Mais Recentes

nunes, manuel

Manuel Nunes nasceu na ilha da Madeira, na freguesia do Paul do Mar, em 1848 e morreu, com 51 anos, na freguesia de São Gonçalo, a 28 de dezembro de 1899, quando ali exercia funções eclesiásticas como pároco, depois de ter sido ordenado presbítero por D. Patrício Xavier de Moura, a 25 de maio de 1872. Era filho de Tomás Nunes, do Jardim do Mar, e de Maria Joaquina, natural do Paul. Foi batizado a 22 de dezembro de 1848 pelo P.e Francisco Plácido da Silva, vigário do Paul. Em 1 de março de 1873, tornou-se pároco convidado do Jardim do Mar; em 1 de dezembro de 1875, cura de Santa Luzia; mais tarde, em 11 de novembro de 1878, pároco convidado da mesma freguesia; em 4 de julho de 1887, cura de São Martinho; e a 7 de março de 1893, tomou posse da igreja de S. Gonçalo, onde teve instituição canónica e acabou por produzir a maior parte das suas composições. Sacerdote, reconhecido pelas suas orações sagradas, famosas pela elegância da forma e correção da linguagem, músico que deixou várias produções apreciadas no seu tempo, baixo barítono muito considerado na música sacra – a música comum a toda a ilha da Madeira, dizia em 1869 o bem conhecido escritor russo Platão de Vakcel, reduz-se a dois ou três géneros de trovas, acompanhadas de violas, rajões e machetes, dos quais se tiram sempre as mesmas modulações, ora em acordes simples, ora em dobrados –, na verdade, um digno literato, conquanto somente depois da sua morte tenham sido reconhecidos os seus méritos nos meios intelectuais. Colaborou em vários jornais locais, mas especialmente no Diário de Notícias. Há versos seus no livro Paróquia de Santo António, de Fernando Augusto da Silva. Cultivou com brilho as letras, sendo a poesia satírica o género literário de que mais cuidou. Luís Marino, na obra Musa Insular, tem o mérito de ter colhido e fixado alguns poemas que permitem ao leitor aferir da qualidade poética de Manuel Nunes, sendo eles o “Hino da Sociedade Artístico Musical”, que comporta como epígrafe “que se organizou nesta cidade, para compor a orquestra do novo teatro D. MARIA PIA”, o “Hino” do 7.º centenário do nascimento de S.to António e a composição inédita “Repique do Baptisado”.   António José Borges (atualizado a 03.03.2018)

Religiões

nunes, diocleciano francisco de assis

Professor e poeta, nasceu na freguesia de Santa Maria Maior, Funchal, a 4 de outubro de 1928, desconhecendo-se o local e a data do seu falecimento. Era filho do Enf.º José Francisco Nunes e de Beatriz Adelaide Freitas Nunes. Estudou, a partir de 1940, no Liceu Jaime Moniz, no Funchal, formando-se como professor primário e diretor de colégio. Foi professor do ensino oficial e do particular, nomeadamente no curso de férias da Escola de Enfermagem de São José de Cluny. Lecionou também em Luanda, Angola, onde pertenceu ao quadro docente oficial. No âmbito da educação, fundou ainda, na Radiodifusão do Funchal, o programa “Meia-Hora dos Estudantes”, nele proferindo várias palestras. Para além do ensino, também se dedicou à escrita, principalmente à poesia. As suas primeiras publicações, crónicas e poemas tiveram lugar na revista Presente, na qual foi ainda responsável pela secção “Cartas para Longe”. Colaborou depois no Jornal da Madeira, na Página dos Estudantes, de que foi cofundador, n’A Madeira Nova, no Almanaque Madeirense, na revista Pérola do Atlântico, do Porto, e também em vários jornais da colónia madeirense em New Bedford e em Fall River, nos EUA. Por fim, colaborou no Intransigente, de Benguela, n’O Comércio de Angola e na revista Ensino, igualmente de Angola. Assinava os seus textos como Assis Nunes, usando, por vezes, o pseudónimo Guido de Monte Cristo. É autor do estudo A Criança – Sua Revelação perante a Sociedade e a Escola, editado como folheto pela Página dos Estudantes. Segundo Luís Marino, em Musa Insular, terá deixado inédita uma vasta bibliografia: Primeiros Versos, Combate, Temas Incompletos, Pecados, África, Quando o Vento Uivar dos Montes, Ao Céu Subiu Uma Estrela, Inveja e O Deputado. Na referida obra de Marino, pode ser apreciado o seu longo poema encomiástico “Tributo à Ilha”, cuja classificação oscila entre a ode, a elegia e a canção. Obras de Diocleciano Francisco de Assis Nunes: A Criança – Sua Revelação perante a Sociedade e a Escola.   António José Borges (atualizado a 03.03.2018) artigos relacionados: poetas liceu / escola secindária jaime moniz arte na educação formação de professores

História da Educação Literatura

nunes, cesário joão

Jornalista, poeta e escritor, nasceu na freguesia de São Gonçalo, no Ribeiro Seco, a 6 de maio de 1905, desconhecendo-se a data e o local do seu falecimento. Era filho de Manuel Francisco Nunes e de Virgínia Cândida Gomes Nunes. Casou-se com Maria Elisa Nunes, filha de José Fernandes de Gouveia e de Olívia da Natividade Fernandes de Gouveia, com quem teve uma filha, Irene Maria José Nunes da Costa. Era debuxador de bordados da Madeira de profissão, sendo os seus trabalhos considerados ainda hoje autênticas obras de arte. No entanto, assumiu-se como um homem multifacetado, dedicando-se igualmente à escrita jornalística e literária, quer em prosa, quer em poema. Assinava os seus textos literários não só com o seu nome, Cesário Nunes, mas com vários pseudónimos, como Ene, João Verdades e Falco. Sob o pseudónimo João Verdades, foi premiado nos jogos florais da Madeira organizados pelo Ateneu Comercial do Funchal em 1946, ganhando o 2.º lugar pelo conto “A Aguardente” e uma menção honrosa pelo conto infantil “O Aparo de Ouro”. No âmbito da sua atividade jornalística, foi correspondente do Comércio do Porto, periódico no qual desempenhou também a função de redator; na Madeira, foi delegado regional do jornal A Cidade, de Lisboa, e colaborou nas publicações periódicas Diário de Notícias, Eco do Funchal, Madeira Nova, Voz da Madeira e Diário da Madeira, entre outras. Nesta última, desempenhou a função de redator-principal a partir de maio de 1961 e manteve, entre outras, as secções “Gis na Parede” – com início a 27 de maio de 1972 e com grande sucesso junto do público, graças a um humor e a uma ironia refinados –, tal como “Ventos Ilhéus” e “Ardósia do Mundo”, ambas iniciadas a 19 de fevereiro de 1966. Enquanto jornalista, esteve envolvido em vários casos importantes da época, nomeadamente na chamada “questão Hinton”, ligada ao monopólio do fabrico de açúcar e álcool, que deu origem a um dos principais debates que animou a política e a opinião pública antes e durante a Primeira República. Na sua obra Política Sacarina (1940), um estudo sobre a economia insular, Cesário Nunes documentou referida situação, asseverando: “Em Portugal nenhuma questão económica atingiu tão alta preponderância e trouxe então grandes embaraços legislativos às entidades governativas como o problema sacarino da Madeira” (VIEIRA, 2004, 173). O facto de os textos que escreveu neste contexto serem citados em vários processos mostra bem a importância da sua opinião. Esteve também envolvido nos principais casos políticos do seu tempo, nomeadamente na Revolta da Madeira, sendo, nessa medida, seu um dos depoimentos que integram o livro A Revolta da Madeira – 1931 (1994). Em 1975, Cesário Nunes foi detido na sequência de uma carta que escreveu para o Diário da Madeira. No Jornal da Madeira do dia 16 de maio de 1975, pode ler-se um comunicado do quartel-general do Comando Territorial Independente da Madeira, com data de 15 de maio de 1975, que dá conta de que, a 10 de maio de 1975, haviam sido publicados no Diário da Madeira três artigos, bem como uma carta inserta na secção “Correio da Madeira”, que denotavam tendências contrárias à unidade nacional, motivo pelo qual haviam sido detidos os seus autores: Cesário Nunes, autor da carta, António de Castro Jorge, M. Macedo de Faria e Manuel Rodrigues. Para além da já referida obra Política Sacarina, estudo dedicado a António de Oliveira Salazar que consiste no primeiro número dos Cadernos Madeirenses, César Nunes é também autor do opúsculo História das Tábuas da Calheta. Um Novo Machim, publicado no Catálogo Coletivo de Bibliotecas da Madeira. Consta que terá destruído inéditos seus, num momento de revolta para com as injustiças e ingratidões de que foi alvo. Nestes, incluir-se-ia um livro de contos com o título Galeria, que teria prefácio do escritor Ferreira de Castro. Desconhece-se se uma obra em dois volumes intitulada Encruzilhada, que tinha em preparação, chegou efetivamente a ser publicada. Na obra Musa Insular, de Luís Marino, constam dois poemas que permitem aferir a sua qualidade poética. São eles “Conselhos”, poema de estrofe única dedicado à sua filha, e o soneto – modelo poético praticado abundantemente entre os poetas madeirenses – “Lágrimas”. Obras de Cesário João Nunes: “Conselhos”; “Lágrimas”; Política Sacarina (1940); História das Tábuas da Calheta. Um Novo Machim (1944). António José Borges (atualizado a 03.03.2018)   artigos relacionados: jorge, antónio vitorino castro república periódicos literários (sécs. XIX e XX) poetas  

Literatura

nóbrega, januário justiniano de

Escritor, poeta e jornalista. Consta que deixou vasta produção poética de elevado valor. A sua obra póstuma Visita de Sua Majestade a Imperatriz do Brazil, viúva, Duquesa de Bragança, à Ilha da Madeira, e Fundação do Hospício da Sereníssima Princesa D. Maria Amélia foi editada em 1867, na Madeira. Palavras-chave: Escritor; Poeta; Jornalista. Nasceu no Funchal a 25 de fevereiro de 1826 e faleceu a 28 de julho de 1866. Foi escriturário da administração do concelho do Funchal desde 30 de junho de 1837 e tornou-se 3.º escrivão da mesma administração a 8 de janeiro de 1857. Apesar de apenas possuir pouco mais do que a instrução primária, revelou-se um dos melhores jornalistas do seu tempo e tinha especial aptidão para a escrita literária, tornando-se reconhecido também como poeta. Persistem dúvidas sobre as reais circunstâncias que envolveram a sua morte: terá perecido como vítima de queda de uma rocha à beira-mar, ou, na verdade, terá existido suicídio derivado de uma suposta alienação mental, numa altura em que tinha preparado uma coletânea de poemas para publicar. Consta que deixou vasta produção poética de elevado valor, cuja localização se desconhece. Escreveu alguns artigos políticos, bastante reconhecidos pela sua qualidade e rigor, tendo colaborado nomeadamente nos periódicos O Funchalense, A Folha, Campo Neutro, Flor do Oceano, Estudo, e no Semanário Oficial, que dirigiu. Há registo de colaboração sua nas obras Flores da Madeira e Álbum Madeirense. O mais importante e copioso repositório de informações, elementos e notícias que interessam à história do arquipélago da Madeira encontra-se no arquivo da Câmara Municipal do Funchal, que contém muitos e valiosos documentos, sobretudo dos sécs. XV, XVI e XVII. Alguns deles foram publicados por Álvaro Rodrigues de Azevedo nas suas anotações às Saudades da Terra, de Gaspar Frutuoso. Entre os escritos que se extraviaram, está um que, tendo sido entregue ao governador José Silvestre Ribeiro, vem mencionado num artigo intitulado “Ilha da Madeira e seu Arquipélago”, do Dicionário Universal Português, nos seguintes termos: “Semelhantemente aconteceu com o manuscrito de uma obra histórico-estatística da Ilha da Madeira do malogrado e talentoso escritor madeirense Januário Justiniano de Nóbrega, a este pago pelo cofre da Câmara do Funchal, e portanto a esta pertencente […]” (ALBUQUERQUE, 1982). Consta que certas partes deste manuscrito ficaram na posse de Rodrigues de Azevedo. A sua obra póstuma, Visita de Sua Majestade a Imperatriz do Brazil, Viuva, Duquesa de Bragança, á Ilha da Madeira, e Fundação do Hospicio da Serenissima Princesa D. Maria Amelia, que se encontra no Arquivo Municipal do Funchal e na Biblioteca Municipal do Funchal, foi editada por Júlio da Silva Carvalho, na Typografia da Flor do Oceano. Silva Carvalho assinou o prefácio. Na Biblioteca Municipal do Funchal encontram-se, de Justiniano de Nóbrega, a Reimpressão das Rimas de Francisco Álvares de Nóbrega, sem editor, publicada no Funchal, segundo consta por volta de 1850, sem capa nem folha de rosto; e, em coautoria, Flores Agrestes. Poesias de João F. d´Oliveira e Januario J. de Nobrega, com edição no Funchal, pela Typografia Funchalense, em 1860. A segunda parte desta obra nunca foi publicada, porque Januário de Nóbrega, num acesso de loucura, destruiu as poesias e outros escritos que possuía, especialmente as peças inéditas. Luís Marino transcreveu, na sua obra Musa Insular, o longo e esteticamente cuidado poema “Apelido de Zargo”, composto por 15 estrofes de sextilhas, e que se serve, a abrir, de uma epígrafe de Cordeiro retirada da História Insulana, de tendência moralista: “Crescerá mais a fidalguia que começa em obras próprias, para os seus descendentes, do que a que só se jacta da dos descendentes, já alheia” (MARINO, 1959). Obras de Januário Justiniano de Nóbrega: Reimpressão das Rimas de Francisco Álvares de Nóbrega (1850?); Flores Agrestes. Poesias de João F. d´Oliveira e Januario J. de Nobrega (1860); Visita de Sua Majestade a Imperatriz do Brazil, Viuva, Duquesa de Bragança, á Ilha da Madeira, e Fundação do Hospicio da Serenissima Princesa D. Maria Amelia (1867); “Apelido de Zargo” (s.d.).   António José Borges (atualizado a 03.03.2018)   artigos relacionados: frutuoso, gaspar azevedo, álvaro rodrigues de poetas nunes, cesário joão

Literatura

nascimento, joão do

A 21 de setembro de 1684, nasceu dentro do castelo de Lisboa João Marques de Afonseca, que viria a ser o 16.º bispo do Funchal, com o nome de D. Fr. João do Nascimento. Foram seus pais Inácio de Mira Solteiro, capitão de cavalos do terço do duque de Cadaval, e D. Garcia Ferreira de Afonseca, membros de uma pequena nobreza rural e morgados da Torre da Giesteira, Montemor-o-Novo. Sendo os progenitores gente piedosa, o jovem João cresceu e foi educado na observância de estritos princípios religiosos e habituado à frequência da comunhão e confissão, bem como à prática da oração mental, cumprindo, desde o nascimento, um programa que em muito se aproximava do da corrente jacobeia, na qual militou depois de adulto. Terminados os seus estudos em Humanidades na corte, transferiu-se para Coimbra, em cuja Universidade concluiu, com louvor, o doutoramento em Cânones. O seu desempenho enquanto aluno fê-lo sobressair de entre os companheiros, pelo que, dentro de pouco tempo, já se encontrava a lecionar na Universidade, tendo-lhe posteriormente sido oferecido o lugar de mestre-escola na Sé de Évora. Apesar das boas perspetivas de carreira eclesiástica que tão cedo se lhe depararam, João Marques de Afonseca, seu nome no século, sentiu o apelo da vida monástica e, renunciando aos cargos que se encontravam à sua disposição, decidiu ingressar no Convento franciscano do Varatojo, onde se fez noviço, em 1713, e frade, em maio de 1714, passando a chamar-se Fr. João do Nascimento. No convento, continuou a dar provas de um talento especial no púlpito e no confessionário e, por isso, em breve se transformou em confessor e missionário. Durante anos, percorreu o interior do país, lutando por uma reforma de costumes e pelo estabelecimento da prática da oração mental em público, isto é, trilhando o caminho proposto pelos ideais da jacobeia. Quando Fr. Gaspar da Encarnação, figura emérita da jacobeia e futuro conselheiro de D. João V em matéria de provimentos episcopais, abandonou o lugar de guardião do Varatojo para, por ordem régia, ir para Coimbra reformar um convento agostinho, passou Fr. João do Nascimento à qualidade de presidente do Seminário varatojano, e o modo como se desincumbiu da função levou a que ascendesse ao lugar de guardião do Convento em 1734. Nessa situação se encontrava quando, em 1740, D. João V se lembrou dele para a mitra do Funchal, então vaga por promoção de D. Fr. Manuel Coutinho para Lamego. Informado da decisão real, procurou Fr. João do Nascimento livrar-se daquele peso, rogando ao monarca que o aliviasse de “uma Dignidade para a qual não tinha ombros” (SANTÍSSIMA, 1804, 247). Não tendo a escusa sido aceite, viu-se o frade nomeado bispo do Funchal a 5 de janeiro de 1741, vindo a ser confirmado a 5 de março, na Patriarcal de Lisboa, na presença, entre outros, do Cardeal e do também jacobeu e bispo de Angra, D. Fr. Valério do Sacramento. Chegado à Madeira a 4 de setembro, recolheu-se provisoriamente ao Convento dos seus confrades no Funchal, de onde saiu para, a 17 do mesmo mês, solenemente assumir na Sé a condução dos destinos da Diocese. Depois de instalado no paço episcopal, pôde D. Fr. João do Nascimento começar a pôr em prática as ideias que trazia para governo do bispado, as quais se começaram a descortinar a partir da sua primeira pastoral, publicada a 5 de janeiro de 1741. Nesse documento, tornam-se visíveis aquelas que eram as preocupações do novo prelado e que respeitavam, em primeiro lugar, ao exemplo que se esperava provir dos eclesiásticos, nomeadamente no tocante à responsabilidade que lhes estava cometida do ensino da doutrina, ainda que partilhada com os pais de família e os mestres de estudantes, como o bispo também referia. Em paralelo com a doutrinação religiosa, chamava-se, ainda, a atenção para a transmissão da importância dos bons costumes, do respeito aos superiores e da devoção a Nosso Senhor e mais santos, reforçando, assim, a mensagem do devocionário tridentino. Como para o cabal cumprimento deste desígnio eram precisos clérigos instruídos e capazes, o prelado apelava, depois, ao estudo da teologia moral, condição necessária à continuação do exercício da função de confessor cometida aos párocos e curas de almas, dando a todos um prazo para se apresentarem a exame. Para os clérigos de ordens menores e outros estudantes que esperassem promoção a ordens maiores, era exigida a frequência da lição de moral no Colégio da Companhia de Jesus. Outro assunto que avultava desta primeira pastoral tinha a ver com a obrigação de residência, impondo-se as devidas penalizações a todo aquele que a não respeitasse. Logo de seguida, eram abordadas as questões da intervenção dos párocos na correção dos pecados públicos, na satisfação das obrigações testamentárias, assunto que muito preocupou o bispo durante todo o episcopado, e no cumprimento das determinações relativas ao modo de trajar dos eclesiásticos. A 6 de Maio de 1742, D. Fr. João do Nascimento fazia publicar a sua segunda pastoral, desta vez mais destinada a chamar a atenção para a necessidade de ouvir missa nos dias de preceito, a lembrar a obrigação de os clérigos participarem nas procissões e os cuidados espirituais a prodigalizar aos doentes. Numa terceira pastoral, de 1743, o prelado voltava a insistir em pormenores do vestuário eclesiástico, sublinhando a proibição do uso de anéis e outros atributos de luxo a todos os que não os pudessem exibir como marca de estatuto, num apontamento consistente com o ideário jacobeu que repudiava o luxo, a ostentação e a vaidade. Em 1744, os cuidados pastorais de D. Fr. João do Nascimento voltaram-se, claramente, para o cabal cumprimento dos legados pios, uma das vertentes da sua ação em que melhor se demonstrou que, apesar de procurar agir com brandura em todas as circunstâncias em que tal fosse possível, o bispo poderia ser duro, se fosse caso disso. O problema do incumprimento dos encargos pios na Madeira vinha de longe, e já tinha custado ao bispo anterior, D. Fr. Manuel Coutinho, bastantes dissabores, estando, no entanto, muito longe de se achar resolvido. O problema radicava sempre nos testamenteiros que, ou por falta de meios, ou por negligência pura e simples, não acudiam às almas do purgatório com os devidos ofícios divinos. A responsabilidade de assegurar que essa obrigação era satisfeita cabia, em meses alternados, à Igreja e ao juiz do resíduo secular, o qual, era, porém, particularmente remisso neste particular. Com esta pastoral, dava D. Fr. João do Nascimento sinal de que este assunto lhe era caro e de que estaria vigilante em relação ao cumprimento do estipulado. O juiz dos resíduos, porém, parece não ter levado em linha de conta as advertências episcopais e a situação manteve-se inalterada até 1747, altura em o bispo decidiu ordenar aos seus visitadores que averiguassem o que se passava também nos meses em que, de acordo com a regra da alternativa, o cumprimento competia ao juiz dos resíduos. Este, ofendido, instou junto do prelado para que suspendesse a medida, comprometendo-se a tratar da questão. Como tal não se chegasse a verificar, o bispo acabou por assumir a responsabilidade integral da satisfação dos encargos, atitude que lhe valeu a apresentação de uma queixa contra si nos tribunais da Coroa, cuja resolução, tendo-lhe sido favorável, não impediu a continuidade de uma relação conflituosa com as entidades envolvidas no processo. Em 1746, D. Fr. João do Nascimento publicou nova pastoral, desta vez dedicada ao problema do sigilismo. O sigilismo foi uma questão que surgiu como decorrência da atuação de alguns bispos jacobeus que, por perseguirem e condenarem desmandos, foram acusados de pressionar os clérigos para obterem dados sobre os cúmplices dos confitentes. Desta situação foi apresentada queixa ao patriarca de Lisboa, D. Tomás de Almeida, e ao inquisidor geral, D. Nuno da Cunha, os quais, por sua vez, a fizeram chegar ao Papa, Bento XIV. O pontífice reagiu à denúncia com um breve em que liminarmente proibia tal prática e foi na sequência desta proibição que D. Fr. João promulgou a sua pastoral, na qual, apesar de declarar não ter conhecimento de que na Diocese se praticassem tais infrações, não deixava de exortar os seus confessores a que nunca caíssem no erro apontado, sob pena de afastarem os fiéis da frequência do sacramento da confissão. Em 1753, o bispo mostrava-se preocupado com o devido cumprimento do ritual a ser observado pelo corpo de eclesiásticos ao serviço da Sé, pelo que publicou uma última pastoral que continha o novo regimento a observar na Catedral, onde se encontravam bem evidenciados os cuidados postos na observação dos comportamentos e no respeito pela hierarquia e pela formalidade, honrando assim um outro princípio da jacobeia, que era o de dar “às práticas da vida espiritual notável dose de exterioridade”, com vista a fazer “contagiosa a virtude” (SILVA, 1963, 266). No que diz respeito às visitações, D. Fr. João do Nascimento também as executou, pessoalmente ou por delegação, revelando, quer o louvor que lhe mereciam os párocos comprometidos com obras e cuidados com as suas igrejas, como aconteceu em São Jorge, quer a atenção que dedicava à prática do ensino da doutrina, à satisfação dos encargos pios, à criteriosa contabilidade das confrarias, ao adequado comportamento dos fiéis, ou ainda, e mais uma vez, às formalidades a observar nas procissões e nos ofícios religiosos, como aconteceu em São Pedro, em 1743. Nunca esquecendo a sua anterior prática missionária e conhecedor dos frutos que as missões de interior poderiam prodigalizar aos fiéis, levou consigo do reino, quando da sua ida para o Funchal, dois pregadores franciscanos, Fr. Lourenço de Santa Maria, futuro arcebispo de Goa e Fr. João do Sacramento, que, durante 20 meses, percorreram todo o arquipélago, tendo operado, com o seu labor, “conversões inumeráveis” (SANTÍSSIMA, 1804, 248). Regressados os dois pregadores ao Varatojo, em 1743, o bispo manteve o interesse na prossecução de um trabalho deste teor, continuando a promover a deslocação de missionários para as paróquias tanto da Madeira como do Porto Santo, embora agora tivesse de se socorrer dos meios que o Convento local de S. Francisco podia disponibilizar. Em relação aos dois conventos sobre os quais exercia tutela direta, a saber, o Convento de N.ª Sr.ª da Encarnação e o de N.ª Sr.ª das Mercês, mostrou-se o bispo empenhado na observação criteriosa das normas da vida conventual, visitando-os com regularidade e zelando para que fossem garantidos os rendimentos necessários à subsistência das freiras. No tocante ao Convento de N.ª Sr.ª da Encarnação, e talvez para dissipar a crispação que se estabelecera entre esta casa monástica e o seu antecessor, D. Fr. Manuel Coutinho mandou D. Fr. João que se instituísse uma capelania perpétua, a qual dotou com a quantia de três contos de reis anuais, a fim de que nela se rezasse missa diária por sua alma e a de seus familiares, tendo até estipulado que o sacerdote encarregado dessa celebração não poderia ser o capelão e confessor do Convento, o que daria às religiosas o privilégio do contacto com uma forma renovada de ouvir a palavra divina. Na gestão do corpo eclesiástico da sua Diocese, os cuidados de D. Fr. João do Nascimento dirigiram-se, por um lado, ao melhoramento das condições materiais para o exercício das funções, tendo conseguido a anuência real para o aumento dos ordenados do provisor e vigário geral, para o reforço das côngruas dos beneficiados de algumas das colegiadas, e para o sustento dos colegiais do seminário, instituição que protegeu e dotou de novo regimento. Apesar desta preocupação com o bem-estar do seu clero, o bispo não deixou de intervir com rigor quando o procedimento de alguns dos seus subordinados não se revelava correto. Foi o que aconteceu quando, estando o prelado já doente, em 1753, se registou um diferendo entre o cabido e o provedor da Fazenda a propósito de um embargo por este movido contra uma nomeação capitular. A queixa que o provedor apresentou a Lisboa foi prontamente atendida e, na sequência de uma recomendação régia para que o prelado mandasse averiguar responsabilidades, D. Fr. João do Nascimento não hesitou em mandar prender um cónego e o prioste na torre da Sé e um padre no Aljube. Por outro lado, esforçou-se por fazer os provimentos dos benefícios nos sujeitos mais capazes, não tendo tido, neste processo, os problemas que afetaram o episcopado do seu antecessor. Sensível à escassez de recursos humanos de que enfermavam algumas paróquias, o bispo também lutou pela criação de cinco novos curatos, apesar de alguns não terem chegado a ser ocupados em tempo da sua vida. Durante os 13 anos que durou o seu episcopado, foi D. Fr. João do Nascimento ainda convocado para desempenhar as funções de governador militar do arquipélago, cargo que ocupou, durante 4 anos, a partir de 1747. Enquanto responsável militar, foi solicitado a resolver a questão do envio de 200 soldados para acudir a Angola, a facilitar a ida para o Brasil de um conjunto de casais madeirenses, em resposta a um pedido do reino, e a gerir as prepotências perpetradas por alguns juízes ordinários que, nas relações com as partes que tinham de arbitrar, trocavam a justiça pela opressão. Em tais casos, não lhe tremeu a mão e mandou, inclusivamente, prender os prevaricadores, encarcerando-os em “Cadeias e Torres conforme a qualidade das pessoas” (SILVA, 1964, 254). Em 1748, durante o seu exercício do cargo de governador, foi o território da Madeira abalado por um tremor de terra que destruiu parte da cidade e não só, tendo-o obrigado à pronta adoção de um conjunto de medidas. Entre estas, contam-se a reconstrução do paço episcopal, tão severamente danificado que o prelado procurou reedificá-lo, desta vez nas imediações da Sé. As dificuldades na aquisição de um terreno para o efeito decidiram-no, porém, a recuperar o edifício primitivo, aí levantando a construção que sobreviveu. A destruição provocada pelo terramoto atingiu, igualmente, a igreja de N.ª Sr.ª do Monte, com cuja recuperação também o prelado se comprometeu, designadamente através da criação da Confraria dos Escravos de Nossa Senhora do Monte, estabelecida em todas as paróquias, a partir das quais se recolheram esmolas que muito ajudaram à recuperação do edifício. No lugar do Estreito de Câmara de Lobos também se fizeram sentir os efeitos do sismo e a igreja paroquial, que já se encontrava em processo de reconstrução, teve igualmente de ser intervencionada, embora a documentação existente remeta o protagonismo da campanha de obras mais para o pároco, Manuel Borges Alemanha, do que para a figura do prelado. A responsabilidade episcopal está, contudo, mais evidenciada na reparação de algumas fortalezas, bem como na edificação, de raiz, de um novo reduto militar – a Fortaleza de S. Francisco, em Santa Cruz. O desempenho de D. Fr. João do Nascimento como governador militar, tanto nas atitudes já referidas, como nas que assumiu em termos dos critérios utilizados para prover lugares de chefia militar, ou até, de subalternos, e que, à semelhança do que fizera em relação aos benefícios eclesiásticos, se pautaram pelo mérito, levou a que o exercício do cargo se prolongasse até agosto de 1751, altura em que foi substituído por D. Álvaro Xavier Botelho de Távora. Em dezembro desse mesmo ano, adoeceu gravemente com uma paralisia que lhe deixou comprometido o lado esquerdo do corpo, ainda que intacto o entendimento. Por conselho médico, procurou obter licença para se ausentar para o reino, na demanda de alívio para o mal que o afligia, mas a progressiva deterioração do seu estado de saúde, agravada por repetições dos ataques, acabou por inviabilizar a deslocação e por conduzir à sua morte, ocorrida a 5 de novembro de 1753. Depois de um episcopado pautado por um espírito rigoroso, mas não autoritário, por uma vida pessoal austera e regrada, por uma preocupação com os pobres, pelos quais fazia, frequentemente, distribuir esmolas, e por uma capaz chefia militar do arquipélago, foi D. Fr. João do Nascimento a sepultar na capela-mor da Catedral do Funchal, no findar do ano de 1753.   Ana Cristina Machado Trindade (atualizado a 03.03.2018)

Religiões

nunes, eduardo fernandes

Eduardo Fernandes Nunes nasceu na freguesia de São Roque, Funchal, a 14 de setembro de 1910. Filho de António Fernandes Nunes e de Maria Matilde Fernandes Nunes, frequentou a Escola Industrial e Comercial de António Augusto de Aguiar e, mais tarde, o liceu do Funchal. Desce cedo, revelou uma grande vocação para a escrita, o que o tornou mais tarde um reconhecido jornalista, não só na Madeira, como também no território continental português e até no Brasil. Iniciou a carreira em 1937, no Diário da Madeira, com o qual colaborou até à suspensão deste matutino. Enquanto jornalista deste diário publicou várias novelas e livros inéditos, como o romance Porto Santo – Da Terra e do Mar, Do Amor e da Madeira e Embriagues, Crónicas Dialogadas. Foi correspondente no Funchal de vários jornais nacionais como O Século e o Primeiro de Janeiro, da agência internacional “The Associated Press”, em Nova Iorque, e ainda das revistas Flama e Cinematógrafo. Eduardo Nunes, como assinava, enquanto escritor/novelista, publicou contos e crónicas, mas foi na reportagem que se destacou com A Virgem de Fátima na Madeira, uma obra a que chamou “a reportagem das reportagens” e que lhe valeu a bênção apostólica do Papa Pio XII, em carta que lhe foi dirigida pelo cardeal G. B. Montini, secretário de Estado do Vaticano (NUNES, 1952, 2). A Virgem de Fátima na Madeira, editada em 1948, com prefácio de Feliciano Soares, testemunha o acontecimento cuja “inconcebível grandeza não podia ficar dispersa nas colunas dos jornais ou nas fotos dos repórteres fotográficos” (Id., Ibid., 4). A reportagem que compõe o livro teve por base, na sua continuidade cronológica, as descrições dos jornais diários Diário de Noticias e O Jornal, tendo sido toda ela, porém, e para o efeito, refundida. Com este “arranjo”, Eduardo Nunes pretendeu abarcar tudo o que foi publicado em data própria, mantendo na forma contextual o “sabor da hora” em que o facto foi vivido. Na sua obra destacam-se ainda textos em prosa como A Levada do Norte, mas o mais relevante é Porque me Orgulho de Ser Madeirense, publicado em 1951, com segunda edição em 1954. Ao longo das 125 páginas deste livro o autor revela e enaltece vários aspetos da ilha da Madeira, desde a sua descoberta no contexto da epopeia portuguesa dos Descobrimentos até à paisagem, aos costumes, ao folclore e às romarias. Além destas obras, publicou ainda a reportagem ilustrada “Levada Central da Calheta”, em 1953, e, no mesmo ano, “Central Salazar – opúsculo documentário ilustrado”. Em 28 de agosto de 1954, publicou a primeira crónica de viagem “Rumo ao Brasil”, na qual narra, no Diário de Notícias da Madeira, a viagem que fez desde o Funchal até ao Rio de Janeiro. Ao longo dos meses seguintes, escreve sobre as comemorações do 4.º centenário de São Paulo, cidade onde testemunha a inauguração, a 21 de agosto, do parque urbano de Ibirapuera. Eduardo Nunes pertenceu à direção do Clube Desportivo Nacional, onde exerceu funções de secretário-geral. Desempenhou o mesmo cargo na Associação de Jornalistas da Madeira, e foi ainda secretário da delegação, no Funchal, do Sindicato Nacional dos Jornalistas. Morreu em Lisboa no dia 4 de abril de 1957, vítima de cancro.   Obras de Eduardo Fernandes Nunes: A Virgem de Fátima na Madeira: Reportagem (1948); Porque me Orgulho de Ser Madeirense (1951); “Levada Central da Calheta” (1953); “Central Salazar” (1953); “Crónica de Viajem, Rumo ao Brasil” (1954); A Levada do Norte; Porto Santo – Da Terra e do Mar, Do Amor e da Madeira e Embriagues, Crónicas Dialogadas.   António José Macedo Ferreira (atualizado a 03.03.2018)

Literatura