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Cuscuz declarado pela UNESCO Património Cultural Imaterial da Humanidade

Foram inscritos na lista de PCI “os conhecimentos, práticas e tradições veiculadas à produção e consumo de cuscuz” nos territórios em questão. No passado dia 16 de Dezembro de 2020, reunido por videoconferência, o Comité do Património da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), sob a Presidência da Jamaica, aprovou a candidatura transnacional da Tunísia, Argélia, Marrocos e Mauritânia. Como principal argumento da candidatura conjunta, o facto de os conhecimentos, práticas e tradições associadas à produção e consumo de cuscuz neste países ter um carácter de transversalidade integrante de seu património cultural, sendo praticadas por todas as populações dos países envolvidos, de todos os géneros, faixas etárias, sedentários ou nómadas, em meios rurais ou urbanos, incluindo os imigrantes, e em ocasiões diversas: dos pratos do dia a dia às refeições festivas. O regozijo traduziu-se na seguinte frase de Audrey Azoulay, Directora Geral da UNESCO: “Esta inscrição conjunta é um grande feito. É um forte sinal de reconhecimento cultural e um verdadeira êxito diplomático num tema tão importante e simbólico para os povos desta região e para muitos outros. Este concenso mostra que o património cultural pode ser tanto pessoal como excepcional e ao mesmo tempo transcender fronteiras.” No âmbito do decurso do projecto SABOREA, no qual a APCA é parcerira regional, uma das rotas gastronómicas sustentáveis delineadas é precisamente a Rota do Cuscuz, sendo que o facto da recente inscrição pela UNESCO na lista do PCI da Humanidade é uma mais valia que valorizará este conteúdo específico. De recordar que além da Madeira, conhecem-se mais dois outros territórios portugueses onde se verificam as práticas e saberes associadas ao cuscuz, sendo estes a Ilha de Santa Maria, nos Açores e Vinhais, localidade de Trás-os-Montes. Supõe-se que tais práticas e saberes tenham sido “incorporadas por influência moura e disseminadas nos vários territórios em Portugal por via dos invasores magrebinos ou dos judeus sefarditas que aí permaneceram, mais tarde como cristãos novos”. Na Madeira, é um legado da presença árabe.   APCA - Madeira

Madeira Cultural Notícias

noronha, adolfo césar de

Naturalista e homem de cultura natural do Funchal, onde nasceu a 9 de setembro de 1873, Adolfo César de Noronha estudou no Liceu do Funchal e nas antigas Escola Politécnica de Lisboa e Academia Politécnica do Porto. A 11 de dezembro de 1914, foi nomeado bibliotecário da Biblioteca Municipal do Funchal (BMF) e, em 1928, seu diretor, cargo que ocupou até à sua aposentação, em 1943. Com ligações familiares ao Porto Santo, efetuou nesta ilha observações meteorológicas, colheitas de espécimes, em particular fósseis, e ainda observações ornitológicas, que, juntamente com outras colheitas no arquipélago, vieram a servir de base a estudos efetuados por eminentes cientistas da época, com destaque para Ernesto Schmitz  (aves), Z. J. Joksimowitsch, P. Oppenheim e J. Böhm (fósseis). Na área do mar, colheu esponjas e briozoários, muitos deles novos para a ciência. À época, causou sensação a descoberta de uma esponja incrustante, simultaneamente com espículas calcárias e siliciosas, Merlia normani, obtida por dragagens no Porto Santo. Estas dragagens foram feitas em conjunto por Noronha e Randolph Kirkpatrick em 1909, tendo este último publicado a descrição desta esponja num extenso artigo publicado no Quarterly Journal of Microscopical Science, em 1911. Em 1922, encabeçou uma expedição científica às ilhas Selvagens (onde já tinha ido em 1906 e 1909), acompanhado de Adão Nunes e Damião Peres. Por vicissitudes com o navio que os deveria trazer de volta ao Funchal, acabaram por lá permanecer dois meses, causando motivos de preocupação na sociedade madeirense. O seu regresso ao Funchal foi motivo de receção pelas mais altas individualidades da Madeira, conforme noticiado pelo Diário de Notícias do Funchal de 13 de junho desse ano. Dessa expedição resultaram observações meteorológicas e colheitas de espécimes que foram enviadas a especialistas mundiais da época. Com o seu vasto conhecimento da história natural da Madeira e sendo fluente no inglês, francês e alemão, Adolfo César de Noronha foi o correspondente por excelência na Madeira de muitas figuras gradas da ciência do início do séc. XX. Como gesto de reconhecimento, várias espécies novas para a ciência foram-lhe dedicadas: Schizoporella noronhai, briozoário abissal, Pecten noronhai e Spondylus noronhai, moluscos bivalves fósseis, entre outras. Estudou com profundidade os peixes da Madeira, tendo publicado em 1925, no Porto, um ensaio intitulado Um Peixe da Madeira. O Peixe Espada Preto, ou Aphanopus carbo dos Naturalistas e, no ano seguinte, nos Annals of the Carnegie Museum, dois artigos sobre duas espécies novas para a ciência: um peixe da família dos escolares, Diplogonurus maderensis, e um tubarão de profundidade raro, que dedicou ao seu amigo Alberto Artur Sarmento, Squaliolus sarmenti. Em coautoria com Sarmento, publicou também, em 1934, um trabalho de divulgação intitulado Os Peixes dos Mares da Madeira e, em 1948, o segundo volume (Peixes) do importante trabalho Vertebrados da Madeira, editado pela Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal. Colaborou ativamente com Fernando Augusto da Silva e com Carlos Azevedo de Meneses na elaboração do Elucidário Madeirense (1922), tornando esta obra numa referência da história natural do arquipélago da Madeira. Logo após a sua nomeação como diretor da BMF, à época instalada no edifício dos Paços do Concelho em exíguas condições, começou a defender a aquisição de um edifício para a sua reinstalação e a criação de um museu que pudesse alojar as suas coleções de história natural e outro património artístico, arqueológico e histórico pertencente à Câmara Municipal do Funchal (CMF). Esta intenção foi concretizada em 1929 com a criação do Museu Regional da Madeira e com a aquisição do palácio de S. Pedro, para a qual foi decisiva a ideia por si realizada de emitir um selo postal da Madeira cuja receita reverteu para esta aquisição. Com a preciosa colaboração de Günther E. Maul, o novo Museu abriu as suas portas ao público em 1933, sendo hoje o Museu de História Natural do Funchal. Ao aposentar-se, a 9 de setembro de 1943, a CMF prestou-lhe homenagem atribuindo o seu nome à sala principal do Museu. A Augusto Nobre (1865-1946), distinto cientista português e catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, são atribuídas as seguintes palavras acerca de Adolfo de Noronha: “possui todos os requisitos para ocupar com distinção uma cátedra em qualquer universidade do país” (SILVA e MENESES, 1965, 426). Adolfo César de Noronha morreu no Funchal, a 6 de abril de 1963. Obras de Adolfo César de Noronha: Um Peixe da Madeira. O Peixe Espada Preto, ou Aphanopus carbo dos Naturalistas (1925); “A New Species of Deep Water Shark (Squaliolus sarmenti) from Madeira” (1926); “Description of a New Genus and Species of Deep Water Gempyloid Fish, Diplogonurus maderensis” (1926); Os Peixes dos Mares da Madeira (1934) (coautoria); Vertebrados da Madeira. Peixes (1948) (coautoria).   Manuel José Biscoito (atualizado a 03.03.2018)

Biologia Terrestre Biologia Marinha Personalidades

meneses, sérvulo drummond de

Advogado, político e jornalista madeirense, com grande influência local durante a época liberal. Nasceu em 1802 no Funchal, tendo perecido no mesmo local em 1862. Palavras-chave: Política; Jornalismo.   Sérvulo Drummond de Meneses nasceu no Funchal, em 23 de dezembro de 1802, sendo filho de João Nepomuceno Correia Drummond e de Maria Isidora de Meneses e Brito. Casou-se com Maria Carlota Arnaut, com quem teve cinco filhos. Concluiu o curso liceal no Funchal e depois iniciou-se como praticante no escritório do tio, o escrivão Inácio Correia Drummond, sendo, mais tarde, nomeado escrivão judicial. Antes de 1820, foi cadete do Corpo de Artilharia Auxiliar, mas, após a Constituição de 1822, tornou-se advogado provisionado, tendo efetuado o concurso de provas junto do Tribunal Superior de Justiça, apesar de não ser formado em Direito, acabando por se destacar como um dos mais distintos advogados do seu tempo e por deixar algumas peças de carácter administrativo e civil, umas inéditas e outras avulsas. Militou no partido cartista, ou liberal, e, mais tarde, no partido cabralista, militância que terá facilitado o seu acesso à carreira política. Foi presidente da Câmara Municipal do Funchal e vereador da mesma Câmara, tendo fundado, a 12 de janeiro de 1838, a Biblioteca Municipal do Funchal, importante estrutura cultural do arquipélago. Entre os cargos públicos que exerceu, relevam-se também o de vogal do Conselho Distrital, o de procurador à Junta Geral, o de secretário-geral do Governo Civil e o de governador civil interino, na ausência do conselheiro José Silvestre Ribeiro (1848-1849). Como jornalista, foi redator e diretor do periódico funchalense A Flor do Oceano, entre 1828 e 1866, tendo colaborado igualmente em outros periódicos, entre os quais O Regedor (1823 e 1828) e A Ordem (1852-1860). Foi autor de várias obras de interesse regional, como Uma Epocha Administrativa da Madeira e Porto Santo, publicado no Funchal (1.º vol., 1849; 2.º vol., 1850; o 3.º vol., de 1852), é de António Jacinto de Freitas); Collecção de Documentos Relativos ao Asylo da Mendicidade do Funchal; Collecção de Documentos Relativos à Construção da Ponte Ribeiro Secco; Collecção de Documentos Relativos á Fome por que Passaram as Ilhas da Madeira e Porto Santo em 1847. Como poeta, publicou, na juventude, poemas que foram incluídos na Collecção d’Algumas Obras Poeticas offerecidas ao Ilmo. e Exmo. Sr. Sebastião Xavier Botelho. Foi agraciado com o grau de cavalaria da Ordem de Nossa Senhora da Conceição, de Vila Viçosa. Faleceu no Funchal, a 13 de janeiro de 1867. Obras de Sérvulo Drummond de Meneses: Collecção de Documentos Relativos ao Asylo da Mendicidade do Funchal (1848); Collecção de Documentos Relativos à Construção da Ponte Ribeiro Secco (1848); Collecção de Documentos Relativos á Fome por que Passaram as Ilhas da Madeira e Porto Santo em 1847 (1848); Uma Epocha Administrativa da Madeira e Porto Santo (1.º vol., 1849; 2.º vol., 1850).   António Manuel de Andrade Moniz (atualizado a 24.02.2018)

Direito e Política História Política e Institucional

mcandrew, robert

Mercador e proprietário de barco nascido em Wandsworth, Londres, em 1802. Era filho do mercador e transportador de fruta William McAndrew. Com a morte do pai em 1819, assumiu, com o irmão, o negócio da família. A partir de 1830, MacAndrew manifesta o seu interesse pela história natural, entrando em 1834 para a Literary and Philosophical Society of Liverpool. Os negócios e viagens que realizou, em Portugal e Espanha, permitiram que reunisse coleções de conchas e que procedesse ao seu estudo. Estabeleceu contactos com Edward Forbes e com outros estudiosos da especialidade, como John Goodsir (1814-1867), James Smith (1782-1867) e John Gwyn Jeffreys (1809-1885). Pertenceu a diversas associações científicas, como a Linnean Society, da qual foi nomeado membro em 1847, e a prestigiada Royal Society, que integrou em 1853. Além disso foi, entre 1856 e 1857, presidente da Literary and Philosophical Society of Liverpool. Em 1872, recebeu, juntamente com Arturo Issel (1842-1922), o Prix Savigny da Académie des Sciences pelo estudo “Report on the Mollusca Testaceous Obtained during a Dredging-Excursion in the Gulf of Suez in the Months of February and March 1869”. Entre 1845 e 1870, publicou diversos estudos sobre os moluscos das costas atlânticas e mediterrânicas. De entre estes, assinala-se a publicação em 1853, na cidade de Liverpool, do estudo “On the Geographical Distribution of Testaceous Mollusca in the North-East Atlantic and Neighbouring Seas”, no qual refere 156 espécies de moluscos marinhos que encontrou nos mares da Madeira. Em 1873, MacAndrew doou a sua coleção de moluscos, que continha dezenas de milhares de espécies, e a sua biblioteca à Universidade de Cambridge. Faleceu no mesmo ano em Middlesex, Londres.   Obras de Robert MacAndrew: “On the Geographical Distribution of Testaceous Mollusca in the North-East Atlantic and Neighbouring Seas” (1853); “Report on the Mollusca Testaceous Obtained during a Dredging-Excursion in the Gulf of Suez in the Months of February and March 1869” (1870).   Alberto Vieira (atualizado a 01.02.2018)

Biologia Marinha Personalidades

melo, antónio júlio de santa marta do vadre de mesquita e

António Júlio de Santa Marta do Vadre de Mesquita e Melo (1833-c. 1900), 3.º visconde de Andaluz, foi para a Madeira como secretário-geral do governador, D. Tomás de Sousa e Holstein, marquês de Sesimbra; porém, o marquês de Sesimbra não estaria um ano no lugar. António Melo foi nomeado para o lugar de governador civil do Funchal em setembro de 1879. Coube ao seu Executivo tentar acalmar a agitação política, que se devia à nomeação de nobres da Corte, o que não se enquadrava já na vida política portuguesa. Palavras-chave: Arranjos familiares; Governo civil; Partidos Políticos; Regeneração; Tumultos populares.   O governador civil do Funchal D. João Frederico da Câmara Leme (1821-1878), do Partido Regenerador, foi exonerado em 1868 pelo Executivo do açoriano conde de Ávila, António José de Ávila (1806-1881), do Partido Reformista ou Partido Popular, então uma cisão do Partido Histórico (Partido Histórico e Partidos políticos). As complexas alianças entre estes partidos levaram o Governo de Lisboa a colocar em S. Lourenço duas figuras da aristocracia da Corte de Lisboa: o marquês de Sesimbra, D. Tomás de Sousa e Holstein (1839-1887), filho do duque de Palmela (1781-1850), como governador civil, e o 3.º visconde de Andaluz, António Júlio de Santa Marta do Vadre de Mesquita e Melo (1833-c. 1900), como secretário-geral. Estas duas escolhas foram alicerçadas em vagas ligações familiares às antigas famílias insulares e foram por certo resultado da pressão dos elementos do Partido Histórico, incapazes de compreender as novas realidades dos meados e da segunda metade do séc. XIX. O marquês de Sesimbra era casado com uma filha dos marqueses da Ribeira Grande, descendentes de Zarco, mas dos Açores, e viria a ser sogro do futuro conselheiro Aires de Ornelas e Vasconcelos (1866-1930); o visconde de Andaluz estaria para se casar com uma filha do barão da Conceição, Fortunato Joaquim Figueira (1809-1885), abastado proprietário que se havia fixado no Funchal nesse mesmo ano de 1868. O marquês de Sesimbra – ou de Cezimbra, como então aparece escrito – foi nomeado por decreto de 9 de setembro e viria a tomar posse a 17 de outubro de 1868, após Te Deum na catedral do Funchal celebrado à uma da tarde; disso nos dá conta o visconde de Andaluz, seu secretário-geral, que o comunicou às autoridades do Funchal, convidando-as para o evento. A administração do marquês ir-se-ia pautar por uma simples gestão administrativa, sendo praticamente toda a correspondência assinada pelo secretário-geral. Realizadas eleições em maio do seguinte ano de 1869, e passado o verão, o marquês de Sesimbra retirou-se, nos primeiros dias de setembro, para o continente, não completando um ano de governo na Madeira. Palácio e Fortaleza de São Lourenço. 1870. Arquivo Rui Carita O visconde de Andaluz tinha sido nomeado governador civil do Funchal por decreto de 4 de setembro, tomando posse a 8 do mesmo mês. Faria então uma proclamação aos “Habitantes do distrito do Funchal! Por decreto de 4 do corrente Houve por Bem Sua Majestade” nomeá-lo governador civil. Apelava então: “Auxiliai-me com o seu conselho e com as suas luzes […] pela prosperidade desta Terra, que eu hei de esforçar-me em promover os interesses dela com solicitude e dedicação” (ABM, Alfândega do Funchal, circular de 9 set. 1869). Era um discurso um pouco ultrapassado para a época, semelhante às proclamações liberais dos anos 30 e 40, conhecidas no Funchal durante a vigência da Junta Governativa de 1847 e o conselheiro José Silvestre Ribeiro (1807-1891) – proclamações que alguns anos depois ainda viriam a surgir, então ainda mais estranhas ao contexto político da época. O novo governador tentou fazer face à situação algo agitada que se vivia, não só política, como geral. No arquipélago, nem sempre se encontrava gente à altura para os vários locais diretivos e, ao mesmo tempo, não se conseguiam definir especificamente estruturas partidárias, daí resultando vagas organizações articuladas em relações pessoais em torno dos membros mais influentes das elites locais. Em maio de 1870, e.g., tendo o visconde de Andaluz suspendido o administrador do concelho de Santana, “não havendo naquela localidade pessoa com os requisitos necessários para, na atual conjetura entrar na referida vagatura”, solicitava à Casa Fiscal da Alfândega do Funchal a disponibilização do funcionário Joaquim Pinto Coelho (1817-1885) para ocupar o lugar (Ibid., Alfândega do Funchal, of. 23 abr. 1870) – uma nomeação acertada, considerando o tempo em que aquele funcionário ocupou o lugar da Alfândega. Nos inícios de 1870, por decreto de 2 de janeiro, procedeu-se à dissolução das Cortes e, a 3 de fevereiro seguinte, à reunião das assembleias eleitorais. Na Madeira, as eleições decorreram a 1 de maio, voltando a sair os nomes de Luís Vicente de Afonseca (1803-1878) e Agostinho de Ornelas e Vasconcelos (1836-1901). Porém, as eleições decorreram muito mal e, especialmente em Machico, ocorreram tumultos graves. Acontece que o governador destacara para os principais centros eleitorais forças de Caçadores 12, nem sempre comandados por elementos capazes de manter o sangue frio. As forças militares acabaram por se refugiar na igreja matriz e, acossadas pela populaça, fizeram fogo sobre a multidão, o que resultou em vários mortos (Tumultos populares). Houve também incidentes em outros locais, inclusivamente no Funchal. O Partido Popular, que se achava na oposição, tinha um certo domínio sobre as massas populares e quando Joaquim Ricardo da Trindade e Vasconcelos (1825-1906), então membro do Partido Fusionista, desembarcou no Funchal, ido precisamente de Machico, foi preso na Pontinha e conduzido à Pr. da Constituição para justiça popular. Evitou o assassinato o jovem Álvaro Rodrigues de Azevedo (1825-1898), uma das figuras prestigiadas do Partido Popular, que se interpôs entre os populares e Trindade e Vasconcelos. Como o visconde de Andaluz tinha feito vários contactos e estabelecido um pacto de não intervenção nos assuntos do Partido Popular, foi isso que aconteceu em relação a novas alterações da ordem pública em Machico, aquando dos funerais das vítimas do dia 1 de maio. Os acontecimentos de Machico produziram grande sensação na imprensa madeirense e, de imediato, no continente, sendo o visconde violentamente atacado nas Cortes e na imprensa de Lisboa. Em julho ainda apareciam na comunicação social de Lisboa abaixo-assinados respeitantes aos acontecimentos de Machico e à maneira pouco ortodoxa como haviam sido encaminhados juridicamente. Um conjunto de cinco guardas da Alfândega do Funchal, e.g., fora indiciado e preso “pelo crime de cumplicidade nas mortes e ferimentos feitos pela força militar dentro do templo de Machico” (A Revolução de Setembro, n.º 8416, Lisboa, 5 jul. 1870, 1). O despacho fora emitido pelo juiz da comarca oriental do Funchal, Cassiano Sepúlveda Teixeira, e os guardas não entendiam como podiam ser acusados de “crimes eleitorais e políticos” e de “crimes de violência contra membros da assembleia eleitoral” (Ibid.), quando o que estava em causa era uma série de mortes entre a população local, cujos autores tinham sido os soldados de Caçadores 12, como se queixam então os guardas António José Nunes, Jacinto Augusto Ferreira, Januário Esteves de Sousa, Augusto Celestino Lacerda e António Vieira. O visconde de Andaluz foi exonerado em poucos dias, por dec. de 14 de maio de 1870. Foi nomeado como governador do distrito do Funchal Afonso de Castro (1824-1885), que tomou posse a 19 desse mês de maio, mas que não estaria na Madeira senão oito dias, face a mais uma intentona militar do duque de Saldanha (1790-1876) em Lisboa. Poucos meses depois, e face ao insucesso das nomeações, D. João Frederico da Câmara Leme voltava a ocupar o lugar de governador civil. O 3.º visconde de Andaluz era bacharel em Direito e herdou o título de seu pai, Joaquim José dos Mártires de Santa Marta do Vadre de Mesquita e Melo (1806-1863), que o tinha recebido por doação de sua tia materna, Maria Bárbara do Vadre de Almeida Castelo Branco, viúva do 1.º visconde, António Luís Maria de Mariz Sarmento, dado do casamento não ter havido descendência. Embora tenha sido uma situação algo insólita, o 3.º visconde de Andaluz, um ano depois do falecimento do pai, conseguiu a confirmação do título por carta régia do D. Luís (1838-1889), de 17 de dezembro de 1864. Casou-se no Funchal com D. Ana Joaquina Figueira, filha dos barões da Conceição. Desse casamento houve quatro filhas, tendo-se a mais velha casado com o conde de Vila Verde, D. Pedro de Almeida e Noronha Portugal Camões Albuquerque Moniz e Sousa (1865-1908). A 4 dezembro de 1890, o 3.º visconde de Andaluz ainda seria nomeado governador civil de Santarém, lugar que ocupou até 2 de janeiro de 1892. Terá falecido cerca de 10 anos depois.   Rui Carita (atualizado a 01.02.2018)

Direito e Política História Política e Institucional Personalidades

mendes, josé alberto reynolds

O Gen. José Alberto Reynolds Mendes nasceu no Funchal a 9 de abril de 1939, filho de João Gregório Mendes e de Cândida Assunção Reynolds Mendes; casou-se em 1967 com Maria de Fátima F. P. Pereira Reynolds Mendes e teve três filhos, Paulo José (1967) e os gémeos Alexandra Sofia e Alberto Sérgio (1968). Frequentou o Liceu Nacional do Funchal e ingressou na Academia Militar como cadete, em 1957. Em julho de 1960 concluiu na mesma Academia o curso de Infantaria e ficou colocado em Mafra, na Escola Prática deste ramo do Exército. No ano seguinte, frequenta na mesma Escola um curso sobre métodos de instrução, na qualidade de aspirante tirocinante. Ainda em 1961, é promovido a alferes, e, após um tempo de serviço no Regimento de Infantaria 2, em Abrantes, é mobilizado para servir na Região Militar de Angola (RMA). A 20 do mesmo mês parte do Aeroporto Militar de Figo Maduro em direção à Base Aérea 9 de Luanda como comandante do pelotão da Companhia de Caçadores 89. Depois de ter sido promovido a tenente, é colocado no Batalhão de Infantaria 19 no Funchal a 13 de abril de 1963. De 11 de junho a 6 de julho do mesmo ano, no Centro de Instrução de Operações Especiais, de Lamego, frequenta o curso de Instrutores e Monitores de Operações Especiais. A 24 de julho de 1964, mobilizado pelo Batalhão de Caçadores 5 de Campolide, segue de novo para Luanda, onde prestará serviço na Região Militar de Angola. Em 1966, habilita-se com o curso de Instrução de Comandos, é promovido a capitão e agraciado com a medalha de mérito militar de 3.ª classe, sendo louvado como “oficial de excelsas virtudes”, “extremo sentido de disciplina e de missão, elevadas qualidades de iniciativa, decisão, coragem e determinação” (“Nota de óbito”), e passa a comandar a 6.ª Companhia de Comandos até 1 de setembro de 1967, data em que regressa à metrópole. A 5 de Março de 1968, é-lhe conferida a medalha de mérito, que dá origem, a 5 de março de 1968, à condecoração com a Cruz de Guerra de 3.ª classe. De 23 de setembro a 4 de outubro do mesmo ano, conclui o estágio de Ação Psicológica no Instituto de Altos Estudos Militares de Pedrouços. No ano seguinte, a 22 de fevereiro, parte para Luanda e integra as tropas de reforço à Guarda Nacional na RMA. Mantém-se nesta comissão até 1973 e habilita-se com o Curso Geral do Estado-Maior. Nesta data recebe a medalha de prata de comportamento exemplar. Em fevereiro de 1975, é nomeado chefe da 2.ª Repartição do Comando Geral da Polícia de Segurança Pública. Parte para Macau, onde, em 1980, frequenta o curso da Criminal Information Research School/Drug Enforcement Administration/EUA e aqui, no posto de major, desempenha as funções de chefe de Divisão de Operações e Informações do Comando das Forças de Segurança. Depois das campanhas de Angola e das comissões especiais em Macau é condecorado, em 1984, com o grau de cavaleiro da Ordem de Avis (comendador). Frequenta, em 1986, o curso do Colégio de Defesa da NATO, em Roma, onde, após graduação e promoção a coronel, foi Conselheiro de Estudos, entre 1987 e 1990. Uma vez promovido a brigadeiro, exerceu o cargo de subdiretor do Instituto de Defesa Nacional, e foi colocado, em 1996, como comandante da Zona Militar e comandante operacional da Madeira, tendo terminado este desempenho em 1998. Passou à situação de reserva em abril deste mesmo ano, por limite de idade. Em 2003, participa no fórum da Military Review, revista profissional do exército dos EUA, sediada em Fort Leavenworth, Kansas, com um estudo intitulado “Guerra Assimétrica, Riscos Assimétricos”. O estudo consiste numa análise sobre os diversos níveis de terrorismo existentes nos começos do séc. XXI e em previsões sobre os seus efeitos nas organizações de defesa, nas alianças internacionais e nas áreas de informações, operações e logística. Este estudo foi publicado na versão brasileira da mesma revista (vol. LXXXIII, 2.º trim., pp. 46-54. Com a patente de major-general, Reynolds Mendes atinge a reforma em julho de 2004. Foi ainda diretor do Gabinete de Gestão do Litoral do Governo Regional da Madeira. Na sua obra poética, publicada sob o pseudónimo de Marco Reynolds, a escrita revela-se uma necessidade moral de participar no mistério da vida, na intangibilidade dos afetos e no contraditório da existência humana: a sua dupla face, em busca dum estado de ser. Observa a matriz sanguínea e telúrica que define o poeta, amador da vida, do amor e da terra de origem, a “Ilha-Mãe”, onde “vale a pena reencontrar” (-se) (MENDES, 2009, 36). A fusão dos vários espaços onde se move remete para uma situação de duplicidade em que o homem-cívico, imbuído dum espírito de missão, se coliga ao homem-emotivo, sensível aos sortilégios do amor. Há um sentimento de promissão dirigido a uma vontade de resgate da mulher amada e do solo “depredado” que permanece em todos os seus livros, consolidando-se a última vertente em Ilha-Mãe – Ilha-Pátria. Sendo a Ilha a terra do regresso e da esperança, são as memórias do seu tempo em África que o levam a auscultar, em Ofício Prestante, os caminhos imperfeitos, ainda que aliciantes, da pátria: a pátria que refere como “lágrima de Deus” e “ubérrimo ventre”. “Não tomes nas tuas mãos pálidas/o meu esplendor de ébano selvagem/O que digas perder-se-á nas brumas/de África/e assaz tardará o sol a aquecer-nos/Não tomes no peito o amor/antes que chegue o tempo maduro da vinha nas encostas” (MENDES, 2005, 78). José Alberto Reynolds Mendes morreu em Lisboa, em 2016. Outras distinções profissionais recebidas pelo Gen. José Alberto Reynolds Mendes: medalha das expedições das Forças Armadas Portuguesas – Macau, 1976-80; medalha de mérito militar de 2.ª Classe, 1979; medalha de prata de Serviços Distintos, 1985; medalha de ouro de comportamento exemplar, 1988; medalha de mérito militar de 1.ª classe, com distintivo branco do exército espanhol, 1991; medalha de mérito militar de Avis (cavaleiro, oficial, grande oficial), 1995; medalha de ouro de Serviços Distintos, 1998. Vários louvores individuais provenientes de entidades militares e Conselho de Governo da Madeira. Obras de José Alberto Reynolds Mendes: Gestação de Uma Nova Face (1970); “Guerra Assimétrica, Riscos Assimétricos” (2003); Gestação da Face e Outros Poemas (2005); Ofício Prestante (2006); Ilha-Mãe – Ilha-Pátria (2009).   Irene Lucília Andrade (atualizado a 01.02.2018)

História Militar Personalidades