavia, na reserva absoluta de competência desta Assembleia do Estado (art. 164.º, al. i), da CRP). Com efeito, apesar de a revisão constitucional de 1989 ter reconhecido poderes muito amplos às regiões autónomas, no sentido do desenvolvimento de leis de bases da AR, entendia o TC que a competência para desenvolver a Lei de Bases do Sistema Educativo caberia em exclusivo ao Governo da República (GRe). Assim, e nesta matéria, declarou o TC que os poderes legislativos das regiões autónomas estariam particularmente limitados ao ser atribuído ao GRe o exclusivo do desenvolvimento da Lei de Bases do Sistema Educativo, nos termos do preceituado no art. 198.º, n.º 1, al. c), da CRP. Acresce ainda que o próprio dec.-lei n.º 115-A/98 (art. 13.º) se assumia para valer como lei geral da República, prescrevendo mesmo a sua aplicação territorial às regiões autónomas. Nesta decorrência, o TC acabaria, por fim, por se pronunciar pela desconformidade de algumas das normas do dec. leg. regional n.º 4/2000/M, fundamentalmente da fórmula de recrutamento dos então designados direção executiva ou diretor mediante procedimento concursal a decorrer na escola (e não eleição), e impor que o mesmo fosse alterado por contrariar a CRP. Perante esta decisão do TC, de imediato se ensaiou a necessária aprovação da alteração ao dec. leg. regional n.º 4/2000/M, de novo sob o impulso do GRM (resolução n.º 998/2005, aprovada em plenário do GRM, de 14 de julho de 2005). Concomitantemente, a ALRAM viria a aprovar, em sessão plenária de 22 de março de 2006, aquilo que seria o dec. leg. regional n.º 21/2006/M, de 21 de julho, que veio alterar o dec. leg. regional n.º 4/2000/M, tendo aqui como normativos habilitantes os arts. 227.º, n.º 1, alínea a), e n.º 4, conjugados com os arts. 37.º e 81.º, do Estatuto Político-administrativo definitivo da Madeira e no desenvolvimento da Lei Bases do Sistema Educativo. Contudo, o representante da República (por força da revisão constitucional de 2004, substituto constitucional do ministro da República) suscitou a apreciação do diploma através da fiscalização preventiva da constitucionalidade, por entender que a Madeira estaria ainda persistindo em diferenças, no regime de funcionamento e organização, que seriam introduzidas no modelo de organização e funcionamento das escolas. Aspetos que conflituariam agora com as suas competências constitucionais e com a unidade do sistema nacional. Isto, curiosamente, apesar de, ao contrário do que acontecia no quadro constitucional anterior, com a assinalada revisão de 2004, a AL, por força do disposto no art. 227.º, n.º 1, al. c), da CRP, passar a dispor de competência para “desenvolver para o âmbito regional os princípios ou bases gerais dos regimes jurídicos, contidos em lei que a eles se circunscrevam”, mesmo quando, como na situação em apreço, tais bases do sistema de ensino se inscrevam no âmbito da reserva absoluta de competência legislativa da AR. Não obstante a evolução de competências das regiões, aberta pela revisão da Constituição de 2004, e a possibilidade de a Madeira ensaiar uma iniciativa legislativa regional numa área antes reservada ao GRe (por força da já assinalada reserva absoluta do Estado – Lei de Bases do Ensino), bem como a convicção clara do TC de que a “[…] razão pela qual o juízo a proferir pelo Tribunal Constitucional sobre a questão que agora lhe é submetida haverá de confrontar-se com um quadro jurídico-normativo substancialmente distinto daquele que vigorava aquando da aprovação do Acórdão n.º 161/2003” (ac. n.º 262/2006, proc. n.º 358/2006 do TC, DR, I Série-A, n.º 107, 2 de junho de 2006, p. 3685); ainda assim, aquele Tribunal considerou que a proposta de alteração do dec. leg. regional n.º 4/2000/M continha normas, concretamente o caso do recrutamento do órgão de gestão (direção executiva/diretor, renomeado posteriormente como conselho executivo/diretor), contrárias à própria Lei de Bases do Sistema Educativo, com a qual se deveria conformar, na medida em que esta, no seu entender, exige a eleição democrática dos órgãos que asseguram a direção das escolas. Não se pode deixar de referir que este acórdão foi aprovado com algumas declarações de voto vencido (não concordância) de alguns do seus juízes conselheiros, entre eles Benjamim Rodrigues, que era favorável à proposta de decreto legislativo regional apresentada, pois no seu entender: “É que não conseguimos descortinar ­– mesmo aceitando, por inteiro, um dos pressupostos de que parte o acórdão, de que ‘bases’ correspondem às ‘opções político-legislativas fundamentais respeitantes à matéria’ do sistema de ensino –, que as normas em questão contrariem as ‘bases do sistema de ensino’, definidas pela referida LBSE, no que aqui importa, ouse seja, ‘as bases’ relativas à ‘administração do sistema de ensino’ e à ‘administração e gestão dos estabelecimentos de educação e ensino’ [arts. 46.º e 48.º]” (ac. n.º 262/2006, p. 3694). Sobre o papel do TC na dimensão regional do modelo regional de autonomia, administração e gestão escolar, assistem-se a duas intervenções jurisprudenciais, ambas incidindo sobre o modelo, mas descortinando neste apenas aspetos que não o comprometem na sua integralidade, nem mesmo aquilo que consideramos a sua matricialidade, quedando-se fundamentalmente sobre a forma de escolha do órgão de gestão. Porém, esta conclusão merece contestação, pois parece discutível não só poder concluir-se por esta desconformidade, tout court, face à Lei de Bases, como caracterizar esta suposta desconformidade como tratando-se de uma matéria de natureza de inconstitucionalidade per se. De facto, o TC entendeu que haveria uma desconformidade da legislação regional, não por contrariedade ao desenho legal fixado na Lei de Bases (único parâmetro conformador, como se viu, após a revisão de 2004), mas por não conformação à lei nacional, ao tomar como parâmetro referencial o dec.-lei n.º 115-A/98. Acontece que ao adotar esta opção interpretativa, e discutível, acabou o TC por neutralizar a competência constitucional da RAM para desenvolver a Lei de Bases do Sistema Educativo. Além disso, o TC, ao tomar como referência conformadora o citado dec.-lei n.º 115-A/98, criou mesmo, ao arrepio da CRP, uma nova categoria de leis reforçadas, indo além do art. 112.º, n.º 3, in fine, da CRP. Ora, a ser assim, trata-se aqui de introduzir nesta lógica de pensamento jurídico, do TC, o fenómeno típico dos ordenamentos jurídicos federais: a preempção, ainda que não aplicável em Portugal, figura em virtude da configuração constitucional de Estado unitário, com regiões. Em síntese, esta análise coloca em evidência o sentido restrito que o TC em Portugal tem tido em matéria de repartição constitucional de competências, entre o Estado e a RAM, na área da administração educacional, procurando contornos restritivos que a arquitetura jurídica, saída da revisão de 2004, claramente não coloca. No início do séc. XXI, vigora no espaço continental português, no âmbito da autonomia e administração das escolas, um modelo nacional criado com a publicação do dec.-lei n.º 75/2008, de 22 de abril (subsequentemente alterado, ainda que pontualmente, pelos decs.-lei n.os 224/2009, de 11 de setembro, e 137/2012, de 2 de julho). Este diploma nacional assume-se como aprovando um novo regime nacional de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos. São definidos, no preâmbulo do dec.-lei n.º 75/2008, objetivos estratégicos que suportam as mudanças que se pretendem implementar: “reforçar a participação das famílias e comunidades” na direção estratégica dos estabelecimentos de ensino; “reforçar a liderança das escolas” e “reforçar a autonomia das escolas”. Neste sentido, propõe-se que a obtenção desses objetivos será conseguida por via de alterações a introduzir na organização e gestão das escolas através de: aumento da representação parental e comunitária, no órgão de direção estratégica (posteriormente denominado conselho geral (CG)); ampliação dos poderes deste órgão, em especial no que respeita à eleição do diretor e à supervisão da sua atividade de gestão; criação do cargo de diretor, o seu recrutamento por via de um procedimento concursal e o reforço dos seus poderes (presidência por inerência do conselho pedagógico, faculdade de designar os responsáveis pelas estruturas de gestão intermédia); ampliação da margem de manobra das escolas na definição da sua organização interna, em função da especificidade do serviço de educação que prestam. No essencial é absolutamente paramétrico, e não deixa de ser característica que marca especialmente este novo modelo, aquilo que diz respeito ao órgão de gestão da escola: o diretor. A opção por esta figura, que se caracteriza não só pelo facto de não se prever sequer a possibilidade de aquele órgão ser colegial, por opção da escola (como em todos os modelos anteriores e como no modelo regional da Madeira previsto no dec. leg. regional n.º 4/2000/M, de 31 de janeiro, alterado pelo dec. leg. regional n.º 21/2006/M, de 21 de julho), passando a ser de imposição unipessoal (pela primeira vez desde o 25 de Abril, quiçá repristinando, apesar de impropriamente, a célebre figura dos diretores das escolas do Estado Novo), como na forma de o seu recrutamento assentar num procedimento concursal desencadeado pelo CG (art.º 22.º), a que se segue um procedimento eletivo (art.º 23.º). Ora, no essencial e na forma de recrutamento, não pode deixar de mencionar-se a clara aproximação que se introduz neste modelo estatal face ao modelo regional da Madeira (constante da versão inicial do dec. leg. regional n.º 4/2000/M e sem a alteração que este viria a sofrer pelo dec. leg. regional n.º 21/2006/M, consequência das decisões do TC). Isto porque a forma de recrutamento que o dec.-lei n.º 75/2008 vem introduzir assenta num procedimento concursal conduzido pelo CG (art.º 22.º n.os 3-5), sendo em tudo semelhante àquele que o dec. leg. regional n.º 4/2000/M (mencionada versão inicial) previa em processo conduzido pelo Conselho da Comunidade Educativa (art.º 17.ºss.). De resto, e a este propósito, não pode aqui deixar de se acompanhar João Barroso, ao questionar-se até a “legalidade deste procedimento” (BARROSO, 2008, 7) a propósito do dec.-lei n.º 75/2008, face à Lei de Bases do Sistema Educativo, quando a mesma, no âmbito do dec. leg. regional n.º 4/2000/M, foi considerada contrária a esta Lei de Bases tendo em conta os fundamentos antes destacados, sobretudo do ac. n.º 262/2006 do TC. Realizando finalmente uma análise morfológica, merecem destaque, no modelo regional: o órgão de gestão, inicialmente designado por direção executiva e dependente de “provas de mérito” (recrutamento através de procedimento concursal interno na escola – isto na versão original constante do dec. leg. regional n.º 4/2000/M), e subsequentemente a escolha deste mesmo órgão, já designado por conselho executivo, mediante eleições a cujo mandato os docentes da escola se candidatam por lista junto de toda comunidade escolar (isto na versão do dec. leg. regional n.º 21/2006/M); a realidade dos agrupamentos de escolas (não aplicável na Madeira, ao contrário do modelo nacional); os contratos de autonomia (sem existência regional) e o âmbito de aplicação do próprio modelo (aplicável na Madeira apenas a escolas dos 2.º e 3.º ciclos, e do secundário). Tudo aspetos que convergem claramente no sentido de poder afirmar-se que estamos, de facto, perante características matriciais fundamentais no modelo da Madeira, que se distinguem, globalmente, do regime estatal. Tudo isto é potenciado pelas realidades existentes nesta Região ao nível dos quadros jurídicos de pessoal docente, que existem por escola e por zona pedagógica, contrariamente ao continente, em que existem por agrupamento. Ainda, o permitir-se que para o desempenho das funções de direção escolar releve, não apenas a qualificação académica específica, como também, e em igualdade, o anterior desempenho destas funções por um mandato diretivo completo, sempre com a obrigatoriedade de os docentes serem do quadro da própria escola a que se candidatam (ao contrário do modelo do Estado). Estes aspetos confluem, assim, enormemente no sentido de também aqui existir, e de forma reforçada, uma dimensão matricial regional própria. Em rigor, temos por convicção que, na Madeira, naquilo que à organização das escolas diz respeito, seguir um modelo regional idiossincraticamente vocacionado para a realidade regional permite à administração educativa ser conduzida no sentido de abordagens que, no limite, deverão abandonar (não caindo na mera declaração reformista do Estado) a tentação tecnocrática da visão do papel da escola e das suas relações com a administração, através de um diretor nos moldes descritos anteriormente pelo modelo estatal. Não obstante, parece-nos apesar de tudo que esta fórmula, assim concebida, tudo terá a ganhar se ficar aliada a uma política educativa regional que pressuponha uma nova estratégia no funcionamento das organizações escolares, considerando-as na dimensão que Erhard Friedberg entende, como sistemas de ação concreta, e em cujas lógicas de funcionamento interno as escolas se apresentem na posse de plenas capacidades de perceção e realinhamento em relação à intervenção normativista da administração educacional.     J. Eduardo M. Alves (atualizado a 30.07.2017)

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