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sousa, josé xavier cerveira e

Como resultado da rutura de relações entre Portugal e a Santa Sé provocada pela implantação definitiva do liberalismo em Portugal, em 1834, as dioceses do reino sofreram um processo de vacatura. No Funchal, durante o período de 10 anos que durou essa situação, o governo do bispado esteve entregue a um franciscano egresso, António Alfredo de Santa Catarina Braga (c. 1795-c.1845), entre 1834 e 1840, e, depois, ao cabido. Só quando se repôs a normalidade nas relações entre o reino e Roma teve lugar a indigitação de novo prelado, tendo a escolha recaído na pessoa de D. José Xavier de Cerveira e Sousa, natural de Mogofores, onde nascera a 27 de novembro de 1797. Filho de um magistrado, o Dr. José Xavier Cerveira, e de D. Rosa Joaquina Cerveira de Sousa, estudou teologia em Coimbra, em cuja universidade se doutorou e foi docente até ser escolhido para o desempenho de funções episcopais na Madeira. Confirmado bispo em 14 de junho de 1843, foi sagrado a 2 de junho de 1844, e chegou à Madeira a 8 de julho do mesmo ano. Ao tomar, presencialmente, contacto com a diocese, deparou com um território perturbado pela presença e ação prosélita do reverendo Robert Reid Kalley (1809-1888), que, como membro da igreja presbiteriana escocesa e grande pregador, tinha conseguido arregimentar um considerável número de madeirenses, os quais, com alguma facilidade, trocavam o seu catolicismo tradicional pelas novas ideias protestantes. Robert Kalley era um médico e pastor escocês que, em 1838, se fixara na Madeira acompanhado pela mulher, Margaret Crawford. Para poder exercer medicina em Portugal, fora a Lisboa, em 1839, matricular-se na faculdade de Medicina, a qual, nesse mesmo ano, o declarou apto para exercer em território nacional. Regressado à Madeira, o reverendo Robert Kalley abriu então um consultório tendo primeiramente em vista atender pacientes ingleses da já grande colónia britânica fixada na Ilha, mas logo depois estendeu a sua ação aos madeirenses pobres, que atendia gratuitamente. Ajudado pelos fundos disponibilizados pelos comerciantes ingleses, pôde abrir um pequeno hospital de 12 camas, onde atendia e tratava os madeirenses de menos recursos, alargando, depois, a sua ação à difusão do ensino primário, para o qual abriu várias escolas espalhadas pela parte oriental da Madeira, nas zonas de Santa Cruz, Santo da Serra, Machico e Porto da Cruz, onde ele próprio assumiu funções de alfabetização. Atendendo a que as autoridades portuguesas pouca atenção dedicavam, na altura, quer à generalização da educação, quer à prestação de cuidados de saúde aos mais desfavorecidos, cedo a fama de benemérito do reverendo Kalley se consolidou, valendo-lhe os maiores elogios de todos os quadrantes sociais da Madeira e até da própria câmara municipal do Funchal, que, em maio de 1841, publicamente o louvou pela atividade filantrópica. Aproveitando a onda de simpatia gerada à sua volta, o reverendo Kalley iniciou, então, uma campanha de conversão ao protestantismo que, graças às suas qualidades oratórias e ao reconhecimento do seu trabalho meritório na assistência social, rapidamente conquistou um inusitado número de adeptos, começando a preocupar as autoridades. As notícias destas conversões terão chegado a Lisboa em 1841, vindo de lá ordens para o deão da sé, Dr. Januário Vicente Camacho, no sentido de travar a campanha evangelizadora. Apesar destas determinações, o Dr. Januário Camacho, amigo pessoal do reverendo Kalley e antigo exilado em Inglaterra por razões políticas, não agiu com a assertividade que o momento requeria, pelo que, em vez do pretendido esmorecimento do proselitismo protestante, assistiu-se, pelo contrário, a um aumento da sua atividade, patente, por exemplo, na adoção da Bíblia protestante como fonte de textos usados nas escolas fundadas por Kalley. A agravar esta conjuntura, já de si complexa, a Madeira sofreu, em 1842, uma grande aluvião que veio maximizar os efeitos da crise económica que já se sentia como reflexo das alterações do contexto político, fazendo grassar a fome por todo o arquipélago. A degradação das condições de vida na Madeira teria, também, contribuído para o engrossar das fileiras dos seguidores de Kalley, fenómeno que, em 1843, começou a gerar grande apreensão por parte das autoridades insulares. Essa preocupação revelou-se, por exemplo, em advertências do administrador do concelho do Funchal ao pastor, no sentido de não falar de religião aos madeirenses, e em alertas do governador, Domingos Olavo Correia de Azevedo, à população, salientando a ilegalidade do culto protestante. Por outro lado, a Igreja também reagia, e instaurava processos por heresia a dois convertidos. A imprensa juntou-se ao coro das críticas, chegando o periódico católico O Imparcial a recomendar o chicote, a forca e a fogueira como únicos meios capazes de travar a progressão das ideias calvinistas. O governador, por seu turno, continuava a oficiar para Lisboa, informando da marcha dos acontecimentos, que se sentia incapaz de travar, e pedindo auxílio à rainha, a quem solicitava que as notícias fossem comunicadas. A 23 de maio de 1843, o governador chegou a um entendimento com o reverendo, que garantiu não voltar a receber madeirenses nas suas práticas, compromisso que violou logo um dia depois. Em julho do mesmo ano, instaurou-se a Kalley um processo-crime no tribunal do Funchal, do qual resultou a prisão do pastor e de 26 seguidores. Encarcerado durante seis meses, o reverendo foi, depois, libertado por diligências da comunidade inglesa, de novo retomando as suas atividades, para as quais tinha conseguido mais financiamento no decurso de uma viagem que efetuou a Inglaterra. Foi este o conturbado contexto com que deparou o novo bispo do Funchal, que, ao desembarcar na Ilha em 8 de julho de 1844, logo meteu mãos à complicada obra que o aguardava, publicando uma pastoral com data de 13 do mesmo mês, na qual, depois de declarar que por várias vezes declinara a mitra, passava a louvar o clero diocesano que reputava de respeitável, conspícuo e benemérito, para além de muito competente para dirigir o rebanho, numa alusão, ainda que velada, à ausência de necessidade de recurso a outros pastores. Mais abertamente, logo depois referia-se aos dias de tribulação por que passava a Ilha, sujeita ao cisma e à heresia, contra os quais apontava a firmeza na fé como solução, exortando os fiéis a permanecerem constantes na crença dos antepassados. Depois deste, e antes de o ano findar, saíram à luz outros três textos, mais ásperos, e todos voltados para o combate à heresia. Aproveitando os recursos que a época disponibilizava, D. José Cerveira e Sousa fazia igualmente publicar na imprensa, dois dias depois, uma exortação pastoral consonante com o texto referido, pretendendo assim alcançar um público o mais vasto possível, o mesmo acontecendo com outras determinações episcopais que também serão anunciadas em periódicos. Ciente dos efeitos que a crise económica tinha sobre a população, o bispo alertava também contra o impacto que as fingidas ações de beneficência traduzidas “num capcioso bocado de pão” produziam no povo, falando da importância de se não cair nas garras do “lobo” (ARM, Arquivo Paroquial do Episcopado do Funchal, doc. 411, fl. 17). A produção de tantas pastorais num tão curto espaço de tempo dá bem a medida da inquietação do bispo, que se começava a ver impotente para deter o avanço das conversões de Kalley, e explica que, logo em janeiro de 1845, o prelado tenha continuado o seu labor com mais um documento em que, desta feita, aplicava à Madeira o resultado de uma súplica para que se diminuíssem os dias santos, por se considerar que eram sério obstáculo ao trabalho necessário à sobrevivência em tempos tão difíceis. O mesmo texto dava, ainda, conta da ausência de Kalley para Inglaterra, apelando à população para que aproveitasse o momento para se purificar do “mortífero veneno” que a atingira (Ibid., fl. 18). Perante o regresso do pastor protestante, D. José Cerveira e Sousa, desiludido com a falta de resposta positiva às suas repetidas exortações, decidiu trocar a Ilha pelo reino, invocando, a 12 de fevereiro de 1846, um débil estado de saúde, o cansaço da administração e a necessidade de pessoalmente resolver alguns negócios, deixando, por algum tempo, o governo da diocese ao provisor do bispado. Sem conseguir prever o rumo dos acontecimentos, despedia-se, considerando que aquela exortação pudesse ser “talvez, Deos o sabe, […] a ultima que vos dirigimos” (Ibid., fl. 21). A 2 de agosto de 1846, contudo, deu-se um volta-face na situação do reverendo Kalley, que viu alguns seguidores perseguidos pela população. Travado o processo pela polícia, reacendeu-se poucos dias depois, quando, a 8 e 9 do mesmo mês, se registaram novos incidentes em que foram visados habitantes “calvinistas” de Santo António da Serra e do Lombo das Faias, expulsos das suas residências, as quais acabaram pasto das chamas. No mesmo dia 9 também a casa do próprio reverendo foi objeto da fúria popular, que a invadiu na esperança de encontrar o pastor. Este, contudo, avisado a tempo, tinha conseguido refugiar-se, embarcando no dia seguinte, disfarçado de mulher, num barco inglês que o levou para não mais voltar. Este ponto final na questão Kalley na Ilha não pôde deixar de agradar ao prelado, que graças a ele e em resposta à chamada do novo governador, José Silvestre Pereira, se aprestou a regressar, congratulando-se, a 30 de outubro de 1846, pela devolução do seu rebanho que, depois de dilacerado por “esse lobo da Escócia”, era exortado a retornar ao redil do catolicismo (Ibid., fl. 32). José Silvestre Ribeiro, empossado como governador a 7 de outubro de 1846, ficara, à sua chegada ao Funchal, consternado com dois aspetos da vida na Ilha: um enorme fluxo migratório para Demerara e outros pontos da América do Sul e a devastadora miséria que assolava os residentes. Para fazer face a esse cenário desolador, o governador encetou, de imediato, contactos com diversas personalidades locais, nomeadamente com autoridades eclesiásticas, e a 13 de outubro enviava para o reino um pedido de urgente regresso de D. José Cerveira e Sousa, o qual foi, como se viu, prontamente correspondido. Na procura de soluções incluiu o governador a reativação de uma Comissão Central de Auxílio que então se passou a designar Comissão de Socorros Públicos, de cuja presidência encarregou o prelado. Este foi apenas um dos sinais do apreço que Silvestre Ribeiro tinha pelo bispo, mas outros se podem encontrar no período de tempo em que coexistiram na Madeira. Um deles foi a nova indigitação do prelado para presidir ao Asilo de Mendicidade, que o governador fez acompanhar de sentido agradecimento da “inestimável fineza” de que dera provas D. José Cerveira de Sousa ao aceitar aquele encargo (CARITA, 2008, 115). Outro prende-se com a colaboração do governador com a Igreja insular demonstrada na campanha de obras levadas a cabo para recuperar igrejas degradadas, nomeadamente a do Santo da Serra, a matriz de S. Jorge e a igreja do Colégio que, depois de reabilitada, foi entregue à diocese. Podendo, agora, depois de desaparecida a ameaça Kalley, dedicar-se a outros aspetos da vida diocesana, D. José Cerveira e Sousa apelava, em fevereiro, à caridade dos fiéis, exortando-os a ajudar os necessitados, e, a 11 de março de 1847, à realização de novenas de preces para se acabar a fome. A 10 de agosto, o bispo dirigia-se aos madeirenses para que se mantivessem em paz, evitando replicar na Ilha o clima de agitação social que se vivia no reino. Já em julho de 1848, e graças a cartas régias enviadas por D. Maria II, se ficava a saber que o bispo tinha procedido a diligências anteriores que visavam um aumento das côngruas eclesiásticas e a uma nova divisão paroquial que reformulava quatro paróquias anteriores: Água de Pena, Achadas da Cruz, Quinta Grande e Faial, cuja área se pretendia aumentar. No tocante às remunerações do clero, a carta régia refere ter emitido, em maio de 1845, ordens no sentido de se proceder a averiguações sobre o verdadeiro estado económico dos eclesiásticos, das quais ficaram encarregados o bispo e o governador. A essas pesquisas se ficarão, talvez, a dever os comentários que José Silvestre Ribeiro produziu sobre a situação, quando declarava que os membros do clero, apesar de muito necessários, eram “contra toda a razão, os mais mal recompensados” (CARITA, 2008, 116). A ação conjunta das duas personalidades permitiu, pois, que se remediasse o estatuto financeiro de párocos, curas e beneficiados. Assim, quando em 1849 D. José Cerveira de Sousa trocou o bispado da Madeira pelo de Beja, levava a consciência de ter realizado um trabalho meritório na diocese, que tinha deixado mais serena e apetrechada do que quando a recebera. D. José de Cerveira e Sousa acabou por, depois de Beja, ser bispo de Viseu, cargo a que resignou, retirando-se para a sua terra natal, Mogofores, onde veio a falecer a 15 de março de 1862.       Ana Cristina Trindade Rui Carita (10.02.2017)                        

História Económica e Social História da Educação Religiões

silva, nuno estêvão lomelino da

(Funchal, 1892 - Lisboa, 1967) Lomelino Silva foi um tenor lírico madeirense do séc. XX, de renome internacional. Estudou canto em Lisboa e em Itália, estreando-se no Teatro Dal Verme de Milão. Realizou várias digressões pelos grandes palcos mundiais, alcançando sucesso na interpretação de importantes papéis em óperas de, entre outros, Verdi e Puccini. Nos Estados Unidos da América foi chamado de “Caruso português”, por comparação com Enrico Caruso, célebre cantor italiano de música clássica. Em 1926, gravou alguns temas musicais pela editora britânica His Master’s Voice, que foram recuperados em 2009, na edição de um CD áudio, no Funchal. Palavras-chave:  música, ópera, tenor, teatro, cultura. Nuno Estêvão Lomelino da Silva foi um tenor lírico do séc. XX, que se tornou uma das figuras madeirenses mais célebres da sua época, com uma carreira artística de grande projeção internacional. No meio artístico usava o nome Lomelino Silva, pelo qual também ficou conhecido. Lomelino Silva nasceu na R. das Maravilhas, no sítio da Cruz de Carvalho, pertencente à freguesia de São Pedro, no Funchal, a 26 de dezembro de 1892, e faleceu em Lisboa, a 11 de novembro de 1967, um mês antes de completar 75 anos. Era filho de Guilherme Augusto da Silva e de Helena Lomelino da Silva. Completou o curso da Escola Comercial Ferreira Borges e, posteriormente, da Escola de Oficiais Milicianos. Trabalhou em Lisboa, no Banco Totta, alistando-se depois no Exército, onde alcançou o posto de alferes de Artilharia. Durante a Primeira Guerra Mundial participou na defesa da ilha da Madeira, quando foi atacada por submarinos alemães. Todavia, encorajado por amigos, acabou por abandonar a carreira militar e prosseguir os estudos na área da música. A sua estreia como cantor aconteceu em 1916, num recital de caridade, no então denominado Teatro Dr. Manuel de Arriaga (posteriormente Teatro Municipal Baltazar Dias), onde recebeu vários elogios pela sua interpretação da opereta Primeiros Afectos, da autoria de Alberto Artur Sarmento. Após o sucesso da sua primeira apresentação pública, seguiu para Lisboa, em 1918, ainda antes do fim da Primeira Guerra Mundial, para ter aulas de canto com o professor Alberto Sarti. Mais tarde, por volta de 1920, depois de regressar à Madeira, acatou diversos conselhos para estudar em Itália, onde foi aperfeiçoar o seu talento musical e adquirir conhecimentos técnicos do bel-canto como discípulo de Giovanni Laura e Ercole Pizzi, dois conceituados músicos da época. No dia 31 de dezembro de 1921, estreou-se nos palcos italianos, no Teatro Dal Verme de Milão. Esta data determinaria o início de uma carreira singular como cantor lírico, marcada por várias digressões internacionais, com apresentações públicas em vários países. Em Itália, Lomelino Silva interpretou os importantes papéis de Duque de Mântua, na ópera Rigoletto, de Verdi, e de Rodolfo, em La Bohème, de Puccini, alcançando notável reconhecimento. Ao longo da sua carreira artística desempenhou vários papéis de destaque, em obras como Mefistófeles, Tosca, Fausto, entre outras. Interpretou igualmente canções portuguesas conhecidas na época, que cantava nos seus espetáculos. No início de 1922, integrou uma companhia italiana de ópera e fez uma digressão pela Holanda. No final daquele ano, fez a sua primeira digressão ao Brasil. Nas diversas atuações que realizou nos anos seguintes, incluíram-se as que efetuou pela Europa onde, além dos concertos produzidos em várias cidades italianas, o cantor madeirense atuou ainda em Espanha, França, Suíça e Inglaterra. Decorria o ano de 1926 quando Lomelino Silva foi convidado pela editora musical britânica His Master’s Voice para gravar alguns temas, tendo sido o primeiro madeirense a ter este privilégio, de acordo com Duarte Mendonça. O reportório fonográfico incluiu composições de Verdi, Sarti, Tomás de Lima, Fernando Moutinho, Coutinho de Oliveira, António Menano, Alfredo Keil e Rui Coelho. As gravações foram distribuídas internacionalmente, o que contribuiu para a projeção mundial do tenor madeirense. Em 1927, andou em digressão pelos Estados Unidos da América, sobretudo na Florida, Nova Iorque, Pensilvânia, Massachusetts, Virgínia e Califórnia. Neste país foi comparado ao tenor italiano Enrico Caruso, devido à sua excelente voz, tendo recebido a alcunha de “Caruso português”. Na verdade, também no Brasil, em 1930, a imprensa brasileira corroborou o cognome atribuído pelos americanos e os elogios à sua voz. Em 1931, encetou outra digressão mundial, que duraria cerca de dois anos, com início pela costa leste e oeste dos Estados Unidos e pelo Havai. A partir da América empreendeu uma viagem por diversos territórios asiáticos como Xangai, Hong-Kong, Macau, Filipinas, Singapura e Índia, passando depois por Moçambique e a África do Sul, onde deu vários concertos. Em 1934, realizou uma digressão pelas Antilhas e, mais tarde, em 1936, viajou novamente pelos Estados Unidos, apresentando-se em cidades como Nova Iorque, Hollywood e Los Angeles. Entre 1938 e 1949, Lomelino Silva terá ainda voltado a atuar nas Antilhas e no Brasil, antes de se despedir dos palcos, em fevereiro de 1949, no Cinema Tivoli, em Lisboa. A par das atuações internacionais, em que foi reconhecido pelo seu talento, o tenor madeirense foi realizando concertos no seu país, nomeadamente, em Lisboa, no Porto e nos arquipélagos. À Madeira regressou várias vezes, apresentando diversos recitais líricos no Teatro Municipal do Funchal, que ia interpolando com a sua aclamada carreira internacional. Refira-se, e.g., os espetáculos realizados nos anos de 1921, 1925, 1926, 1928, 1931, 1933, 1939, 1943, 1944 e 1946, o que revela a sua estima à terra natal, pelo número de vezes que atuou “em casa”. A imprensa da época, quer a regional, quer a nacional e mesmo a internacional, por diversas vezes elogiou a melodiosa voz de Lomelino Silva e os seus concertos tiveram largo destaque nas páginas dos diferentes jornais. A imprensa madeirense, em reconhecimento do seu conterrâneo, dedicou-lhe vários artigos, sobretudo quando atuava no Funchal. Cantores de Ópera Portugueses (1984), de Mário Moreau, dedica um longo artigo ao tenor madeirense incluindo transcrições de artigos de alguns periódicos nacionais e internacionais com menções a Lomelino Silva. É também possível seguir a trajetória do célebre cantor lírico através das informações ali contidas, relativas a datas, locais, programação dos recitais e concertos dados ao longo da sua carreira artística. Em reconhecimento do seu talento, foram-lhe prestados vários tributos em vida e póstumos. Em 1925, foi realizada uma homenagem no Funchal, com o descerramento da uma placa de mármore com o seu nome no Salão Nobre do Teatro Municipal. Tratou-se de uma iniciativa do Club Sport Marítimo, após o êxito de um concerto promovido pelo Club Sports da Madeira, organizado por um grupo de amigos de Lomelino Silva, em agosto de 1925, e das solicitações do público para a realização de uma segunda récita. O Club Sport Marítimo decidiu então promover um segundo concerto, pedindo ainda autorização à Câmara Municipal do Funchal para a colocação de uma placa comemorativa da passagem do tenor pelo Teatro. A proposta foi aprovada pelo município funchalense, que se associou à iniciativa. Quatro anos depois, a 19 de junho de 1929, foi condecorado por Óscar Carmona, então Presidente da República portuguesa, com o grau de Oficial da Ordem Militar de Cristo, a maior homenagem que recebeu em vida no seu país natal. Em 1992, por ocasião do centenário do seu nascimento, o Governo regional da Madeira promoveu a colocação de uma placa comemorativa no local onde nasceu Lomelino Silva. Posteriormente, em 2001, o tenor português Carlos Guilherme (n. 1945) prestou-lhe tributo, promovendo um espetáculo no Teatro Municipal Baltazar Dias, onde interpretou o mesmo reportório apresentado pelo madeirense em Lourenço Marques (a então capital de Moçambique), a 29 de dezembro de 1932. Mais tarde, em 2009, foi editado um CD que recupera as gravações de Lomelino Silva realizadas em Londres, em 1926. Esta edição discográfica inclui um livreto com a sua biografia, elaborada por Duarte Miguel Barcelos Mendonça, assim como transcrições de artigos publicados na imprensa.   Sílvia Gomes (atualizado a 03.02.2017)

Artes e Design Cultura e Tradições Populares História Militar Madeira Cultural

silva, josé marmelo e

José Marmelo e Silva nasceu no Paul, concelho da Covilhã, a 7 de maio de 1911, tendo falecido em Espinho, a 11 de outubro de 1991. Frequentou o ensino secundário na Covilhã e em Castelo Branco, e o ensino superior em Coimbra e Lisboa, onde se licenciou em Filologia Clássica, com a dissertação Um Sonho de Paz Bimilenário: a Poesia de Virgílio. Fez serviço militar em Mafra, uma experiência com ecos em Depoimento, e na Madeira, vivência que ressoará em Desnudez Uivante. Regressa à Madeira já casado para, com a esposa, lecionar no Colégio Académico do Funchal, no ano letivo de 1946-1947. No ambiente insular, encontrou inspiração para escrever os Poemas da Ilha do Porto Santo, que publica na Seara Nova, na década de 1960. Foi, porém, em Espinho que exerceu funções docentes a maior parte do tempo, dando o seu nome à biblioteca local. De 1932 a 1983, publicou, com várias reedições, diversos livros, deixando inéditos os Memoriais, de carácter autobiográfico: O Homem que Abjurou a Sociedade – Crónicas do Amor e do Tempo, contos (Renegado); a novela Sedução; Depoimento, contos; O Sonho e a Aventura, narrativas; a novela Adolescente, título da 1.ª edição, alterado para Adolescente Agrilhoado na 2.ª edição aumentada; O Ser e o Ter Seguido de Anquilose, contos (a primeira versão de O Ser e o Ter é O Conto de João Baião, que teve uma única edição); o romance Desnudez Uivante. Foi agraciado, em 1987, com a medalha de ouro da cidade de Espinho e, em 1988, com o grau de Comendador da Ordem de Mérito, pelo então Presidente da República, Mário Soares. Obras de José Marmelo Silva: Poemas da Ilha do Porto Santo; O Homem que Abjurou a Sociedade – Crónicas do Amor e do Tempo (1932); Sedução (1937); Depoimento (1939); O Sonho e a Aventura (1943); Adolescente (1948) Adolescente Agrilhoado (1958); O Ser e o Ter seguido de Anquilose (1968); Desnudez Uivante (1983).   António Moniz (atualizado a 03.02.2017)

Literatura Madeira Cultural

psicologia na educação especial

Em 1978, na sequência da política de regionalização dos serviços, foi criado o Centro Regional de Educação Especial (CREE), no qual foram integrados os estabelecimentos de ensino para deficientes auditivos, visuais e intelectuais. Entre 1965 e 1978, o apoio a crianças e jovens que frequentavam os estabelecimentos de ensino para crianças e jovens com deficiências da audição e da fala, intelectual e visual funcionava na dependência de um serviço nacional, o Instituto de Assistência aos Menores, posteriormente integrado no Instituto da Família e Ação Social. Nessa altura, as crianças e jovens deficientes eram apoiados, na área da psicologia, pelo Centro de Observação e Orientação Médico Pedagógico, cujos técnicos se deslocavam à Região Autónoma da Madeira (RAM), sob a orientação do Dr. Bairrão Ruivo. Foi em 1980 que o CREE contou com o primeiro psicólogo nos seus quadros. A 7 de abril do ano seguinte, foi criada a Direção Regional de Educação Especial (DREE), que imprimiu uma nova dinâmica no apoio às crianças e jovens com deficiência da Região. Na sua orgânica, integrou, pela primeira vez, um Serviço de Psicologia, com a função de “apoiar os Serviços Técnicos de Educação, incumbindo-lhe a observação, o diagnóstico e a orientação psicopedagógica dos educandos e futuros utentes, em colaboração com outras valências e serviços”. Em 1984, com a reestruturação do Governo da RAM, a DREE, que até então constituía um departamento da Secretaria Regional dos Assuntos Sociais, foi integrada na Secretaria Regional de Educação, privilegiando-se, nesta nova fase, a interação entre todos os graus de ensino e estabelecimentos de ensino regular. A designação “Direção Regional de Educação Especial e Reabilitação” (DREER) surgiu em 1997, no decreto regulamentar regional n.º 13-A/97, de 15 de julho, estabelecendo a criação e descentralização de vários serviços de atendimento às crianças e jovens com necessidades educativas especiais. A necessidade de integrar psicólogos nas equipas multidisciplinares que entretanto se foram constituindo na DREER tornou-se cada vez mais notória na déc. de 90, período ao longo do qual o número de psicólogos admitidos duplicou. Aos poucos, os psicólogos foram-se afirmando como um grupo profissional indispensável na resposta psicopedagógica às crianças e jovens com necessidades educativas especiais. Com a alteração da estrutura orgânica da Direção Regional de Educação Especial e Reabilitação, aprovada pelo despacho n.º 103/2005, é criada, em setembro de 2005, a Divisão de Psicologia, que em novembro de 2008 passa a designar-se Divisão de Psicologia e Orientação Vocacional (DPOV), dirigida por um psicólogo, chefe de divisão. A existência desta divisão na orgânica da DREER possibilitou uma forte coesão e identidade socioprofissional, bem como uma resposta consistente e atualizada em termos técnico-científicos, tornando-se uma referência para outros psicólogos da RAM. Com cerca de 40 psicólogos, alguns dos quais a exercerem funções de coordenação e direção, a DPOV tinha por missão “garantir a intervenção psicológica junto dos alunos / utentes dos diferentes serviços técnicos de educação e de reabilitação profissional e programas ocupacionais, em colaboração com a família e comunidade, contribuindo para o seu equilíbrio sócio emocional”. A sua atuação regia-se pelos princípios e orientações subjacentes ao Código Deontológico da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP), de onde se destacavam valores como respeito pela dignidade e direitos da pessoa, competência, responsabilidade e integridade. A DPOV apresentavaas seguintes atribuições e competências: “a) Observar, diagnosticar e orientar os educandos e futuros utentes com vista à adaptação ou reeducação escolar, profissional e social, consoante as características individuais, disfunções ou perturbações; b) Prestar apoio psicoterapêutico, nos casos em que apresentem perturbações emocionais e comportamentais resultantes de deficiência ou de sobredotação; c) Acompanhar e supervisionar a intervenção protagonizada pelos elementos desta área afetos aos diferentes serviços da DREER”. A intervenção do psicólogo da DPOV era muito versátil pela variedade de áreas, faixas etárias e serviços que apoiava. O psicólogo intervinha desde a idade precoce (0-6 anos), junto de alunos com necessidades educativas especiais a frequentar os 1.º, 2.º e 3.º ciclos até à idade jovem e adulta; a sua atuação abrangia o domínio sensorial (audição e visão), o domínio cognitivo e da aprendizagem (deficiência intelectual, dificuldades intelectuais, dificuldades de aprendizagem específicas e perturbação da linguagem e da fala), o domínio motor (perturbações das aptidões motoras e problemas motores/neuromotores), o domínio cognitivo, motor e/ou sensorial (multideficiência), o domínio da comunicação, relação e afetivo-emocional (perturbação da relação e comunicação, perturbações do espectro do autismo e perturbações emocionais ou comportamentais graves) e outras condições não enquadradas nos domínios anteriores, tais como atraso global de desenvolvimento, défice de atenção com ou sem hiperatividade e sobredotação. O psicólogo tinha uma participação ativa nas equipas multidisciplinares dos vários serviços técnicos de educação especial e reabilitação (Serviços Técnicos de Educação, Centros de Apoio Psicopedagógicos e Centros de Atividade Ocupacionais, Serviço Técnico de Integração e Formação Profissional, entre outros) e trabalhava não só com o aluno/utente, mas também com os pais/tutores, professores e demais agentes comunitários, em prol do desenvolvimento educativo, socioprofissional e pessoal. Deste modo, contribuía para o desenvolvimento da própria instituição escolar ou ocupacional e da comunidade. Na avaliação multidisciplinar, o psicólogo assume um papel importante na elegibilidade de crianças, jovens e adultos com necessidades especiais. A sua atuação, pautada por uma intervenção mais próxima da abordagem ecológica e de respostas inclusivas, centradas no eixo preventivo, estava orientada no sentido de promover as potencialidades das crianças e jovens com necessidades especiais, procurando minimizar as suas diferenças e maximizar as suas capacidades, facilitando, assim, a sua inserção nos vários contextos e promovendo, em alguns casos, a sua transição para a vida ativa. Muitas vezes, o recurso ao apoio psicológico visava promover o processo de aprendizagem e integração social do aluno, em virtude de, em muitos casos, às necessidades especiais estarem associados problemas emocionais ou, até, perturbações psicopatológicas, os quais exponenciam as dificuldades de aprendizagem e integração. A intervenção do psicólogo contemplava, por vezes, uma vertente clínica/terapêutica. O psicólogo da DREER desempenhava, igualmente, funções de formação de novos psicólogos, nomeadamente através da orientação de estágios profissionais promovidos pela OPP e pelo Instituto de Emprego da Madeira, e colaboração na orientação de estágios curriculares dos finalistas do Mestrado em Psicologia da Educação da Universidade da Madeira; da colaboração na supervisão clínica e educacional dos estágios; da participação no ensino da unidade curricular de Psicologia da Educação, da licenciatura em Psicologia da Universidade da Madeira – a saber, através da intervenção em painéis em que era abordado o papel do psicólogo nos diferentes contextos educativos e da receção de alunos para contacto direto com a praxis do psicólogo na educação especial. A prática do psicólogo contemplava ainda atividades de pesquisa e investigação e a utilização dos respetivos resultados na prática educacional. Bibliog.: AGUIAR, E., “História do apoio à deficiência na RAM”, Educação Especial, n.º 30, 1985, pp. 11-25; dec. reg. n.º 13/81, de 23 de junho; dec. reg. n.º 12/84, de 22 de novembro; dec. reg. regional n.º 13-A/97, de 15 de julho; desp. n.º 5/78, de 5 de abril; desp. n.º 103/2005. Líria Maria Jardim Fernandes Luísa Valentina Teixeira de Mendonça Correia (atualizado a 03.02.2017)

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moniz, jaime

Fig. 1 – Fotografia da estátua de Jaime Moniz, da autoria do mestre Anjos Teixeira, inaugurada em 1961 pela Câmara Municipal do Funchal. Fotografia de António Freitas. Aquele que viria a ser um dos grandes intelectuais portugueses e mais ilustres madeirenses do séc. XIX, distinguindo-se pela sua eloquência e erudição, como pensador e político, nasceu no ano de 1837, data da fundação do Liceu Nacional do Funchal. Passados 80 anos, o Liceu foi designado por “Jaime Moniz”, pelo decreto n.º 5096 de 13 de janeiro de 1919, em memória deste ilustre jurisconsulto, académico, professor e político que marcou a sua época. Jaime Constantino de Freitas Moniz, ficando conhecido pelo nome abreviado de Jaime Moniz, nasceu no dia 18 de fevereiro, na freguesia de Santa Maria Maior, Funchal, sendo filho de António Caetano da Costa Moniz, avô de Augusto César Barjona de Freitas, um influente e iminente político do partido regenerador que terá uma influência decisiva no percurso político do seu primo Jaime Moniz, e de Eufémia de Freitas, filha de António de Freitas. Após frequentar o ensino primário, matriculou-se no Liceu, como aluno ordinário, na 1.ª e 2.ª cadeiras, com a idade de 14 anos, em outubro de 1851, conforme registo n.º 30 do Livro de Termos (fig. 2). Nesse ano e nos subsequentes obteve sempre a classificação máxima e, em 1857, rumou para Coimbra, a fim de cursar direito.   Fig. 2 – Reprodução o registo de matrícula do aluno Jaime Constantino Freitas Moniz em 1851. Fonte: ARM, Liceu Jaime Moniz.   Bulhão Pato escreveu que o seu exame de admissão foi um verdadeiro acontecimento e deixou-nos um interessante testemunho do seu encontro fortuito com o jovem Jaime Moniz aquando de uma visita à Madeira, relatando-nos que, apesar dos seus 14 anos, a sua imaginação já era brilhante e que ficara impressionado com a sua sabedoria e maturidade. O interesse pelas letras e pelos assuntos históricos e filosóficos era já visível no jovem adolescente quando, em 1860, quis conhecer pessoalmente Alexandre Herculano, por quem nutria uma especial admiração, não só pelo seu talento como escritor, mas também pelo seu carácter. Frequentou o curso de direito durante cinco anos, de 1857 a 1862, como um aluno estudioso, aplicado e preocupado com os temas ligados à Literatura, Filosofia e História, sendo o seu desempenho brilhante. Por esse facto, recebeu sempre o primeiro prémio, no valor de 40 réis, o que o ajudou a custear os seus estudos, considerando que, embora pertencesse a uma família conceituada funchalense, esta carecia de recursos económicos. Acabado o curso em 1862, estabeleceu-se em Lisboa, onde exerceu advocacia, retirando-se pouco tempo depois por causa do serviço público, do seu frágil estado de saúde e também por ser uma pessoa tímida e reservada, apesar de ser dotado de excelentes dotes oratórios e de ter adquirido boa fama. Assim, podemos compreender a sua opção por uma carreira orientada para o ensino e para as questões pedagógicas quando, em 1863, concorreu à vaga aberta na 5.ª cadeira – História Universal e Filosófica – do Curso Superior de Letras, criado pelo Rei D. Pedro V, apresentando a tese Da Natureza e Extensão do Progresso Considerado como Lei da Humanidade e Applicação Especial dessa Lei às Bellas Artes. Aprovado por unanimidade, ingressou no ensino nesse mesmo ano. Bulhão Pato, nas suas Memórias, reportava que as suas aulas atraíam a atenção de quantos prezavam as letras e que todas as noites a sala se enchia para o ouvir. Referia ainda que em poucos homens tinha conhecido tão elevados dotes de orador. Jaime Moniz foi professor do Curso Superior de Letras desde 1863 até 1901, exercendo o seu magistério com alta distinção e tendo como colegas grandes vultos das letras portuguesas, como Pinheiro Chagas, Adolfo Coelho e Teófilo Braga. Em 1901, abandonou a docência para presidir o Conselho Superior de Instrução Pública. Com a criação da Junta Consultiva de Instrução Pública, em 14 de dezembro de 1869, foi um dos seis vogais escolhidos para a integrar. Assim, entre 17 de julho de 1873 e 19 de setembro de 1878, presidiu às sessões da referida Junta em virtude de desempenhar, nesse período, as funções de Diretor Geral da Instrução Pública. Esta escolha contribuiu para afirmar Jaime Moniz como um dos principais pensadores da educação em Portugal. Por esta junta passavam todos os problemas referentes ao ensino, pelo que ficamos a conhecer, através das atas das suas sessões, os pensamentos, as opções e as posições pedagógicas, políticas e até filosóficas dos seus membros. Apesar de ter orientado a sua atenção para as questões de ensino, Jaime Moniz não deixou de exercer as funções de tribuno, deixando traços do seu brilhantismo e suscitando a profunda admiração dos seus contemporâneos. Em 1867, defendeu o Cap. D. Rodrigo de Almeida, que fora padrinho de um duelo em desagravo de alegadas ofensas no qual estiveram envolvidos um deputado e um sobrinho do irmão do marquês de Sá da Bandeira, resultando na morte do deputado. Rodrigo de Almeida foi acusado e julgado em Conselho de Guerra, tendo Jaime Moniz obtido para o seu constituinte a pena mínima. Uma situação surgiu em 1870, quando Jaime Moniz se apresentou a defender José Cardoso Vieira de Castro, escritor e ex-deputado do partido regenerador, acusado de crime de homicídio contra a sua mulher. O julgamento, além de ser muito concorrido, pela identidade do arguido e grande divulgação nos meios de comunicação social, teve um enorme impacto na opinião pública, sendo a alegação da defesa considerada como um dos trechos mais brilhantes e eloquentes que nos tempos modernos se havia pronunciado na história do foro português. Jaime Moniz empenhou-se profundamente na defesa do amigo e antigo companheiro nas lides académicas de Coimbra com notável brilhantismo e eloquência, o que lhe valeu encómios de diversos intelectuais portugueses, nomeadamente de Camilo Castelo Branco e Pinheiro Chagas, tendo este feito uma notável apreciação em folhetim da Gazeta do Povo n.º 336, de 1871. Por sua vez, os portugueses residentes no Rio de Janeiro enviaram uma coroa de ouro a Jaime Moniz como tributo de homenagem pelo monumental discurso. Os discursos proferidos e as atas do julgamento foram publicados em livro intitulado O Processo e Julgamento de José Cardoso Vieira de Castro, tendo a edição esgotado rapidamente. No campo político, Jaime Moniz aderiu à causa do Partido Regenerador, formado em torno de personagens ligadas a um passado cartista, como Saldanha e Fontes Pereira de Melo. Tal partido viria a tornar-se no mais forte e qualificado da segunda metade do séc. XIX, sendo o responsável pelas grandes mudanças operadas nos domínios económico e social, nas décs. de 70 e 80 de oitocentos. Em 31 de março de 1870, Jaime Moniz iniciou o primeiro mandato como deputado eleito pelo círculo de Castelo Branco. Nesse ano, a enorme expectativa gerada com a abertura das chamadas “Conferências do Casino”, iniciativa de uma plêiade de grandes intelectuais que foi depois proibida, gerou um enorme escândalo na sociedade portuguesa, levando à queda do ministério do marquês de Ávila e Bolama. Para presidir a um novo governo foi chamado Fontes Pereira de Melo, em setembro de 1871. A vitória do movimento liberal em 1834 não acabara com a instabilidade política e social, e o novo governo iria encetar um dos períodos mais longos e estáveis da monarquia constitucional, conhecido como a regeneração/fontismo, que trouxe ao país um grande crescimento económico e tecnológico. Do novo governo faziam parte Augusto César Barjona de Freitas, como Ministro dos Negócios Eclesiásticos e da Justiça, e Jaime Moniz, como Ministro da Marinha e do Ultramar. Havia apenas decorrido uma semana da sua tomada de posse, quando eclodiu uma revolta no exército do Estado da Índia Portuguesa. Para fazer face a esta difícil e complexa situação, tomou de imediato as providências consideradas mais adequadas para rapidamente restabelecer a ordem, enviando um reforço de tropas e decretando a extinção do exército no referido estado. Em seguida, apresentou um conjunto de medidas legislativas que visavam obter transformações económicas e sociais pela introdução de novos estabelecimentos de ensino, nomeadamente a criação de um instituto profissional para preparar os jovens do dito Estado para tarefas nos domínios agrícola, industrial e comercial e uma escola de pilotagem. Estas medidas evidenciaram os seus valores, o seu carácter e a sua visão, bem como a sobreposição dos seus ideais pedagógicos às conveniências estritamente políticas. Jaime Moniz também percorreu os meandros difíceis e tortuosos da política nacional. A sua passagem pelo governo foi relativamente breve, pois, em 19 de novembro de 1872, era exonerado a seu pedido, alegando motivos de saúde como era costume, mas alguns testemunhos defenderam que o abandono do governo se deveu mais à sua personalidade e ao seu talento, que dificilmente se moldavam às conveniências estritas da política. Embora tendo sido eleito em várias legislaturas pelos círculos de Castelo Branco e de Goa, a sua atuação como parlamentar foi modesta. Esteve como parlamentar nas legislaturas de 22 de junho de 1871 a 2 de abril de 1874 e de 12 de janeiro de 1875 a 4 de maio de 1878, que coincidiram com o mais longo governo da história do parlamentarismo português sob a presidência de Fontes Pereira de Melo. Causa alguma perplexidade o facto de nunca ter sido deputado pela Madeira e de, após a sua estada em Lisboa, nunca ter regressado à sua terra natal. No seguimento da revisão introduzida pelo 2.º Ato Adicional à Carta Constitucional, de 24 de julho de 1885, foi criada uma parte eletiva na Câmara dos Pares do Reino, tendo Jaime Moniz sido eleito, por unanimidade, Par do Reino pelos estabelecimentos científicos. Nomeado Diretor Geral das Repartições da Câmara de Deputados, em setembro de 1879, exerceu funções até 26 de novembro de 1886, onde demonstrou as suas enormes capacidades de organização e de coordenação, tendo reestruturado todas as secções do parlamento. Um dos atos mais aplaudidos e elogiados consistiu na publicação do Anuário da Câmara dos Senhores Deputados no ano de 1882, que teve continuidade nos anos seguintes e que constitui um repositório importante para o conhecimento intrínseco das atividades parlamentares. A 1 de junho de 1882, foi eleito, em votação unânime, sócio efetivo da Academia Real das Ciências de Lisboa, 2.ª Classe (secção de ciências económicas e administrativas), onde, uma vez mais, manifestou as suas capacidades de organização e administração, tendo procedido à reestruturação de várias secções desta instituição. No Conselho Superior de Instrução Pública, organismo recém-criado pela carta de lei de 23 de maio de 1884, com competências reforçadas e que substituiu a Junta Consultiva de Instrução Pública, Jaime Moniz, como vice-presidente, desempenhará um papel de extrema importância na condução da política educativa, sendo o responsável pela configuração de uma das reformas mais importantes no domínio da educação, tendo ficado conhecida como a Reforma de Jaime Moniz. Em 18 de novembro de 1884, foi nomeada, no Conselho Superior de Instrução Pública, uma comissão, presidida por Jaime Moniz, para se deslocar ao estrangeiro, a fim de proceder a estudos sobre a organização do ensino secundário, e em 27 de agosto do ano seguinte aquele foi incumbido de ir ao estrangeiro estudar a organização do ensino superior. Em menos de um ano, em 14 de janeiro de 1886, e de acordo com a missão de que fora incumbido, apresentava ao referido Conselho uma proposta de reorganização do Curso Superior de Letras em que previa a sua transformação numa Escola Superior de História, Filosofia e Letras. A grande reforma do Curso Superior de Letras, no sentido proposto por Jaime Moniz, ocorreu em 1901, mas até essa data o notável pedagogo nunca deixou de lutar pela dignificação do curso e do seu corpo docente. Em 13 de março de 1890, foi nomeado diretor da publicação, subsidiada pelo Estado, Corpo Diplomático Português, sendo impressos, sob a sua orientação, os tomos X, XI, XIII e XIV que compreendem os documentos relativos aos negócios de Portugal com a Cúria Romana, desde o reinado de D. Sebastião até ao reinado de Afonso VI. Nos finais de 1880, apesar de algumas reformas levadas a cabo no domínio da instrução secundária, o ensino secundário estava em plena crise, estagnado, com enorme descrédito junto da opinião pública, e os liceus eram transformados em fábricas de diplomas, funcionando praticamente só na época de exames. O ensino debatia-se com grandes dificuldades que abrangiam um variado leque de carências: instalações deficientes ou mesmo impróprias, falta ou inexistência de material didático, insuficiente formação científica e pedagógica dos professores, desorganização curricular, politização excessiva das questões educativas e subordinação das normas escolares ao clientelismo eleitoral. Em suma, um conjunto de problemas que se enquadravam na difícil e embaraçosa situação financeira do país. Neste contexto, a crise financeira de 1890 acentuou ainda mais o já de si débil e deficiente estado do ensino. A Reforma de Jaime Moniz enquadrou-se nesta conjuntura adversa e difícil. Os regeneradores, em 1892, voltaram ao poder, chefiados por Hintze Ribeiro, tendo com responsável pelo Ministério do Reino João Franco. Consciente dos graves problemas de que enfermava o ensino secundário, João Franco apresentou, em outubro de 1894, um projeto de reforma ao Conselho Superior de Instrução Pública. Coube a Jaime Moniz a apreciação do projeto, tarefa espinhosa e complexa considerando o estado deplorável a que chegara o ensino secundário. Iniciada em outubro, a Reforma da Instrução Secundária viria a ser publicada no dia 24 de dezembro no Diário do Governo. Causou espanto e admiração o facto de, em tão pouco tempo, Jaime Moniz ter apresentado uma proposta tão bem estruturada e que, pela primeira vez, tentava abranger, de forma orgânica e sistemática, todos os aspetos da vida da escola num determinado grau de ensino: currículos, horários, metodologia e materiais de ensino, organização administrativa e recrutamento e formação de professores. A reforma de Jaime Moniz de 1894/1895 estabeleceu, pela primeira vez, uma unidade orgânica e funcional para os estudos secundários realizados nos liceus e constituiu um marco decisivo na história do ensino secundário porque, ao contrário das reformas que a antecederam, abarcou um conjunto de alterações pedagógicas e organizacionais de forma concertada e estruturada, contemplando as metodologias de ensino, os programas, a avaliação, a organização, a administração dos liceus e a supervisão. A inovação curricular introduzida pela Reforma de 1894-1895 residia no estabelecimento do regime de classes, e não de disciplinas, como a introduzida pela reforma de Passos Manuel, e foi implementada de forma gradual, como previsto no art.º 136 do regulamento de 14 de agosto de 1895. Sob o ponto de vista pedagógico, a reforma apresentou inovações fecundas que viriam a manter-se até aos nossos dias, pelo que pode ser considerada um marco importante na história do ensino secundário de Portugal. Algumas vantagens que poderão ser assinaladas à reforma de Jaime Moniz são: reconhecimento do valor do regime de classe, uma nova metodologia de ensino e uma unidade e organicidade do curso liceal. No entanto, o modelo proposto por Jaime Moniz, fortemente influenciado pela cultura alemã, apresentava aspetos negativos que foram corrigidos pela Reforma de 1905: a existência de um curso complementar único, a não inclusão da disciplina de educação física no currículo, o peso excessivo do latim e do alemão e a questão do livro único. Foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, com a Grã-Cruz de Carlos III de Espanha, em 1891, e com a Grã-Cruz da Ordem de Santiago, em 1895. Pertenceu a numerosas associações científicas portuguesas e estrangeiras: sócio da Sociedade de Geografia de Lisboa, sócio honorário do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil, sócio correspondente da Sociedade Antropológica de Espanha, entre outras. Jaime Moniz faleceu em 16 de setembro de 1917, deixando, segundo as palavras do visconde do Porto da Cruz, “bem marcadas a honradez e nobreza do seu espírito, o valor do seu trabalho, a sua inteligência e profunda erudição” (PORTO DA CRUZ, 1953, 15). No seu funeral fizeram-se representar o Presidente da República, que na véspera se deslocara pessoalmente à sua casa do Monte Estoril. Dois anos após o seu falecimento, em 1919, o Governo da República, como forma de homenagear os grandes vultos, atribuiu o nome de Jaime Moniz ao Liceu Nacional do Funchal. Em 1961, a CMF batizou a praça em frente da fachada principal do Liceu de “largo Jaime Moniz”. No ano seguinte, em 18 de fevereiro, foi colocada no centro da praça uma estátua esculpida em mármore, da autoria do mestre Anjos Teixeira, com a figura do cidadão madeirense nascido na cidade do Funchal, insigne pedagogo, político e professor.   Jorge Moreira de Sousa (atualizado a 05.02.2017)

História da Educação Personalidades

moda

A abordagem da moda enquanto atividade estética integrada nas dinâmicas sociais e com a sua retórica própria radica, em grande parte, nos escritos de Roland Barthes e de Gillo Dorfles sobre o tema. Um momento marcante para uma reflexão teórica sobre a moda em Portugal, é, sem dúvida, a exposição Depois do Modernismo, em 1983, organizada por Luís Serpa, Cerveira Pinto e Leonel Moura, todos eles ligados às artes. A par da arquitetura, das artes visuais, do teatro, da dança e da música aparece também a moda (VASCONCELOS, 1983, 183-188), A emergência de novas atitudes e criadores de moda potencia o aparecimento de eventos que, ora vocacionados para a descoberta de novos talentos, ora numa vertente mais comercial, procuram a ligação ao mercado e ao mundo empresarial (SANTOS, 2007, 334). Destaca-se pela continuidade e pela repercussão a ModaLisboa, criada em 1991, que se afirma como uma plataforma de comunicação e marketing destinada a desenvolver a moda o contexto das indústrias criativas. Cada vez mais a criação na moda é assumida como uma das variantes do design, tanto no seu modus operandi, como nos seus circuitos de produção e de divulgação. Em 1991 a Europália integrou na exposição “Manufacturas - Criação Portuguesa Contemporânea”, em Bruxelas, comissariada por Delfim Sardo e desenhada por Pedro Silva Dias, com a presença de artistas plásticos e de designers de produto e de moda. Este é também o tipo de convivência que se verificou na exposição “Qualquer Semelhança é Inevitável”, produzida pela Loja da Atalaia e, Lisboa, em 1994 e comissariada pelo designer Filipe Alarcão. O Portugal Fashion, criado em 1995, fomentou a internacionalização da moda portuguesa estreando-se nas passerelles em 1999, com Fátima Lopes, José António Tenente, Maria Gambina, Miguel Vieira e Nuno Gama, apresentando ainda oito marcas. Em 2009, é inaugurado o MUDE - Museu do Design e da Moda onde podemos ver a Colecção Francisco Capelo, cujo núcleo de design de produto tinha sido exposto no Museu do Design no Centro Cultural de Belém, entre 1999 e 2006. A significativa presença da moda neste museu, dá conta do modo como os seus produtos se foram transformando em objetos de coleção, passíveis de institucionalização. Quanto ao contexto regional, os madeirenses, em particular as famílias mais abastadas do arquipélago, sempre receberam com muito interesse as novidades que eram trazidas além-mar, sobretudo dos grandes centros culturais europeus como Paris e Londres. No início do séc. XX, eram publicados no Funchal alguns periódicos que atribuíam grande importância à moda e às tendências da altura. Um deles, o Diário da Madeira, publicava duas a três vezes por semana uma coluna intitulada "Diário Elegante", onde se escreviam textos sobre moda, tecidos e cultura, com algumas opiniões e informações de interesse e curiosidade para a sociedade madeirense. O Comércio da Madeira reservava à mulher funchalense uma coluna intitulada "Jornal da Mulher", onde eram publicadas crónicas sobre moda. O Jornal da Madeira chegou a criar uma página feminina, intitulada "Jornal da Mulher", onde eram tratados os mais variados assuntos. Por volta de 1926, foram editados, por vários periódicos, Suplementos Femininos que retratavam a moda europeia e faziam chegar à sociedade madeirense todas as novidades nesta área. Por esta altura, já existiam algumas lojas de tecidos, que eram assiduamente publicitadas nos periódicos regionais: a Companhia Portuguesa de Bordados (recebia sempre os melhores e mais modernos tecidos); o Salão de Moda, a loja Rachel; a loja Braga; loja Primavera; o Petit Royal, entre muitas outras. Uns anos mais tarde já encontramos outras lojas como Casa Tavares, Dois Amigos, Último Figurino e um pronto-a-vestir de caráter seletivo em estabelecimentos como Maison Blanche, Cayres, Balão Vermelho, etc. Nos anos 80, a Cruz Vermelha Portuguesa - Delegação da Madeira, organizava no Hotel Savoy, durante a tarde, chás acompanhados por desfiles de moda, integrando espaços comerciais e jovens criadores de então para fins de beneficência. Estes eventos eram organizados por equipas de senhoras voluntárias da referida instituição e que tinham como principal dinamizadora a Sr.ª D.ª Branca Melim. Numa tentativa de revitalização do Bordado da Madeira, criou-se em 2000 o Centro de Moda e Design, que se propunha preservar e dar uma nova imagem desta tradição, apoiar os jovens criadores no acesso a contactos com o exterior, seja participando em feiras e exposições, seja na mediação com a indústria têxtil nacional e internacional. O Centro, dirigido pela Eng.ª Isabel Araújo e com equipa própria, funcionava no IBTAM – Instituto do Bordado, Tapeçaria e Artesanato da Madeira, que era então presidido pelo Escultor Ricardo Velosa. Investiu em equipamentos para modelação e impressão, com o intuito de assessorar os industriais de bordado e os designers de moda. Foi na altura do seu funcionamento considerado por muitos como um “novo fôlego para o Bordado” (CASSACA, 17-7-2002, 8, 9) e, embora não tivesse atingido o impacto desejado, o seu encerramento em 2007 causou surpresa (HENRIQUES, 30-7-2007, 15). O Portugal Fashion, importante evento da iniciativa da ANJE-Associação Nacional de Jovens Empresários, APT- Associação Portuguesa de Têxteis e Vestuário e Fundação da Juventude (“Grande Moda”, 18-4-2001, 17) realizou no Madeira Tecnopolo, através do Centro de Moda de Design, uma edição na Madeira em 2001, com coleções para o Outono/Inverno 2001/2002 que, pela sua qualidade e ineditismo, teve grande afluência. Os estilistas madeirenses presentes neste evento foram Fernanda Nóbrega, Hugo Santos, André Correia, Patrícia Pinto, Bela Henke, Zequita, Susana Menezes, Ana Rita Pessanha e Lúcia Sousa. (ORNELAS, 2001, 14-21). No desfile participaram ainda Luís Buchinho, Miguel Vieira, Maria Gambina, Ana Salazar, Anabela Baldaque, Paulo Cravo & Nuno Baltazar, Katty Xiomara, Osvaldo Martins, João Tomé & Francisco Pontes, destacados criadores de moda no panorama nacional, bem como diversas marcas portuguesas. Nesta edição do Portugal Fashion houve a intenção de criar sinergias entre turismo e moda, promovendo assim o destino Madeira. O mesmo objetivo é retomado em 2005, no ModaMadeira, tendo agora como promotora a AJEM - Associação de Jovens Empresários da Madeira, num evento que, entre 21 e 24 de Abril, trouxe à Madeira consagrados criadores de moda do panorama nacional e regional. Esta 1ª edição teve lugar no Centro das Artes - Casa das Mudas, na Calheta com a presença de Louis de Gama, Júlio Torcato, Katty Xiomara Isilda Pelicano, Paula Rola, Lidija Kolovrat, e coleções da Kispo, Lions of Porches e MacModa, para além de quatro dezenas de modelos nacionais e internacionais. A I ModaMadeira incluiu ainda três exposições temáticas: “Gama de Casa”, de têxtil lar de Nuno Gama; “A Modernização do Bordado Madeira” pela D’ART e o Sindicato das Bordadeiras e ainda uma mostra fotográfica “Looking at living style” do fotógrafo de moda Cassiano Ferraz. Participaram nos desfiles criações dos madeirenses Hugo Santos, Lúcia Sousa, Fernanda Nóbrega, Susana Menezes, André Correia e Patrícia Pinto ( “Quatro dias de moda na Calheta, 21-4-2005, 1 “Palco de moda e de glamour”, 21-4-2005, 2-3; ABREU, 22-4-2005, 26; GONÇALVES, 1-5-2005, 10-11). Funchal Fashion Week 2005 teve lugar de 26 a 28 de Maio, numa organização em parceria da Sportsmoods, da Elite Models Portugal e da Câmara Municipal do Funchal, que declarou aspirar a uma futura internacionalização deste evento. Participaram Maria Gambina, Luís Buchinho, José António Tenente, Pedro Waterland, Nuno Baltazar, as lojas Nova Minerva e Ana’s Boutique e os criadores madeirenses André Correia, Hugo Santos e Patrícia Pinto (GOUVEIA, 12-5-2005, 12; GONÇALVES, 27-5-2005, 17). O ModaMadeira regressou em 2007 para mais uma edição no Madeira de 4 a 5 de maio, no Tecnopolo, que se orientou para o mercado madeirense em torno da moda, afastando-se da estratégia promocional da sua génese, mais vocacionada para a internacionalização. Pretendia incrementar a componente comercial, promover o Bordado Madeira, criar e desenvolver mercados e estimular os profissionais do sector. Para tal, estabeleceu um protocolo com a empresa D’Art e realizou ainda um concurso para jovens talentos. Foi promovido pela AJEM com a organização da Controlmedia, ficando a produção dos desfiles a cargo de Isabel Branco. Contou com a presença Alexandra Moura, Story Taylors, Filipe Faísca e Ana Salazar e com os madeirenses Fernanda Nóbrega, André Correia, Patrícia Pinto e Lúcia Sousa (HENRIQUES, 1-5-2007, 15; “Moda”, 28-4-2007, 24-26; PESTANA, 22-4-2014, 25). Ficou então prevista uma 2ª edição neste mesmo ano e duas no ano seguinte. A 3ª edição do Moda Madeira, em 2008, contou com duas galas. A primeira, a 18 e 19 de janeiro no Madeira Tecnopolo recebeu os estilistas madeirenses Hugo Santos, Patrícia Pinto, Lúcia Sousa, Fernanda Nóbrega e os consagrados estilistas nacionais, Nuno Baltazar e José António Tenente. A grande novidade foi a participação de jovens talentos na área da criação — Ana Catarina Freitas, Janett Agrela — e um desfile de marcas promovido pelo centro comercial Dolce Vita. (PESTANA, 05-01-2008, 33 e 18-01-2008, 36). Hugo Santos apresentou uma coleção inserida no contexto “Bordar Madeira”, uma iniciativa promovida pela Associação de Jovens Empresários Madeirenses (AJEM) em parceria com este criador de moda (PESTANA, 08-01-2008, 33). A segunda gala desta 3ª edição foi realizada em Maio, mantendo a participação de Anabela Baldaque, Miguel Vieira e de marcas do Centro Comercial Dolce Vita. Esteve presente também Fernanda Nóbrega e quatro jovens madeirenses, escolhidos por um júri, que mostraram o seu trabalho: Ruben Freitas, André Pereira, Ana Catarina Freitas e Janett Agrela (PESTANA,22-5-2008, 33 e 31-5-2008, 26-27). Esta foi a última edição deste evento, a que se seguiu, em 2012, um novo formato integrado numa marca criada pela AJEM intitulada New Order (http://ajem.pt/marcas-ajem/). No Centro de Congressos do Casino estiveram presentes os Storytailors, dupla constituída por João Branco e Luís Sanchez (este natural da Madeira), e os jovens estilistas selecionados no concurso de talentos Joana Mendonça, Mariana Sousa e Fábio Carvalho. Nos eventos de moda que se seguiram, a vertente de divulgação da criação e produção local para fora da ilha ficou mais focada em iniciativas particulares. Tem mantido continuidade o certame Funchal Noivos, promovido a partir de 2009 pela ACIF, com exposições e desfiles de moda, inicialmente específicos deste tema mas posteriormente alargados a festas e cerimónias em geral (“Funchal Noivos, 14-3-2009, 31). Hugo Santos, Lúcia Sousa, Fernanda Nóbrega, André Correia, Patrícia Pinto, Fábio Carvalho, Emília Luz, André Pereira são alguns dos criadores que participaram ao longo das sucessivas edições. No decorrer dos anos, tivemos alguns criadores madeirenses que se destacaram, como por exemplo Fátima Lopes que deixou para trás a ilha e a sua atividade de guia turística para fixar-se em Lisboa, em 1990, e dedicar-se à moda. Abriu a loja Versus com roupas e acessórios de criadores internacionais e, em 1992, criou a sua própria marca. Em 1995 participa no Portugal Fashion e em feiras de moda francesas e em 1998 abriu um espaço no Bairro Alto com boutique, ateliê, bar e agência de modelos, o que indicia a sua visão integrada de uma atividade que exige um trabalho de equipa coeso e a convicção da necessidade de criar sinergias com a indústria. No ano seguinte integrou a ModaLisboa e passou a ser presença assídua na Paris Fashion Week. A sua persistência e profissionalismo valeram-lhe o reconhecimento internacional e uma Comenda da Ordem do Infante Dom Henrique (2006), pelo seu importante papel na expansão dos valores culturais portugueses. Diversificou a área de atuação da sua marca para a criação de acessórios de moda, peças de joalharia, óculos, cutelaria, tapeçarias, porcelanas, cristais, instrumentos de escrita, calçado e também um perfume. Desenhou ainda o traje oficial da seleção nacional de futebol (2005), a vestuário oficial da equipa do Sporting (2007) e as fardas dos funcionários do prestigiado Hotel Conrad, no Algarve (2012). No início de 2016 mudou do Bairro Alto para um novo espaço perto da Avenida da Liberdade com ateliê, show room e agência Face Models. De entre os criadores que desenvolveram a sua atividade na Madeira podemos destacar vários nomes pela continuidade e qualidade do seu trabalho, como Patrícia Pinto, André Correia. Fernanda Nóbrega, Hugo Santos ou Lúcia Sousa. Patrícia Pinto nasceu em 1976 e concluiu o Curso de Design de Moda no IADE em 1998. Participou no Portugal Fashion na Madeira (2001), no Funchal Fashion Week (2005), no Porto Fashion Week, no Moda Madeira, no Portugal Fashion (2005 e 2006) entre muitos outros. Desde 2010 realiza desfiles individuais onde apresenta as suas coleções marcadas pela multiplicidade de cores, pela justaposição de padrões, tecidos e malhas: Yangu Afrik no Museu Casa da Luz, em 2011; 2011-2012, Dress up, please no Parque de estacionamento Almirante Reis; em 2012 In the market no Mercado dos Lavradores do Funchal; 2013 Orange – Blue e La vie en rose, no 7º Aniversário da sua loja, assinalando 15 anos de carreira; em 2015 Back to the Market, de novo no Mercado dos Lavradores. André Correia começou uma carreira na moda em 1992, em simultâneo com trabalhos de cenografia e figurinos para teatro. Neste mesmo ano abriu o seu ateliê e, em 1999, um novo espaço, já com loja. Iniciou o seu percurso na Escola de Moda Gudi, no Porto, realizando posteriormente um curso de Modelismo no CITEM, em Lisboa. Foi completando e diversificando a sua formação com a licenciatura em Design (2010) e uma pós-graduação em Arte e Design no Espaço Público (2013) ambos pela Universidade da Madeira. Lecionou Plástica do Espetáculo no Curso de Teatro do Conservatório-Escola das Artes, no Funchal (2012 e 2013). Apresentou coleções no Portugal Fashion (Madeira, 2001 e Porto 2005 e 2006), no Funchal Fashion Week (2005), no Moda Madeira (2005 e 2007), no Fashion Week nos Açores (2006) e marcou presença na ExpoNoivos no Porto (1998) e FunchalNoivos (desde 2009). Para além de criações personalizadas em que predominam os materiais nobres e naturais, explora técnicas e materiais que muitas vezes levam a cruzamentos entre traje e escultura, incorporando cordas, fibra de vidro, polímeros, técnicas de capeline, e outras. Nesta linha enquadra-se Bizarria, do espetáculo de moda, na discoteca Vespas e bares anexos Jam e Marginal; a instalação individual Silhuetas Virtuais, Galeria da Secretaria Regional do Turismo e Cultura (Funchal, 2003) e a coleção integrada nas Jornadas Académicas de Arte e Design, Alternativas, bem como os coordenados apresentados no evento Hypnotic Black Ice (discoteca Vespas 2004). Fernanda Nóbrega finalizou o curso de design de moda em 1990 e abriu o seu próprio ateliê em 1995. Define-se como de influência minimalista, que alia frequentemente a pormenores em bordado Madeira. Participou no Moda Madeira, no Portugal Fashion, Funchal 2001 e também em eventos nacionais como o 2000-Porto Capital Europeia da Cultura e da Moda, o Portugal Fashion Figueira 2002, o AdroModa, em Viseu, entre 2008 e 2011 e internacionais, caso do Global Fashion Festival em Berlim, em 2006. Hugo Santos fez uma nova abordagem da aplicação do bordado Madeira no vestuário, aproveitando a sua familiaridade com o bordado, adquirida desde cedo na empresa familiar. Começou por ser desenhador de bordado, tendo feito formação com Leandro Jardim. Apresentou coleções no Moda Madeira em 2005 e 2008, e participa no FunchalNoivos desde 2009, tendo sido presença assídua em diversas feiras internacionais. Lúcia Sousa, nascida na Austrália em 1976, formou-se em Arquitectura de Design de Moda em 2001 pela Faculdade de Arquitectura de Lisboa e estagiou com José António Tenente. Iniciou-se como profissional em 2004 e tem marcado presença em eventos de moda regionais, nomeadamente na ModaMadeira e FunchalNoivos, e nacionais como a ExpoNoivos em Lisboa e a Exponor, no Porto. Nas suas criações para a moda feminina recorre frequentemente a draping e cortes assimétricos, exaltando o colorido e brilho dos tecidos. Atualmente a Madeira conta com jovens criadores como André Pereira, Mariana Sousa, Carolina Teixeira e Fábio Carvalho, que marcam presença nas passerelles madeirenses, que deram os primeiros passos na profissão na sequência do concurso de Jovens Talentos do ModaMadeira.     André Correia Licínia Macedo (atualizado a 05.02.2017)

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