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andrade, maria lucinda de sousa

Maria Lucinda de Sousa Andrade nasceu no sítio das Feiteiras de Cima, freguesia e concelho de São Vicente, na costa Norte da Ilha da Madeira a 10 de março de 1903. Filha de João Francisco de Andrade e de Dª. Amélia Carolina de Sousa, foi batizada na igreja matriz desta freguesia a 24 de março do mesmo ano sendo seus padrinhos seu tio materno Carlos João de Sousa e Nossa Senhora, (segundo prática habitual no seio da religião católica em que é possível consagrar uma criança a uma figura do culto católico no momento do batismo ou por falta de um dos padrinhos ou por vontade dos pais). O casal teve outras duas filhas, Maria Pia (n. 22.06.1900) e Teresa (n. 09.02.1908) sendo Lucinda a filha do meio e, segundo relatos, em São Vicente as três irmãs eram conhecidas quando solteiras como “as meninas Andrade”, sendo que Lucinda Andrade nunca viria a contrair matrimónio. Após terminar o ensino básico no ensino particular, rumou à capital madeirense onde completou o sétimo ano do Curso dos Liceus no Liceu Nacional do Funchal e na década de 30, com vista a prosseguir uma carreira no ensino, terá frequentado um curso de Pedagogia em Lisboa no Liceu de Pedro Nunes, segundo uma notícia publicada no Jornal da Madeira aquando da sua morte (Jornal da Madeira, 13.10.2000), embora no decurso desta investigação tenha surgido também a hipótese de haver frequentado a Escola Pedagógica João de Deus, não nos foi possível confirmar nenhuma das hipóteses sendo que certo é que ambas as instituições eram então estruturas vocacionadas para a formação de professores. Mais tarde, de volta ao Funchal, iniciou a sua carreira docente e em 1943 regressou à freguesia de São Vicente, de onde, exceto em viagem, não voltaria a sair, dedicando-se ao ensino – atividade que exerceria durante toda a sua vida. Considerada a “mãe” do ensino secundário no concelho de São Vicente, a vida de Lucinda Andrade está intimamente ligada à evolução do ensino nesta localidade, pois até meados da década de 60, em São Vicente, o ensino era ministrado em regime de ensino particular por professores em suas residências, sendo que Lucinda Andrade ensinava já matérias do nível secundário e chegou a preparar na sua residência uma divisão para o efeito, onde em “mesas estreitas e bancos corridos”, ensinava Inglês, Português, Matemática, Desenho e Físico-química sendo a sua área de eleição o Francês, em que era considerada “excelente”, preparando os alunos ditos “auto-propostos” para os exames de 2º e 5º ano do Liceu. Tendo em conta que os dados estatísticos revelam que na primeira metade do século XX o analfabetismo na RAM ascendia aos 70%, valor que só minguaria para os 33% a partir da década de 60 após a criação do Plano de Educação Popular e da Campanha Nacional de Educação de Adultos em 1952, pode-se associar a crescente alfabetização da população do Norte da ilha da Madeira, e em especial no concelho de São Vicente, à enérgica ação de Lucinda Andrade assumindo esta o papel de grande impulsionadora do ensino neste concelho, que a agraciou por seus méritos em 1983 com a sua Medalha Municipal (Id., Ibid ,.). Em 1964, aquando da criação do Externato São Vicente, no sítio das Casas Novas, fez parte do corpo docente inicial desta instituição de ensino vocacionada para o ensino do 1º e 2º ciclo do ensino Liceal, com capacidade para 80 alunos de ambos os sexos – algo pouco habitual na época – e que se manteria em regime de ensino particular até 1988, ano em que, por se considerar “ser necessário proceder à criação do Ensino preparatório e Secundário oficial nesta Vila [de São Vicente] (…), foi criada a Escola Preparatória e Secundária de São Vicente; que entrou em funcionamento no ano letivo de 1988-1989”. Ainda no ano de 1988, por deliberação do Conselho de Governo e assente no Ofício – Circular nº 189/4.0.1/88, atribuiu-se à nova entidade escolar a denominação de Escola Preparatória e Secundária Dona Lucinda Andrade, como forma de homenagear a professora que “dedicou toda a sua vida ao ensino, com espírito de abnegação invulgar e extraordinária competência e zelo.”, citando o documento supramencionado. As novas instalações da atual Escola Básica e Secundária Dona Lucinda Andrade foram inauguradas no sítio do Passo no dia 04 de outubro de 1993, em cerimónia que contou com a presença do então Presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim, do Secretário Regional da Educação, Francisco Santos e Gabriel Drummond, Presidente da Câmara Municipal de São Vicente e em que Lucinda Andrade teve a honra de destapar a placa ostentando o seu nome (fig.2). De referir que a atual escola comemora anualmente o Dia da Escola a 10 de março, data de nascimento de Lucinda Andrade. Fig. 2– Inauguração da Escola Básica e Secundária Dona Lucinda Andrade. 04.10.1993. Foto do arquivo pessoal de Teresa Silva Atendendo ao falecimento recente de Lucinda Andrade, bem como à escassez de material consultável onde se pudesse apoiar este texto, ele acabou por ser produzido com recurso, sobretudo, a testemunhos obtidos de antigos alunos, colegas de profissão, amigos e familiares que nos traçaram o perfil de uma mulher de personalidade forte, vivaz e determinada, ainda que reservada e pouco dada a contactos sociais tendo recebido as homenagens que lhe foram prestadas com “aparente modéstia”. Pioneira e empreendedora, terá sido das primeiras mulheres a conduzir um automóvel em São Vicente, era “muito culta”, amante da moda, cultivando um extremo cuidado com a sua imagem, sendo senhora de postura altiva e grande beleza física, “a sua maior relação era com os alunos”, segundo relatos, dizendo-se mesmo que “dava a vida pelos alunos”, atribuindo-se à sua paixão pela Educação o facto de não haver constituído família. Contudo, ainda segundo relatos a própria Lucinda Andrade terá comentado certa vez sobre o tema: “não calhou” [casar]. Faleceu na cidade do Funchal no dia 12 de outubro de 2000, aos 97 anos, vítima de acidente doméstico em sua residência de São Vicente. Isilda Quintal Fernandes     artigos relacionados silva, ângelo augusto da liceu / escola secundária jaime moniz moniz, jaime a obra das mães pela educação nacional na madeira

História da Educação Educação História Económica e Social

arquitetura popular na madeira

O termo "vernacular" terá sido usado pela primeira vez por Bernard Rudofsky, em 1964, no âmbito da exposição “Arquitetura sem arquitetos” realizada no Museu de Arte Moderna, de Nova Iorque. Neste roteiro vamos ao encontro de exemplos constitutivos desta expressão “popular” na Madeira, bem como das construções que se enquadram na tipologia tradicional, cujas técnicas foram apropriadas nalguns casos pelos arquitetos.      Núcleo arquitetónico dos Salgados O Sítio dos Salgados é tido como a primeira área habitada desta zona, apontando-se a mesma como sendo o berço da freguesia da Camacha. No entanto, neste sítio encontramos um conjunto de habitações que remetem para diversas épocas. As casas com telha-marselha, por exemplo, remetem para o século XX, provavelmente relacionado com o regresso de emigrantes. As suas características, segundo o arquiteto e investigador português Vítor Mestre, são largamente influenciadas pelas técnicas tradicionais. Aqui encontramos vários exemplos caracterizadores da arquitetura popular madeirense. Na parte de menor altitude da localidade, junto ao acesso pela Levada da Camacha, proveniente do Caniço, que terá sido a primeira via de ligação ao litoral, encontramos habitações datadas de períodos anteriores. Casa Elementar de dois pisos Estas casas correspondem a um modelo evolutivo das casas de um piso, sendo que um dos principais objetivos consiste no aproveitamento do desnível do terreno. No andar superior situam-se os aposentos, enquanto que no inferior encontram-se as "lojas", normalmente duas, reservadas para armazenamento dos produtos agrícolas. Repare-se ainda que o balcão de acesso à casa fica situado no piso superior, sendo o espaço aproveitado para a lida da casa. Cachorros de pedra Este elemento desempenha a função de suporte das varas da latada, presença característica na arquitetura popular. As latadas funcionavam como um prolongamento do espaço habitado, desenrolando-se aí algumas actividades relacionadas com a lida da casa. Provavelmente um espaço eminentemente feminino sendo também por esse motivo um espaço de ligação entre a casa e a horta ou campo agrícola, no qual as mulheres tinham papel ativo. A relação entre este espaço e a feminilidade representativa da cultura madeirense é reforçada nos casos em que a latada se encontra na zona mais discreta da casa, isto é, afastada das áreas de ligação ao mundo exterior da habitação, cuja presença masculina é muito mais notada que a feminina. A rocha como espaço funcional A perfuração da rocha para construção de grutas, ou furnas, como localmente são mais conhecidas, foi uma das primeiras formas de habitar na ilha. Provavelmente, com influencias do habitar guanche, povo canário, que terá sido trazido para a Madeira na condição de escravo. Paulatinamente abandonadas, foram no entanto recuperadas em períodos de crise, desenvolvendo-se o conceito até ao ponto em que eram edificadas fachadas com os elementos caracterizadores das casas. A continuação da evolução remeteu as grutas para espaços de despejo ou de apoio à habitação. Mas foram-lhe dadas outros usos, como abrigo de animais ou armazéns. Neste caso concreto, aproveitava-se o frio deste espaço para guardar mantimentos que requerem frio para evitar a deterioração dos mantimentos. Forno e Chaminé Nesta casa de dois pisos encontramos dois elementos presentes na arquitetura popular. Referimo-nos à chaminé e ao forno. Sobre este último, estamos na presença de um forno exterior com boca para o interior, colocado a um nível relativamente superior ao piso térreo, situação encontrada com alguma regularidade. Quanto às chaminés, tornaram-se mais esbeltas e ligeiras ao longo da sua evolução, apresentando forma retângular na maior parte dos casos. Por último, referência para os elementos decorativos na extremidade dos beirais. Estes elementos expressam o caráter supersticioso e religioso, associando-se estas representações ao desejo de proteção e de fertilidade. Influenciado por exemplos existentes no continente português adquiriram especificidade na Madeira, atingido expressões exuberantes no século XX. As “pombinhas” estarão associados ao Espírito Santo. Outro exemplo de iconografia animalista neste âmbito é a cabeça de cão ou outros animais. Casa elementar com telhado de palha Este tipo de casa (a casa elementar) é um dos paradigmas da arquitetura popular na Madeira, cujos modelos incorporam caraterísticas dos modelos de Portugal continental mas que ganharam especificidade no contexto insular madeirense, fruto das condições geográficas, climáticas e dos materiais disponíveis no meio natural. Esta é a tipologia mais comum na ilha da Madeira, podendo o telhado ser de palha ou de cerâmica, e as paredes serem em pedra ou em madeira. Por outro lado, a cozinha pode aparecer integrada no corpo principal ou num corpo à parte por motivos de segurança. Casa elementar de dois pisos com balcão As casas elementar de dois pisos podem apresentar caraterísticas distintivas quanto à volumetria do corpo. Observou-se relativamente a este aspecto duas formas diferentes, uma de cariz mais modesto, de aspeto sóbrio, enquanto que outras têm um aspeto pretensioso, com um maior equilíbrio nas proporções. Ganham relevância precisamente pela sua volumetria inserida na paisagem rural.   textos: César Rodrigues fotos: Rui A. Camacho

Arquitetura Património Rotas

igrejas e capelas erguidas pela força da fé

A Ordem de Cristo com o Infante D. Henrique como Grão Mestre teve um papel fundamental na expansão portuguesa. Um dos territórios descobertos por nobres pertencentes à casa do Infante foi o arquipélago da Madeira, que viria a tornar-se uma posse da Ordem de Cristo até D. Manuel se ter tornado rei de Portugal, em 1495. Mas a relação de grande proximidade à Igreja Católica Romana manteve-se ao longo dos séculos, cristalizando-se na paisagem através das igrejas e capelas, algumas das quais de cariz particular. Igreja Nova do Jardim da Serra A nova Igreja do Jardim da Serra, desenhada por Cunha Paredes, arquitecto português de origem madeirense, e inaugurada em 2009 tem invocação a São Tiago e constitui-se como símbolo da forte religiosidade católica da população e da melhoria das condições económicas que caracterizou nas últimas décadas a ilha da Madeira. A comparação das suas características e dimensão com as da anterior sede paroquial, situada bem próxima desta, é elucidativa. Capela da Mãe de Deus - Caniço A Capela da Mãe de Deus ou Madre de Deus, de traça manuelina, foi construída em 1536 e é um dos mais antigos templos marianos na Madeira. Integra-se num pequeno núcleo de construção mais antiga que se confronta com a construção mais recente que o rodeia, constituído por uma mercearia, e duas habitações particulares, que mantêm as características originais. Nas casas é possível observar a distinção das cores, o vermelho e o ocre, resultantes do facto de estes serem os únicos pigmentos disponíveis, mas também do facto de as cores carregarem o símbolo de classe ou de status social. O vermelho estava reservado para as casas senhoriais e mais abastadas. Observe-se ainda o banco em pedra, espaço de socialização e de lazer. Capela de São José - Largo da Achada, Camacha Foi mandada erigir por Alfredo Ferreira Nóbrega Júnior em 1924 e concluída em 1928, que pretendeu desde o início criar um espaço educativo de cariz religioso. Possui um altar-mor rico em ornamentação e bem conservado bem como uma obra de Martin Canan. O livro “Ao Redor de um Ideal”, de Eutíquio Fusciano, publicado com a chancela da Câmara Municipal de Santa Cruz, é um dos documentos que podem ser consultados. Igreja Paroquial da Camacha A construção deste imóvel dedicado ao culto católico data do século XVII. Trata-se de uma estrutura arquitectónica com planta longitudinal de nave única e capela-mor. Completam o conjunto uma torre sineira e duas capelas laterais. Como elemento decorativo destaca-se a tela do retábulo da capela-mor, ali colocado no ano de 1914 e com provável autoria dos Irmãos Bernes. Aquando da sua recuperação descobriu-se que a mesma tapava outra tela, a original, provavelmente da autoria de Nicolau Ferreira Igreja Paroquial da Achada de Gaula Uma das duas paróquias da freguesia de Gaula, denominada Achada de Gaula, encontra sede nesta igreja construída já no século XX. Tem por padroeira a Nossa Senhora da Graça. Das festividades que aqui ocorrem destaque-se a festa em honra da sua padroeira, realizada no primeiro fim-de-semana depois de 15 de Agosto. Em Janeiro realiza-se, desde há relativamente pouco tempo, a Festa de Santo Antão, padroeiro dos animais. Igreja de Santa Beatriz - Água de Pena Construída no ano de 1745, no local onde antes existia a Capela de Santa Beatriz, e a partir de onde segundo as crónicas, cresceu a freguesia. Foi mandada construir por Lançarote Teixeira, que lhe deu o nome da Santa Beatriz, por ser o mesmo de sua esposa. A fachada principal ostenta a cantaria regional, de basalto, e no cimo da mesma uma Cruz de Cristo. No último Domingo de Julho realiza-se uma festa popular em honra de Santa Beatriz e que tem nesta Igreja o seu epicentro. Igreja Paroquial do Porto da Cruz Sendo de construção recente (1958), a Igreja matriz alberga no seu interior alguns pormenores muito interessantes no que respeita ao património imaterial e móvel. No interior, observa-se um moderno lambril de azulejos padronados do prestigiado artista Querubim Lapa. O templo guarda ainda alguns elementos decorativos barrocos provenientes da antiga igreja de Nossa Senhora de Guadalupe. Uma Nossa Senhora de Guadalupe (séc. XVI ou XVII, em madeira policromada) e um Santo António (em terracota). Os quadros da Via-sacra são de autoria de João Gomes Lemos, de pseudónimo "Melos", médico natural da freguesia. É uma obra do Arquitecto Raul Chorão Ramalho.   textos: César Rodrigues fotos: Rui A. Camacho

História da Arte Religiões Rotas Madeira Cultural

do ouro branco e pela vinha às quintas

Desde o Século XV, a Madeira recebeu comerciantes e turistas de diversas nacionalidades. Pela Madeira passaram, por exemplo, comerciantes venezianos e flamengos no contexto do afamado período do “ouro branco” deixando a sua marca na toponímia da cidade do Funchal e no sobrenome de famílias madeirenses, mas a partir do século XVII, com a paulatina substituição da cultura do açúcar pela da vinha, os comerciantes britânicos tornaram-se a comunidade estrangeira mais importante no arquipélago. A influência desta comunidade manifestou-se em alguns de setores económicos e na edificação, entre as quais se contam as tão conhecidas quintas da Camacha e do Santo da Serra.     Quinta do Jardim da Serra Esta Quinta, construída no século XIX pelo Cônsul Inglês Henry Veitch, tem importância fulcral na história da própria freguesia. Foi o nome desta propriedade que deu origem à denominação da freguesia: Jardim da Serra. Adaptada em 2010 numa excelente unidade hoteleira, preserva um edifício com arquitetura tradicional. É ainda possível contactar com as práticas de agricultura biológica e alguns exemplares de flores madeirenses nos amplos jardins da propriedade. Realce para o facto da quinta ter sido fonte de inspiração para Max Römer, e estar representada numa gravura do século XIX, patente na reitoria da Universidade da Madeira, no Funchal. Quinta das Romeiras Esta quinta foi desenhada pelo conhecido arquiteto português Raul Lino e foi mandada construir pelo Drº Alberto Araújo, como residência de férias. Foi construída no ano de 1933, ano em que a 14 de Abril o Diário da Madeira noticiava que se estava “trabalhando afanosamente na construção de uma opulenta vivenda de campo, no sítio das Romeiras, desta freguesia, donde se desfruta um largo e aprazível panorama. O povo já a baptizou de Quinta dos Penedos”. A escritora Maria Lamas em 1956 descrevia assim seus jardins: “Do branco de neve ao salmão, ao carmesim, ao amarelo-oiro e ao roxo, passando por todas as escalas de tons - quem poderá imaginar, sem a ter visto, aquela sinfonia de cores?” Quinta do Vale Paraíso Constituída por um edifício principal, construído em meados do século XIX, e por outros 9 de dimensões mais reduzidas, transformadas em pequenas residências de férias, as quais mantêm de um modo geral o nome da sua função original. Este espaço oferece ainda amplos jardins compostos por plantas endémicas e exóticas pertencentes a cerca de 220 espécies. A partir desta quinta acedemos, através de uma vereda, à Levada da Serra do Faial. fonte: ariscaropatrimonio.wordpress.com Quinta do Revoredo Esta propriedade foi mandada construir por John Blandy, em 1840, que depois de conhecer a Madeira como marinheiro de um navio inglês nas guerras napoleónicas viria a tornar-se no mais importante homem de negócios da ilha e cuja família ainda é uma das mais influentes na Região. Hoje a quinta é propriedade da edilidade e é nela que se encontra a sede da orquestra filarmónica de Santa Cruz, sendo utilizada também como Casa da Cultura do município. Quinta de São Cristóvão Esta quinta com caraterísticas da arquitetura portuguesa, foi mandada construir em 1692 pelo morgado Cristóvão Moniz de Menezes e manteve-se como propriedade da família até que recentemente Carlos Cristóvão da Câmara Leme Escórcio de Bettencourt, sem descendentes, o cedeu ao Governo Regional da Madeira. Chegou a albergar o Conservatório de Música e actualmente funciona como casa do artista. Este solar está ainda relacionado com a Paróquia do Piquinho, uma vez que foi aqui erigida a Capela de São Cristóvão, a qual recebe em Maio a festa religiosa de São Cristóvão. Também aqui funcionou uma escola fundada pela irmã Mary Jane Wilson, entre 1904 e 1910.   Textos: César Rodrigues Fotos: Rui A. Camacho

Arquitetura Património História Económica e Social Rotas

museus

No arquipélago da Madeira, e particularmente na cidade do Funchal, os museus desenvolveram-se como resultado da investigação e da constituição de coleções científicas, saídas do espírito iluminista dos finais do séc. XVIII. A sua posição estratégica, entre os circuitos do Velho Mundo e os seus impérios coloniais, nas rotas de atravessamento do Atlântico fez com que se iniciassem investidas do domínio científico, sobretudo no âmbito das ciências naturais. Charles Darwin não esteve na Madeira, mas mandou lá um discípulo e incluiu várias espécies madeirenses nos seus trabalhos científicos. James Cook, por sua vez, esteve no arquipélago à procura de raridades botânicas, iniciado que estava na Europa um pensamento sistemático de cariz científico para conhecer a fauna e a flora. Do estudo e catalogação da natureza, partiu-se rapidamente para a sua recriação, procurando-se, num espaço confinado, reproduzi-la a partir do trabalho do homem. Nasciam assim, e tornavam-se cada vez mais comuns, os jardins botânicos. Já Hans Sloane (1660-1753), fundador do Museu Britânico, esteve na Madeira a caminho de expedições às Antilhas Inglesas. As expedições científicas tinham por objetivo a constituição de coleções, como são os casos do Museu Britânico, dos Kew Gardens, da Universidade de Cambridge e do Museu de História Natural de Paris. A Madeira funcionou muitas vezes como laboratório de experimentação das técnicas de estudo e recolha que foram aplicadas nas viagens feitas no Atlântico, no Índico e no Pacífico. Serviu também o arquipélago de espaço de aclimatação de plantas entre os hemisférios Sul e Norte, existindo até, desde finais do séc. XVIII, estudos para a criação de jardins com esse propósito. Até cerca de 1828, funcionou, na zona do Monte, um primeiro viveiro de plantas. Em 1850, o governador civil da Madeira, José Silvestre Ribeiro, lançou a ideia da criação de um gabinete de história natural, afirmando: “tomei sobre mim o empenho de dar começo ao estabelecimento de um museu, na cidade do Funchal, deixando ao tempo, ao zelo dos que me substituírem e à solicitude do ilustrado Governo de Sua Majestade e seu progressivo desenvolvimento. Em todos os países cultos, a fundação de Museus tem merecido aos governantes a mais desvelada atenção. É que estas instituições são livros abertos aos olhos da inteligência popular e o melhor meio de cultura científica e social” (SILVA, 2002, 72). Neste contexto, chegaram mesmo a ser disponibilizadas algumas salas do palácio de São Lourenço para a instalação provisória do museu, que acabou por ser desmontado com a saída do governador. Em 1852, Frederico Welwitsch propôs a criação de um jardim de aclimatação do Funchal. Uma recolha realizada na Madeira foi depois entregue ao herbário da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Em 1854, o barão de Castelo de Paiva desenvolvia na Madeira trabalhos de recolha científica, que resultou na doação de um herbário da Madeira e Porto Santo à Real Academia das Ciências. Já o documento elaborado por Frederico Welwitsch, sob o título Aforismos acerca da Fundação de Jardins de Aclimatação na Ilha da Madeira e em Angola, na África Austro-Ocidental, e entregue à Casa Real refere curiosamente que a existência de um bem organizado jardim, povoado com as mais vistosas produções da flora de todas as zonas, havia forçosamente de chamar para ali um avultado número de viajantes curiosos e aumentar consideravelmente a já não pequena concorrência de doentes, convidando uns e outros a uma maior demora naquela Ilha dos encantos: “parece a criação de um jardim de aclimatação, com as componentes modificações para ao mesmo tempo servir de passeio público, uma das mais eficazes providências que o governo de Sua Majestade atualmente podia dar para aquela Ilha, a fim de mitigar algum tempo tanto as tristes consequências da devastadora epífita que lá reina, bem como para evitar a futura repetição de semelhantes desastres, que mais cedo ou mais tarde sempre se deverá recear, se os madeirenses continuarem a basear exclusivamente, como até agora, todas as suas esperanças agrícolas sobre um só género de cultura” (VIEIRA, 1985, 102). Assim, ao longo do séc. XIX, foi-se acumulando experiência científica no ramo das ciências da natureza, transformando-se a Madeira num ponto estratégico no quadro da exploração mundial. Para além disso, a presença assídua da Madeira na rota das campanhas oceanográficas do príncipe Alberto do Mónaco, entre 1879 e 1912, parece ter também inspirado a atenção dada ao mar por D. Carlos I, Rei de Portugal. O padre alemão Ernesto João Schmitz, nascido em Rheydt, vice-reitor do Seminário do Funchal, fundou em 1882 um Museu de História Natural, conhecido como Museu do Seminário, reunindo, na sua qualidade de especialista em ornitologia, uma coleção notável da fauna madeirense. As coleções primeiramente organizadas por Schmitz foram depois completadas e aprofundadas por outros especialistas. Em 1908, o Museu passa a ser dirigido pelo então reitor do Seminário, Cón. Manuel Agostinho Barreto. Com a implantação da república, o Museu foi desmontado e transferido para casa própria no Lg. de Ribeiro Real. Esteve depois um tempo desativado até ter voltado, na déc. de 40 do séc. XX, ao Seminário da Encarnação, integrado, já na déc. de 80 do mesmo século, no Jardim Botânico do Funchal. Como são exemplo outras unidades surgidas com a República, foram criados pelo país museus escolares, como é o caso do Museu do Liceu do Funchal, a partir de coleções ligadas às ciências da natureza adquiridas em 1913 e 1914 por Alberto Artur Sarmento. A primeira experiência museológica fora das ciências da natureza que revela uma preocupação com a proteção do património construído é da Câmara Municipal do Funchal (CMF), em 1915, com o projeto de constituir um museu arqueológico no Convento de Santa Clara do Funchal, reunindo elementos arquitetónicos de demolições de edifícios históricos, como as armas do Convento de São Francisco do Funchal e várias inscrições epigráficas. Foi ainda revelada a intenção de esse Museu ser o fiel depositário do próprio espólio artístico do Convento de Santa Clara, que se encontrava praticamente ao abandono. No entanto, problemas relativos à tutela e direitos de outras instituições sobre o Convento não permitiram dar continuidade ao projeto. Outra ideia sem continuidade efetiva foi a do museu oceanográfico que a CMF, em 1920, queria instalar no edifício da Santa Casa da Misericórdia. Por deliberação da CMF, foi criado, em 1929, o Museu de Ciências Naturais, sob proposta de Adolfo César de Noronha (nomeado diretor da Biblioteca Municipal em 1928), só abrindo ao público em 1933, no palácio de São Pedro, antiga residência dos condes Carvalhal. Nasceu com a designação Museu Regional da Madeira, anexo à Biblioteca Municipal, tendo-se achado pertinente a existência de secções de arqueologia, arte e etnografia. A inexistência de outras unidades museológicas que desenvolvessem outros aspetos da história do arquipélago justificavam a presença das secções referidas. Em visita à instituição, Manuel Cayola Zagallo refere a sua insuficiência no que concerne à designação de “museu regional”, visto ser pouco abrangente noutros campos do conhecimento para além das ciências da natureza, afirmando a necessidade de ser rebatizado como Museu de História Natural, a sua verdadeira vocação. Por sugestão de Adão Nunes, em 1957, foi possível concretizar, no rés do chão do edifício, um aquário de água salgada, já com orientação técnica de Günther E. Maul, onde se apresentaram os mais importantes elementos da fauna marinha costeira da Madeira. Günther E. Maul, diretor do Museu entre 1943 e 1981, foi desenvolvendo a apresentação de animais montados, encontrando-se, em 2015, acessíveis ao público cerca de 78 espécies de peixe, 247 aves, 14 mamíferos terrestres e marítimos, 3 répteis marinhos, 152 insetos e outros invertebrados, assim como uma importante coleção de rochas e minerais do arquipélago, tais como fósseis marinhos do Porto Santo. Em 2015, as coleções atingem cerca de 37.500 exemplares. Permanecendo praticamente intacto desde a sua inauguração, este museu passou a ser, em termos de conceção museográfica, e apesar da reorganização do seu programa científico e orientação museológica, um importante exemplo da história da museologia portuguesa, mantendo o seu cariz oitocentista. É também de destacar o facto de ter sempre desenvolvido uma vertente de investigação científica, publicando desde 1945 o Boletim do Museu Municipal do Funchal e ainda, de forma não periódica, a revista Bocagiana, com a inscrição de novas espécies para a ciência dos vários arquipélagos atlânticos. A manutenção, desde o nascimento do Museu, de um sistema de permutas deu origem a uma importante biblioteca especializada. O Museu desenvolveu ainda uma importante ação educativa, com atividades ligadas à educação ambiental e divulgação científica que são desenvolvidas dentro do espaço museológico dos seus serviços de educação, mas também no exterior. O Museu seria integrado no departamento de ciência da CMF, assim como na Estação de Biologia Marinha, junto ao antigo cais do carvão, no Funchal. No campo das artes plásticas, história e arqueologia, sendo esparsas as preocupações das entidades governamentais e autárquicas, apesar de referidas em vários fóruns, a Madeira não conseguiu, até meados da segunda década do séc. XX, concretizar nenhuma instituição museológica com plena autonomia. No campo das artes plásticas era notória a existência de algumas coleções e do interesse por obras de arte dos colecionadores portugueses e de origem inglesa estabelecidos na Ilha. É exatamente por via de uma coleção privada, a de César Filipe Gomes, e da sua doação ao Estado, após a aquisição em 1946 da Qt. das Cruzes, que nascerá o primeiro museu de vocação próxima das artes decorativas. A inauguração do Museu da Quinta das Cruzes, quinta que, em 1947, havia sido classificada como imóvel de interesse público, só acontecerá em 1953, integrada nas comemorações oficiais do 28 de Maio. O processo de aquisição do imóvel não foi pacífico, tendo sido concluído apenas em 1948. No documento de doação de toda a coleção de obras de arte por parte de César Filipe Gomes, fica à responsabilidade da então Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal a criação do Museu de Artes Decorativas, com particular empenho do então presidente João Abel de Freitas. Já em 1955, João Couto refere: “Esta primorosa instituição cuja base foi a coleção do amador César Gomes, não tem deixado de ser enriquecida com peças adquiridas pela Junta Geral. A Madeira, graças aos seus atuais dirigentes, dignos herdeiros dos esforçados paladinos doutras felizes eras, passa agora um momento alto no que diz respeito à resolução dos seus difíceis problemas artísticos” (COUTO, 1955, 32). O Museu, desde a sua fundação até 1976, foi dirigido por comissões diretivas que dependiam diretamente da Junta Geral. A comissão que vigorou até 1973 era constituída por Rui Vieira, Frederico de Freitas e António Aragão Mendes Correia, que em 1970 publica o primeiro catálogo geral do Museu. São depois substituídos por Rui Carita, Álvaro Simões e Jorge Marques da Silva. Em 1976, Amândio de Sousa torna-se no seu primeiro diretor. A instalação do Museu de Artes Decorativas na Qt. das Cruzes não deixa de ter uma raiz simbólica, na medida em que se trata de uma das mais prestigiadas quintas madeirenses. A quinta madeirense liga-se ao conceito de quinta de recreio portuguesa, distribuindo-se por várias dependências, desde a casa grande, a capela, a casinha de prazer, o parque ajardinado e a pequena horta, que, a partir do séc. XVIII, foram pontuando sobretudo o anfiteatro da baía do Funchal. A designação “das cruzes” permanece incerta no tempo, aproximando-se das primitivas casas de João Gonçalves Zarco, 1.º capitão donatário do Funchal. Esta casa foi depois ampliada no tempo do seu filho, o 2.º capitão João Gonçalves da Câmara, ao mesmo tempo que se realizava obras na capela de Nossa Senhora da Conceição de Cima e construía o Convento de Santa Clara do Funchal. Ao longo dos séculos, foi sofrendo transformações importantes até que, em meados do séc. XVIII, deverá ter ganho a estrutura que se manteve. Em 1692, havia sido construída a capela de N.ª Sr.ª da Piedade, pela família Lomelino. A vocação de artes decorativas sempre marcou a coleção do Museu da Quinta das Cruzes, sendo que a designação “Museu da Quinta” procurava, de certa forma, apontar para um programa científico que visava enquadrar a ideia de quinta funchalense, das suas funcionalidades, espaços e equipamentos. A coleção, primeiro nascida do conjunto doado por César Gomes, refletia de certa forma o gosto dominante na Madeira da primeira metade do séc. XX. A primeira montagem da coleção ficará a dever-se essencialmente a Frederico de Freitas e a José Leite Monteiro, com a colaboração de Ângelo Silva, de Eduardo Pereira, de Basto Machado e de João Maria Henriques. Veja-se o que nos diz António Aragão: “Na realidade, os espaços das ‘casas das cruzes’ que através dos séculos serviram de moradia a variadas gerações, voltaram a ser compostos com objetos de uso doméstico, objetos esses, é claro, selecionados segundo um critério de qualidade e apresentação que os transferem de posição utilitária e doméstica para uma situação de objetos referenciáveis dentro duma outra escala de valores” (CORREIA, 1970, 46). Às coleções iniciais, juntaram-se, em 1966, as de ourivesaria europeia de João Wetzler, antiquário que residia na Madeira, havendo um importante esforço de aquisição sobretudo no mercado regional, e depois nacional, de obras de arte. Nas coleções, e dentro da sua variedade tipológica, deveremos destacar o conjunto de mobiliário português dos sécs. XVII-XVIII ao gosto madeirense, dito “caixa de açúcar”, realizado com madeiras exóticas, na sua maioria brasileiras. No mobiliário estrangeiro, o destaque vai para o mobiliário inglês dos sécs. XVIII-XIX, Chippendale, Hepplewhite, Sheraton, etc. Refiram-se ainda dois contadores indo-portugueses, produzidos em Goa em meados do séc. XVII, um outro da Índia Mogol, realizado no segundo quartel do séc. XVII, e um escritório Namban, japonês, de inícios do séc. XVII. Notáveis são também os dois contadores espanhóis ao gosto hispano-mourisco, dito Vargãnos, de meados do séc. XVII. Merece especial referência um conjunto de ourivesaria portuguesa religiosa e civil de meados do séc. XVI até ao séc. XVIII, com destaque para uma bandeja com pé, de inícios do séc. XVI, e um porta-paz do início do segundo quartel do mesmo século com a aplicação de cabochões de pedras preciosas. Na ourivesaria estrangeira, pode destacar-se uma taça com pé de Nuremberga, coberta, de meados do séc. XVI, uma salva de Augsburgo de finais do séc. XVII, outra de Amsterdão de meados do séc. XVII e um par de escravas saleiro em prata e ébano, do México, de meados do séc. XVII. No Museu, consta ainda um pequeno conjunto de jóias e objetos de adorno femininos e masculinos, originários da coleção de César Gomes. Trata-se de peças oriundas, na sua maioria, de oficinas europeias, com destaque especial para algumas obras portuguesas de meados do séc. XVIII, como minas de proveniência brasileira ou um par de brincos goeses de início do séc. XVII. O Museu possui também uma importante coleção de glíptica, com exemplares de entalhes romanos (séc. I d.C.) e modernos (sécs. XV e XVI), assim como camafeus desta última época. Integrada na exposição de joalharia, e montada num estojo de meados do séc. XVIII, encontra-se uma placa aberta a buril com a representação da Sagrada Família, assinada por um dos mais importantes artistas holandeses da segunda metade do séc. XVI, Henrick Goltzius (1558-1617). A cerâmica existente nas coleções divide-se em dois núcleos. O das faianças, maioritariamente portuguesas, dos sécs. XVII a XIX e um núcleo de porcelanas europeias e orientais. Estas últimas estão representadas por alguns exemplares da dinastia Ming e sobretudo da dinastia Qing, com peças de encomenda europeia, ditas da Companhia das Índias. Muito curiosa é a presença de um conjunto, serviço de chá, encomendado pelos lealistas franceses, com as silhuetas, dissimuladas em jogo ótico, do Rei Luís XVI, de Maria Antonieta e do delfim real, de finais do séc. XVIII. Na pintura, o Museu possui uma coleção eclética, com destaque especial para algumas pinturas de raiz romântica, maioritariamente inglesas, com vistas da baía do Funchal e da ilha da Madeira, assim como três pinturas de Tomás da Anunciação, das quais se destaca O Piquenique, onde se vê em primeiro plano a família do conde de Carvalhal na sua propriedade do Palheiro Ferreiro. Na coleção, encontramos ainda vários retratos do pintor Joaquim Leonardo da Rocha e uma pintura, rara na obra do artista, com a representação do forte da Pontinha. É ainda de destacar duas pequenas pinturas atribuídas a Jacques Callot (1692-1625) ou o retrato do marquês de Castelo Rodrigo, D. Francisco de Moura, de escola flamenga ou holandesa de meados do séc. XVII. Referência especial deve ter ainda a pintura da Virgem do Loreto, pintura a óleo sobre madeira que parece ser ainda uma cópia do séc. XVI, de Rafael. Na escultura, deve nomear-se especialmente um retábulo flamengo da cidade de Bruxelas do último quartel do séc. XV, em madeira de carvalho, assim como uma Virgem com o Menino, provavelmente da escola de Bruges, de finais do mesmo século. Deve aqui referir-se ainda uma coleção de figuras de presépios de barro datáveis de meados do séc. XVIII, algumas delas produzidas em oficinas regionais. Montadas em enquadramento romântico, em pleno jardim, estão algumas pedras significativas, provindas de demolições que tiveram lugar ao longo dos sécs. xix e xx no Funchal. Destaque-se a presença de duas janelas de recorte manuelino em cantaria basáltica, assim como parte do pelourinho da cidade do Funchal. Nos jardins do Museu está implantada uma cafetaria anexa a uma estrutura de apresentação de um orquestrofone, adquirido pelo visconde de Cacongo, João Rodrigues Leitão (1843-1925), na Exposição Mundial de Paris de 1900, e integrado nas coleções do Museu desde 1978. Em 2007, depois de devidamente restaurado, este foi apresentado ao público. O Museu de Arte Sacra do Funchal nasce de uma crescente preocupação das entidades civis e religiosas relativamente ao património artístico da ilha da Madeira depois da extinção das ordens religiosas a partir de 1834 e da revolução de 1910. Desde 1933 que se reuniram algumas peças da Sé em duas salas anexas, gesto que manifestou uma primeira preocupação com o património religioso. Em 1934, o conservador do palácio da Ajuda, Manuel Cayola Zagallo, com a colaboração das entidades locais e o entusiasmo de D. António Pereira Ribeiro, bispo do Funchal, realizou um primeiro levantamento da pintura flamenga da ilha da Madeira. Esta primeira abordagem constitui uma primeira consciência da qualidade e excecionalidade do conjunto redescoberto. Depois do apoio logístico e financeiro da então Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal, o conjunto foi enviado para Lisboa para ser restaurado no ateliê de Fernando Mardel e apresentado, em 1949, no Museu Nacional de Arte Antiga, numa exposição temporária orientada pelo diretor João Couto. De regresso ao Funchal, o conjunto fica exposto num anexo da Sé até à abertura do Museu, a 1 de junho de 1955. O Museu foi instalado no antigo paço episcopal, que, entre 1914 e 1943, havia funcionado como Liceu do Funchal, sofrendo depois profundas obras de adaptação praticamente contemporâneas da reorganização urbanística da praça do município, nas suas traseiras. O antigo paço episcopal, harmonizado por grandes obras da segunda metade do séc. XVIII, no tempo do bispo D. João do Nascimento, foi primitivamente fundado por Luís de Figueiredo Lemos, em 1594. Da época primitiva é a arcaria dupla de sabor maneirista sobre a posterior praça do município e a capela de São Luís de Tolosa, datada de 1600. Dominando a construção, sobre o edifício do séc. XVIII ergue-se uma torre avista navios, que permitia, no último piso, através de uma varanda aberta, observar toda a baía do Funchal. Nesta varanda na parede a norte, foram colocados gigantes painéis de azulejaria portuguesa do séc. XVIII, que ilustram os temas da fé, da esperança e da caridade. Nas coleções do Museu, podem destacar-se duas áreas essenciais, a da arte flamenga e a da arte portuguesa. A presença da arte flamenga na ilha da Madeira relaciona-se com os intensos contactos comerciais estabelecidos com a Flandres, desde meados do séc. XV e por todo o séc. XVI, por causa do açúcar produzido em larga escala sobretudo na costa sul da ilha da Madeira. Muitos dos produtores e donos de engenhos, assim como comerciantes, realizaram encomendas sumptuárias à Flandres, de pintura, escultura e ourivesaria, de que a coleção do Museu de Arte Sacra é um exemplo paradigmático. A coleção de pintura apresenta exemplares do período que vai do último quartel do séc. XV até aos anos 40 do séc. XVI, com obras atribuídas a Dieric Bouts, Gérard David, Joos Van Cleve, Jan Provoost, mestre do tríptico Morrison, Pieter Coeck van Aelst, Jan Gossaert, dito Mabuse, entre outros. Dos conjuntos retabulares, de invulgaríssimas dimensões, refira-se, a título de exemplo, A Virgem e o Anjo da Anunciação, atribuída a Jan Provoost, e, provindos da igreja matriz da Calheta, A Adoração dos Reis Magos, atribuída ao Mestre da Adoração de Machico, da igreja matriz de Machico, Maria Madalena, atribuída a Jan Provoost da Sé do Funchal, e São Pedro, São Paulo e Santo André, atribuído a Joos van Cleve, da capela de São Pedro e São Paulo do Funchal. Na escultura flamenga, encontram-se exemplares das escolas de Malines, Antuérpia e Bruxelas e de ateliês hispano-flamengos de finais do séc. XV até ao fim do primeiro quartel do séc. XVI. A escultura flamenga tem vindo, ao lado da pintura, a ganhar maior significado, até pela entrada na coleção de novas obras. Refira-se especialmente as peças Calvário, São Roque e Deposição no Túmulo, da Sé do Funchal, Santa Luzia, da primitiva igreja de Santa Luzia do Funchal, ou a Virgem com o Menino da igreja matriz de Machico. Na coleção, destacam-se ainda duas raríssimas peças, uma bandeja e um cálice puncionados, da cidade de Antuérpia, de inícios do séc. XVI. No Museu encontramos também uma coleção importante de arte portuguesa, provinda na sua maioria de igrejas e capelas da Diocese do Funchal. Esta divide-se em vários núcleos, estando as peças organizadas cronologicamente e com uma forma de apresentação que revela o cruzamento de tipologias artísticas. Na pintura, referência para São Bento, de uma oficina portuguesa de finais do séc. XV, provindo da Sé do Funchal, ou Ecce Homo, do antigo Convento das Mercês, Ascensão de Cristo, de Fernão Gomes, ou A Visitação, de Vieira Lusitano. Na escultura portuguesa, especial referência deve ter São Sebastião, de finais do séc. XV ou inícios do séc. XVI, atribuído à oficina de Diogo Pires, o Moço, ou o conjunto respeitante ao camarim da Sé do Funchal, datável do início da segunda metade do séc. XVII, atribuído ao imaginário Manuel Pereira. Destaca-se ainda uma Santa Isabel, do séc. XVII, provinda do antigo Convento da Encarnação, e a Dormição de São Francisco Xavier, do mesmo século, provinda do Convento do Bom Jesus da Ribeira. No Museu de Arte Sacra, é ainda de referir uma importante coleção de ourivesaria portuguesa dos meados do séc. XV até aos últimos anos do séc. XVIII. Destaca-se igualmente o conjunto do denominado tesouro da Sé do Funchal, onde assume relevo a cruz processional, oferecida por D. Manuel I e chegada já depois da sua morte ao Funchal, em 1527, e uma excecional caldeirinha, com o recorte no fundo da esfera armilar, símbolo régio. Na coleção, encontra-se ainda um importante grupo de ourivesaria maneirista, datável entre o último terço do séc. XVI e meados do séc. XVII, como o cálice, datado de 1580, da capela do Corpo Santo no Funchal, a naveta da matriz de Câmara de Lobos, de 1589, ou a ânfora de prata da Sé, de meados do séc. XVII. No séc. XVIII, referência especial devem ter a urna de prata da Sé e a custódia de ouro assinada e datada de 1799, de Paul Mallet, de uma oficina de Lisboa. A exposição de ourivesaria do Museu é apresentada a par de paramentaria dos sécs. XVII - XVIII. O Museu de Arte Sacra desde cedo se constituiu como sede de exposições temporárias pela existência de uma sala especialmente a elas dedicada. À própria fundação do Museu se ligam trabalhos de levantamento patrimonial, que resultaram em edições como Lampadários – Património Artístico da Ilha da Madeira (1949), por Luiz Peter Clode, e a organização, em 1951, de uma exposição e catálogo de ourivesaria sacra, no Convento de Santa Clara do Funchal, à qual se seguiu uma outra, em 1954, sobre esculturas religiosas. No Museu, organizaram-se, desde a déc. de 70, exposições temporárias sobre temas próximos à defesa do património cultural e artístico e, mais tardiamente, de integração de arte antiga e contemporânea. Exemplo disso são as exposições Jesus Cristo Ontem Hoje Sempre, O Futuro do Passado, Eucaristia Mistério de Luz, A Madeira nas Rotas do Oriente ou Alguns Santos Mártires Revisitados, de Rui Sanches em 2003, Remains de Graça Pereira Coutinho, em 2006, Obras de Referência dos Museus da Madeira, em 2008, e Madeira do Atlântico aos Confins da Terra, exposição comemorativa dos 500 anos da Diocese do Funchal, em 2014. Como foi já referido, é bastante antigo o interesse pela botânica e por coleções de espécies naturais na ilha da Madeira. Desde o séc. XIX se mostrou interesse pela fundação de um jardim botânico, o que só se concretizou com a aquisição da Qt. do Bom Sucesso por parte da então Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal, em 1960. O Jardim Botânico da Madeira é uma instituição científica do Governo regional da Madeira que se dedica ao estudo e conservação da flora e da vegetação dos arquipélagos da Madeira e das Selvagens. A Qt. do Bom Sucesso, que havia pertencido à família Reid, situa-se numa zona privilegiada da baía do Funchal, na encosta sul de um vale compreendida entre os 150 e os 300 m. Reúne as condições para a instalação de numerosas espécies, numa área superior a 80.000 m2, apresentando, nos inícios do séc. XXI, cerca de 2000 espécies exóticas. Neste espaço, as plantas encontram-se identificadas com o nome científico comum, origem e afinidades ecológicas e geográficas. Nos jardins, ainda deve ser destacada uma zona respeitante às plantas indígenas e endémicas, exclusivas da Madeira e da Macaronésia (Açores, Madeira, Canárias e Cabo Verde), com a natural presença de espécies da Laurissilva, caracterizada como floresta perenifólia de características subtropicais, sendo as suas árvores mais comuns as laureáceas, como o til, o loureiro, o barbusano e o vinhático. Encontram-se ainda no Jardim Botânico espécies de outras zonas do globo, ecologicamente opostas, desde os Himalaias, à América do Sul e trópicos. Uma área independente apresenta uma importante coleção de plantas tropicais, cultivares, aromáticas e medicinais, ligadas aos costumes e tradições culturais e gastronómicos madeirenses. Foi ainda disponibilizado ao público um parque com aves tropicais. Na casa principal da Qt. do Bom Sucesso, está instalada uma parte do antigo Museu de História Natural do Seminário do Funchal, transferido em 1982, que alberga os trabalhos de João Schmitz, ornitólogo alemão estabelecido na Madeira em 1874. A Photographia - Museu “Vicentes”, como o próprio nome indica, nasceu da tentativa da musealização de um ateliê fotográfico. O Vicentes Photógraphos foi um dos mais antigos estúdios de fotografia de Portugal, tendo sido fundado em 1848 por Vicente Gomes da Silva e permanecido em funcionamento ininterrupto até 1982, dentro da mesma família, ao longo de quatro gerações. Em 1852, estes fotógrafos foram convidados a fazer parte da comitiva que organizou a visita de Sua Majestade a Imperatriz do Brasil e de sua filha, a princesa D. Amélia. No ano seguinte, apresentava já na fachada das suas instalações as armas imperiais do Brasil e era reconhecido como “Gravador de S. M. Imperatriz do Brasil”. Da mesma época são as suas primeiras experiências com a daguerreotipia. O estúdio inicia, assim, uma longa carreira, registando importantes acontecimentos da história da Madeira e de muitos dos seus visitantes ilustres. Em 1866, fotografa a Imperatriz Isabel de Áustria, a célebre Sissi, e, em 1901, aquando da visita de D. Carlos e D. Amélia, Reis de Portugal, fotografa-os na varanda sul do palácio de São Lourenço. Este Museu possui um espólio notável de 800.000 negativos, registo incontornável de uma história mental, social e cultural da ilha da Madeira. Ao património inicial, juntaram-se os de outras casas ou de fotógrafos amadores, como os de João Francisco Camacho (1833-1898), José Júlio Rodrigues (1843-1893), Joaquim Augusto de Sousa, João António Bianchi (Vale Paraíso), Major Charles Courtnay Shaw, Gino Romoli, Francisco Barreto, João Soares, Álvaro Nascimento Figueira, Luís de Bettencourt, João Anacleto Rodrigues, Russel Manners Gordon (Torre Bela), Alexander Lamont Henderson, Photo Figueiras, Foto Arte, Joaquim Figueiras e Carlos Fotógrafo, assim como o espólio de um notável ateliê, o Perestrellos Fotógrafos, com uma coleção notável de reportagem de acontecimentos sociais e políticos. No Museu, para além de originais fotográficos, é também de relevar uma estrutura organizativa de um ateliê fotográfico do séc. XIX que permanece quase intacta. A coleção passou depois a desenvolver outras áreas de interesse, como a recolha e identificação de cinema documental sobre a Madeira. Em 1972, todo o recheio do ateliê Vicentes havia sido vendido pela família Vicentes à Sociedade Pátio, Livros e Artes, Lda., através da sua gerente, Maria de Mendonça, uma jornalista açoriana radicada na Madeira que desenvolveu a esperança de abrir um museu dedicado às fotografia e artes gráficas. Em 1982, todo o conjunto foi adquirido pelo Governo regional da Madeira, sendo criado o Museu. Em 1983, foi criada uma nova pequena unidade museológica pelo Instituto do Vinho Madeira, que, em 1979, veio substituir a antiga Junta Nacional do Vinho: o Museu do Vinho Madeira. O Museu foi instalado numas dependências do Instituto, importante edifício romântico da cidade do Funchal edificado no princípio do séc. XIX pelo cônsul inglês Henry Veitch. A sua coleção, de modesta dimensão, procurava mostrar o processo de produção do vinho Madeira e agenciá-lo no seu contexto histórico. O Museu foi encerrado pela tutela, que passou a ser o Instituto do Vinho, Bordado e Artesanato da Madeira (IVBAM). Em 1986, a 21 de agosto, Dia da Cidade do Funchal, foi inaugurada no edifício da CMF uma pequena estrutura museológica em duas salas, sob a designação de Museu da Cidade, que procurava mostrar os ciclos fundamentais da história da Ilha, socorrendo-se de algumas peças de época do acervo da CMF e de elementos de apoio gráfico. Esta unidade foi encerrada em 1995, passando uma parte do seu espólio a integrar o Núcleo Museológico A Cidade do Açúcar. Por iniciativa da CMF, foi inaugurado, nas instalações de um antigo auxílio materno-infantil e durante o Marca – Festival de Arte Contemporânea, em setembro de 1987, o Museu Henrique e Francisco Franco. Em 1966, a CMF adquiriu, junto de herdeiros de Francisco Franco, um importante conjunto de obras que pensou colocar numa sala especial do Museu da Quinta das Cruzes. Contudo, essa intenção não chegou a concretizar-se. Em 1972, um novo conjunto do espólio dos irmãos Franco foi adquirido aos seus herdeiros, incluindo um grupo de pinturas de Henrique Franco. No entanto, só em 1987, depois de várias apresentações públicas do espólio, foi criado o Museu. Apesar da dignidade do espaço, não era possível apresentar de forma sistemática e global o conjunto reunido, tendo-se, depois de um pequeno período de encerramento, reaberto o Museu com exposições temporárias de média duração, que permitiam explorar em regime de rotatividade temas e conteúdos específicos na obra dos irmãos Franco, facultando a visita de especialistas às reservas organizadas. Na reorganização de 1996, procedeu-se ao inventário sistemático da coleção, a trabalhos de conservação e restauro, e à implementação de um novo programa museológico e museográfico. O Museu apresentou a exposição Por Causa de Paris, juntando por coerência temática algumas obras cedidas pelo Museu da Quinta das Cruzes. No mesmo ano, o Museu disponibilizou ainda um roteiro de visita às esculturas de Francisco Franco em locais públicos da cidade do Funchal. Em 1988, foi aberta ao público a Casa-Museu Frederico de Freitas, que ficou instalada na denominada Casa da Calçada, a residência dos condes da Calçada entre o séc. XVII e os inícios do séc. XX. Nos meados dos anos 40 do séc. XX, ali se instalou Frederico de Freitas e a família até à sua morte, em 1978. Todos os seus bens móveis foram deixados à RAM para que se criasse uma casa-museu. Frederico de Freitas (1894-1978) fora um advogado e importante impulsionador das artes e da defesa do património cultural na Madeira. Em 1999, ficou concluído o processo de adaptação da sua residência a casa-museu, englobando áreas diversificadas: a casa da entrada, com receção, loja, serviço educativo e gabinete de estampas e desenhos, a casa principal, designada por Casa da Calçada, a Casa dos Azulejos, edifício novo construído para acolher a coleção de azulejaria, assim como um auditório e uma cafetaria. O Museu possuía, desde 1988, uma sala de exposições temporárias junto a um jardim que se abre à Calç. de Santa Clara, com o tradicional pavimento de calhau rolado, um corredor de vinha e canteiros de flores, rematando a extremidade do muro, e uma “casinha de prazer” que fora, no tempo de Frederico de Freitas, o espaço que albergava parte da coleção de azulejos holandeses. Das coleções, destaque-se o particular interesse de todos os temas relacionáveis com a Madeira e a sua memória patrimonial e artística. A Casa-Museu possui uma importante coleção de estampas, aguarelas e desenhos da Ilha, na sua maioria de ingleses do séc. XIX, com álbuns de Pitt Springett, Andrew Picken, Emily Geneviéve Smith, Susan Vernon Harcourt, John Eckersberg, Frank Dillon, etc. Refira-se especialmente o manuscrito original de Journal of a Visit to Madeira and Portugal (1853-1854), de Isabella de França. Outro importante núcleo da coleção é o da azulejaria portuguesa, hispano-mourisca, holandesa, flamenga, inglesa, turca e persa, desde meados do séc. XII até aos meados do séc.XIX. Do conjunto, destaque-se os conjuntos de Toledo, Manises, Valência, Sevilha, Talavera de la Reina, Bristol, Liverpool, Delft, Kashan, Rayy, Iznik e Tabriz, entre outros. Na azulejaria portuguesa, refiram-se conjuntos de padrão de tapete de meados do séc. XVII, provindos, na sua grande maioria, de demolições na ilha da Madeira. A coleção de cerâmica da Casa-Museu é vasta, integrando desde exemplares portugueses e europeus até aos do Extremo Oriente, como o conjunto de peças da denominada Companhia das Índias, à volta de duas divisões da casa, o quarto dos bules e das canecas. Na Casa-Museu Frederico de Freitas encontra-se ainda, entre outras coleções, uma importante coleção de escultura religiosa datável entre os sécs. XVI e XVIII. Do conjunto, destaca-se um São Jerónimo de barro de meados do séc. XVI, uma cena da Visitação de meados do séc. XVII, uma Santa Ana Ensinando a Virgem a Ler de meados do séc. XVIII ou um São João Evangelista, para além de um importante conjunto de marfins luso-orientais, dos quais se destaca, para além de Bons-Pastores de Goa, uma especialmente rara Virgem com o Menino sino-portuguesa de inícios do séc. XVII. O conjunto de mobiliário da Casa-Museu é eclético, sendo marcado sobretudo por peças madeirenses que remontam aos inícios do séc. XIX, sob a forte influência do mobiliário inglês de finais do séc. XVIII. Desde 1989, podem ser visitadas, em regime de visita acompanhada e organizada, as antigas adegas de São Francisco do Funchal, propriedade da Madeira Wine Company. Estas adegas são o remanescente do antigo Convento de S. Francisco do Funchal, situado nas suas dependências principais no posterior Jardim Municipal, que foi demolido nos finais do séc. XIX. O Convento foi fundado primitivamente em 1473, por Luís Álvares da Costa e pelo seu filho Francisco Álvares da Costa. As adegas correspondem a algumas dependências que eram usadas como armazéns nos meados dos sécs. XVII e XVIII. A Madeira Wine Company foi fundada em 1913, incorporando várias empresas de produtores independentes que se associaram, como William Hinton, Welsh, Cunha & Co. Lda., Henriques & Câmara, Cossart Gordon, Blandy, Leacock e Miles. As adegas passaram a possibilitar a visita a salas que mostram os mais importantes passos, e a tecnologia utilizada, para a produção do vinho das principais castas, como Sercial, Malvasia, Verdelho e Boal, e ainda a sua história ao longo dos muitos séculos. Para além disso, há também a possibilidade de visitar armazéns e salas de provas, entre outros espaços. O Museu-Biblioteca Mário Barbeito de Vasconcelos era uma pequena unidade museológica da empresa Vinhos Barbeito (Madeira) Lda., sendo fundado em 1989. As suas coleções foram reunidas pelo bibliófilo Mário Barbeito de Vasconcelos, comerciante de vinhos da cidade do Funchal, que desde sempre se interessou pela criação de uma biblioteca que tivesse como temas principais a história do arquipélago da Madeira e da expansão portuguesa, bem como a figura de Cristóvão Colombo. Nas três salas de exposição, encontravam-se livros raros, moedas, medalhas e gravuras sobre Cristóvão Colombo. Na segunda sala, edições raras, manuscritos e estampas sobre o arquipélago da Madeira e a história do seu vinho, e ainda uma coleção de documentação e livros sobre a botânica da Madeira, adquirida a outro colecionador, George Walter Grabham. A terceira área era dedicada a um arquivo documental sobre vários aspetos culturais de predominância regional. O Museu foi miseravelmente atingido pela aluvião de 20 de fevereiro de 2010, tendo entrado num processo de reorganização. A Casa Colombo, inaugurada em novembro de 1989, correspondia a um pequeno museu evocativo da figura do navegador Cristóvão Colombo, ligado de forma indelével ao arquipélago da Madeira, em particular ao Porto Santo. Segundo a tradição popular, tal Casa terá sido residência de Cristóvão Colombo, sendo harmonizada mais tarde por uma arquitetura de fundo popular de meados do séc. XVIII sobre um núcleo mais antigo, do qual se destaca, numa parede a norte, duas janelas armadas de blocos de barro em ogiva de finais do séc. XV. Cristóvão Colombo casara com Filipa de Moniz, filha de Bartolomeu Perestrelo, 1.º capitão donatário do Porto Santo. Deve ter estado pela primeira vez na Madeira em 1476, tendo sido depois encarregue por Paolo di Nero de deslocar-se à Ilha para negociar açúcar para o genovês Ludovico Centurione. A Casa Colombo, que, em 2005, passou a ser Casa Colombo – Museu do Porto Santo, foi completamente reformulada, contando com um novo programa museológico que permitiu uma nova organização de espaços e a criação de três áreas temáticas, tendo por pano de fundo a posição estratégica do Porto Santo no contexto da expansão. Numa primeira sala, explora-se o contexto histórico da expansão portuguesa e o descobrimento do Porto Santo e da Madeira, bem como dos primeiros séculos da sua economia dominante, com a presença de peças de época que criam um enquadramento temático, como um elmo português de meados do séc. XVI ou uma cruz processional de cobre dourado de finais do séc. XV. Uma segunda sala é dedicada à expansão castelhana e à figura do descobridor da América, Cristóvão Colombo, com destaque para uma pintura italo-flamenga de meados do séc. XVII. As últimas duas pequenas salas do percurso expositivo são dedicadas ao afundamento, na costa norte do Porto Santo, de um galeão holandês, o Slot ter Hooge, em 1724. As três áreas temáticas afirmam o papel de três das potências europeias fundadoras da expansão. A Casa Colombo – Museu do Porto Santo possui áreas específicas para exposições temporárias, uma loja, um auditório de ar-livre, uma sala de serviço educativo e um acervo documental onde se encontra um conjunto de gravuras sobre Cristóvão Colombo, oferecido ao Museu por Mário Barbeito de Vasconcelos. O Museu da Baleia é um museu da Câmara Municipal de Machico, cujos estatutos foram aprovados em 1990, ano da sua abertura ao público, com a participação, para além das verbas municipais, do International Fund for Animal Welfare (IFAW). O Museu pretende contar a história da atividade baleeira na Madeira, proibida em 1981, partindo da coleção recolhida por Eleutério Reis na antiga Fábrica das Baleias e de doações da comunidade local no Caniçal. Sendo um baluarte da história, este Museu constitui-se como centro de defesa da conservação das baleias, especialmente do cachalote, contribuindo para a sua preservação. Em 2011, o Museu abriu novas instalações para o desenvolvimento das suas funções museológicas, transformando-se num pólo de investigação e defesa dos mares. A Fundação Berardo abriu ao público em 1991, nos jardins da Qt. Monte Palace, situada numa zona privilegiada sobre a baía do Funchal. A freguesia do Monte, sede de muitas quintas de veraneio, transformou-se num importante reduto do romantismo na ilha da Madeira. A história da Qt. Monte Palace está ligada à compra, nos meados do séc. XVIII, de uma propriedade a sul da igreja do Monte pelo cônsul inglês Charles Murray, que aí construiu a Qt. do Prazer. Em 1897, Alfredo Guilherme Rodrigues adquiriu a propriedade e construiu a casa sede da propriedade em estilo revivalista, criando o prestigiado Monte Palace Hotel. Em 1987, após longos anos de abandono, a propriedade foi adquirida por Joe Berardo. Realizaram-se grandes trabalhos de reordenamento da vegetação, plantando-se numerosas espécies novas. Foram introduzidas plantas exóticas, como uma importante coleção de cicas e próteas da África do Sul, azáleas da Bélgica, urzes da Escócia e uma grande quantidade de espécies características da laurissilva madeirense. Nos jardins, foram colocadas várias peças decorativas, destacando-se um retábulo em pedra renascentista de uma oficina coimbrã, do séc. XVI. Está também presente uma grande coleção de painéis de azulejos, na sua maioria portugueses, desde os exemplares hispano-mouriscos do séc. XVI até às produções do início do séc. XX. Foi ainda criado um jardim oriental, com vários elementos arquitetónicos. Foi também construído um edifício de raiz, onde ficaram reunidas outras coleções do comendador Joe Berardo, como uma de escultura contemporânea africana e outra de minerais provenientes de praticamente todo o mundo. O Museu de Arte Contemporânea – Fortaleza de Santiago tem a sua origem na criação dos prémios de arte contemporânea Cidade do Funchal, em 1966 e 1967, organizados pela então Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal, através da Delegação de Turismo do Funchal. Com as obras premiadas e outras aquisições realizadas, pensou-se na criação de uma espécie de extensão contemporânea da coleção do Museu da Quinta das Cruzes. Esta funcionou, no entanto, de forma precária a partir de 1984 numa sala da Direção Regional dos Assuntos Culturais, tendo depois transitado para outras dependências na Qt. Magnólia no Funchal sob a designação de Núcleo de Arte Contemporânea. Com a entrega da fortaleza de S. Tiago à administração do Governo da RAM em 1992, foi pensada a sua adaptação para a instalação de um museu de arte contemporânea, assim como uma sala de vocação militar que contasse de forma coerente a relação dessa fortaleza no contexto da história da defesa da baía do Funchal. A fortaleza de S. Tiago iniciou-se em 1614, sob o risco de Jerónimo Jorge e, depois, de Bartolomeu João, seu filho. A primeira fase das obras deve ter terminado por volta de 1637. No séc. XVIII, sofreu grandes transformações sob as ordens do Gov. José Correia de Sá, terminando tal intervenção em 1767. O Museu foi aberto ao público em 1992, reunindo o núcleo central dos prémios Cidade do Funchal dos anos 60 e aquisições feitas desde então. Das obras iniciais, destaque para Joaquim Rodrigo, António Areal, José Escada, Helena Almeida, Artur Rosa, Manuel Baptista e Jorge Martins, aos quais se juntaram obras de outros autores adquiridas desde então, nomeadamente de Lourdes Castro, René Bertholo, José de Guimarães, António Palolo, João Queiroz, Rui Sanches, Gaetan, Michael Biberstein, Fernando Calhau, Pedro Cabrita Reis, Pedro Portugal, Pedro Calapez, Sofia Areal, Pedro Casqueiro, Miguel Branco, Pedro Proença, Ilda David, Rigo, entre muitos outros. Foi também reunido um conjunto de obras de artistas que desenvolveram a sua atividade artística principalmente na ilha da Madeira, nomeadamente de Élia Pimenta, Celso Caires, Isabel Santa Clara, Eduardo de Freitas, Graça Berimbau, Teresa Jardim, Filipa Venâncio, Karocha, Guilhermina da Luz, António Rodrigues, Danilo Gouveia e Guida Ferraz, entre outros. Em 2009, foi realizada no Centro das Artes Casa das Mudas, na Calheta, uma exposição que permitiu reunir pela primeira vez toda a coleção nacional, sob o título A Experiência da Forma – Um olhar sobre o Museu de Arte Contemporânea I. Em 2015, a coleção de arte contemporânea da Madeira deixou a Fortaleza de S. Tiago e passou definitivamente para o antigo Centro das Artes na Calheta, criando-se o Mudas. Museu de Arte Contemporânea da Madeira. A fortaleza-palácio de S. Lourenço foi mandada construir por determinação de D. Manuel I, em 1513, tendo a construção sido iniciada logo na década seguinte. Dela, permaneceu praticamente intacto o torreão nascente, com as armas reais, cruz de Cristo e esfera armilar. As obras foram encomendadas a João Cáceres, sendo depois ampliadas após o ataque corsário de 1566. No período filipino, são feitas importantes transformações com a construção de novos baluartes da responsabilidade de Mateus Fernandes e Jerónimo Jorge. Por razões diversas, a fortaleza de S. Lourenço foi sendo progressivamente transformada em palácio dos governadores da Madeira, sobretudo a partir do séc. XVIII. Em 1836, a separação administrativa dos poderes civil e militar provocou uma divisão física do palácio. A leste, antes da responsabilidade do governador militar, passou a estar o Comando da Zona Militar da Madeira. A área oeste, correspondente às principais dependências e salas nobres, antes próximas do governador civil, ficou ligada ao ministro da República para a Madeira e, a partir de 2004, ao representante da República na RAM, sendo a sua residência oficial. Depois de 1993, foi iniciado um aturado processo de conservação e restauro do edifício e das coleções postas à sua guarda, das quais uma parte significativa tinha sido transferida de palácios nacionais, na déc. de 30 do séc. XX, sendo outras pertencentes a um fundo antigo do palácio. Destas coleções, destaque-se um conjunto de mobiliário Boulle e uma curiosa galeria de retratos, como os de D. João V e D. José I. A criação de um circuito de visita e a instalação de serviços de conservação preventiva e serviços de educação criaram, desde 1995, as condições para a musealização do espaço. Na área militar, encontra-se instalado, em pequenas dependências, um núcleo histórico-museológico onde se apresentam elementos para a compreensão da evolução histórica da construção da fortaleza, assim como do seu papel na estratégia de defesa da baía do Funchal, para além de outros aspetos da história militar da cidade. Embora já há muito tempo se fizessem apelos nesse sentido, só em 1996 foi criado o Museu Etnográfico da Madeira, cujas coleções tiveram na sua origem algumas peças da coleção etnográfica do Museu da Quinta das Cruzes. O Museu foi instalado na Ribeira Brava, no quadro de uma importante aposta na descentralização cultural, num antigo solar transformado mais tarde em unidade industrial, o antigo engenho de aguardente da Ribeira Brava. O Convento de Santa Clara, foreiro de uma casa ali existente, vendeu os terrenos a Luís Gomes da Silva, capitão de ordenanças da Ribeira Brava. Em 1710, acrescentou-se ao conjunto uma capela da invocação de S. José. Em 1853, a antiga casa foi convertida em unidade industrial, criando-se um engenho de cana-de-açúcar com alambique para a destilação de aguardente. Foi pouco depois instalado um sistema de moagem através de energia hidráulica, com roda motriz de madeira servido por levada de água própria para a moagem de cereais. Em 1974, a estrutura entretanto desativada foi adquirida pela Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal, e só várias décadas mais tarde, em 1996, se inaugurou o Museu depois de obras de adaptação. O Museu tem por princípios orientadores a investigação, documentação, conservação e divulgação dos testemunhos da cultura tradicional madeirense, centrando-se nas atividades produtivas, como a pesca, os ciclos produtivos do vinho, dos cereais e do linho, os transportes, as unidades domésticas e o comércio tradicional. No seu acervo, podemos encontrar equipamento de uso doméstico, alfaias agrícolas, artes e ofícios, festividades cíclicas, instrumentos musicais, atividades lúdicas, trajes, sistemas de atrelagem, cerâmica, figuras de barro e tecnologia têxtil. O Núcleo Museológico do IBTAM – Instituto do Bordado Tapeçaria e Artesanato da Madeira, posteriormente o IVBAM – Instituto do Vinho, Bordado e Artesanato da Madeira, foi instalado na antiga sede do Grémio dos Industriais de Bordado da Madeira, inaugurado em 1958, projeto da autoria de Fabrício Rodrigues. Este núcleo tem por base duas exposições organizadas em 1986. A primeira teve lugar no Museu da Quinta das Cruzes, com a participação do Museu Nacional do Traje, onde foram recolhidas peças, cronologicamente situadas entre 1850 e 1900, de numerosas coleções particulares, na sua maioria completamente inéditas, numa organização de Luiza Clode. Uma segunda mostra foi organizada logo depois e inaugurada no mesmo ano no IBTAM, com um quadro cronológico mais abrangente que chegava aos anos 30 do séc. XX. Dessa exposição, um pequeno núcleo remanescente, que constituía a coleção do IBTAM e algumas cedências temporárias, foi montado provisoriamente. O Núcleo Museológico foi reformulado em 1996, com a criação de ambientes de enquadramento da época, a segunda metade do séc. XIX, e ainda áreas respeitantes à produção da primeira metade do séc. XX. Foram também desenvolvidas áreas pedagógicas e técnicas de explicação do processo criativo e produtivo. O Núcleo Museológico A Cidade do Açúcar foi inaugurado em 1996, sendo consequência do pequeno Museu da Cidade, já referenciado, antes aberto ao público em duas salas dos paços do concelho. Em 1989, foram realizadas escavações no terreno e imediações da antiga casa de João Esmeraldo no Funchal, que resultaram no aparecimento de numeroso e interessante espólio arqueológico, e organizada uma exposição no Teatro Baltazar Dias, no Funchal. Num edifício a norte, onde posteriormente, após reordenamento urbanístico, se criou a Pç. Colombo, foi criado o núcleo museológico que deu origem ao Museu A Cidade do Açúcar. O núcleo encontrava-se localizado no espaço correspondente a uma casa do final do séc. XV, destruída no séc. XIX, do comerciante João Esmeraldo, que hospedou o descobridor da América, Cristóvão Colombo. Para além da apresentação do espólio da escavação arqueológica e da história da desaparecida casa de João Esmeraldo, procurava afirmar-se como espaço de relação das memórias ainda vivas da cidade do Funchal no seu ciclo açucareiro. Nesse sentido, propunha guias didáticos de visita ao Funchal manuelino. Este era um museu preferencialmente ligado ao enquadramento dos achados arqueológicos, em especial os da escavação das casas de João Esmeraldo realizadas em 1989. O espólio recolhido ajudou a perceber o quotidiano da cidade do Funchal entre o final do séc. XV e meados do séc. XVII. Na escavação, foram recuperadas grandes quantidades de fragmentos de cerâmica portuguesa dos sécs. XV, XVI e XVII, entre eles formas de açúcar, selos de chumbo da Alfândega do Funchal e moedas. Na coleção, foram ainda colocadas algumas obras de enquadramento histórico, como Medidas Manuelinas, datada de 1499, um São Sebastião de madeira de carvalho de uma oficina flamenga de inícios do séc. XVI ou uma salva com pé com as armas da cidade do Funchal de inícios do séc. XVII. O projeto não pretendeu constituir-se como espaço de identificação da memória e tecnologia açucareira, que deveria ser instalado num antigo engenho de açúcar. Dedicava-se apenas às consequências culturais desse período fundamental da economia regional. Este Núcleo Museológico, que foi transformado no Museu A Cidade do Açúcar em 2009, foi totalmente destruído pela aluvião de 2010 no Funchal, entrando depois disso em processo de reorganização. O Museu da Eletricidade Casa da Luz foi inaugurado em 1997, após trabalhos de adaptação e musealização da antiga central térmica do Funchal, sob projeto museológico de Sara Silva. O Museu centra-se em várias áreas temáticas, como os vários tipos de iluminação pública ao longo dos tempos da cidade do Funchal, desde as primeiras lamparinas de azeite até aos candeeiros modernos. Uma segunda área temática apresenta-nos um historial evocativo da evolução da eletrificação do arquipélago da Madeira, com a presença de maquinaria diversa e com as duas principais formas de produção de energia elétrica: a térmica e a hidráulica. Foi ainda transformado para exposição um posto de transformação elétrica, sendo complementado por várias maquetas de centrais elétricas, urbanas e rurais. Numa terceira zona, apresenta-se, com sentido interativo e didático, uma exposição sobre fontes de energia, primárias e renováveis, como as energias eólica e solar, assim como uma área dedicada à ciência e à tecnologia. O Centro Cívico e Cultural de Santa Clara – Universo de Memórias João Carlos Abreu é uma unidade pública responsável pela conservação, manutenção e exposição ao público de todos os bens doados à RAM em 2001. Encontra-se instalado numa casa de finais do séc. XIX, na Calç. do Pico, com as coleções de artes decorativas reunidas por João Carlos Abreu, ex-secretário regional do Turismo e Cultura, jornalista, escritor, gestor e diretor hoteleiro. A coleção reflete as suas numerosas viagens à volta do mundo, nas quais adquiriu numerosas recordações. Aí, podem ser visitadas a biblioteca, a sala vermelha, a sala roxa, a sala de jantar, a sala das viagens, a cozinha, a sala dos cavalos, o oratório, a sala das joias de cena, o quarto verde e o quarto bege, entre outros espaços. Em 2003, foi aberto ao público um pequeno museu, numas instalações à R. do Carmo, das Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora das Vitórias. Trata-se de um projeto constituído por cinco salas, que procuram apresentar a vida e obra de Mary Jane Wilson (1840-1916), fundadora da congregação. A exposição organiza-se por várias áreas temáticas, como a infância e juventude, com uma coleção de desenhos por si realizados e ainda alguns objetos ligados à sua chegada à Madeira. Uma segunda sala é dedicada à sua conversão ao catolicismo, enquanto a terceira e a quarta são dedicadas ao desenvolvimento do seu trabalho enquanto enfermeira e fundadora de obras sociais e caritativas, como aconteceu durante o surto de varíola em 1906. Na última divisão, é feita a reconstituição de uma sala com objetos pessoais de Mary Jane Wilson, como testemunho da sua vida. O Museu do Brinquedo na Madeira abriu ao público em 2003, com a apresentação de uma coleção privada de brinquedos de José Manuel Borges Pereira, provindos dos mais variados centros de fabrico europeus, desde meados do séc. XIX até ao final do séc. XX. Estão, assim, reunidos cerca de 12 mil objetos que refletem a época histórica em que se enquadram e o imaginário infantil de numerosas gerações. À coleção particular atrás referida, juntaram-se vários depósitos de outras coleções particulares. Em 2015, o Museu foi deslocado da R. da Levada dos Barreiros para o edifício Armazém do Mercado, na R. Latino Coelho, n.º 39. O Madeira Story Centre abriu ao público, como centro de interpretação histórica, em 2005, após trabalhos de adaptação de um edifício na zona de Santa Maria no Funchal, integrando uma área no jardim do Almirante Reis, junto à estação do teleférico da Madeira, onde estão expostas duas antigas lanchas de desembarque no porto do Funchal, a Mosquito e a Áquila. O Madeira Story Centre era uma organização privada da FUN – Centros Temáticos do Funchal, Lda. em parceria com a Etergeste. Apresentava-se como um centro de informação sobre a Madeira, que, de uma forma lúdica e interativa, desenvolvia o tema da história da Ilha. Os visitantes encontravam os seguintes tópicos: as origens vulcânicas; lendas da descoberta; descoberta da Madeira; tumulto e comércio; Ilha estratégica; desenvolvimento da Madeira; depois da navegação; e explore a Madeira. Foi encerrado em 2015. O Núcleo Museológico do Solar do Ribeirinho nasceu em 2007, sob a tutela autárquica de Machico, resultando de um aturado e contínuo trabalho da ARCHAIS – Associação de Arqueologia da Madeira e do CEAM – Centro de Estudos de Arqueologia Moderna. Está organizado a partir de quatro áreas temáticas: uma primeira sobre a história e a arquitetura do solar, a segunda sobre as origens, o povoamento e a vida local, a terceira sobre o percurso económico e uma quarta sobre o quotidiano. Este espaço funciona em articulação com o Núcleo Arqueológico da Junta de Freguesia de Machico. Em 2013, foi aberto ao público o Museu de Imprensa, no centro de Câmara de Lobos, junto da Biblioteca Municipal. Trata-se de uma unidade gerida pela Câmara Municipal, com a apresentação, numa grande nave, de um importante espólio de máquinas tipográficas, ligadas em muitos casos à antiga impressão de jornais. O Museu aproxima-se tematicamente também da história do jornalismo da Madeira e respetiva génese. Ainda em 2013, foi inaugurado, no Funchal, um espaço museal dedicado ao futebolista madeirense Cristiano Ronaldo, com um historial do seu percurso profissional, acolhendo numerosos troféus desportivos. Assim, o início do séc. XX trouxe à Madeira o primeiro museu de vocação científica, de história natural, mas a designação “Museu Regional” denunciava já a vontade de se abarcar outras áreas, que permaneceriam residuais, nas vertentes histórica, arqueológica, artística, etnológica, etc. O séc. XX irá, pois, estruturar progressivamente o conhecimento e fazer entender a necessidade de enquadrar outras realidades museológicas, a que os avanços da historiografia regional e levantamentos patrimoniais e artísticos davam sedimento. A aquisição e posterior transformação da Qt. das Cruzes em museu afirma-se, junto das tutelas oficiais, como um exemplo ilustrativo das muitas carências no campo das artes, servindo mesmo, ao longo da sua história, como génese de outras unidades mais especializadas. É no Museu da Quinta das Cruzes que se depositam as primeiras obras de arte contemporânea, com o objetivo de se constituir uma extensão contemporânea do próprio Museu, que levará mais tarde ao nascimento do Museu de Arte Contemporânea. Ainda no Museu da Quinta das Cruzes se conservava o reduto principal de uma coleção etnológica que se constituía com o fito de um dia integrar um museu no antigo Recolhimento do Bom Jesus, ideia que, no entanto, foi logo abandonada. Tal coleção viria a constituir o cerne da coleção do Museu Etnográfico da Madeira, na Ribeira Brava. A criação do Museu de Arte Sacra junta as vontades da Diocese e da então Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal, e inicia uma especialização progressiva dos museus, dando seguimento aos amplos trabalhos de recuperação e, em muitos casos, de descoberta de um extraordinário património artístico. A realidade política criada com a autonomia, consequência da revolução de 1974 e de intensas mudanças a nível nacional, trouxe uma progressiva sedimentação das unidades museológicas criadas e a possibilidade de uma crescente especialização, assistindo-se, sobretudo durante as décs. de 80 e 90, como na maior parte do país, a uma explosão museológica que trouxe naturalmente necessidades de reajustamento e ponderação estratégica: “A autonomia político-administrativa alcançada pelas regiões autónomas portuguesas (Açores e Madeira) permitiu-nos, e agora refiro-me especialmente ao caso particular da Madeira, em determinadas circunstâncias e com alguma criatividade e pioneirismo, ultrapassar dificuldades específicas em áreas funcionais fundamentais, nomeadamente no que se refere à divulgação e comunicação nos museus, com a criação de serviços educativos que, numa primeira fase, funcionaram exclusivamente com recurso ao destacamento de professores efetivos, de algumas Escolas do Ensino Básico e Secundário, num claro apoio de intercâmbio institucional com a Secretaria Regional da Educação” (PAIS, 2005b). Na Madeira, os anos 90 começam com o congresso da Associação Portuguesa de Museus (APOM), sob o título “Panorama Museológico Nacional – Perspetivas para a Década de 90”, onde museólogos locais defenderam um museu da Região, dada a importância de haver uma unidade mais abrangente na história multifacetada do arquipélago. A abertura da formação em museologia a novos quadros, a colocação em atividade dos serviços de educação nos museus e o desenvolvimento de trabalho de investigação sobre as coleções abriram caminho ao aparecimento de novos museus e de novos públicos, e motivaram uma nova atenção a questões como segurança e conservação preventiva. A abertura de novos e especializados programas de formação, tal como aconteceu a nível nacional com a criação de vários tipos de pós-graduação, proporcionou a conquista de novos quadros, que programas locais, como os cursos de formação profissional, ajudaram a consolidar. A participação dos museus da Madeira em grandes exposições nacionais e internacionais (caso do Festival Europália em Bruxelas e Lisboa, em 1990-1991, e da Exposição Internacional de Sevilha, em 1992), do Museu de Arte Sacra, sobretudo, e do Museu da Quinta das Cruzes, fez equacionar a importância do seu património. Em 2009, foi organizada, no palácio nacional da Ajuda, a exposição Obras de Referência dos Museus da Madeira – 500 Anos de História de um Arquipélago, que constituiu a mais abrangente embaixada cultural e patrimonial da Madeira em Portugal continental. Já desde os anos 90 se assistia a uma maior sensibilidade relativamente ao património, que a criação de roteiros de leitura patrimonial ajudaram a concretizar. Para além disso, a posterior entrada em cena de unidades culturais de âmbito paramuseológico, como os centros culturais, vieram trazer um complemento importante à ativação do dinamismo cultural, quase todos com uma dimensão de descentralização, como o Centro Cultural John dos Passos, na Ponta do Sol, o Parque Temático de Santana, o Centro de Vulcanismo, em São Vicente, o Centro de Ciência Viva, no Porto Moniz, e especialmente o Centro das Artes Casa das Mudas, pelas excecionais condições infraestruturais e superior qualidade arquitetónica. Esta descentralização cultural e uma cada vez maior abrangência de tipologias e diversificação dos conteúdos têm motivado uma maior consciência da identidade e uma noção mais ampla de património cultural. Tal processo deve entender-se num quadro de interação cultural e rentabilização de esforços, correndo-se, no entanto, o perigo da pulverização dos recursos e estratégias. Uma esperança redobrada nasceu com o protocolo celebrado entre a Direção Regional dos Assuntos Culturais e o Instituto Português de Museus, em 2002, com a entrada dos museus dependentes desta tutela regional para a Rede Portuguesa de Museus. A participação e consolidação da presença dos museus madeirenses na Rede criou a oportunidade do estabelecimento de parâmetros comuns de atuação e a circulação de formação e informação fundamental para a ação museológica, como mostra, por exemplo, a criação de regulamentos internos dos museus, que a Lei Quadro dos Museus (n.º 47/2004, de 19 de agosto) e o estabelecimento do princípio da credenciação (desp. normativo n.º 3/2006, de 25 de janeiro) vieram impor. Assim, a Rede tem sido um agente de colaboração e de participação ativa na criação de ações de formação profissional dos quadros da Ilha e um participante ativo no financiamento de projetos do Museu de Arte Sacra do Funchal (desp. normativo n.º 3/2006, de 13 de julho).   Francisco António Clode Sousa (atualizado a 01.02.2018)

Artes e Design História da Arte Património

noronha, adolfo césar de

Naturalista e homem de cultura natural do Funchal, onde nasceu a 9 de setembro de 1873, Adolfo César de Noronha estudou no Liceu do Funchal e nas antigas Escola Politécnica de Lisboa e Academia Politécnica do Porto. A 11 de dezembro de 1914, foi nomeado bibliotecário da Biblioteca Municipal do Funchal (BMF) e, em 1928, seu diretor, cargo que ocupou até à sua aposentação, em 1943. Com ligações familiares ao Porto Santo, efetuou nesta ilha observações meteorológicas, colheitas de espécimes, em particular fósseis, e ainda observações ornitológicas, que, juntamente com outras colheitas no arquipélago, vieram a servir de base a estudos efetuados por eminentes cientistas da época, com destaque para Ernesto Schmitz  (aves), Z. J. Joksimowitsch, P. Oppenheim e J. Böhm (fósseis). Na área do mar, colheu esponjas e briozoários, muitos deles novos para a ciência. À época, causou sensação a descoberta de uma esponja incrustante, simultaneamente com espículas calcárias e siliciosas, Merlia normani, obtida por dragagens no Porto Santo. Estas dragagens foram feitas em conjunto por Noronha e Randolph Kirkpatrick em 1909, tendo este último publicado a descrição desta esponja num extenso artigo publicado no Quarterly Journal of Microscopical Science, em 1911. Em 1922, encabeçou uma expedição científica às ilhas Selvagens (onde já tinha ido em 1906 e 1909), acompanhado de Adão Nunes e Damião Peres. Por vicissitudes com o navio que os deveria trazer de volta ao Funchal, acabaram por lá permanecer dois meses, causando motivos de preocupação na sociedade madeirense. O seu regresso ao Funchal foi motivo de receção pelas mais altas individualidades da Madeira, conforme noticiado pelo Diário de Notícias do Funchal de 13 de junho desse ano. Dessa expedição resultaram observações meteorológicas e colheitas de espécimes que foram enviadas a especialistas mundiais da época. Com o seu vasto conhecimento da história natural da Madeira e sendo fluente no inglês, francês e alemão, Adolfo César de Noronha foi o correspondente por excelência na Madeira de muitas figuras gradas da ciência do início do séc. XX. Como gesto de reconhecimento, várias espécies novas para a ciência foram-lhe dedicadas: Schizoporella noronhai, briozoário abissal, Pecten noronhai e Spondylus noronhai, moluscos bivalves fósseis, entre outras. Estudou com profundidade os peixes da Madeira, tendo publicado em 1925, no Porto, um ensaio intitulado Um Peixe da Madeira. O Peixe Espada Preto, ou Aphanopus carbo dos Naturalistas e, no ano seguinte, nos Annals of the Carnegie Museum, dois artigos sobre duas espécies novas para a ciência: um peixe da família dos escolares, Diplogonurus maderensis, e um tubarão de profundidade raro, que dedicou ao seu amigo Alberto Artur Sarmento, Squaliolus sarmenti. Em coautoria com Sarmento, publicou também, em 1934, um trabalho de divulgação intitulado Os Peixes dos Mares da Madeira e, em 1948, o segundo volume (Peixes) do importante trabalho Vertebrados da Madeira, editado pela Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal. Colaborou ativamente com Fernando Augusto da Silva e com Carlos Azevedo de Meneses na elaboração do Elucidário Madeirense (1922), tornando esta obra numa referência da história natural do arquipélago da Madeira. Logo após a sua nomeação como diretor da BMF, à época instalada no edifício dos Paços do Concelho em exíguas condições, começou a defender a aquisição de um edifício para a sua reinstalação e a criação de um museu que pudesse alojar as suas coleções de história natural e outro património artístico, arqueológico e histórico pertencente à Câmara Municipal do Funchal (CMF). Esta intenção foi concretizada em 1929 com a criação do Museu Regional da Madeira e com a aquisição do palácio de S. Pedro, para a qual foi decisiva a ideia por si realizada de emitir um selo postal da Madeira cuja receita reverteu para esta aquisição. Com a preciosa colaboração de Günther E. Maul, o novo Museu abriu as suas portas ao público em 1933, sendo hoje o Museu de História Natural do Funchal. Ao aposentar-se, a 9 de setembro de 1943, a CMF prestou-lhe homenagem atribuindo o seu nome à sala principal do Museu. A Augusto Nobre (1865-1946), distinto cientista português e catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, são atribuídas as seguintes palavras acerca de Adolfo de Noronha: “possui todos os requisitos para ocupar com distinção uma cátedra em qualquer universidade do país” (SILVA e MENESES, 1965, 426). Adolfo César de Noronha morreu no Funchal, a 6 de abril de 1963. Obras de Adolfo César de Noronha: Um Peixe da Madeira. O Peixe Espada Preto, ou Aphanopus carbo dos Naturalistas (1925); “A New Species of Deep Water Shark (Squaliolus sarmenti) from Madeira” (1926); “Description of a New Genus and Species of Deep Water Gempyloid Fish, Diplogonurus maderensis” (1926); Os Peixes dos Mares da Madeira (1934) (coautoria); Vertebrados da Madeira. Peixes (1948) (coautoria).   Manuel José Biscoito (atualizado a 03.03.2018)

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