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A Companhia Portuguesa Rádio Marconi (CPRM), popularmente conhecida como Marconi, assumiu um papel importante na sociedade madeirense a partir dos finais do primeiro quartel do séc. XX, com realce para o seu protagonismo no campo das telecomunicações. De facto, a intervenção da Marconi veio transformar os hábitos quotidianos dos madeirenses. Além disso, os meios que a empresa colocou ao dispor vieram banir as barreiras que definiam o casulo do isolamento do arquipélago. Os anos 20 foram de autêntica euforia em relação às ondas elétricas. O período de 1920 a 1926 foi de perfeita loucura nos Estados Unidos, o que levou o Governo a estabelecer, em 1926, uma legislação especial para disciplinar o espetro radioelétrico. Esta vaga chegou à Madeira no verão de 1927, altura em que surgiram os primeiros anúncios para a venda de material de telefonia da Marconi e Sterling. As primeiras receções de rádio tiveram lugar no ano seguinte e, em 1929, davam-se os primeiros passos de uma emissão, com a onda de 47 m. Para isso, deverá ter contribuído a presença de Alberto Carlos de Oliveira, funcionário da empresa do cabo submarino. Ele havia iniciado, em 1914, em Cabo Verde, as primeiras comunicações com os navios do alto mar. Em 1920, foi transferido para a delegação da empresa no Funchal e aqui manteve as experiências, tendo ensaiado, em 1925, a transmissão com um emissor de lâmpadas em ondas curtas. Foi assim que se gerou na Madeira uma verdadeira e duradoura afición pelo “senfilismo”. Uma das fases mais decisivas da história da Marconi na Madeira aconteceu em 1986, com a elevação da delegação local ao estatuto de direção regional. Até 1982, a empresa era representada por um gerente de estação, passando, desde então, a existir o cargo de delegado regional, para o qual foi empossado Graciano Góis, a 15 de maio. A partir de 15 de março de 1991, a Marconi passou a dispor de novas instalações para a sede da sua delegação regional na Madeira. Um espaço amplo, até então abandonado, foi transformado e adaptado para a prestação de um novo serviço, que a imortalizará nos anais da história da Ilha. No ano de 1995, a Portugal Telecom adquiriu o capital da CPRM na íntegra, concluindo, em 2002, o processo de fusão. A Companhia Rádio Marconi foi constituída em 20 de junho de 1897, mas só em 1922 a empresa chegou a Portugal, onde se tornou pioneira na prestação do serviço de telecomunicações: pela lei n.º 1353, de 22 de agosto de 1922, o Governo foi autorizado a contratar com a Marconi Wireless Telegraph Company Ltd. o estabelecimento de uma rede radiotelegráfica. Todavia, nesta lei estabelecia-se como cláusula contratual a obrigatoriedade de a empresa constituir uma congénere nacional até ao fim do ano. A constituição teve lugar a 14 de setembro e, a 8 de novembro, foi assinado o acordo de concessão do serviço público de radiocomunicações da CPRM, ficando ela com o direito de exploração dos serviços entre o continente, a Madeira, os Açores, as províncias ultramarinas e o estrangeiro, por um período de 40 anos. Novos contratos foram assinados a 23 de abril de 1930, 20 de novembro de 1956 e 23 de abril de 1966. No último, foi ampliada a concessão ao serviço de cabo submarino e o prazo foi prorrogado por mais 25 anos. Durante o período da primeira concessão, a CPRM empenhou-se no estabelecimento de um serviço nacional e ultramarino: a 15 de dezembro de 1926, a inauguração das instalações em Lisboa coincidiu com a abertura dos circuitos radiotelegráficos entre o continente e as novas estações telegráficas do Funchal e de Ponta Delgada. Nos anos imediatos, para além da prestação de novo serviço (o radiotelefone), abriram-se novos circuitos nas possessões ultramarinas: em Cabo Verde, em Angola e em Moçambique (1927), e, depois, em Macau (1939), em Goa (1938), em São Tomé (1949), em Timor (1950) e na Guiné-Bissau (1959). Com estas iniciativas, a Marconi dava corpo à unidade do espaço metropolitano e colonial. A concretização, em 1926, de uma estação de telefonia sem fios (TSF) no Caniçal, trouxe a este rincão o nome de Marconi, através dos inventos e de uma delegação da empresa, criada em setembro de 1922 para prover o território nacional de uma rede de TSF. Esta presença foi evidente a partir de 15 de dezembro de 1926, data memorável para os anais da firma, e que marca o início de atividade em Portugal e também a afirmação da TSF em detrimento do cabo submarino, que entra na curva descendente. Desde então, a concorrência entre os dois meios de comunicação dominará o panorama regional, até que a companhia do cabo submarino encerre, em 1970, os seus serviços na Ilha, ficando a CPRM com o exclusivo das comunicações por TSF e por cabo submarino. A viragem não foi pacífica, manifestando-se através de uma concorrência entre os meios de transmissão de telegramas por TSF e por cabo submarino. Uma das primeiras consequências foi a redução das taxas cobradas por palavra na emissão de telegramas. Em 1942, a Via Portucale confirma a supremacia da TSF. A derrota do cabo submarino na guerra de comunicação era evidente: o cabo estava velho e sujeito a constantes e custosas reparações e as despesas de manutenção eram elevadas, não podendo o cabo, deste modo, competir com o seu concorrente, a TSF. Os reflexos das descobertas de Marconi chegaram a Portugal por intermédio da companhia Marconi Wireless Telegraph Co. Ldt., a quem o Governo português concedeu, a 22 de agosto de 1922, a exploração, por um período de 40 anos, da rede de radiotelegrafia nacional. A 14 de setembro do mesmo ano, foi constituída a empresa em Portugal e, a 15 de dezembro de 1926, data já mencionada, eram inaugurados os primeiros serviços de TSF de ligação do continente com a Madeira, os Açores e a Inglaterra. Entretanto, em 1966, foi feita nova concessão por 25 anos, sendo a prestação de serviços alargada ao cabo submarino, de que resultou o aparecimento de novo cabo, no Funchal, em 1970. No entanto, as transmissões da telegrafia sem fios na Madeira não se iniciaram só em 1926 com a estação da Marconi do Caniçal, pois no período da Primeira Guerra Mundial os Ingleses haviam já criado um serviço na Quinta Santana (espaço do Hospital Dr. João Almada), que encerrou as suas atividades a 2 de abril de 1919. O material ficou na Ilha, sendo usado na montagem de uma nova estação no 1.º andar de um edifício da R. de João Gago, onde estava instalada a Estação Telegráfico-Postal do Funchal. As obras da primeira estação ficaram concluídas a 31 de maio de 1922, iniciando-se as emissões no dia seguinte. As primeiras comunicações foram com Las Palmas e, depois, com o vapor inglês Kenil Worth Castle. Esta estação fora criada por despacho publicado no Diário do Governo, a 26 de julho. Todavia, a pretensão dos madeirenses era a de uma estação telegráfica mais adequada, integrada na rede estabelecida para todo o país, aprovada na Câmara dos Deputados a 21 de agosto de 1922. A 20 de agosto, o Diário de Notícias reclamava a montagem de uma estação telegráfica no Funchal, para o necessário apoio à navegação, uma vez que a existente cobria um raio de ação de apenas 400 milhas. Em 1926, a estação do Funchal estava situada no Pico Rádio, mas, com a entrada em funcionamento, a 4 de novembro, da estação do Caniçal, o serviço marítimo passou a ser assegurado por esta. O desenvolvimento dos meios de comunicação por meio de ondas eletromagnéticas iniciara-se em 1924, tendo-se alcançado alguns progressos nos anos de 1935-1938, que levaram ao início das emissões regulares de televisão em Londres, a partir de 25 de agosto de 1938. Note-se que algumas das experiências que conduziram à afirmação da televisão tiveram lugar na Madeira em 1936, por iniciativa de W. L. Wrigth. Todavia, a televisão só chegou aos lares madeirenses bastante mais tarde, se excetuarmos a receção da das Canárias. O historial da CPRM em Portugal estende-se por mais de meio século, sendo rico em realizações que fizeram deste rincão ocidental um espaço aberto e em contacto permanente com o mundo. A posição charneira de Portugal continental e das ilhas do arquipélago da Madeira e dos Açores fez com que este eixo se afirmasse como importante no domínio das telecomunicações. A segunda fase de concessão, que se iniciou em 1956, distingue-se pelo recurso a novos e mais adequados meios de comunicação. Na déc. de 60, deu-se a reafirmação do cabo submarino, com a inauguração da estação de Sesimbra, a 11 de agosto de 1969. Este serviço (Sat-1) divergia para uma ligação de Londres a Portugal e à África do Sul, num comprimento total de 10.787 km, com capacidade para 360 circuitos. Estabeleceram-se três amarrações ao longo do percurso (Tenerife, Sal e Ascensão). Seguiram-se outros, que estabeleceram a ligação com a Madeira (1971), a França (1979), Portugal/Senegal/Brasil (1982), Marro­cos (1982) e a África do Sul (1992). Em 1964, foi criada, nos Estados Unidos, a Intelsat (Organização Internacional para a Exploração de Telecomunicações por Satélite), mas Portugal só aderiu à organização em 1971, de modo que o primeiro serviço só foi instalado em 1974. Na estação terrena instalada em Sintra, estabeleceram-se os primeiros contactos, com Angola e Moçambique, e só depois com os Açores (1917) e a Madeira (1982). Em Sintra, foram instaladas estações para o serviço de satélites disponíveis: Intelsat, Eutelsat, Inmarsat. Na Madeira, até à inauguração do serviço radiotelegráfico da Marconi, a 15 de dezembro de 1926, como anteriormente referido, o serviço de comunicação entre a Ilha e o exterior fazia-se por cabo submarino ou por uma incipiente estação de TSF, montada em junho de 1922 na Estação Rádio Telegráfica do Funchal, situada na R. de João Gago. Todavia, um mês depois, chegava ao Funchal o equipamento necessário para a montagem da nova estação radiotelegráfica da Madeira, que ficou instalada no Caniçal. Os trabalhos continuaram em ritmo acelerado e, a 10 de julho de 1926, o superintendente da estação de Lisboa, João Maria Carneiro, fez a primeira inspeção ao posto do Caniçal, onde se davam os últimos retoques na instalação das antenas e dos equipamentos. Finalmente, a 4 de novembro, os trabalhos estavam concluídos, podendo a estação receber as primeiras mensagens e estabelecer contactos com o exterior. Durante o dia, 10 telegrafistas mantiveram contactos com os inúmeros vapores que circulavam nas águas do oceano, próximas da Madeira. A abertura do serviço da Marconi na Madeira surgiu num momento de grandes dificuldades económicas, agravadas com a crise do comércio do bordado e do encerramento de algumas casas bancárias. Os prenúncios da crise que assolou o Estado americano em 1929 eram já evidentes neste ano, e conduziram ao processo conhecido como Revolta da Madeira. O serviço da estação de TSF da Marconi era feito com extrema dificuldade, devido às difíceis condições de acesso ao local onde estavam instaladas as antenas e à inexistência de pessoal habilitado. O acesso às referidas instalações era muito mais fácil por via marítima do que pelos caminhos íngremes que circundavam as serras entre Machico e o Caniçal. Deste modo, a empresa tinha ao seu dispor, na vila de Machico, uma embarcação a remos que transportava os técnicos e os operadores. Eles, de um modo geral, viviam no Funchal e deslocavam-se para aí, no início, de barco e, depois, nos transportes públicos disponíveis. A estação encontrava-se isolada e, por isso mesmo, haviam-se instalado aí os meios para que os funcionários da empresa se pudessem manter entre uma semana a 15 dias. Para além das instalações de radiotelegrafia, existiam quartos de dormir, cozinha e refeitório. A alimentação dos funcionários baseava-se em peixe seco e carne salgada, que adquiriam na vila vizinha do Caniçal, e em produtos de produção própria no local: aí plantavam leguminosas e tratavam de coelhos e de galináceos. O testemunho de alguns funcionários traça de forma emotiva os primeiros anos de vida da Marconi na Madeira. Numa prolongada conversa que tivemos oportunidade de presenciar em Lisboa, ficamos a saber das dificuldades e da monotonia do dia a dia na estação do Caniçal, das dificuldades para aí chegar e da vida boémia dos saraus musicais dos casinos e dos salões madeirenses da época, no período de descanso. Foi com esta verdadeira aventura, que exigiu um redobrado esforço, que a Madeira perdeu o isolamento, através dos serviços de TSF da Marconi. As antenas e a estação estavam colocadas num extremo da Ilha, num local com as melhores condições de receção e emissão para os meios técnicos da época, mas o principal destinatário estava no Funchal. Deste modo, entre as duas localidades, existiam fios telegráficos de comunicação que percorriam mais de 50 km. O centro estava instalado na estação telegráfica postal da Trav. do Cabido. Todavia, a partir de 1927, foi negociado com os CTT a instalação de um posto da Marconi nesta estação. Aí foi instalado, em setembro de 1927, um aparelho de comunicação permanente com o Caniçal. Em face disto, melhoraram os serviços de atendimento ao público, que passaram a ser feitos ininterruptamente, só fechando aos sábados, domingos e feriados, mas, em 4 de fevereiro de 1931, passarão a ficar abertos todos os dias. Durante os 42 anos de existência, este serviço de radiotelegrafia fixa da Marconi foi alvo de múltiplas transformações, sendo as mais significativas operadas em 1947, com a oferta do serviço radiotelefónico, a partir da estação do Garajau. As telecomunicações implantam-se para serviço da sociedade, em que elas são o cordão umbilical que mantém a ancestral ligação ao velho continente e ao espaço envolvente. A TSF, ativa durante as 24 h do dia, é a voz permanente do madeirense anónimo, das autoridades locais, dos veraneantes e dos estrangeiros de passagem, e a única boia de salvação para as embarcações em dificuldades. Pelos transmissores de faísca e depois pelos eletromagnéticos perpassam variados problemas. O operador e o boletineiro são correias de transmissão do circuito e nada mais. Apenas quando a situação atinge os limites e acontece alguma anormalidade, os operadores, até então meros agentes passivos, passam a ser ativos protagonistas. Assim sucedeu em abril de 1931, durante a célebre Revolta da Madeira, em que, pela primeira vez, foi posta à prova a funcionalidade e a importância da Marconi nas transmissões a longa distância, através da estação de TSF do Caniçal. Quando, a 4 de abril, rebentou a Revolta, o cabo que ligava o Funchal a Lisboa emudeceu e, por isso, a única via de contacto com o exterior eram as ondas eletromagnéticas emitidas pela estação de TSF da Marconi, no Caniçal. As comunicações preferenciais da estação eram com Lisboa, que depois fazia a conexão com o mundo. Todavia, a Madeira poderia estabelecer contactos com as estações de Ponta Delgada, de Las Palmas e de Madrid. Quando, em Lisboa, o recetor emudeceu para os sinais da Ilha, o emissor madeirense não deixou de emitir, orientando-se para os Açores, Las Palmas ou Madrid. Todavia, até ao dia 26 de abril, a troca de telegramas com Lisboa foi apenas entre o Governo da Junta Revolucionária e o da ditadura. A 26 de abril, os emissores e recetores da estação de TSF da Marconi foram silenciados. As tropas destacadas para a Ilha, com o objetivo de pôr cobro à rebelião, desembarcaram primeiro no Caniçal, com o intuito de desmantelar a estação telegráfica. A força tomou, sem oposição da guarnição revolucionária, as instalações da estação e desmantelou o emissor e o recetor. Por algum tempo, a Madeira perdeu a ligação com o mundo. Os técnicos telegrafistas da Marconi das estações do Caniçal e do Funchal tiveram alguns dias de férias. Este foi o único período, em 65 anos da empresa na Madeira, em que as instalações foram silenciadas, após terem sido protagonistas ativas de uma conjuntura política peculiar, e um importante instrumento de agitação política por parte dos revolucionários. O desenvolvimento das novas tecnologias conduziu ao paulatino apagamento desta estação, que terminou em 1982, com o aparecimento de uma via alternativa para o cabo submarino, com a inauguração da Estação de Satélites. Desde esta data, com as remodelações posteriormente realizadas, aí passou a funcionar apenas uma estação do serviço móvel marítimo e uma casa de repouso para os funcionários da empresa. O Porto Santo, porém, já então uma importante estância de veraneio, continuava isolado e carente destes meios. Foram incessantes os esforços do Ateneu Comercial do Funchal e de um grupo de madeirenses ilustres para que o Porto Santo ficasse servido de TSF. Em fevereiro de 1927, conjugaram-se os esforços da Marconi com os das autoridades do arquipélago e deu-se início às obras de construção do edifício para instalar a estação de TSF. As habituais dificuldades burocráticas impediram que o material para a montagem da estação chegasse prontamente. Por outro lado, o equipamento era obsoleto e provinha da estação de Sintra. Mesmo assim, conseguiu-se mantê-lo e, em outubro de 1928, faziam-se os primeiros ensaios, estabelecendo-se contactos com a estação do Caniçal e o Funchal. Entretanto, a imprensa anunciava que estava prevista a sua inauguração para 25 de novembro de 1928. Mas só a 16 de março do ano seguinte saiu do Funchal o Gavião, levando a bordo as autoridades que, no dia seguinte, iriam inaugurar a nova estação. O equipamento aí instalado, sendo de segunda mão, não durou muito tempo, e cedo sugiram as dificuldades: a 15 de dezembro de 1932, o transmissor estava mudo, e permaneceu nestas circunstâncias até à chegada de novo aparelho, a 10 de novembro de 1935. Este era um novo equipamento de radiotelegrafia, mas não se adaptou às condições da Ilha, uma vez que, a 15 de janeiro de 1939, perdeu de novo a “voz”, e só em novembro chegou à Ilha novo equipamento. A Marconi, entretanto, mantinha-se atenta aos novos inventos ao nível das telecomunicações, procurando adequar as instalações e os serviços na Madeira a esta realidade. Foi neste sentido que, em janeiro de 1938, iniciou as obras para a construção de um novo posto no Garajau (Caniço), capaz de prestar o serviço de radiotelefonia. A 10 de dezembro, todos os serviços foram transferidos para a nova estação, que começou os contactos com o continente e os Açores. As instalações do Caniçal (1 de janeiro de 1939) foram desmanteladas e postas à venda a 9 de julho de 1939, sem haver comprador. No decurso da Segunda Guerra Mundial, esta estação exerceu uma função primordial nas ligações da Madeira com exterior, mercê do bloqueio marítimo a que a Ilha esteve sujeita. Entretanto, as instalações da empresa no Funchal ganharam uma nova dinâmica com a abertura ao público de um serviço de aceitação e distribuição de telegramas. A nova realidade surge a partir de 31 de dezembro de 1943, com a inauguração em novo edifício, na Av. Arriaga. O serviço funcionou até 1942 na Trav. do Cabido, sendo transferido a 29 de março de 1942 para o 1.º andar da Rosa d’Ouro, à Av. Dr. António José de Almeida, de onde depois foi deslocado, a 29 de março do ano seguinte, para a sede definitiva da Av. Arriaga, inaugurada a 28 de outubro. Aqui passou a funcionar um serviço permanente de atendimento e de distribuição de telegramas. O último era realizado, de início, pelos boletineiros-peões, e, depois, a partir de 1970, por motociclistas. Na déc. de 50, redobraram as responsabilidades da Companhia, ao ser-lhe atribuída a exploração do rádio móvel marítimo: os serviços aumentaram em área, volume e qualidade. Imperativos técnicos conduziram a que se fizesse uma subdivisão entre os serviços de emissão e receção: o Garajau permaneceu como central, dispondo apenas das antenas de receção, enquanto o Caniçal foi reativado como posto de emissão, e, no Funchal, ficaram centralizados, desde 4 de julho de 1951, os serviços de rádioescuta naval. A mudança técnica das instalações do Caniço só ficou concluída a 25 de março de 1968, com a inauguração da nova estação do Caniçal. No ato, estiveram presentes o governador civil do distrito e o diretor técnico da Marconi, Fernando Feijó. Aí ficaram instalados os serviços de receção das comunicações telegráficas e telefónicas e da estação costeira para a navegação. As obras iniciaram-se em setembro de 1966, nas instalações abandonadas em 1942, tendo sido visitadas a 17 de agosto de 1967 pelo então ministro das Comunicações. Nos primeiros anos das comunicações por radiotelefone para o exterior, o ambiente das operações era algo surrealista, comparado com a situação que muito depois se viveria: a ligação era feita via rádio através do operador da Marconi com a estação de Lisboa. Quando sucedia qualquer interferência, interrompia-se a ligação e os operadores procediam à mudança de canal para uma melhor receção. A sintonia era feita por meio de uma gravação do bailinho da Madeira, que era passada pela estação do Caniçal. Concluída esta operação, os utentes continuavam a sua receção. As ligações com o Porto Santo continuavam a ser um problema, pois, em junho de 1945, em plena época de veraneio, houve mais de uma interrupção. A solução viria a estar na nova estação de radiotelefonia inaugurada a 30 de agosto de 1959. Na época, era grande o incremento do serviço telefónico no arquipélago e a Marconi preparava-se para adequar a disponibilidade dos serviços aos madeirenses. No Natal de 1958, prometeu presentear os madeirenses com novos serviços (o telex e a radiofotografia), mas tal só veio a suceder muito mais tarde. O telefone chegou à Madeira em 1911, mas só na déc. de 50 teve um maior incremento, tendo-se iniciado, em 1958, o processo de automatização da rede telefónica do Funchal, através das novas instalações no edifício dos Correios, na Av. de Zarco. O aumento desmesurado da procura dos serviços de radiotelefonia e o carácter obsoleto dos meios disponíveis para a ligação com o exterior levaram a Marconi a apostar noutro serviço capaz de satisfazer as necessidades da Ilha. Sob o lema “servir mais e melhor”, a Marconi avançou, a partir de 1969, com um novo meio de comunicação: o cabo submarino. A partir do verão de 1971, a Madeira foi servida por novo cabo submarino, com capacidade para corresponder às necessidades dos locais, em substituição do cabo dos Ingleses. As obras começaram em dezembro de 1971, e em maio do 1972 foi lançado o cabo submarino, que viria a ser inaugurado a 2 de setembro. Para a inauguração, deslocou-se propositadamente à Ilha o secretário de Estado das Comunicações, Oliveira Martins. No ato, estiveram presentes o presidente e o vice-presidente do Conselho de Administração da Marconi, respetivamente Manuel de Athayde Pinto de Mascarenhas e José Maria Camolino Ferraz de Matos e Silva. As referidas instalações foram, depois, visitadas pelo Chefe de Estado, Américo de Deus Rodrigues Thomaz, aquando da sua visita à Madeira, em 1962. O cabo submarino alargou as possibilidades às ligações com o exterior e à disponibilização de novos serviços, como o telex. As telecomunicações, que haviam avançado de forma lenta no meio aquático, ganharam um novo vigor com a conquista do espaço celeste. Desde as primeiras tentativas de afirmação, na déc. de 50, sucederam-se inúmeros progressos que chegaram também às telecomunicações madeirenses. Todavia, a Madeira, que havia sido dos primeiros locais a usufruir das ligações por cabo submarino e depois por TSF, foi a última a usufruir desse novo serviço de telecomunicações – o satélite. As ligações por essa via entre as ilhas, o continente português e o mundo só tiveram lugar em 1982, i.e., passados mais de oito anos sobre a entrada em funcionamento deste serviço em Portugal. Esta nova via foi possível graças à abertura de uma nova estação terrena em Sintra. A montagem da estação do Funchal, situada em São Martinho, iniciou-se em fevereiro de 1980, num investimento global de mais de meio milhão de contos. Os trabalhos para este empreendimento tiveram lugar em outubro de 1977, com a criação de um grupo de trabalho que tinha o objetivo de estudar as possibilidades de alargamento à Madeira deste meio de comunicação. Em fevereiro de 1980, iniciaram-se as obras e foi aberto um concurso internacional para o fornecimento do material necessário às estações terrenas da Madeira e de Sintra: o contrato de fornecimento foi assinado a 18 de fevereiro de 1981 com o consórcio italiano Satelit Telecomunications Systems. A antena instalada foi do tipo Cassegram, com refletor parabólico de 25 m de diâmetro, pesando 240 t. No ato de inauguração, que teve lugar no dia 16 de novembro, estiveram presentes o secretário de Estado dos Transportes Exteriores e Comunicações, José da Silva Domingos, e os presidentes dos conselhos de administração da CPRM e dos CTT (Correios e Telecomunicações de Portugal)/TLP (Telefones de Lisboa e Porto), Miguel Horta e Costa e Oliveira Martins, respetivamente, bem como as autoridades regionais. A abertura do referido serviço na Ilha veio propiciar aos madeirenses o acesso direto às emissões televisivas. Por outro lado, este meio veio proporcionar aos 20.000 assinantes da rede telefónica da Madeira o acesso telefónico direto à Europa e a alguns países da África e da América, favorecendo uma maior aproximação entre os madeirenses residentes na Ilha e aqueles que se encontravam emigrados nos mais diversos destinos. Neste contexto, merece referência a inauguração, a 20 de fevereiro de 1984, das ligações telefónicas diretas com a Venezuela e a África do Sul; seguiram-se o Panamá e as Antilhas Holandesas (20 de setembro de 1984), o Havai (19 de janeiro de 1985) e a Europa Oriental (28 de agosto de 1986). Esta ligação direta chegou a mais de 70 países. Em 15 e 16 de dezembro de 1986, a Marconi propiciou aos madeirenses o visionamento de alguns canais televisivos que, recebidos em Sintra através do Eutelsat I-F1, eram retransmitidos para o Funchal pelo Intelsat V-F11. Esta situação transitória foi uma demonstração daquilo que foi possível com o lançamento da série de satélites Eutelsat II, que permitiram à Madeira a receção de TV e outros sinais de telecomunicações, com uma antena parabólica de dimensões reduzidas. Perante esta situação, a Marconi passou a oferecer aos madeirenses 288 circuitos, sendo 144 de cabo submarino e 144 via satélite. Todavia, os serviços da Companhia não se ficaram por aqui, pois, para além do cabo submarino de fibra ótica, para substituir o de 1972, digitalizou-se as comunicações por satélite. Este esforço de modernização dos serviços da empresa, a partir de 1982, está avaliado em 1.700.000 contos. Refira-se ainda o Serviço Móvel Marítimo (SMM). Esta via baseava-se num serviço telefónico e telegráfico permanente em VHF (frequência muito alta), onda média e curta. A sua modernização teve lugar a partir de 1979, assistindo-se, desde 1984, a uma melhoria e a uma variedade na oferta de serviços: em 1984, entrou em funcionamento a estação de VHF do Porto Santo; em maio de 1986, foi a vez da estação da Ponta do Pargo; a 1 de agosto de 1988, inaugurou-se o centro de operações do Funchal, a partir do qual são telecomandadas as estações espalhadas pelo litoral da Ilha; em 1989, foi o estabelecimento da cobertura em onda média, com a entrada ao serviço das estações da Ponta do Pargo (em abril), de Pico da Cruz (em maio) e do Porto Santo (em julho). Com este investimento, no valor de cerca de 350.000 contos, a Marconi conseguiu a cobertura total da zona económica exclusiva madeirense, sendo a primeira no país a merecer tal oferta de serviços. A maior oferta de serviços pela Marconi e a reafirmação da Madeira como eixo importante das telecomunicações com o Atlântico Sul levaram a Companhia a apostar num novo Centro de Telecomunicações, capaz de corresponder a esta realidade. Assim, desde 25 de setembro de 1992, a Madeira dispõe deste Centro, que coordena a atividade da empresa, em termos do tráfego dos cabos submarinos de fibra ótica e transmissão digital (Eurafrica, Sat-2, Columbus-2, Inland), da rede móvel e dos satélites. Esta infraestrutura concentra os serviços que estavam dispersos pelo Porto Novo, Garajau e Funchal. Aí está instalada a nova estação de cabos submarinos dos sistemas Euráfrica e Sat-2, os serviços de exploração, englobando o Centro de Operação e Controlo do SMM e a Central Telegráfica, bem como os serviços técnicos e administrativos. A inauguração do Centro foi simultânea à do cabo submarino internacional Euráfrica. A esta seguiu-se, a 28 de abril de 1993, a do cabo Sat-2, que liga a República da África do Sul às Canárias e à Madeira. Este é o maior cabo submarino do Atlântico e o terceiro a nível mundial. O Sat-2 permite a ligação de 15.000 circuitos telefónicos e a transmissão de 32 canais de televisão. Esta aposta da Marconi levou a que a Madeira retomasse a histórica vocação de plataforma do Atlântico. De novo, a Madeira assume um papel destacado como entroncamento de infraestruturas submarinas de telecomunicações, e Portugal passa a dispor de uma posição de relevo na rede atlântica de cabos submarinos. Alberto Vieira (atualizado  01.02.2018)   artigos relacionados: ateneu comercial do funchal radiodifusão portuguesa / rdp - madeira correios telegrafia sem fios (tsf)

Física, Química e Engenharia Sociedade e Comunicação Social

monteiro, josé leite

José Leite Monteiro nasceu no Porto a 27 de setembro de 1841. Foi advogado, professor, escritor e político. Fez o curso de Direito na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em que ingressou em 1859, tendo concluído os estudos em 1864. Estabeleceu-se, em seguida, no Funchal, onde abriu um escritório de advocacia. Diz o Elucidário Madeirense que José Leire Monteiro nutria pela Madeira uma “carinhosa idolatria”, semelhante à que seria possível num filho natural da Ilha (SILVA e MENESES, II, 1998, 227); foi aí que desenvolveu a sua atividade profissional e intelectual. Foi professor no liceu do Funchal, depois de, em 1867, ter alcançado a nota mais elevada no concurso público para professor de Filosofia dos liceus. Passou a sua vida profissional na Ilha, a qual representaria um dos vértices das suas preocupações e dos seus interesses. Na vida pública, desempenhou funções em várias comissões de serviço, como governador civil substituto, como membro do Conselho do Distrito, como presidente da Junta Geral e como presidente da Câmara Municipal do Funchal. De salientar ainda que fez parte do Partido Fusionista e que entrou nas lutas políticas madeirenses de 1868, no âmbito das quais prestou serviços ao Partido Regenerador. José Leite Monteiro colaborou com vários jornais do Funchal, chegando a ser redator do jornal O Direito, órgão da política regeneradora. Também publicou vários livros, entre os quais se destacam O Ultramontanismo na Instrucção Publica de Portugal, de 1863, e Elementos de Direito Civil Portuguez, de 1895. Foi sócio efetivo da Associação de Direito Internacional. Em colaboração com o Cón. Alfredo César de Oliveira, coligiu diversos poemas dispersos de autores madeirenses, que acabariam por ser publicados num volume com o título Flores da Madeira. Morreu no Funchal, a 10 de março de 1920. Obras de José Leite Monteiro: O Ultramontanismo na Instrucção Publica de Portugal (1863); Elementos de Direito Civil Portuguez (1895).   Raquel Gonçalves (atualizado a 01.02.2018)

História da Educação Personalidades

noronha, adolfo césar de

Naturalista e homem de cultura natural do Funchal, onde nasceu a 9 de setembro de 1873, Adolfo César de Noronha estudou no Liceu do Funchal e nas antigas Escola Politécnica de Lisboa e Academia Politécnica do Porto. A 11 de dezembro de 1914, foi nomeado bibliotecário da Biblioteca Municipal do Funchal (BMF) e, em 1928, seu diretor, cargo que ocupou até à sua aposentação, em 1943. Com ligações familiares ao Porto Santo, efetuou nesta ilha observações meteorológicas, colheitas de espécimes, em particular fósseis, e ainda observações ornitológicas, que, juntamente com outras colheitas no arquipélago, vieram a servir de base a estudos efetuados por eminentes cientistas da época, com destaque para Ernesto Schmitz  (aves), Z. J. Joksimowitsch, P. Oppenheim e J. Böhm (fósseis). Na área do mar, colheu esponjas e briozoários, muitos deles novos para a ciência. À época, causou sensação a descoberta de uma esponja incrustante, simultaneamente com espículas calcárias e siliciosas, Merlia normani, obtida por dragagens no Porto Santo. Estas dragagens foram feitas em conjunto por Noronha e Randolph Kirkpatrick em 1909, tendo este último publicado a descrição desta esponja num extenso artigo publicado no Quarterly Journal of Microscopical Science, em 1911. Em 1922, encabeçou uma expedição científica às ilhas Selvagens (onde já tinha ido em 1906 e 1909), acompanhado de Adão Nunes e Damião Peres. Por vicissitudes com o navio que os deveria trazer de volta ao Funchal, acabaram por lá permanecer dois meses, causando motivos de preocupação na sociedade madeirense. O seu regresso ao Funchal foi motivo de receção pelas mais altas individualidades da Madeira, conforme noticiado pelo Diário de Notícias do Funchal de 13 de junho desse ano. Dessa expedição resultaram observações meteorológicas e colheitas de espécimes que foram enviadas a especialistas mundiais da época. Com o seu vasto conhecimento da história natural da Madeira e sendo fluente no inglês, francês e alemão, Adolfo César de Noronha foi o correspondente por excelência na Madeira de muitas figuras gradas da ciência do início do séc. XX. Como gesto de reconhecimento, várias espécies novas para a ciência foram-lhe dedicadas: Schizoporella noronhai, briozoário abissal, Pecten noronhai e Spondylus noronhai, moluscos bivalves fósseis, entre outras. Estudou com profundidade os peixes da Madeira, tendo publicado em 1925, no Porto, um ensaio intitulado Um Peixe da Madeira. O Peixe Espada Preto, ou Aphanopus carbo dos Naturalistas e, no ano seguinte, nos Annals of the Carnegie Museum, dois artigos sobre duas espécies novas para a ciência: um peixe da família dos escolares, Diplogonurus maderensis, e um tubarão de profundidade raro, que dedicou ao seu amigo Alberto Artur Sarmento, Squaliolus sarmenti. Em coautoria com Sarmento, publicou também, em 1934, um trabalho de divulgação intitulado Os Peixes dos Mares da Madeira e, em 1948, o segundo volume (Peixes) do importante trabalho Vertebrados da Madeira, editado pela Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal. Colaborou ativamente com Fernando Augusto da Silva e com Carlos Azevedo de Meneses na elaboração do Elucidário Madeirense (1922), tornando esta obra numa referência da história natural do arquipélago da Madeira. Logo após a sua nomeação como diretor da BMF, à época instalada no edifício dos Paços do Concelho em exíguas condições, começou a defender a aquisição de um edifício para a sua reinstalação e a criação de um museu que pudesse alojar as suas coleções de história natural e outro património artístico, arqueológico e histórico pertencente à Câmara Municipal do Funchal (CMF). Esta intenção foi concretizada em 1929 com a criação do Museu Regional da Madeira e com a aquisição do palácio de S. Pedro, para a qual foi decisiva a ideia por si realizada de emitir um selo postal da Madeira cuja receita reverteu para esta aquisição. Com a preciosa colaboração de Günther E. Maul, o novo Museu abriu as suas portas ao público em 1933, sendo hoje o Museu de História Natural do Funchal. Ao aposentar-se, a 9 de setembro de 1943, a CMF prestou-lhe homenagem atribuindo o seu nome à sala principal do Museu. A Augusto Nobre (1865-1946), distinto cientista português e catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, são atribuídas as seguintes palavras acerca de Adolfo de Noronha: “possui todos os requisitos para ocupar com distinção uma cátedra em qualquer universidade do país” (SILVA e MENESES, 1965, 426). Adolfo César de Noronha morreu no Funchal, a 6 de abril de 1963. Obras de Adolfo César de Noronha: Um Peixe da Madeira. O Peixe Espada Preto, ou Aphanopus carbo dos Naturalistas (1925); “A New Species of Deep Water Shark (Squaliolus sarmenti) from Madeira” (1926); “Description of a New Genus and Species of Deep Water Gempyloid Fish, Diplogonurus maderensis” (1926); Os Peixes dos Mares da Madeira (1934) (coautoria); Vertebrados da Madeira. Peixes (1948) (coautoria).   Manuel José Biscoito (atualizado a 03.03.2018)

Biologia Terrestre Biologia Marinha Personalidades

mcandrew, robert

Mercador e proprietário de barco nascido em Wandsworth, Londres, em 1802. Era filho do mercador e transportador de fruta William McAndrew. Com a morte do pai em 1819, assumiu, com o irmão, o negócio da família. A partir de 1830, MacAndrew manifesta o seu interesse pela história natural, entrando em 1834 para a Literary and Philosophical Society of Liverpool. Os negócios e viagens que realizou, em Portugal e Espanha, permitiram que reunisse coleções de conchas e que procedesse ao seu estudo. Estabeleceu contactos com Edward Forbes e com outros estudiosos da especialidade, como John Goodsir (1814-1867), James Smith (1782-1867) e John Gwyn Jeffreys (1809-1885). Pertenceu a diversas associações científicas, como a Linnean Society, da qual foi nomeado membro em 1847, e a prestigiada Royal Society, que integrou em 1853. Além disso foi, entre 1856 e 1857, presidente da Literary and Philosophical Society of Liverpool. Em 1872, recebeu, juntamente com Arturo Issel (1842-1922), o Prix Savigny da Académie des Sciences pelo estudo “Report on the Mollusca Testaceous Obtained during a Dredging-Excursion in the Gulf of Suez in the Months of February and March 1869”. Entre 1845 e 1870, publicou diversos estudos sobre os moluscos das costas atlânticas e mediterrânicas. De entre estes, assinala-se a publicação em 1853, na cidade de Liverpool, do estudo “On the Geographical Distribution of Testaceous Mollusca in the North-East Atlantic and Neighbouring Seas”, no qual refere 156 espécies de moluscos marinhos que encontrou nos mares da Madeira. Em 1873, MacAndrew doou a sua coleção de moluscos, que continha dezenas de milhares de espécies, e a sua biblioteca à Universidade de Cambridge. Faleceu no mesmo ano em Middlesex, Londres.   Obras de Robert MacAndrew: “On the Geographical Distribution of Testaceous Mollusca in the North-East Atlantic and Neighbouring Seas” (1853); “Report on the Mollusca Testaceous Obtained during a Dredging-Excursion in the Gulf of Suez in the Months of February and March 1869” (1870).   Alberto Vieira (atualizado a 01.02.2018)

Biologia Marinha Personalidades

música tradicional

A música tradicional madeirense da atualidade resulta da combinação de um conjunto de elementos trazidos por sucessivas levas de povoadores. Na Região Autónoma da Madeira (RAM), estes contributos foram evoluindo de forma isolada, mas recebendo pontuais influências de novas populações, de visitantes ocasionais ou ainda, a partir do séc. XX, dos meios de comunicação social de âmbito nacional, com particular incidência nas estações radiofónicas, ou da generalização do ensino oficial, com a chegada de docentes de diversos pontos do país. Deste modo, popularizaram-se na RAM canções que, com o tempo, têm vindo a assumir, para muitos, um carácter tradicional. Como é natural, trata-se de peças cuja identificação nem sempre é fácil, pois há pouca investigação feita sobre o tema nas diversas regiões do país. No caso particular das cantigas religiosas, é ainda necessário referir a influência de sacerdotes portadores de orientações precisas por parte da hierarquia ou de uma formação padronizada nos seminários que frequentaram. Um último aspeto que poderá estar na origem de algumas influências alheias é o regresso de emigrantes que trazem das terras onde viveram elementos tradicionais passíveis de ser incorporados na tradição. No entanto, seja por o fenómeno ser ainda relativamente recente, em termos de mecanismos de mudança cultural, seja apenas por ainda não ter havido quem o estudasse seriamente, a verdade é que não se sabe, atualmente, se essa componente se manifesta. Não é possível definir características genéricas da música tradicional madeirense. Por esse motivo, e de modo a facilitar a exposição, optou-se por abordar aqui, separadamente, cada um dos grandes géneros musicais, após uma primeira referência ao bailinho, o elemento mais conhecido e identitário da tradição musical da RAM. Aborda-se igualmente a mourisca, que, embora com menor realce, constitui também um modelo musical transversal a diversos géneros. Bailinho Com um padrão rítmico bastante simples, o bailinho é executado geralmente na tonalidade de Sol Maior, por ser aquela a que mais facilmente se adapta a voz. É esta melodia que está na base de muitos dos mais conhecidos bailes regionais, sendo também a forma assumida pela mais popular forma de canto improvisado em despique da RAM (com o nome de bailinho, retirada, meia noite ou outro). Encontramo-lo ainda a dar o “som” de muitos romances tradicionais, cantigas narrativas, cantigas de lazer, etc. De certa forma, é um elemento que, por si só, permite a qualquer não madeirense identificar uma melodia como sendo da RAM, sendo, atualmente, a forma musical mais presente e espontânea em todos os ambientes festivos na Região, acompanhada por qualquer instrumento ou mesmo por formas improvisadas de criar som. É importante chamar aqui a atenção para uma confusão bastante frequente resultante da coincidência do nome deste género musical. Existe uma canção muito conhecida, interpretada pelo cantor madeirense Max, que tem precisamente o nome de “Bailinho da Madeira”. No entanto, apesar da referência na sua letra ao bailinho, musicalmente esta nada tem a ver com ele. Antes pelo contrário, a música tradicional que serviu de inspiração para algumas das suas frases musicais foi o charamba. A grande popularidade desta canção tem feito com que seja frequente a confusão. Mourisca A mourisca madeirense dos começos do séc. XXI apresenta características que a aproximam de um vira valseado. Musicalmente, baseia-se no compasso binário composto, padrão rítmico de 6/8. Harmonicamente, tem a forma tradicional de alternância entre tónica e dominante. Na tradição local, principalmente a que se pode identificar através de recolhas efetuadas em anos anteriores, encontram-se formas de mourisca em diversas circunstâncias. Existem referências e alguns registos de mouriscas cantadas em despique, com letras improvisadas; contudo já não se encontram cultores desta prática, sobrevivendo apenas como canção de letra fixa. A sua grande força é traduzida numa dança, conhecida predominantemente na zona sul da ilha, em torno da Camacha, da Gaula, do Machico e do Caniçal. Existem algumas referências quanto à existência da mourisca dançada pelos populares em outras zonas, como os Canhas. Esta pode ser denominada, de forma indiferente, como mourisca ou chama-rita. No Porto Santo, existia o baile sério, nos começos do séc. XXI executado apenas pelo grupo folclórico desta ilha. Trata-se de uma variante da mourisca madeirense, com uma letra própria. Os habitantes da ilha consideravam-no a dança dos grupos mais abastados da ilha, em oposição à meia volta ou ao baile do ladrão, associados às classes populares. A sua letra é fixa, tal como na mourisca da ilha da Madeira, alternando quadra com refrão. As quadras são entoadas alternadamente por uma mulher e por um homem, sendo o refrão cantado em coro. Cantigas de trabalho Como resultado da transformação dos modos de vida e das atividades produtivas rurais, as cantigas associadas ao trabalho encontram-se atualmente numa situação peculiar. Com efeito, a verdade é que, nas zonas rurais, já não se ouve cantar a chamusca, a cava, a sementeira, a erva, a ceifa do trigo, a malha na eira, a boiada ou cantigas do moleiro, de acartar lenha, dos borracheiros, do linho, dos pastores, etc. Com o desaparecimento das atividades agrícolas que lhes estavam associadas, estas cantigas perderam o seu carácter funcional. De uma forma geral, podemos considerar que as cantigas de trabalho assumem diversas das características a seguir enunciadas: – Género exclusivamente vocal, sem acompanhamento instrumental; – Estrutura musical vulgar, nalguns casos simétrica; – Melodia simples e curta, muitas vezes irregular, com intervalos curtos; – Andamento lento e livre, dependente da respiração de cada um. O seu tempo é relativo e variável, dependendo da sensibilidade de quem canta e também do trabalho associado; – A tonalidade é a que melhor serve ao intérprete. Por vezes, verifica-se um prolongamento da última nota (de 8 ou 12 tempos finais), como, por exemplo, na cantiga da ceifa, da carga ou dos borracheiros. Não há mudança de tom; – Padrão rítmico: 2+2; 4+4; – Canto monódico. No entanto, a sua entoação pode variar, existindo diferentes formas de o fazer: a) Um único intérprete canta a totalidade da cantiga, ou cada um canta a sua quadra; b) Uma voz inicia a quadra e, nos dois últimos versos, os restantes participantes acompanham em uníssono imperfeito; c) Todos entoam, em conjunto, quadras já conhecidas; d) Cada um improvisa a sua quadra. – Sem refrão; – Forma de cantar: alto (agudo), voz de cabeça; – São frequentes os modos arcaicos (sistema modal); As características mais notórias da letra são: – A mesma letra pode servir para diferentes melodias, podendo ser de temática completamente alheia à tarefa. Esta é geralmente pouco profunda, mas ligada à tarefa do dia-a-dia, às dificuldades da vida. São temas recorrentes: Deus, amor, saudade, tristeza, alegria, humor, malandrice; – É frequente a apropriação de versos já conhecidos e pertencentes a cantigas de lazer, de carácter religioso ou romances tradicionais; – O cantar de improviso é um fator importante neste género de música associada ao trabalho caseiro, dependendo da capacidade poética de quem canta; – Entre as quadras ou versos, são frequentes os apupos ou onomatopeias; Listam-se abaixo algumas das mais significativas cantigas de trabalho madeirenses. Borracheiros Na costa norte da Madeira, as uvas eram tradicionalmente apanhadas e levadas para um lagar local. O mosto era posteriormente acartado para as adegas do Funchal, onde iria fazer parte do processo de produção do famoso vinho generoso. A ausência de boas vias de comunicação obrigava a que o seu transporte fosse feito em odres (borrachos) carregados aos ombros de homens pelas veredas da serra. Podiam juntar-se várias dezenas de borracheiros, que, em fila, faziam o percurso até à cidade. Como forma de atenuar a dureza da caminhada, iam entoando uma cantiga específica. O primeiro homem da fila era o chamado candeeiro, que cantava umas quadras de métrica irregular, a que respondiam os restantes (o gado), com vivas. O último do grupo era o boieiro. O canto servia para animar os elementos do grupo, fazendo alusão ao próprio caminho, podendo também incluir elementos de troça em relação a algum componente ou de incentivo ao esforço. A construção de estradas e infraestruturas levou ao inevitável fim dos borracheiros. Em 1974, por iniciativa de Eduardo Caldeira, constituiu-se um grupo, no Porto da Cruz, que recuperou essas tradições, apresentando-as em diversos eventos madeirenses. Cantiga da carga A força humana foi, desde sempre, o elemento que assegurou o transporte na ilha. Mesmo cargas pesadas eram levadas aos ombros ou à cabeça. Por vezes, onde os terrenos o permitiam, podia recorrer-se à ajuda de animais para facilitar a tarefa. No entanto, a ida à serra para recolher lenha para aquecer a casa ou cozinhar, ou para cortar erva para o gado que, no palheiro, a aguardava, dificilmente escapava à necessidade da força humana para o transporte dos pesados fardos. Esta cantiga era entoada naqueles percursos do regresso, aliviando, de certa forma, a dureza do esforço. A letra era composta por quadras, que podiam ser improvisadas, intercaladas por apupos e entoadas numa cadência lenta, acompanhando o ritmo lento da tarefa. Cantiga de embalar Adormecer uma criança é uma tarefa que pode ser árdua e que está muito dependente do tempo necessário para atingir o objetivo. Assim, a tradicional cantiga de embalar tem um andamento muito lento, sem grandes irregularidades. A letra tem versos intercalados por onomatopeias destinadas a fazer adormecer mais facilmente a criança.   Cantigas de carácter religioso O ciclo do Natal O primeiro momento do ciclo do Natal na Madeira, em termos musicais, é constituído pelas Missas do Parto. No seu estudo sobre o tema, Rufino da Silva (1998) afirma que os cantos que têm presença certa nestas cerimónias são conhecidos, pelo menos, desde finais do séc. XIX>, sendo no entanto impossível determinar se são de origem madeirense. Segundo o mesmo autor, estes cânticos apresentam traços de lirismo popular, revelam influência minhota pela harmonização em terceiras e a sua estrutura harmónica é basicamente de alternância entre a tónica e dominante e quase exclusivamente em modo maior. Embora esta seja a caracterização da maior parte das canções, o autor detecta nalgumas delas traços de influência do canto gregoriano.   Romagem. Missa do Galo. Boaventura. Foto: Rui A. Camacho A missa da Noite de Natal é um mais alto momento das vivências religiosas da população regional. Associadas à importância litúrgica de comemorar o nascimento de Cristo, há diversas práticas tradicionais que ajudam a que esta seja realmente a grande Festa. Em alguns locais, esta celebração ainda assume características muito próprias, terminando com as romagens, nas quais grupos de vizinhos, familiares ou amigos percorrem a nave do templo tocando e cantando, para levar até ao sacerdote as suas oferendas. A própria missa é intercalada por diversos momentos de representação e entoação de cantos, como o da “Anunciação aos Pastores” ou a “Pensação do Menino”, tradicionalmente cantados junto do presépio. Possivelmente, estes serão os últimos vestígios de um ancestral auto apresentado na ocasião. A alteração das condições de realização da cerimónia, incluindo alguma necessidade de encurtar a sua duração, poderá estar na origem da eliminação de componentes ou redução do número de estrofes entoadas, daí resultando a sobrevivência de apenas algumas canções isoladas. As romagens são um bom exemplo de uma outra realidade: o que aqui é tradicional é o contexto de interpretação e não a canção em si. Apesar de ser uma tradição que tende a perder-se, nos locais onde se mantém, a principal preocupação dos vários grupos que preparam a sua romaria é mostrar qualquer coisa que as pessoas presentes na igreja não conheçam, pelo menos no que respeita à letra, pelo que muitas vezes se adapta uma música conhecida a uma letra criada. Principalmente nas zonas onde essa preocupação pela conservação da tradição é maior, o grupo que apresente uma romaria que ele ou outro cantou naquela igreja no ano anterior ou dois anos antes, da qual toda a gente se lembra, é alvo de troça, uma vez que não foi capaz de preparar e apresentar uma romagem original, o que obriga a questionar o lugar da tradição. A tradição está na prática de as pessoas de um determinado sítio se reunirem e levarem uma canção para a missa de Natal, com ou sem instrumentos. Por definição, se o que o grupo tem de apresentar é uma novidade, então as músicas não podem ser tradicionais. O que acontece por vezes é que se o público gostar de uma romaria de Natal, seja pela situação em que ela foi apresentada, seja pela qualidade artística da sua melodia ou da sua letra, esta permanece e pode tornar-se tradicional, como uma cantiga de passatempo.   Noite de Reis. Foto: Rui A. Camacho Cantiga de Reis Na noite de 5 para 6 de janeiro, formam-se grupos que percorrem as casas dos vizinhos ou amigos, entoando cantos próprios da época, como forma de desejar um bom Ano Novo. Ao chegar à porta, canta-se enquanto se aguarda que o dono da casa abra e ofereça a todos as bebidas e bolos que os esperam. Depois de uns minutos de convívio, há que prosseguir o percurso, que dura até de manhã. Em cada zona da ilha tende a haver um canto próprio desta noite, embora haja alguns mais conhecidos que são partilhados por várias localidades. A cantiga é entoada em uníssono por todos os participantes. A sua estrutura melódica é constituída por duas partes distintas: uma primeira cantada em compasso de 3/4 e uma segunda em compasso de 3/8, embora haja casos em que surge o compasso 2/4. No final, é frequente haver uma quadra de despedida aos donos da casa. Espírito Santo. Camacha. Foto: Rui A. Camacho Espírito Santo Após a Páscoa, começam as visitas das insígnias do Espírito Santo às casas. Num número de domingos variável em função da quantidade de locais a percorrer, forma-se um grupo constituído pelos festeiros, portadores das insígnias (pendão com a pomba desenhada, coroa e cetro), músicos e duas ou quatro saloias (meninas que transportam cestos para acolher as ofertas). Ao chegar a cada casa, as saloias entoam o Hino, que pode variar de freguesia para freguesia, alusivo à entrada do Espírito Santo, a que se seguem o pedido e o agradecimento das esmolas ao dono da casa. Podem seguir-se outras cantigas, de acordo com pedidos feitos pelos moradores e/ou decisão dos festeiros. Cantigas de lazer Cantos improvisados Brinco em bailinho O despique em bailinho é, ainda hoje, o momento alto da festa popular. Em qualquer arraial tradicional, ou mesmo nas festas familiares, se pode encontrar um brinco. Um músico, pelo menos – tocando rajão, braguinha ou viola de arame, hoje frequentemente substituídos pelo acordeão –, atrai uma roda de cantadores que, à vez, entoam as suas quadras, podendo haver um acompanhamento adicional de palmas (se necessário, pode-se prescindir inclusivamente da presença de músicos). Musicalmente, encontramos uma melodia tonal, com base na harmonia da tónica, dominante.   Despique. Arraial de Ponta Delgada. Foto: Rui A. Camacho O canto é, no essencial, improvisado. No entanto, um bom despicador pode recorrer, se necessário, a quadras decoradas. Esta situação será um recurso aceite no contexto de um despique que se prolongue num arraial. A tentativa de “atirar” quadras críticas ou irónicas sobre os restantes pode proporcionar momentos de grande alegria. A forma poética escolhida é a quadra de verso curto, com rima cruzada (ABAB ou ABCB). Habitualmente, cada verso é bisado, e após o segundo verso toca-se o interlúdio musical. Por vezes, o despicador acrescenta mais dois versos (rima CB ou DB), como mecanismo que permite completar melhor a ideia. Em casos mais raros, poderá ser entoada uma nova quadra completa, tendência que se tem tornado mais comum em tempos mais recentes, possível sinal de uma menor capacidade inventiva e de síntese. A satisfação dos presentes é manifestada por meio de apupos. O despicador, ao chegar a sua vez, pode prescindir de participar, passando a vez ao seguinte. A conclusão mais natural do despique será a que resultar do progressivo abandono dos participantes, vencidos pelo mais inspirado. Num arraial, o brinco poderia prolongar-se por longo tempo, sendo um dos grandes momentos de animação antes da generalização dos grupos de música moderna. Na ilha do Porto Santo, é habitual chamar “Retirada” ao despique em bailinho. Charamba   Charamba. Foto: Rui A. Camacho É hoje a forma musical associada por excelência à viola de arame, embora tradicionalmente pudesse ser acompanhado por outros instrumentos. É uma forma de canto despicado, quase exclusivamente masculino. Na maior parte das vezes, os tocadores não participam no canto, sendo este alternado entre os participantes, que podem cantar quadras ou estrofes mais longas e também com uma métrica variável. A sequência é obrigatoriamente no sentido dos ponteiros do relógio. Ao conjunto dos charambistas que participam numa determinada sessão chama-se “quadrado”. Segundo alguns dos intérpretes tradicionais, o importante neste género musical era o conteúdo do que se cantava. Nalguns casos, acordava-se previamente um tema (fundamento) que estaria obrigatoriamente presente em todas as intervenções. O tema poderia também ser acordado após quadras iniciais entoadas pelos participantes. No momento do canto, o intérprete tem toda a liberdade de definir o andamento e a extensão dos seus versos. Se necessário, o tocador terá de “ir atrás” do cantor, prolongando as frases musicais ou repetindo-as. Para alguns, a opção é ir tocando uns acordes muito simples durante o canto. As quadras são entoadas com repetição de cada verso ou repetindo cada par de versos. Após a repetição, há o indispensável interlúdio musical, que tem uma forma padronizada e bem definida, num padrão rítmico regular de 2/4 (embora possa mudar para 5/8), sendo ele que, musicalmente, define o charamba. A estrutura harmónica é simples, baseando-se na Tónica e Dominante do tom de Sol maior. O seu andamento é lento/andante. Jogos cantados Nos momentos de convívio dos mais jovens, seja entre si, seja com os adultos da família ou amigos, as lengalengas e os jogos ocupavam um lugar importante. Estes apresentam uma grande diversidade de características, podendo ser cantados ou não, tal como ter associada uma coreografia própria. Embora não sendo possível efetuar generalizações, existe um conjunto de aspetos que se podem apresentar como sendo muito comuns aos jogos cantados: – São cantados em tom maior, com refrão e um ritmo simples; – É habitual possuírem refrão, cantado por todos em uníssono, intercalado com outras partes entoadas a solo por algum dos participantes; – Sem acompanhamento instrumental; – Recurso a acompanhamento de palmas; – A sua letra é composta maioritariamente por quadras de verso curto Muitos dos jogos têm uma coreografia associada. Os jogadores podem colocar-se em roda simples ou dupla, podendo ter um elemento no centro, podem estar em fila, frente a frente, etc. Histórias Outra forma muito comum de passar o tempo livre, ou mesmo acompanhar as longas horas de trabalho do bordado, era contando ou cantando histórias. Estas podiam assumir características diversificadas. Tanto podiam ser os antigos romances da tradição hispânica, como narrativas inspiradas em factos da vida real, como ainda histórias de animais ou mesmo lengalengas. Um elemento importante é assumirem, com grande frequência, um carácter didático ou terem uma conclusão moral. A sua componente musical varia muito. Ainda podemos encontrar alguns romances com as suas melodias ancestrais, a par de outros textos a que se foi adaptando uma música mais recente. Nestes casos, o facto de se tratar de uma melodia bem conhecida facilitava a sua memorização e podia tornar mais recetivos os ouvintes. De qualquer modo, são sempre melodias com frases musicais curtas, que se vão repetindo ao longo de todo o texto. Danças As duas formas dançadas mais comuns na RAM são os já referidos bailinho e mourisca. Para além delas, pode referir-se duas outras tradicionais da ilha do Porto Santo, a Meia Volta e o Ladrão, e uma outra, a Dança das Espadas, associada à festa de São Pedro, na Ribeira Brava. Meia volta Na ilha do Porto Santo, os momentos de festa em família ou com vizinhos e amigos tinham lugar nas eiras ou num espaço amplo dentro de casa. Aí, o tocador da rabeca colocava-se no centro e os restantes participantes do baile iam formando pares em roda (pares que nunca se tocavam, realçavam alguns dos mais antigos). Na roda, incluíam-se os tocadores dos outros instrumentos, como o rajão e viola de arame. Caso único nas danças da RAM, existia um mandador que orientava a sequência coreográfica do baile, ao mesmo tempo que cantava e tocava a viola de arame. Os restantes cantadores ficavam fora da roda. A música tem ainda hoje carácter modal (frígio), claro sintoma da sua antiguidade, embora todas as hipóteses até hoje lançadas para explicar a sua origem sejam puramente especulativas. Tradicionalmente, o canto era improvisado. Atualmente extinto da tradição, são elementos do Grupo Folclórico local que preservam a sua recordação. Musicalmente, apresenta uma sequência harmónica de três acordes: Sol, Lá, Sol, tom de Sol maior. O andamento é moderado e mantém-se sempre inalterável, mudando o número de notas musicais, criando uma intensidade sonora e desenvolvendo uma dinâmica rítmica, enquanto o violino executa uma interessante melodia com base na escala de Sol maior. A meia volta é única em relação a todas as outras músicas tradicionais. Dança das espadas Música tradicionalmente executada durante os festejos de São Pedro, na Ribeira Brava. Praticada até meados do séc. XX, esta dança desapareceu progressivamente da tradição, sendo alvo de trabalho de reconstituição em finais do século, tendo posteriormente retomado o seu lugar na festa.   Dança das Espadas. Ribeira Brava. Foto: Rui A. Camacho É interpretada por um conjunto de homens com um trajo próprio, tendo duas partes distintas: uma executada em marcha e a outra com uma coreografia própria. Aspecto peculiar, a dança é apenas instrumental, sem qualquer canto associado, o que faz com que seja a única dança da tradição popular que apresenta essas características. Musicalmente, é simples, baseando-se apenas em quatro compassos, em tom maior. Embora haja registo de ligeiras alterações, podemos definir o acompanhamento musical como sendo feito por rajão, braguinha, viola de arame e pandeiro.   Jorge Torres Rui Camacho (atualizado a 01.02.2018)

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heer, oswald

Oswald Heer (1809-1883), geólogo e botânico suíço, especializou-se no estudo de fósseis. Por motivos de saúde, Heer passou um inverno na Madeira e, como resultado dessa estadia, publicou um artigo onde descreve fósseis das plantas de São Jorge. Heer nasceu na Suíça a 31 de agosto de 1809 e passou a maior parte da sua juventude no cantão de Glarus, onde seu pai era pastor luterano. Em 1828, começou os estudos de Teologia e História Natural na Universidade de Halle e foi ordenado pastor em 1831, embora deixasse esta profissão pouco depois, para se dedicar exclusivamente às ciências. Em 1834, começou a trabalhar como professor de Botânica na recém-fundada Universidade de Zurique e, nesse ano, fundou o herbário dessa instituição. Em 1855, quando o Politécnico de Zurique foi fundado, Heer ocupou o cargo de professor de Botânica, que exerceu até ao fim da sua vida. Em 1845, funda a Sociedade de Agricultura e Horticultura de Zurique e, durante muitos anos, foi membro do Grande Conselho dessa cidade. Os seus primeiros trabalhos científicos foram dedicados à entomologia, embora depois se dedicasse quase exclusivamente ao estudo de fósseis. Publicou numerosos artigos nessa área, mais de 70, entre eles, a descrição da flora fóssil da Suíça, do Ártico, Gronelândia, e de algumas partes de Inglaterra, do Canadá e da Ásia. Heer tinha problemas pulmonares e, por esse motivo, passou o inverno de 1854-1855 na ilha da Madeira. Após esta viagem, publicou alguns artigos sobre os fósseis da ilha: “Über die fossilen pflanzen von St. Jorge in Madeira” e “Contributions à la flore fossile du Portugal”, incluindo uma discussão sobre a origem da flora e fauna da Madeira, dos Açores e das Canárias: “On the probable origin of the organized beings now living in the Azores, Madeira, and the Canaries”. Oswald Heer ganhou a medalha Wollaston em 1874 e a medalha Real em 1877 pela sua contribuição para o conhecimento das plantas fósseis da Europa e do Ártico e pelas suas teorias sobre a relação entre o clima e a origem da flora no período terciário. Morreu em Lausanne, na Suíça, a 27 de setembro de 1883. Obras de Oswald Herr: “On the probable origin of the organized beings now living in the Azores, Madeira, and the Canaries” (1856); “Über die fossilen pflanzen von St. Jorge in Madeira” (1857); “Contributions à la flore fossile du Portugal” (1881).   Pamela Puppo (atualizado a 23.02.2018)

Personalidades Geologia