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tutela administrativa

A figura jurídica da tutela representa, no âmbito do direito administrativo, uma forma de controlo administrativo que uma pessoa coletiva pública, através dos seus órgãos considerados legalmente competentes para o efeito, pode exercer sobre outra pessoa coletiva pública. Esta figura jurídica releva particularmente em ordenamentos jurídicos que consagram um sistema de organização administrativa descentralizado, pressupondo a existência de diversas pessoas jurídicas públicas. A tutela administrativa implica uma relação entre duas pessoas coletivas públicas, em que uma tem a posição de entidade tutelar e a outra de entidade tutelada. No âmbito dessa relação, a entidade tutelar acompanha e verifica o desempenho funcional da entidade tutelada, promovendo ou concorrendo para a adequação ou correção desse desempenho. A existência de uma relação tutelar entre duas pessoas coletivas públicas não se presume, dependendo de lei que, de modo inequívoco, a preveja. Estando prevista legalmente, só acarreta para a entidade tutelar os poderes sobre a entidade tutelada que resultarem, expressa ou implicitamente, da lei, não se admitindo a consagração tácita da tutela ou dos poderes tutelares respetivos. Acresce que, por definição, o legislador, ao consagrar um regime de tutela administrativa de uma pessoa coletiva pública sobre outra, deverá no limite fazê-lo de tal modo que daí não resulte a anulação da autonomia da entidade tutelada, sob pena de ficar em causa a sua personalidade jurídica e de, consequentemente, deixar de ser possível falar de uma relação entre entidades distintas, como é próprio da tutela. As limitações que por essa via se impuserem à autonomia da entidade tutelada devem restringir-se ao estritamente necessário para que se realizem os fins que o ordenamento jurídico considera que a podem justificar. Esta figura jurídica não se confunde com outras que relevam também para o direito administrativo. Assim, distingue-se desde logo da hierarquia administrativa, porque esta toma como referência uma relação entre órgãos de certa pessoa coletiva pública e não – como é próprio da tutela administrativa – uma relação entre distintas pessoas coletivas públicas. Distingue-se também da superintendência administrativa, na medida em que esta se traduz numa interferência juridicamente relevante de uma pessoa coletiva pública na gestão de uma outra, correspondendo tal interferência não a uma situação de mero controlo intersubjetivo, como é próprio da tutela, mas antes, especificamente, ao exercício de poderes tais como os de dirigir orientações, de emitir diretivas ou de solicitar informações aos órgãos dirigentes de outra pessoa coletiva pública sobre os objetivos a atingir na gestão desta e sobre as prioridades a adotar na respetiva prossecução. A tutela administrativa também não se confunde com a figura da fiscalização administrativa sobre entidades privadas que exerçam poderes públicos que é exercida por pessoas coletivas públicas. Neste caso, a diferença está em que a tutela administrativa pressupõe uma relação entre pessoas coletivas públicas, sendo que, diferentemente disto, nesta outra figura agora em referência está presente uma relação entre uma pessoa coletiva pública e uma entidade privada. Noutro aspeto, cabe referir que a tutela administrativa pode ter expressões muito distintas, variando consoante, nomeadamente, o seu alcance finalístico e material ou ainda em razão dos poderes de controlo que se lhe associam. A tutela administrativa, em razão das finalidades a que se vincula, pode configurar-se como tutela de legalidade ou como tutela de mérito, envolvendo, no primeiro caso, um controlo do cumprimento das determinações legais por parte da entidade tutelada e, no segundo caso, um controlo sobre a conveniência e a oportunidade dos comportamentos realizados pela entidade tutelada. Por sua vez, considerando o seu alcance material, distingue-se a tutela administrativa stricto sensu da tutela administrativa financeira: a primeira tem incidência sobre a autonomia administrativa da entidade tutelada; a segunda interfere com a autonomia financeira da entidade tutelada. Com referência aos poderes abrangidos, podem ainda ser identificados os seguintes tipos de tutela administrativa: tutela integrativa, em que o controlo administrativo se concretiza por via da aprovação ou da autorização da prática de determinados atos pela entidade tutelada; tutela inspetiva, que se exprime no poder de a entidade tutelar averiguar da regularidade da atuação da entidade tutelada; tutela sancionatória, que traduz o poder de aplicar sanções que se devam fazer corresponder a irregularidades verificadas no funcionamento da entidade tutelada; tutela revogatória, que envolve o poder de fazer extinguir os efeitos de regulamentos e/ou atos administrativos produzidos pela entidade tutelada e tutela substitutiva, que implica o poder de a entidade tutelar praticar atos legalmente devidos, em caso de inércia do órgão responsável da entidade tutelada. No que respeita particularmente ao ordenamento jurídico português vigente em 2016, importa ter em consideração que a Constituição, no n.º 2 do seu art. 267.º, determina que a lei estabelecerá adequadas formas de descentralização administrativa, devendo tal ocorrer sem prejuízo, nomeadamente, dos poderes de tutela dos órgãos competentes. Cabe depois esclarecer como é concebida a tutela administrativa nas situações de descentralização territorial, associativa e institucional operadas no ordenamento jurídico português. Neste sentido, com referência à descentralização territorial, impõe-se distinguir entre a que respeita às Regiões Autónomas e a que se relaciona com as autarquias locais. Quanto à descentralização em favor das regiões autónomas, será de relevar que a Constituição não prevê que seja acompanhada da consagração de correspondentes poderes de tutela estaduais. Tal descentralização é de natureza político-administrativa e não meramente administrativa, entendendo-se, por isto, que não se aplica às regiões autónomas a previsão sobre tutela administrativa contida no citado n.º 2 do art. 267.º da Constituição. Será assim de entender que, por falta de base constitucional, não será admissível a consagração, por via estatutária ou outra via legislativa ordinária, de tutela estadual sobre as Regiões Autónomas. A propósito da descentralização relativa às autarquias locais, diferentemente, a Constituição determina, no n.º 1 do seu art. 242.º, que sobre estas será exercida tutela, a qual consiste estritamente na verificação do cumprimento da lei por parte dos órgãos autárquicos, sendo exercida nos casos e segundo as formas previstas na lei. A tutela administrativa a exercer sobre as autarquias locais é, neste sentido, apenas, uma tutela inspetiva de legalidade, não cabendo aos órgãos tutelares, desde logo, o poder de apreciação do mérito dos atos praticados pelos órgãos autárquicos. Mais se determina constitucionalmente, no referido artigo, que as medidas tutelares restritivas da autonomia local devem ser precedidas de parecer de um órgão autárquico, nos termos a definir por lei (n.º 2), admitindo-se que a determinação da dissolução de órgãos autárquicos apenas possa ter por causa ações ou omissões ilegais graves (n.º 3). Tal tutela administrativa incumbe ao Estado, no caso das autarquias locais do continente, competindo ao Governo da República (art. 199.º, al. d) da Constituição); por sua vez, pertence às regiões autónomas, no caso das autarquias locais existentes nos arquipélagos dos Açores e da Madeira, competindo ao respetivo Governo regional, como resulta da al. m) do art. 227.º da Constituição e dos Estatutos Político-Administrativos das Regiões Autónomas. Ainda a propósito do regime da tutela administrativa sobre as autarquias locais, importa considerar, especificamente, o que resulta da lei n.º 27/96, de 1 de agosto (alterada pela lei orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro), a qual se aplica também às regiões autónomas, sem prejuízo da publicação de diploma regional que identifique especificamente os membros dos Governos regionais que são competentes para o exercício da tutela administrativa; e.g., em relação à Madeira, o dec. leg. regional n.º 6/98/M, de 27 de abril. Neste diploma, entre outros aspetos, definem-se os regimes de realização de ações inspetivas e de aplicação de sanções resultantes da prática, por ação ou omissão, de ilegalidades no âmbito da gestão das autarquias locais (perda de mandato e dissolução de órgãos). No que respeita à tutela administrativa relacionada com a descentralização associativa que se concretiza em favor de associações públicas, cabe logo considerar a realidade das entidades intermunicipais (áreas metropolitanas e comunidades intermunicipais), que se regem pelo disposto nos arts. 63.º e seguintes da lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, e estão sujeitas ao mesmo regime da tutela administrativa que se aplica às autarquias locais e se encontra consagrado na citada da lei n.º 27/96, de 1 de agosto. Por seu turno, as associações públicas profissionais beneficiam, nos termos da legislação que define o seu regime (lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro), do reconhecimento de uma ampla autonomia que se traduz logo na determinação legal de que não estão sujeitas a superintendência governamental nem a tutela de mérito, ressalvados quanto a esta, os casos especialmente previstos na lei (art. 45.º, n.º 1 da citada lei). Estão sujeitas a tutela de legalidade idêntica à exercida sobre as autarquias locais, sendo essa tutela de carácter inspetivo, salvo quanto aos regulamentos que versem sobre os estágios profissionais, as provas profissionais de acesso à profissão e as especialidades profissionais, os quais só produzem efeitos após a sua homologação por parte da respetiva entidade tutelar (art. 45.º, n.os 2 a 5 da citada lei). Com referência às situações de descentralização institucional relativa a institutos públicos – serviços ou fundos personalizados (neste último caso, também designados como fundações públicas de direito público) do Estado ou das regiões autónomas –, importa sublinhar que estas entidades, gozando de autonomia administrativa e financeira, se sujeitam todavia a superintendência administrativa e a tutela – consoante os casos – do Estado ou da região autónoma respetiva. A tutela administrativa que pode ser exercida sobre os institutos públicos pode ser de legalidade e de mérito, configurando-se como tutela inspetiva, integrativa, sancionatória e substitutiva, nos termos do que resulta do art. 41.º da respetiva Lei-Quadro (aprovada pela lei n.º 3/2004, de 15 de janeiro, alterada e republicada pelo dec.-lei n.º 105/2007, de 3 de abril). A propósito considerem-se, ainda, as adaptações legislativas regionais constantes do dec. leg. regional n.º 17/2007/M, de 12 de novembro (alterado e republicado pelo dec. leg. regional n.º 2/2013/M, de 2 de janeiro) e do dec. leg. regional n.º 13/2007/A, de 5 de junho (alterado e republicado pelo dec. leg. regional n.º 13/2011/A, de 11 de maio). Por último, deverá cuidar-se da tutela administrativa que se realiza com referência às entidades públicas empresariais e às entidades administrativas independentes. As entidades públicas empresariais sujeitam-se à tutela administrativa que for consagrada nos atos legislativos que determinarem a sua criação. No caso das entidades administrativas independentes e, em particular, de entidades que exercem funções de regulação e de promoção e defesa da concorrência respeitantes às atividades económicas dos sectores privado, público, cooperativo e social, deverá ser considerado o disposto na Lei-Quadro da Entidades Reguladoras (aprovada pela lei n.º 67/2013, de 28 de agosto). Trata-se de entidades que, dispondo de uma ampla autonomia administrativa e financeira, se caracterizam por não se encontrarem sujeitas a superintendência ou a tutela administrativa, sujeitando-se, todavia, ao poder governamental de solicitação de informações e de aprovação e autorização prévia de alguns atos (art. 45.º da citada Lei-Quadro).   Afonso d’Oliveira Martins (atualizado a 04.01.2017)

Direito e Política

acordos e tratados internacionais (participação da madeira na negociação de)

A participação da Região Autónoma da Madeira (RAM) na negociação de acordos e tratados internacionais traduz-se na intervenção no procedimento de vinculação internacional do Estado português desta pessoa coletiva territorial, dotada de personalidade de direito público ao abrigo do direito português (art. 2.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (EPARAM)). Trata-se de uma intervenção inserida no âmbito do processo de conclusão de tratados em Portugal, ou treaty-making power, ao constituir uma questão relacionada com os poderes conferidos às diferentes entidades públicas portuguesas e às competências atribuídas aos órgãos do poder político para intervirem na assunção de um compromisso internacional pelo Estado português. Tendo em consideração os efeitos internos e internacionais que serão potencialmente produzidos pelos compromissos internacionais, a referida intervenção deve ser analisada tendo por base uma abordagem que tenha simultaneamente em conta os contributos do direito regional, do direito interno português e do direito internacional. Os acordos e os tratados internacionais são acordos de vontade entre sujeitos de direito internacional. Nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 2.º da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969 (CVDT69), a “expressão ‘tratado’ designa um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido pelo direito internacional, quer esteja consignado num instrumento único, quer em dois ou vários instrumentos conexos, e qualquer que seja a sua denominação particular”. Daqui decorre serem determinantes, para a qualificação de um compromisso internacional como acordo internacional ou tratado internacional, a intervenção de, pelo menos, dois sujeitos de direito internacional e a sua sujeição ao direito internacional. O modo como os acordos de vontade entre sujeitos de direito internacional são designados não é, assim, decisivo para os efeitos jurídicos que estes venham a produzir nos planos nacional e internacional, sendo “acordo (internacional)”, “tratado (internacional)”, e “convenção (internacional)” as denominações mais correntemente encontradas na prática dos Estados. Ao nível do direito internacional, relativamente à menor ou maior complexidade do procedimento de vinculação internacional utilizado, entende-se que a distinção entre acordo internacional e tratado internacional resulta da existência de ratificação ou da necessidade da manifestação de vontade a estar vinculado através de assinatura ser confirmada por um órgão do poder político distinto daquele a quem está confiada a negociação dos compromissos internacionais. A Constituição da República Portuguesa (CRP), no seguimento do direito internacional, utiliza os conceitos de convenção (internacional), de tratado (internacional) e de acordo internacional em diversas disposições do seu articulado. As convenções (internacionais) correspondem a compromisso internacional enquanto género (CRP, art. 8.º, n.º 2), enquanto os tratados internacionais são a espécie de vinculação internacional carecida de ratificação pelo Presidente da República (CRP, art. 135.º, alínea b)) e os acordos internacionais correspondem aos compromissos internacionais que não exigem a prática de um ato discricionário de confirmação por parte desse órgão de soberania. O EPARAM, por seu turno, faz expressa referência a tratados e acordos internacionais em quatro disposições distintas: (i) na alínea r) do art. 69.º, relativamente à competência do Governo regional para participar na negociação de compromissos internacionais; (ii) na alínea c) do art. 93.º, no que respeita à conclusão de protocolos de colaboração permanente sobre matérias de interesse comum entre o Estado e a RAM; (iii) no art. 95.º, sobre a representação na negociação de tratados e acordos internacionais que incidam sobre matérias de interesse específico da RAM; e, finalmente, (iv) na alínea e) do art. 108.º, no que concerne às receitas da RAM que sejam geradas por tratados e acordos internacionais respeitantes à Região. A potencialidade de assumir compromissos internacionais é uma prerrogativa reconhecida aos sujeitos de direito internacional, com destaque para os Estados soberanos. Nesse sentido, o art. 6.º da CVDT69 prevê expressamente que “todo o Estado tem capacidade para concluir tratados”. A possibilidade de entidades que integram a organização política e administrativa de um Estado soberano concluírem compromissos com natureza e efeitos jurídico-internacionais é algo que resulta da sua organização interna e exige a expressa concordância do outro ou dos outros sujeitos de direito internacional intervenientes (nesse sentido, o n.º 3 do art. 225.º da CRP, ao estabelecer que a “autonomia político-administrativa não afeta a integridade da soberania do Estado e exerce-se no quadro da Constituição”, conduziu o Tribunal Constitucional a afirmar, no ac. n.º 403/2009, de 30 de julho, que os “poderes das regiões autónomas, em matéria de política externa, não as transformam, portanto, em entidades autónomas e diferenciadas do Estado Português, do ponto de vista do Direito Internacional Público”). O procedimento de vinculação internacional do Estado português consiste no conjunto de regras jurídicas e de práticas que são seguidas em Portugal na assunção de um compromisso internacional. Trata-se de um procedimento muito complexo, em resultado de a capacidade de Portugal para a conclusão de compromissos internacionais se ter alterado substancialmente em consequência da sua integração na União Europeia (UE). Daqui decorre que uma adequada compreensão desta matéria implique, por um lado, ter-se em consideração que se trata de uma matéria simultaneamente regulada pelo direito interno, pelo direito internacional e pelo direito da UE e, por outro lado, que a liberdade de atuação internacional do Estado português está limitada em virtude de ser um Estado-membro da União Europeia. O procedimento de vinculação internacional dos Estados vai buscar a sua estrutura básica ao direito internacional, nomeadamente às normas de direito consuetudinário codificado e de direito estritamente convencional que integram os arts. 6.º a 25.º da CVDT69. No direito dos Estados encontram-se, por seu turno, as regras jurídicas que desenvolvem essa estrutura fundamental, com destaque para os órgãos com competência para atuar em cada uma das fases do procedimento de vinculação internacional e os termos em que é feita a publicitação internacional das convenções internacionais que tenham sido assumidas pelos Estados. A participação de Portugal na UE, ao implicar a aceitação de um estatuto genérico de capacidade internacional limitada, integra a obrigação de atuar de forma coordenada ou conjunta com as Comunidades ou com a UE ao nível da vinculação internacional. A conclusão de tratados e de acordos internacionais deixou, em conformidade, de ser uma atividade livre do Estado português, para passar a ser uma atuação em que este só se poderá vincular individualmente se tiver capacidade internacional para o fazer. Em conformidade com a alínea t) do n.º 1 do art. 227.º da CRP, a RAM deve “participar nas negociações de tratados e acordos internacionais que diretamente lhes digam respeito, bem como nos benefícios deles decorrentes”. Em sentido concordante, no art. 95.º do EPARAM, integrado na secção IV (“Participação da Região em Negociações Internacionais”) do capítulo II (“Relações entre os Órgãos de Soberania e os Órgãos de Governo Próprio”) do título III (“Relações entre o Estado e a Região”), está expressamente previsto que a “participação nas negociações de tratados e acordos que interessem especificamente à Região realiza-se através de representação efetiva na delegação nacional que negociar o tratado ou o acordo, bem como nas respetivas comissões de execução ou fiscalização”. Da leitura conjugada destas duas disposições resultam três perguntas, a que importa dar resposta quando se pretende saber qual é o significado da participação da RAM no procedimento de vinculação internacional do Estado português: (i) quais são as matérias em relação às quais a RAM deve participar na negociação de um compromisso internacional a celebrar pelo Estado português; (ii) como se concretiza o direito constitucional de participação da RAM nas negociações jurídico-internacionais que sejam prosseguidas pelo Estado português; (iii) por último, quando deve ter lugar a participação da RAM na assunção de um compromisso internacional por parte de Portugal. Em primeiro lugar, antes de mais, importa delimitar os compromissos internacionais que integram o direito constitucional de participação na negociação de um compromisso internacional do Estado português por parte da RAM. Para alcançar esse desiderato devem-se ter em consideração três disposições do EPARAM. Em primeiro lugar, o art. 40.º, que apresenta um longo elenco das matérias de interesse específico que são relevantes como “motivos de consulta obrigatória pelos órgãos de soberania”. Em segundo lugar, o art. 94.º do EPARAM, que elenca as matérias de direito internacional que podem constituir o objeto de protocolos de colaboração permanente que venham a ser celebrados entre o Governo da República e o Governo regional e que integram os “trabalhos preparatórios, acordos, tratados e textos de direito internacional” (alínea c) do art. 93.º do EPARAM), e, ainda, os “benefícios decorrentes de tratados ou de acordos internacionais que digam diretamente respeito à Região” (alínea d) do art. 93.º do EPARAM). E, finalmente, a alínea e) do art. 108.º do EPARAM, ao prever que constituem receitas da Região os “benefícios decorrentes de tratados e acordos internacionais respeitantes à Região, tal como definida nos artigos 1.º, 2.º e 3.º deste Estatuto”, em razão da referência, no n.º 2 do art. 3.º do EPARAM, ao “mar circundante e seus fundos, designadamente as águas territoriais e a zona económica exclusiva”. O art. 94.º do EPARAM é particularmente relevante neste domínio, ao prever que constituem “designadamente matérias de direito internacional […] respeitando diretamente à Região”: “a) Utilização do território regional por entidades estrangeiras, em especial bases militares; b) Protocolos celebrados com a NATO e outras organizações internacionais, em especial sobre instalações de natureza militar ou paramilitar; c) Participação de Portugal na União Europeia; d) Lei do mar; e) Utilização da zona económica exclusiva; f) Plataforma continental; g) Poluição do mar; h) Conservação, investigação e exploração de espécies vivas; i) Navegação aérea; e j) Exploração do espaço aéreo controlado”. O Tribunal Constitucional, no ac. n.º 800/2014, de 26 de novembro de 2014, a propósito do dever de audição dos órgãos regionais, avança, em termos muito gerais, que, de acordo com uma jurisprudência “que remonta ao Parecer n.º 20/77 da Comissão Constitucional […], sendo reiterada posteriormente em acórdãos do Tribunal (v. Acórdão n.º 174/2009 e jurisprudência aí referida e, por último, o Acórdão n.º 747/2014), ‘[…] são questões de competência dos órgãos de soberania, mas respeitantes às regiões autónomas, aquelas que, excedendo a competência dos órgãos de governo regional, respeitem a interesses predominantemente regionais ou, pelo menos, mereçam, no plano nacional, um tratamento específico no que toca à sua incidência nas regiões, em função das particularidades destas e tendo em vista a relevância de que se revestem para esses territórios’”. Assim sendo, das disposições citadas, em conjugação com a alínea s) do n.º 1 do art. 227.º da CRP (“participar na definição das políticas respeitantes às águas territoriais, à zona económica exclusiva e aos fundos marinhos contíguos”), decorre que um domínio em que a RAM terá um interesse reforçado em participar em negociações visando a assunção de compromissos internacionais pelo Estado português será o relacionado com as matérias relativas às atividades que podem ser prosseguidas no espaço aéreo e nos espaços marítimos adjacentes e circundantes ao território terrestre do arquipélago da Madeira. Em segundo lugar, importa esclarecer como se concretiza o direito constitucional de participação da RAM na negociação jurídico-internacional, tendo em consideração que o art. 95.º do EPARAM estipula que esta se deve realizar através “de representação efetiva na delegação nacional que negociar o tratado ou o acordo”. Ao Governo regional, em conformidade com o art. 69.º do EPARAM, é atribuída competência para “participar na negociação de tratados e acordos internacionais que digam diretamente respeito à Região bem como nos benefícios deles decorrentes” (alínea r)) e para “participar na definição das políticas respeitantes às águas territoriais, à zona económica exclusiva e aos fundos marinhos contíguos”. A orgânica da presidência do Governo, aprovada pelo dec. reg. regional n.º 11/2016/M, de 6 de abril, estipula, no n.º 3 do art. 2.º, que o “Presidente do Governo Regional exerce os poderes que a lei confere ao Governo Regional” relativamente a “tratados e acordos internacionais que digam diretamente respeito à Região”, sem fornecer qualquer outro elemento relevante neste domínio. No ac. n.º 403/2009, de 30 de julho, antes citado, e a propósito das alterações ao Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, o Tribunal Constitucional não avançou com qualquer elemento relevante neste domínio, dado que se limitou a transcrever um passo de Rui Moura Ramos quando este afirmava que “precisa-se, no que respeita à sua concretização, que tal participação traduzir-se-á na representação efetiva dentro da delegação nacional que negociará o tratado ou acordo”. Em termos que merecem concordância, Maria Luísa Duarte defende que a “participação compreende a representação na delegação da República Portuguesa incumbida da negociação, o direito de ser notificada de toda a documentação relevante e ainda a oportunidade de ser ouvida e de se pronunciar, de modo efetivo, sobre as questões da negociação com incidência regional direta” (DUARTE, 2014, 236). Importa realçar, no entanto, como o fez o presidente do Tribunal Constitucional, conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro, na sua declaração de voto no ac. n.º 136/2016, de 29 de fevereiro, a propósito de uma questão próxima, ao apreciar os poderes das regiões autónomas ao nível do ordenamento do espaço marítimo, em termos particularmente adequados ao seu esclarecimento, que a posição reconhecida à RAM é corporizada por “poderes cuja natureza e alcance permitem apenas estabelecer ‘fluxos de comunicação e manifestação de vontade’ por parte desses órgãos, mas não dão qualquer garantia de que essa vontade seja minimamente tida em conta ou respeitada na decisão final”. Finalmente, em terceiro lugar, importa esclarecer quando deve ter lugar a participação da RAM no âmbito do procedimento conducente à assunção de um compromisso internacional por parte de Portugal. O Tribunal Constitucional, no ac. n.º 800/2014, de 26 de novembro, antes citado, refere, em termos relevantes para a questão em análise, que em “procedimentos legislativos complexos em que as decisões fundamentais quanto ao regime a definir se não tomam em um só momento mas se vão tomando em fases consecutivas, importa assegurar que a audição regional ocorra naquela fase do procedimento em que mais ampla é a liberdade de conformação do legislador nacional”. No procedimento de vinculação internacional do Estado português podem ser distinguidas cinco fases: (i) a negociação; (ii) a assinatura; (iii) a aprovação interna ou aprovação interna conducente à manifestação definitiva do consentimento a estar vinculado internacionalmente; (iv) a ratificação ou manifestação definitiva do consentimento a estar vinculado internacionalmente; e (v) a publicitação, interna e internacional. Sendo a negociação a primeira fase do procedimento de vinculação internacional, é nela que importa garantir a efetividade da participação da RAM, dado que, sendo uma competência do Governo central negociar compromissos internacionais, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art. 197.º da CRP, no seu âmbito podem ser autonomizados dois momentos distintos: por um lado, uma subfase prévia, anterior à negociação, que consiste na decisão de vinculação internacional; por outro lado, a negociação propriamente dita, que é uma concretização da decisão de vinculação internacional. Tendo o procedimento de vinculação internacional do Estado português o seu momento propulsor com a decisão de vinculação internacional, deverá ser este o momento a partir do qual a intervenção da RAM é jurídica e factualmente relevante, na medida em que é nesta ocasião que o decisor português deve fazer o cruzamento entre o interesse ou a necessidade de ser assumida uma determinada vinculação internacional e a possibilidade de esta ser concluída, tendo em consideração o preenchimento de determinadas condições de natureza jurídica. Com efeito, antes de mais, o decisor português tem a obrigação de confrontar a intenção de assumir uma determinada vinculação internacional com um conjunto de condicionamentos de natureza jurídica, de carácter interno e externo. De carácter interno, de uma banda, para analisar a compatibilidade da vinculação internacional que pretende assumir com determinadas normas de natureza constitucional, nomeadamente as que regulam o treaty-making power e as que estabelecem princípios relativos à atuação externa do Estado. De carácter externo, de outra banda, para ter em consideração os limites à decisão de vinculação internacional do Estado português que resultam da sua subordinação às normas de ius cogens, do respeito pelos compromissos anteriormente assumidos que estejam em vigor e, finalmente, da participação de Portugal na União Europeia. Entre os condicionamentos de carácter jurídico tem especial importância a questão da apreciação da capacidade de vinculação internacional do Estado português, em resultado da extensão das limitações impostas pela União Europeia à capacidade de vinculação internacional dos Estados-membros. Esta matéria assume, além disso, uma prioridade lógica na decisão de vinculação internacional, na medida em que, nas situações de incapacidade, o Estado português não terá, enquanto tal, e isoladamente, legitimidade para assumir a vinculação internacional em causa. Confirmada a existência de capacidade para a assunção de um compromisso internacional, a decisão de vinculação internacional deverá ainda ponderar a questão da opção pelo tipo de procedimento a ser utilizado. Como referido anteriormente, a CRP utiliza, nesta matéria, a contraposição entre tratado internacional e acordo internacional: o primeiro é um compromisso internacional sujeito a ratificação ou a uma manifestação semelhante do consentimento a estar vinculado; o segundo é um compromisso internacional que não está sujeito a ratificação ou a um tipo semelhante de manifestação reforçada do consentimento a estar vinculado. Vigora em Portugal, em termos gerais, um princípio de liberdade de escolha do procedimento ou da forma que irá assumir a vinculação internacional, do que resulta ser a opção pelo procedimento a utilizar, na maioria das situações, uma decisão dos contratantes em presença. Existem, no entanto, algumas situações em que é imposta a forma de tratado em Portugal, em resultado da alínea i) do art. 161.º da CRP. Daqui resulta só ser exigida a utilização de um procedimento de vinculação solene nos casos dos compromissos internacionais expressamente previstos na segunda parte do primeiro segmento da alínea i) do art. 161.º da CRP, isto é, relativamente aos “tratados de participação de Portugal em organizações internacionais, os tratados de amizade, de paz, de defesa, de retificação de fronteiras e os respeitantes a assuntos militares”. Nas outras situações de vinculação internacional poderá ser indiferentemente utilizado o procedimento solene ou simplificado, algo que é distinto da exigência da submissão, à aprovação da Assembleia da República, de um conjunto alargado de compromissos internacionais, em conformidade com a alínea i) do art. 161.º da CRP, anteriormente mencionada. Assim sendo, não existe uma justificação jurídico-constitucional para se defender uma distinção material entre tratados e acordos internacionais, nem uma argumentação convincente para defender, em consequência, uma qualquer subordinação hierárquica do acordo internacional (em forma simplificada) ao tratado internacional. A negociação internacional será levada a cabo por intermédio do Ministério dos Negócios Estrangeiros ou dos diversos ministérios ou departamentos sectoriais que integram a administração central do Estado, devendo ser prosseguida com uma efetiva intervenção dos órgãos competentes da RAM. Ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, enquanto “departamento governamental que tem por missão formular, coordenar e executar a política externa de Portugal” (nos termos do art. 1.º do dec.-lei n.º 121/2011, de 29 de dezembro), cabe a apreciação das matérias políticas e técnicas de natureza jurídico-internacional, em conformidade com o que se encontra previsto na sua lei orgânica. Nesse sentido, a alínea j) do n.º 1 do art. 2.º do diploma antes citado prevê que são atribuições do Ministério dos Negócios Estrangeiros “conduzir as negociações e os processos de vinculação internacional do Estado português, sem prejuízo das competências atribuídas por lei a outras entidades públicas”. Em sentido idêntico, os n.os 1 e 2 da resolução do Conselho de Ministros n.º 17/88, de 7 de abril, estabelecem que cabe ao Ministério dos Negócios Estrangeiros a coordenação das negociações conducentes à aceitação de vinculações internacionais. Aos restantes ministérios ou departamentos sectoriais, por seu turno, caberá intervir nas negociações relativamente à matéria técnica que constitui o objeto da vinculação internacional. Importa acrescentar que o direito de participação da RAM deve também abranger o modo como os objetivos e os resultados que estiverem a ser alcançados nas negociações dos compromissos internacionais de maior relevância são objeto de informação por parte do Governo ao Presidente da República, aos partidos políticos representados na Assembleia da República e que não façam parte do Governo e aos grupos parlamentares, nos termos, respetivamente, da alínea c) do n.º 1 do art. 201.º, do n.º 3 do art. 114.º e da alínea j) do n.º 2 do art. 180.º da CRP.   Fernando Loureiro Bastos (atualizado a 25.11.2016)

Direito e Política História Política e Institucional

zona franca ou centro internacional de negócios da madeira

A criação da Zona Franca da Madeira (ZFM), que veio também a ser designada por Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM), resultou de um conjunto de circunstâncias e causas de natureza diversa, sendo umas remotas e outras próximas: por um lado, as aspirações ancestrais dos madeirenses, fundadas na existência de um porto franco de consumo existente nas ilhas Canárias, e, por outro, o movimento que, sob a égide da Associação Comercial e Industrial do Funchal (ACIF), conduziu, face à situação da economia da Madeira na década de 70 do séc. XX, à reflexão do modelo de zona franca mais adequado e consentâneo com as características geográficas, geológicas, morfológicas, económicas e sociais da Madeira. Este desiderato havia já sido ensaiado através da lei n.º 265, de 24 de julho de 1914, que autorizou o Governo a adjudicar a construção e a exploração duma zona franca na Madeira que seria instalada no local julgado mais conveniente por uma comissão técnica, durante 60 anos. Na zona franca, seriam permitidas todas as operações de beneficiação, empacotamento e transformação dos géneros do arquipélago da Madeira em outros produtos comerciáveis, com a exceção do vinho, beneficiando de isenção de direitos para embarcar, desembarcar e depositar aqueles géneros, isenção que não abrangia o cacau e o azeite não destinado a conservas. A zona franca ficava sujeita ao regime fiscal dos armazéns gerais francos, aprovado pelo dec. de 27 de maio de 1911, e a sociedade adjudicatária garantia as suas obrigações legais e contratuais nos termos previstos pela lei de 13 de junho de 1913, que havia autorizado a construção e a exploração de um porto franco em Lisboa. Esta iniciativa legislativa não foi prosseguida e, na déc. de 1970, a ACIF levou a cabo as providências necessárias ao apuramento e à definição do modelo da zona franca mais adequado à Madeira com base nesta dicotomia: uma zona franca comercial ou de consumo, como a das Canárias, ou uma zona franca empresarial, como na Irlanda e nas ilhas do Canal. Para esse efeito, a ACIF promoveu, em 1974, a realização de um estudo da viabilidade e oportunidade da criação de uma zona franca, sustentado em inquérito destinado a recolher a opinião de largos sectores da população sobre o projeto, tendo sido consultados todos os organismos oficiais, os representantes dos vários sectores da vida económica da Região, bem como outros profissionais de diversas atividades. Neste inquérito, a área abrangida pela zona franca admitia três hipóteses: um porto franco, uma zona franca extensiva a toda a ilha da Madeira, ou uma zona abrangendo todo o arquipélago da Madeira. Assente em participação ativa e relevante das entidades consultadas e nos resultados desse inquérito, a ACIF assegurou a elaboração de um estudo prévio, cujo texto provisório foi colocado à apreciação e discussão em 1975, através da consulta às entidades e aos profissionais já auscultados no inquérito anteriormente realizado. O texto preliminar e provisório desse estudo foi publicado na íntegra na imprensa diária, tendo, assim, o debate sido alargado a toda a população. O texto definitivo do estudo prévio resultou da inserção dos contributos obtidos através das diligências efetuadas, contendo uma análise das vantagens advenientes da criação da zona franca – então referenciada como regime de franquia aduaneira –, bem como um projeto de diploma legal e respetivo regulamento atinentes ao correlato regime. Este estudo foi apresentado, em 1975, à então Junta de Planeamento da Madeira, a qual entendeu que, dada a natureza e a importância de que o projeto se revestia, devia o mesmo ser objeto de aprofundamento através de uma entidade internacional especializada na matéria. A ACIF, tendo em consideração que o estudo em causa devia abranger uma perspetiva global, integrada e de longo prazo da economia regional, obteve propostas de três empresas especializadas: a americana International Finance Consultants, a britânica M. L. H. Consultants Ltd e a alemã Agrar und Hydrotechnik, cujos representantes se deslocaram à Madeira para a prestação de esclarecimentos sobre as propostas apresentadas, em reuniões em que também participaram os vogais para o Planeamento e Finanças e para a Indústria, Agricultura e Pescas da então Junta Regional da Madeira. Em 1976, a realização do estudo foi adjudicada à sociedade International Finance Consultants, a qual apresentou o estudo em 1977, tendo o mesmo sido objeto de ajustamentos face ao pedido formulado em 1978 pelo Governo da República de adesão do país à então Comunidade Económica Europeia. Com base neste estudo e nas diligências efetuadas junto do Governo da República, foi, em 1980, criada a Zona Franca da Madeira visando satisfazer uma velha aspiração dos Madeirenses e tendo como pressupostos a especial situação geoestratégica da Madeira, onde se conjugam as características específicas da economia regional com a sua peculiar configuração sócio-política, de molde a facultar o aparecimento de novos sectores voltados para o desenvolvimento económico e social da Região. Na iminência da criação da zona franca, o conselho do Governo regional procedeu à definição da localização e demarcação da área onde a mesma seria instalada, tendo a escolha recaído na freguesia do Caniçal, em território que se delimitava, devido aos princípios e orientações do ordenamento territorial da zona litoral, entre o Garajau e a Ponta de São Lourenço, pela pertença de imóveis afetáveis da Região na referida freguesia, pela localização do aeroporto, pela melhoria do eixo rodoviário que o liga ao Funchal, e pela previsível construção de viadutos previstos sobre as ribeiras em Santa Cruz e no Porto Novo. Em 1988, o Governo regional voltou a pronunciar-se sobre os critérios de implementação da Zona Franca Industrial, tendo em consideração os interesses legítimos do agregado populacional do Caniçal, a localização definitiva das instalações escolares e desportivas, a existência de um porto de pesca e os campos agrícolas experimentais do Governo. Nessa primeira data, ficou assente que seriam definidos posteriormente o regime jurídico-fiscal aplicável, a natureza, o âmbito territorial e as características da zona franca, bem como a regulamentação da atividade nela desenvolvida, tendo em consideração os condicionalismos resultantes das negociações encetadas para a adesão de Portugal à então CEE. Essa definição foi efetuada em 1982, ficando determinado que poderiam ser autorizadas, na zona franca, todas as atividades de natureza industrial, comercial ou financeira, sendo os pedidos de instalação das empresas apreciados e decididos com base em dois parâmetros fundamentais: a idoneidade da firma impetrante e o interesse económico da atividade a desenvolver. Nessa mesma data, ficou a zona franca industrial definida como um enclave territorial onde as mercadorias que nele se encontram são consideradas como não estando no território aduaneiro para efeito de aplicação de direitos aduaneiros, de restrições quantitativas e de mais imposições ou medidas de efeito equivalente. A zona franca deveria ser exteriormente resguardada por uma vedação, de harmonia com o disposto no Código da Reforma Aduaneira, e disporia de uma estância aduaneira e de um posto fiscal próprios, que vieram a ser criados em 1990. A regulamentação operada teve em atenção as normas comunitárias concernentes ao funcionamento de zonas francas e ao denominado regime de aperfeiçoamento ativo, em subordinação ao princípio de conformação das disposições legais aplicáveis à zona franca ao ordenamento jurídico comunitário. Nesse mesmo ano, foi constituída a comissão instaladora da ZFM, composta por dois representantes do Governo regional da Madeira e dois representantes – um efetivo e um suplente – da ACIF. O período compreendido entre 1982 e 1985 foi dedicado à conceção e definição do regime fiscal da zona franca e da sua administração e exploração em regime de concessão. Assim, em 1985, foi aprovado um regime fiscal que se traduziria num sistema contratual de usufruição dos benefícios fiscais, fortemente inspirado pelo regime constante do Código de Investimento Estrangeiro então vigente, mas, que, por não corresponder à proposta apresentada pelo Governo regional ao Governo da República, foi substituído, seis meses depois, por novo decreto-lei, que consagrou o princípio da usufruição automática dos benefícios e incentivos fiscais e financeiros pelas empresas, logo após o seu licenciamento no âmbito da zona franca. Na conceção do regime de incentivos foi tido em consideração o disposto no Tratado de Roma relativamente ao desenvolvimento regional e as regras de salvaguarda da distorção da concorrência no seio da Comunidade Económica Europeia. Paralelamente, a Assembleia Regional da Madeira aprovou o regime de administração e exploração da ZFM, autorizando o Governo a adjudicar, em regime de concessão e com dispensa da realização de concurso, a sua gestão a uma entidade privada nacional ou estrangeira, na qual a Região Autónoma da Madeira (RAM) viesse a participar ou à qual viesse a associar-se. A previsão da existência de uma comissão para assegurar uma simplificação dos procedimentos administrativos, bem como um desburocratizado acompanhamento e fiscalização das atividades licenciadas, foi uma antevisão do gabinete da Zona Franca criado no ano seguinte com esse escopo e essa missão funcional, com a concomitante extinção da comissão instaladora da Zona Franca. O prazo da concessão foi estabelecido em 30 anos, sem prejuízo da sua eventual renovação ou prorrogação, ficando o Governo regional autorizado a regular as condições de exercício das atividades, quer da concessionária quer dos utentes da zona franca. Nesse mesmo ano de 1986, foi regulado o exercício de atividades financeiras através das denominadas sucursais financeiras exteriores, tendo o Governo regional procedido, em 1987, à regulamentação das condições de instalação e funcionamento daquelas sucursais. O exercício destas atividades foi alargado, em 1994, quer às instituições constituídas de raiz quer às sucursais financeiras internacionais, as quais podiam realizar operações com residentes, faculdade que se encontrava vedada às sucursais financeiras exteriores. Em 1987, o Governo regional da Madeira adjudicou a administração e a exploração da zona franca à Sociedade de Desenvolvimento da Madeira, S.A., e aprovou o Regulamento das Atividades Industriais, Comerciais e de Serviços Internacionais no âmbito institucional da ZFM. No reconhecimento da proeminência económica e social, contributiva do desenvolvimento da Região, e da concomitante necessidade de uma gestão célere, proficiente e atempada, considerada como pressuposto e condição essencial para uma maior simplicidade e eficiência do processo decisório, o Governo regional não só rejeitava e removia os processos de antanho, os quais recorriam a desnecessárias complexidades e delongas processuais, desencorajadoras do investimento prosseguido por entidades caldeadas em regimes mais simplificados, como também fundamentava a opção por uma gestão empresarial em termos privados da zona franca. O diploma em causa estabeleceu o regime de licenciamento das atividades em consideração, as competências da concessionária nesse licenciamento, na aprovação dos projetos de instalação e funcionamento das empresas industriais e na fiscalização das obras com base em licença emitida pela concessionária, assim como o regime de uso dos imóveis por via da subconcessão do domínio público em autoconstrução ou de direito de uso em pavilhões construídos pela concessionária, os quais, finda a concessão, revertem gratuitamente para a RAM. Em 1988, os princípios de simplificação, desburocratização e de celeridade fundamentaram a criação da Conservatória do Registo Comercial Privativa da Zona Franca da Madeira e do Cartório Notarial também privativo da zona franca, cujo início de funcionamento foi fixado para o dia 1 de abril de 1989, tendo sido estabelecido que os atos praticados por aqueles serviços privativos se encontravam isentos de qualquer taxa ou emolumento. Os mesmos princípios determinaram, em 1989, a criação da IV Série do Jornal Oficial, destinada exclusivamente às empresas licenciadas na zona franca – cujas publicações, não exigidas em regimes europeus congéneres, foram também isentas de pagamento de taxas –, a autorização da constituição, em 1994, das sociedades comerciais por quotas e anónimas unipessoais e, em 1995, o reconhecimento da faculdade de as sociedades licenciadas usarem palavras ou parte de palavras estrangeiras ou de feição estrangeira na composição das suas firmas ou denominações. Estes princípios, pioneiros no país quer em relação à autorização das sociedades unipessoais, mais tarde autorizadas só para o tipo por quotas, quer em relação à simplificação administrativa e à prática e objetivos empresariais, permitiram que, na sua conceção, a ZFM constituísse o primeiro exercício unitário, integrado e coerente de internacionalização da economia portuguesa. Nesse mesmo sentido, em 1988, tendo em consideração que muitos dos investidores seriam oriundos de países com ordenamentos jurídicos diversos do sistema português, designadamente dos países da common law, e reconhecendo a necessidade de dotar a ZFM de instrumentos mais eficazes na captação do investimento direto estrangeiro, foi autorizada a instituição de instrumentos de trust, instituto jurídico até à data inexistente no ordenamento jurídico português. Este regime de propriedade fiduciária, envolvendo uma relação tripartida entre o settlor ou instituidor, o trustee e os beneficiários ou a causa específica por eles prosseguida, que nos regimes romano-germânicos encontram fronteiras com as fundações, o usufruto, o mandato sem representação e o fideicomisso ou a fidúcia, permitiu à zona franca disponibilizar aos seus utentes um meio jurídico que lhes era facultado noutros regimes e jurisdições congéneres. Em 1989, foi criado o quarto sector de atividades, acrescentando-se à Zona Franca Industrial, aos serviços financeiros e aos serviços internacionais o Registo Internacional de Navios da Madeira (MAR), o qual foi criado visando a prossecução de dois fins: em primeiro lugar, estancar os processos de saída de navios do registo convencional português para registos de conveniência (flagging-out) e, em segundo lugar, atrair novos armadores e navios, oferecendo condições de custos semelhantes às apresentadas pelos registos mais competitivos. Nesse sentido, o MAR foi dotado de uma somissão técnica, composta por um representante do membro do Governo responsável pelo sector dos transportes, um representante da RAM e um representante da Inspeção Geral de Navios. Adentro das condições indispensáveis à atratividade do MAR, a Lei do Orçamento do Estado para 1989 procedeu à consagração da isenção do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) para os tripulantes embarcados nos navios matriculados no MAR e o próprio diploma que procedeu à sua criação não só aplicou aos navios o regime fiscal da zona franca, como também permitiu às partes que designassem a lei que regula a constituição das hipotecas, tendo o aprofundamento do regime de graduação dos privilégios creditórios determinado o recesso da Convenção Internacional para a Unificação de Certas Regras Relativas aos Privilégios e Hipotecas Marítimos, assinada em Bruxelas em 10 de abril de 1926, que se havia tornado um impedimento à adesão dos armadores devido às objeções colocadas pelos credores hipotecários em relação à graduação dos seus créditos. Paralelamente, foi facultado aos tripulantes dos navios o acesso ao regime do seguro social voluntário. A reforma fiscal operada em 1989, com a extinção da contribuição predial e industrial, da sisa e do imposto profissional, e a concomitante criação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), do Imposto Municipal sobre os Imóveis (IMI) e do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas (IMT), determinou que o regime fiscal da ZFM ficasse, em grande parte, plasmado no Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), então aprovado. Nesse sentido, o primeiro regime fiscal (regime i) da zona franca, que vigorava desde 1986, passou a constar do EBF e permitiu o licenciamento de atividades até 31 de dezembro de 2000, usufruindo as empresas que as desenvolvessem da isenção de IRC até 31 de dezembro de 2011. O regime ii, com uma taxa de tributação em IRC de 1 %, 2 % e 3 %, respetivamente nos anos de 2003-2004, 2005-2006 e de 2007 a 2011, entrou em vigor a 1 de janeiro de 2003, permitindo o licenciamento de atividades até 31 de dezembro de 2006, com o usufruto desse benefício pelas entidades que as prosseguissem até 31 de dezembro de 2011. O regime iii, com uma taxa de tributação em IRC de 3 %, 4 % e 5 %, respetivamente nos anos de 2007-2009, 2010-2012 e de 2013 a 2020, entrou em vigor a 1 de janeiro de 2007, permitindo o licenciamento de atividades até 31 de dezembro de 2013, prazo que, de acordo com a legislação comunitária adrede posta em vigor, foi prorrogado, por duas vezes, até 31 de dezembro de 2014, com usufruição dos benefícios fiscais até 31 de dezembro de 2020. As empresas licenciadas no CINM são contribuintes fiscais portugueses para todos os efeitos, pendendo sobre elas as obrigações gerais a que se encontram adstritos os contribuintes em geral, e pagam uma taxa de instalação aquando do licenciamento, e uma taxa anual de funcionamento, através de depósito nos cofres da concessionária nos termos previstos na lei e no contrato de concessão. Os resultados obtidos pela aplicação destes regimes são de natureza qualitativa e quantitativa. Os primeiros, já referidos, permitiram que o CINM constituísse o primeiro exercício político-económico de internacionalização da economia portuguesa, rasgando novos rumos para o ordenamento jurídico português, introduzindo princípios e regras de simplificação administrativa e desburocratização do processo decisório e de licenciamento e exercício de atividades no âmbito do CINM. Do ponto de vista quantitativo, pela aplicação do regime i, constata-se que, em 2000, se encontravam licenciadas cerca de 5900 entidades, congregando 2900 empregos diretos e indiretos, e com o registo de 264 embarcações no MAR. A remuneração média dos quadros qualificados que trabalhavam no CINM era superior em cerca de 60 % à média da Região. Os capitais sociais agregados das sociedades ascendiam ao equivalente a 8600 milhões de euros e os investimentos efetuados pela concessionária na construção e manutenção das infraestruturas internas da ZFI eram de cerca de 18,7 milhões de euros, tendo os utentes investido mais de 143 milhões de euros nas suas unidades industriais. Nesta data, o CINM erigia-se já como um dos pilares fundamentais da economia da Região com um contributo de cerca de 20 % para a formação do respetivo PIB. Em 2000, com o procedimento formal de investigação instaurado pela Comissão Europeia, por força da entrada em vigor das Orientações sobre os Auxílios de Fiscalidade Regional, cujo início de prazo não coincidia com o fim da vigência do regime i, e com a aprovação do regime ii, que só entrou em vigor a 1 de janeiro de 2003 e que introduziu limites máximos (plafonds) ao benefício fiscal usufruído em IRC pelas entidades licenciadas no CINM, verificou-se não só um hiato de dois anos sem licenciamento de atividades, como um retrocesso na atratividade do regime e na adesão dos investidores. Esse retrocesso foi acelerado pela interrupção, em 2010, do processo negocial para revisão e aumento dos plafonds, que havia sido iniciado em 2009, junto da Comissão Europeia, o qual veio a ser retomado em 2011, com conclusão favorável em 2013. Também contribuiu para o agravamento desse retrocesso a revogação do benefício da isenção de dividendos aos sócios e acionistas das empresas licenciadas, benefício que, de acordo com a Comissão Europeia, não se encontrava sujeito a limitação temporal. O referido retrocesso foi reconhecido em 2012 pela Assembleia Legislativa da Madeira que, tomando as suas questões como causas e fundamentos, solicitou ao Governo da República a reabertura do processo negocial dos plafonds, no cumprimento dos deveres para-constitucionais que impendem sobre os órgãos de soberania para assegurarem a rentabilidade e competitividade internacional do CINM. Desse modo, em finais de 2014, encontravam-se licenciadas 1868 entidades, com a criação de cerca de 3000 empregos diretos, estando matriculadas 323 embarcações no MAR. Os capitais sociais agregados das entidades licenciadas ascendiam a 6,4 mil milhões de euros e os investimentos em infraestruturas e equipamentos na ZFI eram de 24 milhões de euros pela concessionária e de 200 milhões pelos utentes. José António Câmara (atualizado a 11.10.2016)

Direito e Política Economia e Finanças História Económica e Social

aljube

“Aljube” era a designação da prisão eclesiástica, que existiu em todas as dioceses portuguesas e não só, desde tempos muito antigos. A sua instalação no Funchal ocorreu com a chegada das primeiras diretivas do Concílio de Trento, em 1562, e com a vigência de D. Fr. Jorge de Lemos (c. 1510-1574), o primeiro bispo residente que a Madeira conheceu (Lemos, D. Fr. Jorge de). Situava-se, sensivelmente, naquele que veio a ser o Lg. João Gago e na rua que logo recebeu o nome “do Aljube”, durando todo o Antigo Regime. Saliente-se, no entanto, que o aljube servia de cárcere a todos aqueles que não fosse possível deter de outro modo, mas não aos eclesiásticos, que na generalidade eram presos na torre da Sé. Área da Sé com o Aljube-1804     Área da Sé com o Aljube-1805   Fr. Jorge de Lemos empreendeu uma vasta campanha de correção dos abusos resultantes da não residência de um prelado no Funchal, facto que permitira a instalação de um clima de pouca observância dos preceitos religiosos, muito especialmente dentro do novo quadro tridentino. Da veemência desta intervenção, adveio a fama de o bispo ser rigoroso e severo nas punições. O seu empenho na correção dos desmandos traduziu-se numa larga produção legislativa que acentuava a necessidade de as justiças secular e religiosa se auxiliarem mutuamente. Entrava-se, progressivamente, no período da Contrarreforma e, a 18 de fevereiro de 1558, o gabinete de D. Sebastião, à frente do qual se encontrava o cardeal D. Henrique e depois se haveria de colocar o P.e Martim Gonçalves da Câmara (c. 1539-1613), fazia publicar um alvará onde se ordenava que o corregedor da capitania do Funchal, o provedor dos resíduos e o juiz de fora se disponibilizassem para acudir ao bispo sempre que as pessoas condenadas, em visitação, a penas até 2$000 réis se recusassem a cumprir o castigo. Logo de seguida, a 12 de março, o gabinete régio promulgou uma nova determinação que obrigava o corregedor e outros oficiais de justiça na Madeira a prestarem ao prelado toda a ajuda e auxílio requeridos. Em 1564, o gabinete régio voltou a publicar outro alvará, insistindo que incumbia aos oficiais judiciais seculares punirem qualquer pessoa que afrontasse a justiça eclesiástica. Aljube e Câmara do Funchal -1870.   A produção de toda esta legislação demonstra bem a vontade régia de colocar os mecanismos de justiça mais diretamente dependentes da coroa ao serviço da administração eclesiástica, a quem, em contrapartida, era solicitado auxílio para intervir, nas pregações e visitações, caso fossem detetados devedores à Fazenda régia, mostrando bem a perfeita consciência da importância da Igreja, localmente representada pelos bispos, como instrumento do reforço da autoridade do poder central. O prelado era apresentado pelo Rei e pago pela Fazenda régia, sendo entendido como o número dois da hierarquia insular, pelo que, faltando futuramente o representante local do rei, aquele viria a assumiria o lugar, inclusivamente, com funções militares, embora tal ocorresse apenas alguns anos depois. Frestas das escadas da torre da Sé Deve-se, assim, ao bispo D. Fr. Jorge de Lemos a montagem do aljube. O edifício foi adquirido a 5 de março de 1562, a Mendo Ornelas de Moura e a sua mulher, moradores no Caniço. Consistia em umas “casas”, “com dois sobrados”, acima da “sé desta cidade, defronte da porta travessa da banda de cima, que partia duma parte com casas de Tristão de França e pela outra, com as dos herdeiros de Francisco Vieira (antigo prioste) e pela banda do norte, com os herdeiros de Tristão Vaz e da outra, com a rua pública”, tendo custado 80$000 réis, tudo “pago em dinheiro de contado” (ANTT, Cabido da Sé do Funchal, maç. 2, docs. 45 e 46). Com esta aquisição, ampliou-se a cerca da sé para norte e montaram-se as escadas no edifício, datando de 15 de abril de 1562 a autorização camarária para se fazer na “rua do concelho a escada do aljube” (Id., Ibid., doc. 46). A 6 de julho de 1562, por alvará régio, foi criado o lugar de aljubeiro, com uma remuneração anual de 4$000 réis e, a 12 de junho, foi ordenado “um acrescentamento de 2$000 ao dito aljubeiro, para ter de seu ordenado 6$000” (BNP, Índice do Registo da Provedoria..., 71v.-72). Nos anos seguintes registaram-se inúmeras prisões no aljube, essencialmente de populares, condenados por crimes diversos, como mancebia e prostituição.     Pormenor do Aljube e Câmara do Funchal -1870.   Pontualmente, no entanto, chegaram a estar ali presos (e por vezes na torre, por falta de espaço disponível) outros indivíduos, como vereadores e funcionários de justiça. Essa situação verificou-se, e.g., na vigência de D. Fr. Manuel Coutinho (1673-1742) (Coutinho, D. frei Manuel) ou de D. Gaspar Afonso da Costa Brandão (c. 1710-1784). Foi em Oitocentos que a ocupação das prisões da cidade, incluindo o aljube, conheceu a sua máxima ocupação, com as alçadas de 1823 e de 1828, no contexto dos conflitos entre liberais e absolutistas. O aljube veio a ser demolido nos finais do séc. XIX, em data que não conseguimos apurar, mas ainda surge em fotografias da déc. de 70 dessa centúria. A sua memória perdura ainda na rua com o seu nome e, embora ao longo do liberalismo e do rotativismo tenha sido uma das artérias a que Câmara tentou atribuir mais vezes outras designações, nenhuma outra persistiu.   Rui Carita (atualizado a 17.08.2016)

Direito e Política

alçadas

Infante D. Henrique Leopoldo de Almeida   A justiça era o atributo máximo dos reis; em relação à Madeira, logicamente, e dada a distância e descontinuidade territorial, foi de início delegada, mas parcialmente, nos representantes dos monarcas. Primeiro, no donatário, o infante D. Henrique (1395-1460), e nos seus capitães, pois o Rei D. João I, na doação do arquipélago ao infante, a 26 de setembro de 1433, reservara para a coroa o princípio da maioria da justiça e da cunhagem da moeda. Depois, nos capitães do donatário e, logo, também nas vereações camarárias, que eram ainda um tribunal; mais tarde, igualmente nos ouvidores e corregedores, eles próprios “com alçada”, ou seja, com determinado âmbito de jurisdição. Denominavam-se alçadas, antigamente, os tribunais coletivos e ambulantes que, percorrendo o território, administravam a justiça em nome do rei. Escreve António de Morais Silva, no Grande Dicionário da Língua Portuguesa, a partir de Vida do Arcebispo de frei Luís de Sousa, que “chamamos alçada a uns tribunais ou casa de justiça, que constam de presidente e companhia, e autoridade de ministros, os quais em forma de ‘Relação’ discorrem por todos os povos com poderes reais, como em visita geral, a desfazer agravos, castigar insultos, tolher forças e humilhar poderosos, que mal usam do seu poder” (SILVA, 1949, I, 568). O termo é, ainda, sinónimo de competência, jurisdição, limite de ação e influência, e aplica-se igualmente à Igreja (Auditório eclesiástico, Jurisdição eclesiástica). Certamente, não com a frequência com que ocorreu com a jurisdição real e não-alçadas eclesiásticas vindas do reino, cuja competência canónica era muito restrita na diocese do Funchal, nem de Roma, cuja distância colocava a Ilha a coberto de uma intervenção desse género através do prelado diocesano, que, face a queixas recebidas e a informações transmitidas pelos seus visitadores, e encontrando-se por vezes em Lisboa, determinava o envio de alçadas a várias freguesias da Madeira. Assim aconteceu com a maioria dos prelados, primeiro, pessoalmente e, depois, por delegados, com especial relevância no caso de D. Fr. Manuel Coutinho (1673-1742) (Jacobeia). Inclusivamente, o bispo possuía prisão própria para os chamados delitos de foro misto, o aljube, sendo os eclesiásticos presos na torre da Sé, embora também tenha havido não eclesiásticos aí detidos. Nos meados do séc. XV, aparecem de imediato na Ilha elementos com determinadas alçadas ou jurisdições enviados pelo donatário como ouvidores, surgindo os primeiros a pedido dos moradores, para uma mais eficaz e correta aplicação da justiça. O primeiro ouvidor do duque D. Fernando (1433-1470), sobrinho e herdeiro do infante D. Henrique, foi Dinis Anes da Grã, nomeado a 10 de maio de 1466 e enviado a pedido dos procuradores da Ilha, então Mem Rodrigues de Vasconcelos, fidalgo da casa do duque, e Gonçalo Anes de Velosa, escudeiro, que o solicitaram por entenderem ser necessário “mandar prover sobre a justiça e boa governação” da Madeira (ARM, Câmara Municipal do Funchal, Registo geral, tombo 1, fls. 134-135). A jurisdição ou alçada de Dinis Anes da Grã, sob a forma de regimento ou de carta, com competência em ambas as capitanias, Funchal e Machico, permitia-lhe realizar a eleição dos juízes e oficiais do concelho, encarregar-se de “todos os feitos crime que a mim pertencer livrar, e cíveis, que forem sobre dívidas e contratos, e outros feitos semelhantes, ora sejam começados ou por começar”, como escreveu o duque, determinando ainda que “os despacheis”, para “livres, sem mais, virem a mim” (Id., Ibid.). Competia-lhe também decidir conjuntamente com o capitão e o almoxarife sobre “os feitos e demandas” relativos às águas e “doações de terras”, e quando estivesse em desacordo com o capitão nessas matérias, deveria fazer registo de tudo para ser presente ao duque-donatário (Id., Ibid.). Não sabemos quanto tempo Dinis da Grã esteve na Ilha. Ainda aí se encontrava a 4 setembro desse ano de 1466, quando o duque enviou uma carta ao mesmo ouvidor sobre a coutada a estabelecer no Funchal para “os bois de arado e bestas de servidão”, dado que para o trabalho das sementeiras não havia “bois que os possam servir” e que seria situada acima da praia Formosa (Ib., Ibid., fls. 136-136v.). O ouvidor faleceu, entretanto, mas não sabemos se na Madeira. Com efeito, em carta de 6 de agosto de 1468, sobre a jurisdição do Funchal em relação ao lugar de Câmara de Lobos, já o duque refere que “umas posturas que Dinis Anes da Grã, meu ouvidor que Deus perdoe”, tinha dado aos moradores daquele lugar atribuía-lhes determinadas prerrogativas sobre “penas e coimas”, pelo que os mesmos moradores entendiam não ter de participar na procissão de Corpo de Deus da vila do Funchal, determinando-se então que eram parte integrante da mesma vila, devendo obediência à dita (Id., Ibid., fls. 270-271). Simão Gonçalves da Câmara_1527-1531   Com o falecimento do infante e duque D. Fernando, em 1470, assumiu a administração da Ordem de Cristo a infanta D. Beatriz (1430-1506). Na menoridade dos seus filhos, enviou também logo ouvidores com idêntica alçada, designadamente Luís Godinho, em 1478, que serviria depois sob a administração do duque D. Manuel (1469-1521). Seguiu-se, em 1485, Brás Afonso Correia e, em 1493, Fernão de Parada. Nos anos sequentes, subindo D. Manuel ao trono e integrando a Madeira na coroa “para sempre”, a 27 de abril de 1497 (Id., Ibid., fls. 272-273v.), face ao protagonismo excessivo assumido pelo Cap. Simão Gonçalves da Câmara (1463-1530) (Câmara, Simão Gonçalves da) e a arbitrariedades várias, houve que proceder de uma outra forma, enviando especificamente um corregedor, que veio a suspender aquele capitão e os seus ouvidores. Já antes, o rei D. Manuel, logo após o falecimento do segundo capitão do Funchal, João Gonçalves da Câmara (1414-1501), fizera partilhar a capitania do Funchal, criando mais duas câmaras: Ponta do Sol, em 1501 e Calheta, em 1502. Depois, em 1508, estando a “igreja grande” do Funchal quase pronta e sagradas as suas paredes, elevou a antiga vila a cidade e ainda, em 1514, conseguiu de Roma a elevação a sede de diocese para a mesma, medidas que fizeram diminuir progressivamente o referido protagonismo local do terceiro capitão do Funchal, Simão Gonçalves da Câmara, que veio a ter o cognome de O Magnífico. Porém, tendo chegado a Lisboa queixas da sua atuação, o rei despachou para a Ilha, a 20 de fevereiro de 1516, Diogo Taveira, em correição, que suspendeu o dito capitão do Funchal. As queixas não eram recentes e já o anterior corregedor, Álvaro Fernandes, enviara ao rei, a pedido do mesmo, a 8 de julho 1504, um auto com o rol das dívidas do capitão. Mais tarde, em carta de 25 de outubro de 1515, também a Câmara do Funchal se queixava da intromissão do capitão nos seus assuntos e na jurisdição dos seus ministros. Simão Gonçalves da Câmara tomou a chegada do corregedor como uma afronta e ingerência nos assuntos da sua capitania, queixando-se às instâncias superiores do reino, invocando estar na posse da jurisdição do cível e do crime, sem dar apelação nem agravo, exceto nas sentenças de morte e talhamento de membro, como constava da sua confirmação à frente da capitania, pelo que não via razão para a sua suspensão e dos seus ouvidores. A 8 de outubro de 1516, o corregedor escreveu ao rei, dando conta das diversas irregularidades, nomeadamente fraudes à Fazenda cometidas pelos rendeiros, falta de administração da justiça e demoras nas demandas. Entretanto, também a Câmara se queixava do aumento da tabela dos selos determinada pelo capitão, que subira o imposto de 9 para $036 réis, provocando assim um substancial aumento das suas receitas, pelo que D. Manuel, a 6 de abril de 1517, ordenou ao corregedor que inquirisse dessa ocorrência e não consentisse o aumento. O Cap. Simão Gonçalves da Câmara, logo em 1516, perante a gravidade das acusações recolhidas pelo corregedor, saiu da Ilha com intenções de passar a Castela. No Algarve, terá tido conhecimento de que os reis de Fez e de Mequinez apertavam o cerco a Arzila, mandando organizar um socorro, após o que se instalou em Sevilha, onde ficou a aguardar notícias de D. Manuel. O rei pareceu sensibilizar-se com este rasgo imprevisto e até grandioso e, para não o ver ao serviço de Castela, “escreveu-lhe uma carta com grandes promessas e esperanças de lhe fazer as honras e mercês que tais serviços mereciam, mandando-lhe que viesse logo e tornasse para o reino que ele o despacharia conforme os seus merecimentos” (FRUTUOSO, 1968, 246-247). Mas isso escreveu Jerónimo Dias Leite e transcreveu, depois, Gaspar Frutuoso, assim tentando justificar a conduta do capitão do Funchal, pois o mesmo, em princípio, não voltou à Madeira, tentou vender a capitania e veio a falecer em Matosinhos, em 1530. Nas décadas seguintes, e no âmbito da história da Madeira, o termo “alçada” indica, especialmente, a chegada de um corregedor do desembargo régio com pessoal ao seu serviço, em resposta a um desmando grave ocorrido na Ilha e que alcançara ao conhecimento da corte. A partir dos finais do séc. XVI, o governador passou a ir à Madeira acompanhado de um corregedor; e, em 1681, o Rei começou a nomear também um juiz-de-fora para a Câmara com funções de correição, similar ao provedor que atuava na esfera da Fazenda. Mas a opção foi para desfasar temporalmente os períodos de estadia dos governadores e dos corregedores, que passaram a responder autonomamente à corte de Lisboa e, durante a União Ibérica, também à de Madrid; assim, estes dois elementos passaram a encarnar os lugares cimeiros da administração periférica da Coroa, vindo a ser designados, amiúde, ministros do Rei, tal como consta em muita documentação coeva. Nos finais do séc. XVI, em 1597, o vice-rei bispo de Leiria, D. Pedro de Castilho, que fora bispo de Angra, enviou o corregedor André Lobo, “do desembargo de S. Majestade, el-rei e com alçada nestas ilhas”, à Madeira. André Lobo tomou posse a 26 janeiro de 1598 e compareceu no Funchal nos últimos dias do ano, tendo-se apresentado na Câmara a 1 de janeiro de 1599. Com este corregedor produziu-se um dos acontecimentos mais marcantes da organização governativa insular, ocorrido com a saída da Ilha do governador Diogo de Azambuja de Melo, em meados de outubro de 1599.   Membros do senado camarário_1821   Assim, a 31 de outubro, reuniram-se os vereadores na sede da Câmara, então nas traseiras da sé, com o bispo do Funchal, D. Luís Figueiredo de Lemos (1544-1608), o desembargador André Lobo, os vereadores camarários, “fidalgos, gente da governança e capitães” do presídio, “e saiu o bispo”, por 21 votos contra os 9 que teve o desembargador (ARM, Câmara Municipal do Funchal, Vereações 1599-1600, liv. 1314, fls. 45-47). A eleição faria jurisprudência na administração madeirense e, nos casos seguintes, não houve sequer votação, sendo o governo entregue, de imediato, ao prelado; esta situação do prelado como governador foi, depois, confirmada pela corte de Lisboa.     Vereadores da Câmara do Funchal em uniforme de gala-1816-1821   A primeira alçada do séc. XVII ocorreu em 1606, com o envio do desembargador António Ferreira, face às informações chegadas a Lisboa de que o governador João Fogaça d’Eça, descendente de Zarco, se recusara a expulsar quatro holandeses que viviam na Ilha, acusados de serem “correspondentes de rebeldes” (AGS, Secretarias Provinciales, liv. 1476, fl. 41). A indicação fora dada por Filipe III de Castela e configura um certo desnorte do governo, entre Madrid e Lisboa, com ordens e contraordens, acabando o governador por não ser suspenso, mas vindo a ser indiciado, em seguida, o do Porto Santo, Diogo Perestrelo Bisforte, a de 31 de outubro do mesmo ano, sendo impedido de continuar o exercício do cargo somente na alçada seguinte e tendo tido então ordem para se fazer apresentar na corte. Ao longo da primeira metade do séc. XVII e na vigência do governo filipino, foram, ainda, enviadas para a Ilha as alçadas do desembargador Simão Cardoso Cabral, em 1610; do desembargador da Casa da Suplicação, Gonçalo de Sousa, em 1614; do desembargador da Relação do Porto, Estêvão Leitão de Meireles, em 1627; e do desembargador da Casa da Suplicação, Ambrósio de Sequeira, em 1634. Estavam em causa, essencialmente, questões gerais de justiça que iam sendo notícia nas cortes de Lisboa e de Madrid, como queixas de assassinatos e, também, queixas relacionadas com o desvio de dinheiros da Fazenda, aspeto a que essas cortes estavam bastante mais atentas. A última alçada visou a cobrança do “donativo” ou “empréstimo” para o socorro do Brasil no valor de 30.000 cruzados (AGS, Secretarias Provinciales, liv. 1527, fl. 112v.; ANTT, Corpo Cronológico, parte 1, mç. 119, doc. 43; ARM, Câmara. Municipal do Funchal, Vereações, liv. 1327, fl. 31v) e revela já alguns aspetos do levantamento geral que ocorria em Portugal contra o governo filipino. Face àquele pedido, a 18 de fevereiro de 1637, os representantes dos vinte e quatro mesteres do Funchal (Casa dos 24) apresentaram mesmo em Câmara uma contestação à nova contribuição; ela começa com a declaração seguinte: “A mais natural obrigação que têm os senhores reis e príncipes católicos é não usurparem aos seus povos e vassalos, etc., aqueles privilégios, leis e isenções que os seus” antecessores haviam dado (ARM, Registo geral, tombo 3, fls. 19v.-20v.). Pediam, assim, que as suas “razões de justa escusa” fossem levadas ao conhecimento do rei, pois, “por particulares erros, não por ofensas públicas, que nunca as houve nesta Ilha contra o serviço real”, tinham sido castigados, desde 1615, “com três rigorosíssimas alçadas, com cujos custos não têm ficado aos moradores cabedal algum para acudirem às suas notórias e extremas necessidades” (Id., Ibid.). Os custos das alçadas caiam, logicamente, sobre os moradores, incluindo a residência do desembargador e do seu pessoal. Desta realidade já se havia queixado o governador D. Francisco de Sousa, em 1628, pedindo que fosse abreviado o tempo das alçadas, geralmente de três anos, mas, por consulta de 30 de janeiro de 1629, o seu requerimento não teve despacho favorável. A provisão régia de nomeação do desembargador Leitão de Meireles, p. ex., estipulava 1$000 réis por dia para o desembargador, $500 para o escrivão, $600 para o meirinho e mais $160 para cada homem armado, tudo ao dia, montantes que deveriam ser pagos pelos culpados, podendo-se fazer execução das suas fazendas. Mais tarde, em 1653, ao corregedor Dionísio Soares de Albergaria, determinava-se um salário de 1$200 réis por dia à custa da fazenda dos culpados executados; não havendo culpados ou não os podendo executar, seriam pagos 1$000 pela Fazenda Real. Grande parte destas averiguações corriam por denúncia, sendo os indiciados imediatamente espoliados dos seus bens e, não se confirmado depois as acusações, dificilmente os recuperavam, havendo inúmeras queixas a este respeito. A opinião dos representantes dos mesteres na Câmara do Funchal, alegando que “ofensas públicas” “nunca as houve nesta Ilha contra o serviço real”, está muito longe de corresponder à realidade, pois sempre existiram e continuariam a existir. Nos finais do séc. XVI, p. ex., organizou-se no Funchal, durante a noite, uma “matraca” contra o desembargador André Lobo (ANTT, Chancelaria de Filipe II, Perdões e legitimações, liv. 3, fl. 108), na qual terá estado envolvido o poeta e novelista Tristão Gomes de Castro (1539-1611) (Alferes-mor), que veio a ter carta de perdão pela acusação a 30 de março de 1605. Mais tarde, o desembargador Gonçalo de Sousa, temendo um atentado, deixou a cidade do Funchal para se refugiar em Machico, como refere, posteriormente, o provedor da Fazenda Francisco de Andrade, em carta de 30 de agosto de 1646, acrescentando que, depois, dois meirinhos e quatro homens da alçada do corregedor Ambrósio de Sequeira tinham sido violentamente atacados e ficado feridos. A 21 de outubro de 1628, os mercadores da cidade também tinham organizado “duas mangas de gente armada com cevadeiros de pedras e fundas” contra o desembargador Leitão de Meireles, ação que culminou com uma surriada e lançamento de imundices à porta deste e que incluiu a colocação de papéis “difamatórios” em vários locais da cidade (VERÍSSIMO, 1995, 262). Nos tumultos tinham estado envolvidos Francisco do Couto e Almeida, perdoado a 11 de outubro de 1640, e Manuel de Atouguia da Costa, que chegara a estar preso em Lisboa. A partir do final desse ano de 1640, a situação da ordem pública no Funchal piorou, não só em relação às questões da Fazenda, que motivaram a carta do provedor, mas também em relação a quase todos os poderes instituídos e, muito especialmente, aos “ministros do rei”. Após a aclamação de D. João IV, na organização dos festejos determinados pela Câmara, a 25 de janeiro de 1641, ocorreram uma série de tumultos graves. O edifício da Câmara foi invadido e foi eleita uma nova vereação; ocupou-se o edifício da Alfândega e foi demitido o provedor Manuel Vieira Cardoso, que teve de se refugiar no paço episcopal, sendo nomeando, por aclamação dita popular, um outro, João Rodrigues Teive. Registam-se, igualmente, tumultos contra o governador Luís de Miranda Henriques, acabando por ser nomeado, um ano depois dos acontecimentos, por provisão régia de 9 de fevereiro de 1642, o corregedor Gaspar Mouzinho de Barba, que se fez acompanhar pelo oficial Amaro Godinho Borges, apresentando-se ambos na Câmara do Funchal a 22 de março seguinte. Logo nesta apresentação, e perante o novo governador Nuno Pereira Freire, o juiz do povo Francisco Gomes solicitou que não se iniciasse a devassa antes de o governador cessante partir, para se poder apurar a verdade do que se passara. O corregedor Gaspar Mouzinho de Barba, no entanto, vinha também indigitado como provedor da Fazenda, com provisão datada de 6 de março de 1642, demitindo o provedor nomeado durante os tumultos de janeiro do ano anterior e iniciando uma série de averiguações que levaram a apurar diversas dívidas à Fazenda, especialmente, respeitantes ao comércio com o Brasil e de que conseguiu ainda recuperar algum dinheiro, em agosto. Deste mês em diante, continuaram a ser detetados outros atrasos nos pagamentos à Fazenda e, no final de dezembro, os vereadores Manuel Homem e Luís Manuel Leme da Câmara foram indiciados como tendo também dívidas e, inclusivamente, como tendo estado envolvidos nas nomeações populares para a Câmara e para a Fazenda realizadas em janeiro de 1641. Dada não apresentação de ambos ao corregedor e uma vez que tentaram refugiar-se na Câmara, aquele foi aos paços do concelho com o governador nos últimos dias de dezembro, interpondo-se Pedro Bettencourt de Atouguia, que, após curtas palavras, puxou da espada e atingiu o corregedor. Gaspar Mouzinho de Barba veio a falecer na sé do Funchal, ao lado da Câmara, para onde fora recolhido, registando o assento de óbito, de 29 de dezembro de 1642, ter sido aí “onde morreu e o ilustríssimo e reverendíssimo D. Jerónimo Fernando o mandou sepultar, e tudo se lhe fez grátis” (ARM, Registos Paroquiais, Sé, Óbitos, liv. 73, fl. 163). Em nota à margem, ainda se regista que “levantou-se o povo que andava desenfreado e lhe deram uma estocada. Não se confessou” (Id., Ibid.). Pedro de Bettencourt de Atouguia veio a ser preso no castelo do Pico, mas fugiu com a ajuda do pai, acolhendo-se no convento de S. Bernardino (Convento de S. Bernardino), em Câmara de Lobos, de que a família era padroeira, acabando por ali ficar como leigo e ao abrigo da justiça, passando depois ao oratório de S. Sebastião da Calheta, que ajudou a fundar, vindo a professar como frei José da Encarnação, falecendo no local. O bispo D. Jerónimo Fernando (c. 1590-1650), conhecido como O Bravo, que ocupara por três vezes o lugar de governador, perante o caso e, acrescente-se, dado ter já uma certa idade, retirou-se para Lisboa, em finais de 1643, vindo aí a falecer; a diocese haveria de ficar em “sé vacante” durante mais de 20 anos. O rei D. João IV, numa primeira fase, condescendeu com a situação e, a 26 de janeiro de 1644, em carta ao governador, transcrita pelas câmaras do Funchal e de Machico e enviada ao cabido, recomendava que “se evitassem os efeitos de inimizades e ódios, ordenando-se às justiças que não procedessem contra pessoa alguma por coisas que sucedessem no tempo da sua feliz aclamação” (ARM, Câmara Municipal do Funchal, Registo geral, tombo 6, fl. 53; Id., Câmara Municipal de Machico, tombo 2, fls. 92-94; ANTT, Cabido da Sé do Funchal, mç. 4, doc. 17). À data, porém, não teria ainda conhecimento do assassinato do corregedor e, seis meses depois, a 28 de julho de 1644, como era hábito, enviou o juiz desembargador da Relação do Porto, Jorge de Castro Osório, com indicações especiais e ordem para investigar a morte do juiz corregedor anterior. Jorge de Castro Osório recebeu, na Madeira, o apoio do escrivão da alçada Amaro Godinho Borges, que, por uns tempos, chegara a servir como provedor da Fazenda. Faleceriam ambos num curto espaço de tempo, em princípio, envenenados: “mortos com peçonha”, como refere a mercê régia de D. João IV para a viúva do oficial de justiça e da Fazenda, concedendo dois lugares de freira para as filhas (Inventário dos Livros..., 1909, 110 e 213). Na Ilha, no entanto, refere-se apenas que morreram, como indicam os registos de óbitos da sé, de 17 de janeiro de 1646 e de 5 de maio seguinte, lendo-se, no primeiro: “Morre o Dr. Jorge Osório que andava em correição” (ARM, Registos Paroquiais, Sé, Óbitos, liv. 73). O rei não tomou, de imediato, medidas especiais, limitando-se a mudar o governador. Escolheu um fidalgo com fortes ligações familiares à Ilha e com propriedade na mesma, Manuel de Sousa Mascarenhas, esperando assim sanar os ânimos, mas tal não veio a acontecer. O governador Manuel de Sousa Mascarenhas teve patente a 22 de fevereiro de 1645 e compareceu na Madeira a 11 de abril, com ordens para inquirir sobre a ação do governador anterior, tal como viria a acontecer consigo e com os governadores seguintes. Em 1647, foi despachado para a Ilha Gaspar Machado de Barros, servindo de provedor da Fazenda; em 1653, Dionísio Soares de Albergaria, juiz com alçada e superintendendo também sobre os assuntos da Fazenda; e, em 1662, João Cordeiro Leitão, igualmente com alçada e ordens secretas. A situação de sé vacante e o início da monarquia absoluta, com questões específicas em relação à Madeira, colocaram o novo governador, D. Francisco de Mascarenhas, numa situação insólita. Com efeito, foi preso por um conjunto de fidalgos locais, a 18 de setembro de 1668, e encarcerado na fortaleza do Pico, tendo os revoltosos eleito um governador e enviado o deposto para o continente, o que nunca tinha acontecido na Madeira (Sedição de 1668). Pouco tempo depois, em 29 de março de 1669, aportou no Funchal o desembargador com alçada João de Moura Coutinho, com regimento especial para tirar residência ao governador-geral deposto. Seguiu-se Manuel Dourado Soares, a 1 de fevereiro de 1677, com regimento especial para tirar residência ao novo governador-general; depois, a 15 de janeiro de 1683, o desembargador com alçada Domingos de Matos Cerveira, superintendendo principalmente sobre assuntos da Fazenda. Nos inícios do séc. XVIII, em 1703, terá havido uma sedição contra o governador João da Costa de Ataíde e Azevedo Coutinho, “no salão da Índia da fortaleza de S. Lourenço”, “e uma conspiração que intentaram fazer os soldados”, “tentando tirar a vida” ao governador e ao juiz de fora da Câmara (ARM, Câmara Municipal do Funchal, Registo geral, tombo 7, fl. 254v.ss.). No atentado ao governador, terá estado envolvido o velho capitão de artilharia António Nunes, que se ausentou do Funchal, imediatamente a seguir aos acontecimentos. Por causa da sedição, o doutor desembargador Diogo Salter de Machado deslocou-se ao Funchal com poderes excecionais. Assim, para proceder às averiguações, fez sair da cidade o governador, “em distância de dez léguas, para que não fosse, com a sua presença e poder, assistindo” às mesmas e interferindo nelas (Id., Ibid.). Nas ordens do desembargador, vinha expresso: “e na mesma embarcação em que fores tirar esta devassa, voltará o provedor da Fazenda Manuel Mexia, por não ser conveniente que fique na Ilha depois da vossa chegada, para se não dar tempo a negociações, e por ser o dito provedor da Fazenda em mais suspeições” (Id., Ibid.). As questões terão sido muito graves e terão envolvido também o prelado da diocese, D. José de Sousa Castelo Branco (1654-1740), pois ficou escrito no regimento do desembargador: “E a queixa contra o bispo deverá ser queimada, para dela não ficar nada, nem memória, e disso deverá ser dado conhecimento ao bispo, para o mesmo saber como o rei e as suas justiças tratam semelhantes casos” (Id., Ibid.), aspeto que passou ao lado dos autores do Elucidário Madeirense. As ordens para o desembargador e corregedor Salter de Machado foram passadas em janeiro de 1703, mas o mesmo só se apresentou na Ilha em junho. Entretanto, já tinha falecido, no Funchal, a 8 de março, o governador João da Costa Ataíde e já tinha tomado posse o novo governador, Duarte Sodré Pereira. Com o dito confronto, fora também designado um juiz-de-fora em Lisboa, em 1703, Francisco Torres Pinheiro, “que acabou de servir em Torres Vedras”, como se refere na nomeação e que tomou posse no Funchal, a 5 de maio de 1704, dado aquela comarca ser da repartição Estremadura e Ilhas (Id., Ibid.., fls. 252-252v.). A nomeação de um juiz-de-fora permanente para o Funchal obviou a necessidade de alçadas, embora, para Duarte Sodré Pereira, o principal problema residisse no Desembargo do Paço, sobre o que escreveu: “Deus me livre que ao Desembargo do Paço vão queixas, porque ou falsas ou verdadeiras, lá se não enjeitam” (ARM, Arquivos particulares, Copiador de cartas de Duarte Sodré Pereira). Com a crescente centralização do poder régio, a figura do juiz desembargador com alçada deixou de fazer muito sentido, vindo o gabinete pombalino a montar, progressivamente, as corregedorias e a suprimir as antigas ouvidorias (Ouvidorias), com a extinção das capitanias, entre outras. No entanto, a sua memória não se extinguiu no Desembargo do Paço, tal como alertou o governador Duarte Sodré Pereira, nos inícios do séc. XVIII. Assim, mais de 100 anos depois, dissolvidas as cortes e derrogada a constituição de 1822, sendo restabelecido o governo absoluto, em julho de 1823, a Madeira foi de novo alvo de uma alçada. Em causa estavam as questões das lojas maçónicas, dos partidos políticos emergentes e das ligações às ideias liberais, tudo indiciando que os madeirenses pretendiam subtrair-se à coroa portuguesa e ligar-se a Inglaterra. Num breve espaço de tempo, houve mais de uma centena de presos; embora só uma dezena deles viessem a ser condenados, os indiciados eram imensos, tendo muitos saído da Madeira. Deste modo, a Ilha foi decapitada de muitos dos seus principais quadros, entre morgados, funcionários públicos, cónegos e vigários, escritores e militares de todas as patentes, entre outros. Infelizmente, essa não foi a última alçada na Madeira, pois, com a tomada do poder pelo infante D. Miguel, em 1828, e conquistada a Ilha pelas forças absolutistas, uma nova alçada foi enviada. Os trabalhos dela ficaram a cargo do ministro sindicante Manuel Luciano Magalhães Abreu e Figueiredo. O processo existente na Câmara do Funchal mostra um conjunto verdadeiramente desonroso de 250 depoimentos, quase todos feitos por convocação do ministro sindicante, lendo-se neles acusações bastante vagas e com base nas quais chegaram a estar envolvidas e presas perto de 2000 indivíduos, acusados de “malhados” e maçons (ARM, Câmara Municipal do Funchal, Registo geral, tombo 6, fls. 305v.-327). Num curto espaço de tempo, a Ilha perdeu, novamente, parte dos seus principais quadros sociais e económicos, militares, administrativos e religiosos, não tendo muitos dos envolvidos regressado à Madeira, optando antes por ficar em Londres e depois no continente, havendo uma parte, de certa forma importante, que preferiu emigrar para o Brasil. A relação dos réus foi elaborada já em Lisboa, por ordem alfabética, e incluía 101 elementos, sendo o termo assinado a 18 de setembro de 1829. A ele juntou-se uma segunda relação, com data anterior, 19 de agosto, e com mais 216 elementos. As sentenças finais foram, assim, dadas em Lisboa, a 18 de setembro de 1829, sendo juízes João Manuel Guerreiro de Amorim, José Pereira Paula de Faria Garção e Romão Luís de Figueiredo e Sousa. Todavia, muitos mais madeirenses vieram a ser indiciados na mesma alçada ao longo daquele ano e do seguinte e a ser deportados para Cabo Verde, Angola e Moçambique.   Rui Carita (atualizado a 17.08.2016)

Direito e Política História Política e Institucional

aguiar, manuel caetano pimenta de

Poeta e dramaturgo. Foi representante da ilha da Madeira nas Cortes Constituintes de 1822 a 1823, tendo sido também deputado, pela Madeira, para a sessão legislativa de 1826 a 1828. Escreveu muitas tragédias de que se conhecem dez: Virgínia (1815); Os Dois Irmãos Inimigos (1816); D. João I (1817); Destruição de Jerusalém (1817); Conquista do Peru (1818); Eudoxa Licinia (1818); Morte de Sócrates (1819); Carácter dos Lusitanos (1820); Arria e D. Sebastião em África. Existe uma tradução francesa do livro Carácter dos Lusitanos publicado em Paris (1823), por Ferdinand Denis. Palavras-chave: poesia; dramaturgia; tragédia; política.   Poeta e dramaturgo, nasceu na ilha da Madeira, na freguesia da Sé, a 16 de maio de 1765 e faleceu, com 67 anos, em Lisboa, na R. Direita da freguesia de São Paulo, a 19 de fevereiro de 1832, vítima de um ataque apoplético. Foi sepultado na igreja paroquial de S. Paulo. Era filho de Bartolomeu Luís Pimenta de Aguiar, doutor em Direito pela Universidade de Coimbra, que foi para a Madeira exercer o lugar de curador geral dos órfãos e lá teve administração duma casa vinculada, e de Maria Felícia de Carvalho. Casou-se com Micaela Antónia de Sá Bettencourt, filha do Cap. Manuel José de Bettencourt e Andrade e de Ana Bárbara de Freitas Drumond Aragão. Teve sete filhos. Um deles, Luiz Pimenta de Aguiar, foi desterrado para Moçambique por ser liberal e lá morreu; outra filha, Isabel Bettencourt de Aguiar, casou-se com António João da Silva Bettencourt Favila. Pimenta de Aguiar habitou uma casa da antiga R. da Carreira, situada um pouco abaixo da travessa com o nome deste notável dramaturgo, poeta de pendor trágico, filósofo das novas ideias do século das Luzes e romântico soldado. Consta que nessa casa escreveu algumas das suas tragédias. Nascido numa família de exemplares virtudes que, formada à sombra da Igreja, gozava de prestígio conquistado desde António Gomes de Aguiar, experienciou uma infância de severo tradicionalismo; foi para Lisboa em 1778, onde deu entrada no Colégio Real de Nobres, fundado pelo marquês de Pombal. Não se sabe se concluiu ali os estudos, mas em 1785, desviado do seu destino de família que apontava para a Universidade de Coimbra, mudou-se para França, como emigrado em busca de glória, a fim de seguir um curso de artes e ciências; durante este período conheceu a literatura francesa, que influenciou toda a sua obra. Durante a Revolução que sairia de França para abalar o mundo, encontrava-se ao serviço do governo francês, tendo alcançado, alistando-se nos exércitos revolucionários, em concreto nas fileiras da cavalaria, o posto de capitão e, pelo seu heroísmo, recebido a Cruz da Legião de Honra. Terminada a luta civil contra o Rei, foi demitido do serviço militar. Até 1815, nada sabemos, de positivo, da sua vida, a não ser o nascimento de quatro filhos. Em 1816, publicou a sua primeira obra, Virgínia, dando à luz o seu último trabalho em 1820. Em tão curto período, trabalhou intensamente, criando 10 tragédias, todas elas obras extensas, seguindo os trâmites clássicos e cultivando o verso. Depois de 1820, com a revolução do Porto – tendo frequentado, na companhia de Borges Carneiro, a casa de Francisco Freire de Melo, deputado da Mesa da Santa Inquisição e amigo de filósofos –, abandonou a atividade literária, desconhecendo-se os motivos que o conduziram a tal decisão. Em 1821 encontrava-se na Madeira; de 1822 a 1823, foi representante da ilha da Madeira nas Cortes Constituintes, tendo sido também deputado pela Madeira para a sessão legislativa de 1826 a 1828. Antes de seguir para Lisboa, apela aos seus concidadãos, no jornal Patriota Funchalense, para que lhe comuniquem os seus anseios para a Madeira. E é com este espírito que vai ocupar a sua cadeira nas Cortes. Cultivou a natureza e a razão, iluminado pelas esperanças de liberdade, entregando-se principalmente ao estudo e ao desenvolvimento das suas predileções literárias. Apresentou vários projetos, entre os quais um que permitia a livre exportação do Vinho da Madeira. No dia 28 de Janeiro de 1822, solenizou-se o aniversário da proclamação da Constituição na Ilha da Madeira. O estabelecimento, em 1828, do governo absoluto obrigou-o a fugir para escapar às perseguições dos emissários miguelistas, que não poderiam poupar quem fora partidário entusiasta da Constituição de 1820 e da Carta Constitucional de 1826. Durante a guerra civil de 1828-34, sofreu as perseguições dos seus inimigos. Intuindo que não havia um verdadeiro teatro em Portugal e inspirando-se nos trágicos franceses, desenvolveu o gosto por este género de literatura. As suas tragédias foram bem recebidas pela crítica. Conhecem-se 10: Virgínia (Lisboa); Os Dois Irmãos Inimigos; D. João I; Destruição de Jerusalém; Conquista do Peru; Eudoxa Licinia (estas 5 publicadas em Lisboa, pela Impressão Régia); Morte de Sócrates; Carácter dos Lusitanos (estas 2 publicadas em Lisboa); Arria e D. Sebastião em África, obras de que se desconhecem capas ou folhas de rosto e sem local ou data de publicação. Existe uma tradução francesa de O Carácter dos Lusitanos, publicada em Paris, em 1823, por Ferdinand Denis. Publicou ainda poemas no Defensor da Liberdade, um semanário do Funchal. Alguns conhecedores da sua obra consideram-no precursor de Almeida Garrett, nomeadamente no que diz respeito à criação do teatro trágico nacional, evidenciando, assim, a importância de Pimenta de Aguiar na história da literatura portuguesa. Muito reconhecido no seu tempo, as suas tragédias, contextualizadas pelos defeitos próprios da época, evidenciavam, sem dúvida, a sua originalidade, um estilo distinto e uma elegância admirável, características pouco comuns naquele período, pelo que o autor era frequentemente aclamado com entusiasmo pelo público. Nascido numa época privilegiada da intelectualidade portuguesa, foi um estilista inteligente e original. No seu Résumé de L'Histoire Littéraire du Portugal, Ferdinand Denis refere-se-lhe de modo bastante lisonjeiro. Ilustre madeirense e distinto escritor, que seguiu a causa de D. Pedro IV, patriota zeloso e intransigente na defesa da independência nacional, M. C. Pimenta de Aguiar não ficou conhecido entre os madeirenses. Contudo, e apesar de ter residido fora da Madeira a maior parte da sua vida, a Câmara Municipal do Funchal decidiu atribuir o seu nome a uma travessa da cidade. Obras de Manuel Caetano Pimenta de Aguiar: Virgínia (1815); Os Dois Irmãos Inimigos (1816); D. João I (1817); Destruição de Jerusalém (1817); Conquista do Peru (1818); Eudoxa Licinia (1818); Morte de Sócrates (1819); Carácter dos Lusitanos (1820); Arria (s.d.); D. Sebastião em África (s.d.).   António José Borges (atualizado a 01.08.2016)

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