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música tradicional

A música tradicional madeirense da atualidade resulta da combinação de um conjunto de elementos trazidos por sucessivas levas de povoadores. Na Região Autónoma da Madeira (RAM), estes contributos foram evoluindo de forma isolada, mas recebendo pontuais influências de novas populações, de visitantes ocasionais ou ainda, a partir do séc. XX, dos meios de comunicação social de âmbito nacional, com particular incidência nas estações radiofónicas, ou da generalização do ensino oficial, com a chegada de docentes de diversos pontos do país. Deste modo, popularizaram-se na RAM canções que, com o tempo, têm vindo a assumir, para muitos, um carácter tradicional. Como é natural, trata-se de peças cuja identificação nem sempre é fácil, pois há pouca investigação feita sobre o tema nas diversas regiões do país. No caso particular das cantigas religiosas, é ainda necessário referir a influência de sacerdotes portadores de orientações precisas por parte da hierarquia ou de uma formação padronizada nos seminários que frequentaram. Um último aspeto que poderá estar na origem de algumas influências alheias é o regresso de emigrantes que trazem das terras onde viveram elementos tradicionais passíveis de ser incorporados na tradição. No entanto, seja por o fenómeno ser ainda relativamente recente, em termos de mecanismos de mudança cultural, seja apenas por ainda não ter havido quem o estudasse seriamente, a verdade é que não se sabe, atualmente, se essa componente se manifesta. Não é possível definir características genéricas da música tradicional madeirense. Por esse motivo, e de modo a facilitar a exposição, optou-se por abordar aqui, separadamente, cada um dos grandes géneros musicais, após uma primeira referência ao bailinho, o elemento mais conhecido e identitário da tradição musical da RAM. Aborda-se igualmente a mourisca, que, embora com menor realce, constitui também um modelo musical transversal a diversos géneros. Bailinho Com um padrão rítmico bastante simples, o bailinho é executado geralmente na tonalidade de Sol Maior, por ser aquela a que mais facilmente se adapta a voz. É esta melodia que está na base de muitos dos mais conhecidos bailes regionais, sendo também a forma assumida pela mais popular forma de canto improvisado em despique da RAM (com o nome de bailinho, retirada, meia noite ou outro). Encontramo-lo ainda a dar o “som” de muitos romances tradicionais, cantigas narrativas, cantigas de lazer, etc. De certa forma, é um elemento que, por si só, permite a qualquer não madeirense identificar uma melodia como sendo da RAM, sendo, atualmente, a forma musical mais presente e espontânea em todos os ambientes festivos na Região, acompanhada por qualquer instrumento ou mesmo por formas improvisadas de criar som. É importante chamar aqui a atenção para uma confusão bastante frequente resultante da coincidência do nome deste género musical. Existe uma canção muito conhecida, interpretada pelo cantor madeirense Max, que tem precisamente o nome de “Bailinho da Madeira”. No entanto, apesar da referência na sua letra ao bailinho, musicalmente esta nada tem a ver com ele. Antes pelo contrário, a música tradicional que serviu de inspiração para algumas das suas frases musicais foi o charamba. A grande popularidade desta canção tem feito com que seja frequente a confusão. Mourisca A mourisca madeirense dos começos do séc. XXI apresenta características que a aproximam de um vira valseado. Musicalmente, baseia-se no compasso binário composto, padrão rítmico de 6/8. Harmonicamente, tem a forma tradicional de alternância entre tónica e dominante. Na tradição local, principalmente a que se pode identificar através de recolhas efetuadas em anos anteriores, encontram-se formas de mourisca em diversas circunstâncias. Existem referências e alguns registos de mouriscas cantadas em despique, com letras improvisadas; contudo já não se encontram cultores desta prática, sobrevivendo apenas como canção de letra fixa. A sua grande força é traduzida numa dança, conhecida predominantemente na zona sul da ilha, em torno da Camacha, da Gaula, do Machico e do Caniçal. Existem algumas referências quanto à existência da mourisca dançada pelos populares em outras zonas, como os Canhas. Esta pode ser denominada, de forma indiferente, como mourisca ou chama-rita. No Porto Santo, existia o baile sério, nos começos do séc. XXI executado apenas pelo grupo folclórico desta ilha. Trata-se de uma variante da mourisca madeirense, com uma letra própria. Os habitantes da ilha consideravam-no a dança dos grupos mais abastados da ilha, em oposição à meia volta ou ao baile do ladrão, associados às classes populares. A sua letra é fixa, tal como na mourisca da ilha da Madeira, alternando quadra com refrão. As quadras são entoadas alternadamente por uma mulher e por um homem, sendo o refrão cantado em coro. Cantigas de trabalho Como resultado da transformação dos modos de vida e das atividades produtivas rurais, as cantigas associadas ao trabalho encontram-se atualmente numa situação peculiar. Com efeito, a verdade é que, nas zonas rurais, já não se ouve cantar a chamusca, a cava, a sementeira, a erva, a ceifa do trigo, a malha na eira, a boiada ou cantigas do moleiro, de acartar lenha, dos borracheiros, do linho, dos pastores, etc. Com o desaparecimento das atividades agrícolas que lhes estavam associadas, estas cantigas perderam o seu carácter funcional. De uma forma geral, podemos considerar que as cantigas de trabalho assumem diversas das características a seguir enunciadas: – Género exclusivamente vocal, sem acompanhamento instrumental; – Estrutura musical vulgar, nalguns casos simétrica; – Melodia simples e curta, muitas vezes irregular, com intervalos curtos; – Andamento lento e livre, dependente da respiração de cada um. O seu tempo é relativo e variável, dependendo da sensibilidade de quem canta e também do trabalho associado; – A tonalidade é a que melhor serve ao intérprete. Por vezes, verifica-se um prolongamento da última nota (de 8 ou 12 tempos finais), como, por exemplo, na cantiga da ceifa, da carga ou dos borracheiros. Não há mudança de tom; – Padrão rítmico: 2+2; 4+4; – Canto monódico. No entanto, a sua entoação pode variar, existindo diferentes formas de o fazer: a) Um único intérprete canta a totalidade da cantiga, ou cada um canta a sua quadra; b) Uma voz inicia a quadra e, nos dois últimos versos, os restantes participantes acompanham em uníssono imperfeito; c) Todos entoam, em conjunto, quadras já conhecidas; d) Cada um improvisa a sua quadra. – Sem refrão; – Forma de cantar: alto (agudo), voz de cabeça; – São frequentes os modos arcaicos (sistema modal); As características mais notórias da letra são: – A mesma letra pode servir para diferentes melodias, podendo ser de temática completamente alheia à tarefa. Esta é geralmente pouco profunda, mas ligada à tarefa do dia-a-dia, às dificuldades da vida. São temas recorrentes: Deus, amor, saudade, tristeza, alegria, humor, malandrice; – É frequente a apropriação de versos já conhecidos e pertencentes a cantigas de lazer, de carácter religioso ou romances tradicionais; – O cantar de improviso é um fator importante neste género de música associada ao trabalho caseiro, dependendo da capacidade poética de quem canta; – Entre as quadras ou versos, são frequentes os apupos ou onomatopeias; Listam-se abaixo algumas das mais significativas cantigas de trabalho madeirenses. Borracheiros Na costa norte da Madeira, as uvas eram tradicionalmente apanhadas e levadas para um lagar local. O mosto era posteriormente acartado para as adegas do Funchal, onde iria fazer parte do processo de produção do famoso vinho generoso. A ausência de boas vias de comunicação obrigava a que o seu transporte fosse feito em odres (borrachos) carregados aos ombros de homens pelas veredas da serra. Podiam juntar-se várias dezenas de borracheiros, que, em fila, faziam o percurso até à cidade. Como forma de atenuar a dureza da caminhada, iam entoando uma cantiga específica. O primeiro homem da fila era o chamado candeeiro, que cantava umas quadras de métrica irregular, a que respondiam os restantes (o gado), com vivas. O último do grupo era o boieiro. O canto servia para animar os elementos do grupo, fazendo alusão ao próprio caminho, podendo também incluir elementos de troça em relação a algum componente ou de incentivo ao esforço. A construção de estradas e infraestruturas levou ao inevitável fim dos borracheiros. Em 1974, por iniciativa de Eduardo Caldeira, constituiu-se um grupo, no Porto da Cruz, que recuperou essas tradições, apresentando-as em diversos eventos madeirenses. Cantiga da carga A força humana foi, desde sempre, o elemento que assegurou o transporte na ilha. Mesmo cargas pesadas eram levadas aos ombros ou à cabeça. Por vezes, onde os terrenos o permitiam, podia recorrer-se à ajuda de animais para facilitar a tarefa. No entanto, a ida à serra para recolher lenha para aquecer a casa ou cozinhar, ou para cortar erva para o gado que, no palheiro, a aguardava, dificilmente escapava à necessidade da força humana para o transporte dos pesados fardos. Esta cantiga era entoada naqueles percursos do regresso, aliviando, de certa forma, a dureza do esforço. A letra era composta por quadras, que podiam ser improvisadas, intercaladas por apupos e entoadas numa cadência lenta, acompanhando o ritmo lento da tarefa. Cantiga de embalar Adormecer uma criança é uma tarefa que pode ser árdua e que está muito dependente do tempo necessário para atingir o objetivo. Assim, a tradicional cantiga de embalar tem um andamento muito lento, sem grandes irregularidades. A letra tem versos intercalados por onomatopeias destinadas a fazer adormecer mais facilmente a criança.   Cantigas de carácter religioso O ciclo do Natal O primeiro momento do ciclo do Natal na Madeira, em termos musicais, é constituído pelas Missas do Parto. No seu estudo sobre o tema, Rufino da Silva (1998) afirma que os cantos que têm presença certa nestas cerimónias são conhecidos, pelo menos, desde finais do séc. XIX>, sendo no entanto impossível determinar se são de origem madeirense. Segundo o mesmo autor, estes cânticos apresentam traços de lirismo popular, revelam influência minhota pela harmonização em terceiras e a sua estrutura harmónica é basicamente de alternância entre a tónica e dominante e quase exclusivamente em modo maior. Embora esta seja a caracterização da maior parte das canções, o autor detecta nalgumas delas traços de influência do canto gregoriano.   Romagem. Missa do Galo. Boaventura. Foto: Rui A. Camacho A missa da Noite de Natal é um mais alto momento das vivências religiosas da população regional. Associadas à importância litúrgica de comemorar o nascimento de Cristo, há diversas práticas tradicionais que ajudam a que esta seja realmente a grande Festa. Em alguns locais, esta celebração ainda assume características muito próprias, terminando com as romagens, nas quais grupos de vizinhos, familiares ou amigos percorrem a nave do templo tocando e cantando, para levar até ao sacerdote as suas oferendas. A própria missa é intercalada por diversos momentos de representação e entoação de cantos, como o da “Anunciação aos Pastores” ou a “Pensação do Menino”, tradicionalmente cantados junto do presépio. Possivelmente, estes serão os últimos vestígios de um ancestral auto apresentado na ocasião. A alteração das condições de realização da cerimónia, incluindo alguma necessidade de encurtar a sua duração, poderá estar na origem da eliminação de componentes ou redução do número de estrofes entoadas, daí resultando a sobrevivência de apenas algumas canções isoladas. As romagens são um bom exemplo de uma outra realidade: o que aqui é tradicional é o contexto de interpretação e não a canção em si. Apesar de ser uma tradição que tende a perder-se, nos locais onde se mantém, a principal preocupação dos vários grupos que preparam a sua romaria é mostrar qualquer coisa que as pessoas presentes na igreja não conheçam, pelo menos no que respeita à letra, pelo que muitas vezes se adapta uma música conhecida a uma letra criada. Principalmente nas zonas onde essa preocupação pela conservação da tradição é maior, o grupo que apresente uma romaria que ele ou outro cantou naquela igreja no ano anterior ou dois anos antes, da qual toda a gente se lembra, é alvo de troça, uma vez que não foi capaz de preparar e apresentar uma romagem original, o que obriga a questionar o lugar da tradição. A tradição está na prática de as pessoas de um determinado sítio se reunirem e levarem uma canção para a missa de Natal, com ou sem instrumentos. Por definição, se o que o grupo tem de apresentar é uma novidade, então as músicas não podem ser tradicionais. O que acontece por vezes é que se o público gostar de uma romaria de Natal, seja pela situação em que ela foi apresentada, seja pela qualidade artística da sua melodia ou da sua letra, esta permanece e pode tornar-se tradicional, como uma cantiga de passatempo.   Noite de Reis. Foto: Rui A. Camacho Cantiga de Reis Na noite de 5 para 6 de janeiro, formam-se grupos que percorrem as casas dos vizinhos ou amigos, entoando cantos próprios da época, como forma de desejar um bom Ano Novo. Ao chegar à porta, canta-se enquanto se aguarda que o dono da casa abra e ofereça a todos as bebidas e bolos que os esperam. Depois de uns minutos de convívio, há que prosseguir o percurso, que dura até de manhã. Em cada zona da ilha tende a haver um canto próprio desta noite, embora haja alguns mais conhecidos que são partilhados por várias localidades. A cantiga é entoada em uníssono por todos os participantes. A sua estrutura melódica é constituída por duas partes distintas: uma primeira cantada em compasso de 3/4 e uma segunda em compasso de 3/8, embora haja casos em que surge o compasso 2/4. No final, é frequente haver uma quadra de despedida aos donos da casa. Espírito Santo. Camacha. Foto: Rui A. Camacho Espírito Santo Após a Páscoa, começam as visitas das insígnias do Espírito Santo às casas. Num número de domingos variável em função da quantidade de locais a percorrer, forma-se um grupo constituído pelos festeiros, portadores das insígnias (pendão com a pomba desenhada, coroa e cetro), músicos e duas ou quatro saloias (meninas que transportam cestos para acolher as ofertas). Ao chegar a cada casa, as saloias entoam o Hino, que pode variar de freguesia para freguesia, alusivo à entrada do Espírito Santo, a que se seguem o pedido e o agradecimento das esmolas ao dono da casa. Podem seguir-se outras cantigas, de acordo com pedidos feitos pelos moradores e/ou decisão dos festeiros. Cantigas de lazer Cantos improvisados Brinco em bailinho O despique em bailinho é, ainda hoje, o momento alto da festa popular. Em qualquer arraial tradicional, ou mesmo nas festas familiares, se pode encontrar um brinco. Um músico, pelo menos – tocando rajão, braguinha ou viola de arame, hoje frequentemente substituídos pelo acordeão –, atrai uma roda de cantadores que, à vez, entoam as suas quadras, podendo haver um acompanhamento adicional de palmas (se necessário, pode-se prescindir inclusivamente da presença de músicos). Musicalmente, encontramos uma melodia tonal, com base na harmonia da tónica, dominante.   Despique. Arraial de Ponta Delgada. Foto: Rui A. Camacho O canto é, no essencial, improvisado. No entanto, um bom despicador pode recorrer, se necessário, a quadras decoradas. Esta situação será um recurso aceite no contexto de um despique que se prolongue num arraial. A tentativa de “atirar” quadras críticas ou irónicas sobre os restantes pode proporcionar momentos de grande alegria. A forma poética escolhida é a quadra de verso curto, com rima cruzada (ABAB ou ABCB). Habitualmente, cada verso é bisado, e após o segundo verso toca-se o interlúdio musical. Por vezes, o despicador acrescenta mais dois versos (rima CB ou DB), como mecanismo que permite completar melhor a ideia. Em casos mais raros, poderá ser entoada uma nova quadra completa, tendência que se tem tornado mais comum em tempos mais recentes, possível sinal de uma menor capacidade inventiva e de síntese. A satisfação dos presentes é manifestada por meio de apupos. O despicador, ao chegar a sua vez, pode prescindir de participar, passando a vez ao seguinte. A conclusão mais natural do despique será a que resultar do progressivo abandono dos participantes, vencidos pelo mais inspirado. Num arraial, o brinco poderia prolongar-se por longo tempo, sendo um dos grandes momentos de animação antes da generalização dos grupos de música moderna. Na ilha do Porto Santo, é habitual chamar “Retirada” ao despique em bailinho. Charamba   Charamba. Foto: Rui A. Camacho É hoje a forma musical associada por excelência à viola de arame, embora tradicionalmente pudesse ser acompanhado por outros instrumentos. É uma forma de canto despicado, quase exclusivamente masculino. Na maior parte das vezes, os tocadores não participam no canto, sendo este alternado entre os participantes, que podem cantar quadras ou estrofes mais longas e também com uma métrica variável. A sequência é obrigatoriamente no sentido dos ponteiros do relógio. Ao conjunto dos charambistas que participam numa determinada sessão chama-se “quadrado”. Segundo alguns dos intérpretes tradicionais, o importante neste género musical era o conteúdo do que se cantava. Nalguns casos, acordava-se previamente um tema (fundamento) que estaria obrigatoriamente presente em todas as intervenções. O tema poderia também ser acordado após quadras iniciais entoadas pelos participantes. No momento do canto, o intérprete tem toda a liberdade de definir o andamento e a extensão dos seus versos. Se necessário, o tocador terá de “ir atrás” do cantor, prolongando as frases musicais ou repetindo-as. Para alguns, a opção é ir tocando uns acordes muito simples durante o canto. As quadras são entoadas com repetição de cada verso ou repetindo cada par de versos. Após a repetição, há o indispensável interlúdio musical, que tem uma forma padronizada e bem definida, num padrão rítmico regular de 2/4 (embora possa mudar para 5/8), sendo ele que, musicalmente, define o charamba. A estrutura harmónica é simples, baseando-se na Tónica e Dominante do tom de Sol maior. O seu andamento é lento/andante. Jogos cantados Nos momentos de convívio dos mais jovens, seja entre si, seja com os adultos da família ou amigos, as lengalengas e os jogos ocupavam um lugar importante. Estes apresentam uma grande diversidade de características, podendo ser cantados ou não, tal como ter associada uma coreografia própria. Embora não sendo possível efetuar generalizações, existe um conjunto de aspetos que se podem apresentar como sendo muito comuns aos jogos cantados: – São cantados em tom maior, com refrão e um ritmo simples; – É habitual possuírem refrão, cantado por todos em uníssono, intercalado com outras partes entoadas a solo por algum dos participantes; – Sem acompanhamento instrumental; – Recurso a acompanhamento de palmas; – A sua letra é composta maioritariamente por quadras de verso curto Muitos dos jogos têm uma coreografia associada. Os jogadores podem colocar-se em roda simples ou dupla, podendo ter um elemento no centro, podem estar em fila, frente a frente, etc. Histórias Outra forma muito comum de passar o tempo livre, ou mesmo acompanhar as longas horas de trabalho do bordado, era contando ou cantando histórias. Estas podiam assumir características diversificadas. Tanto podiam ser os antigos romances da tradição hispânica, como narrativas inspiradas em factos da vida real, como ainda histórias de animais ou mesmo lengalengas. Um elemento importante é assumirem, com grande frequência, um carácter didático ou terem uma conclusão moral. A sua componente musical varia muito. Ainda podemos encontrar alguns romances com as suas melodias ancestrais, a par de outros textos a que se foi adaptando uma música mais recente. Nestes casos, o facto de se tratar de uma melodia bem conhecida facilitava a sua memorização e podia tornar mais recetivos os ouvintes. De qualquer modo, são sempre melodias com frases musicais curtas, que se vão repetindo ao longo de todo o texto. Danças As duas formas dançadas mais comuns na RAM são os já referidos bailinho e mourisca. Para além delas, pode referir-se duas outras tradicionais da ilha do Porto Santo, a Meia Volta e o Ladrão, e uma outra, a Dança das Espadas, associada à festa de São Pedro, na Ribeira Brava. Meia volta Na ilha do Porto Santo, os momentos de festa em família ou com vizinhos e amigos tinham lugar nas eiras ou num espaço amplo dentro de casa. Aí, o tocador da rabeca colocava-se no centro e os restantes participantes do baile iam formando pares em roda (pares que nunca se tocavam, realçavam alguns dos mais antigos). Na roda, incluíam-se os tocadores dos outros instrumentos, como o rajão e viola de arame. Caso único nas danças da RAM, existia um mandador que orientava a sequência coreográfica do baile, ao mesmo tempo que cantava e tocava a viola de arame. Os restantes cantadores ficavam fora da roda. A música tem ainda hoje carácter modal (frígio), claro sintoma da sua antiguidade, embora todas as hipóteses até hoje lançadas para explicar a sua origem sejam puramente especulativas. Tradicionalmente, o canto era improvisado. Atualmente extinto da tradição, são elementos do Grupo Folclórico local que preservam a sua recordação. Musicalmente, apresenta uma sequência harmónica de três acordes: Sol, Lá, Sol, tom de Sol maior. O andamento é moderado e mantém-se sempre inalterável, mudando o número de notas musicais, criando uma intensidade sonora e desenvolvendo uma dinâmica rítmica, enquanto o violino executa uma interessante melodia com base na escala de Sol maior. A meia volta é única em relação a todas as outras músicas tradicionais. Dança das espadas Música tradicionalmente executada durante os festejos de São Pedro, na Ribeira Brava. Praticada até meados do séc. XX, esta dança desapareceu progressivamente da tradição, sendo alvo de trabalho de reconstituição em finais do século, tendo posteriormente retomado o seu lugar na festa.   Dança das Espadas. Ribeira Brava. Foto: Rui A. Camacho É interpretada por um conjunto de homens com um trajo próprio, tendo duas partes distintas: uma executada em marcha e a outra com uma coreografia própria. Aspecto peculiar, a dança é apenas instrumental, sem qualquer canto associado, o que faz com que seja a única dança da tradição popular que apresenta essas características. Musicalmente, é simples, baseando-se apenas em quatro compassos, em tom maior. Embora haja registo de ligeiras alterações, podemos definir o acompanhamento musical como sendo feito por rajão, braguinha, viola de arame e pandeiro.   Jorge Torres Rui Camacho (atualizado a 01.02.2018)

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livrarias

A existência de livrarias, com espaço físico ou virtual, e a facilidade no acesso ao livro, em termos de preço e disponibilidade no mercado, bem como a vulgarização do livro nas estantes das livrarias e bibliotecas pessoais é uma realidade tardia. Inicialmente, as bibliotecas (designadas de livrarias) eram institucionais. Só as famílias mais destacadas tinham lugar na sua casa para uma biblioteca, uma vez que a maioria da população não dispunha de condições para ter um espaço dedicado a essa função ou, tão-pouco, para comprar um livro. Note-se que em 7 de agosto de 1815, quando Napoleão Bonaparte escalou o Funchal a bordo do HMS Northumberland, a caminho de Santa Helena, o cônsul geral de Inglaterra, Henry Veitch, o visitou para lhe oferecer vinho, livros e fruta fresca. Também, mais tarde, Isabella de França, uma Inglesa casada com um morgado madeirense, que visitou o Funchal em 1853, refere a presença de livros em algumas casas, onde pareciam funcionar como elementos de decoração. Assim, numa visão geral das casas visitadas, refere: “Sobre as mesas encontram-se livros ricamente encadernados, porcelana francesa e outros adornos, entre os quais não faltam jarras de flores delicadas” (FRANÇA, 1970, 67). Sabemos que os livros faziam parte da bagagem dos viajantes, pois Isabella de França testemunha a presença destes no seu baú, entre roupa e outros objetos. Maria Clementina (1803-1867), freira do Convento de S.ta Clara e filha de Pedro Agostinho Teixeira de Vasconcellos e de sua mulher, Ana Augusta de Ornelas, tinha em seu poder uma coleção de livros. Fanny Anne Burney, no jornal que escreveu em 1838 e que só publicou em 1891, refere que a freira era detentora e leitora de obras de Racine, de Corine, de M.me de Stael, da tradução francesa de Abbot de Walter Scott, das Maximes de Chateaubriand, de Paulo e Virgínea, e de Génie du Christianisme. Até ao aparecimento da imprensa, a circulação do livro fazia-se através de cópias entregues a copistas especializados de instituições como conventos. Na Madeira, só com a publicação, em 1821, do jornal O Patriota Funchalense se registou a primeira tipografia, sendo a atividade exclusiva desta a edição de jornais. O primeiro livro que terá sido editado na Ilha foi Saudades da Terra de Gaspar Frutuoso, com as anotações de Álvaro Rodrigues de Azevedo, em 1873, na Tipografia Funchalense. Por outro lado, não podemos esquecer o controlo da edição de livros que existiu em Portugal, primeiro pela Inquisição e depois por ordem política, que condicionou a circulação de livros. O livro era um produto raro e quase só estava disponível em bibliotecas, ou livrarias, de instituições. Conhecemos a importância das livrarias dos conventos, nomeadamente da livraria do Colégio dos Jesuítas, e da livraria da Escola Médico-Cirúrgica, no Funchal. Também podemos assinalar algumas bibliotecas privadas de instituições industriais, como a de Hinton, ou de técnicos especializados, como João Higino Ferraz, que tinham necessidade de obras especializadas de âmbito científico e que encomendavam, por interposta pessoa, livros editados em França e Inglaterra. Mas, na segunda metade do séc. XIX, a realidade madeirense começa a mudar, de forma que José Silvestre Ribeiro refere as livrarias do Paço Episcopal, dos conventos, do Seminário e da Câmara. Ademais, a tradição dos clubes privados e das associações conduziu à valorização da leitura com a disponibilização de livros. Assinale-se o Clube Inglês, onde se anuncia, com muita pompa, a disponibilidade de uma sala de leitura que vinha colmatar as necessidades de lazer dos súbditos britânicos de passagem. Note-se que os Ingleses insistiam nas carências culturais da cidade funchalense, apontando a falta de teatro, cafés e livrarias, como sucede com Emiline Stuart Wortley, em 1854. A venda de livros na Madeira parece ter começado através do comércio a retalho em lojas, mercearias e bazares, onde se vendia tudo. O comércio por miúdo de produtos em lojas especializadas é uma realidade do séc. XX. Mais tarde, vamos encontrar a venda de livros associada às tipografias em geral, às tipografias especializadas e à publicação de jornais, através de anúncios que publicitavam os locais de assinatura das publicações que apareciam em fascículos, a saber, algumas lojas de referência na cidade, que tinham representações das editoras de Lisboa. Em 1850, John Driver estranha a ausência de livrarias no Funchal, afirmando: “There is no literature – no bookseller's shop – on the whole Island; although a few books may be had in other shops, but very few [Não há literatura – não há nenhuma livraria – em toda a Ilha; embora se possa comprar um ou outro livro noutras lojas, mas muito poucos]” (DRIVER, 1850, 381-382). Dennis Embleton confirma esta ausência de livrarias e conclui: “The want of booksellers' shops is a sure sign of the backwardness of education among the people, and it is a great inconvenience to visitors [A ausência de livrarias é um sinal evidente do atraso educativo do povo, e um grande inconveniente para os visitantes]” (EMBLETON, 1862, 36). Em 1868, Gomes Leal esteve no Funchal e, numa das suas missivas, referiu uma biblioteca na Madeira “que o deixou atónito. Era muito cheia de livros de Jesuítas e, entre eles, um Dicionário Universal composto de 200 volumes. É a coisa mais curiosa que tenho visto” (NEPOMUCENO, 2008, 41). Ainda na mesma data, vemos António Nobre dizer que, na sua viagem para a Ilha, ia carregado de livros: “levo livros, muitos livros e o ‘Regresso’ para o completar: desta vez sempre irá” (NEPOMUCENO, 2008, 50). Em 1885, a situação persiste, afirmando J. Y. Johnson que: “A private library is a thing unheard of, and there is not a Portuguese bookseller's shop on the island. Some of the shopkeepers, it is true, keep books on their shelves, hut they are very few in number and chiefly works of religious devotion [Não há bibliotecas particulares, nem existe uma livraria portuguesa na Ilha. É verdade que algumas lojas vendem livros, mas são muito poucos e são essencialmente obras de devoção]” (JOHNSON, 1885, 55). Por tradição, se os leitores da Ilha não importassem os livros do continente e do estrangeiro, tinham de se sujeitar ao regime de assinaturas, que operava apenas com as publicações mais vulgarizadas. Em 1882, O Crime de Alberto Didot, por exemplo, poderia ser comprado mediante assinatura, que poderia ser feita no Funchal, nas lojas Nova Minerva, Camacho & Irs. e Camisaria Central. Já a assinatura da História de Portugal de Manuel Pinheiro Chagas poderia ser feita diretamente no jornal que publicava o respetivo anúncio. No entanto, em 1877, o Diário de Noticias refere que o Bazar Camacho e Irs. já vende livros e que a Casa Camacho e Carregal tem disponível o Almanach das Senhoras para o ano de 1878. As razões que explicam o facto de o livro ser um produto pouco comum na sociedade madeirense e de ser rara a sua venda em lojas são o elevado custo das publicações e o problema do analfabetismo, que chegou, em parte, ao séc. XXI. A paulatina vulgarização do ensino levou à necessidade de livros escolares e abriu caminho para um potencial de leitores. Assim, em 1889, a Gramática de Língua Portuguesa de João de Nóbrega Soares, que apresentava maior procura, vendia-se em diversos estabelecimentos no Funchal. Já o livro de J. C. Faria, O Archipelago da Madeira, tinha um depósito geral na casa Dilley no Funchal. A déc. de 80 do séc. XIX, marca, portanto, uma mudança de atitude em relação à venda dos livros. As publicações que eram vendidas, quase sempre através de anúncio de jornal, passam a dispor de livrarias e de vários estabelecimentos de depósito de livros. O Funchal passa a ter uma loja especializada para a sua venda. Surge, assim, em 1886, a Livraria e Tipografia Esperança, que perdurou como espaço exclusivo para a venda de livros. Em 1914, esta livraria com projeção nacional mudou-se para a R. da Alfândega e, em 1938, para a R. dos Ferreiros. Em 1973, instala-se definitivamente no número 119 da R. dos Ferreiros, com um stock de 12.000 livros diferentes. Em 1991, a continuidade da livraria foi assegurada com a criação da Fundação Livraria Esperança, Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) declarada como sendo de utilidade pública. Passados cinco anos, ampliou-se o espaço de exposição com a aquisição de um prédio que serve de anexo, com uma área de 1200 m2 e mais de 96.000 livros expostos. A partir do séc. XX, começam a surgir novas livrarias, o que quer dizer que o livro, como produto de venda, tem cada vez mais clientes. Assim, em 1906, temos a livraria Funchalense e, em 1907, a livraria Escolar de Polonia & C.ª. O Almanac Madeirense para 1909 apresenta publicidade ao Bureau de la Presse de J. M. da Rosa e Silva, um quiosque da época sito à Pç. da Constituição, onde se vendia: “livros Nacionais e estrangeiros aos preços das casas editoras – sempre as últimas novidades literárias!” (Almanac de Lembranças Madeirense para 1909, 1908). Em 1910, o Roteiro do Funchal de A. Trigo apresenta as seguintes papelarias e livrarias: Antonio d’Andrade, R. dos Ferreiros, 24 e 26; Bazar do Povo, R. do Bettencourt, 1 a 21; Coelho, Irs., Lg. da Sé, 4; livraria Escolar, R. Camara Pestana, 14; livraria Funchalense, R. do Bispo, 25 a 35; Loja Dilley, R. do Aljube, 13 e 15; Minerva Phenix, R. do Príncipe, 53; Nova Minerva, R. da Alfandega, 45. Já o almanaque ilustrado de 1913 refere em anúncio a livraria Popular de José Eduardo Fernandes na R. de João Tavira, que vende “grande variedade de quinquilharias, vidros, objetos para escritório, livros de estudo e objetos de culto religioso” (1913 – Almanach Ilustrado do Diário da Madeira, 1912). Mesmo assim, Charles Thomas-Stanford, no mesmo ano, fica com a imagem de uma terra que não é de amantes de livros, pela sua raridade: “Book-lovers will deplore the booklessness of the town – which does not boast a bookseller of any sort [Os amantes dos livros não deixarão de lamentar que se trate de uma cidade sem livros – uma cidade onde não existe uma única livraria]” (THOMAS-STANFORD, 1910, 201). No séc. XXI, o Funchal, para além destas livrarias, dispunha de outras com menor dimensão, sendo de destacar as livrarias Bertand, FNAC e Worten. Todavia, devemos salientar que o conceito de livraria corre o perigo de se perder com a assimilação por parte dos espaços de venda de produtos variados, como é o caso da livraria FNAC, que está incorporada numa loja de artigos eletrónicos e eletrodomésticos, e das livrarias dos supermercados, nomeadamente da marca Continente e Pingo Doce. O Funchal contava ainda com a Fundação Livraria Esperança, a Julber papelaria e livraria Lda, a Leya SA, e a livraria Papel e Caneta. Por tradição, as lojas especializadas em serviço de papelaria, como a livraria Figueira, a papelaria Condessa, a papelaria do Colégio e o Bazar do Povo, tinham serviço de venda de livros. A livraria Figueira viria a desaparecer. A papelaria Condessa e o Bazar do Povo cessariam o serviço de venda de livros. Apenas a papelaria do Colégio manteria uma diminuta secção de livros Por outro lado, as instituições oficiais dispõem de expositores e de serviço de vendas de publicações tanto num regime material como num virtual, pela Internet. Assim, a Direção Regional de Cultura apresenta, na R. dos Ferreiros, os livros publicados pela extinta DRAC e pelo Arquivo Regional da Madeira; já o Centro de Estudos de História do Atlântico tem, na R. das Mercês, um expositor e serviço de vendas. Também a Câmara Municipal do Funchal apresenta, no átrio do Teatro Municipal, o seu Serviço de Publicações. Com orientação definida em termos das publicações, deveremos referir a Paulinas Multimédia, que existe no Funchal. Esta livraria dedica-se a publicações de carácter religioso. Podemos referir ainda a livraria Inglesa, que funcionava em diminuto espaço do Pateo Photographia Vicentes e que tinha um serviço especializado de venda de publicações em inglês. Num âmbito especializado da banda desenhada, merece, por fim, referência a livraria Quinta Dimensão, criada em setembro de 2004, que se transformou num polo de divulgação de banda desenhada. Ainda no âmbito do mercado livreiro, não podemos esquecer a realização dos festivais literários e das feiras do livro, organizadas, desde 1975, pela Câmara Municipal do Funchal, que sempre foram um espaço de divulgação e de contacto do público com o livro.     Alberto Vieira (atualizado a 14.12.2017)  

História da Educação Literatura Sociedade e Comunicação Social Madeira Cultural

grupo de folclore da casa do povo de gaula

O Grupo de Folclore da Casa do Povo de Gaula foi fundado a 16 de setembro de 1978 e tem por objetivo principal divulgar e preservar as tradições da sua terra, através das danças, dos cantares, dos trajes, da reconstituição de costumes e de atividades culturais. Conta com uma intensa atividade, com atuações diversas em festas tradicionais, arraiais e vários eventos culturais, e com a participação em festivais e encontros de folclore. Dos seus registos musicais fazem parte a edição de dois CD (2009 e 2015) e a participação, com o tema “Chama-Rita de Gaula”, no DVD O Melhor do Folclore da Madeira (2014). Palavras-chave: folclore; trajes; música; dança; tradições populares.   O Grupo de Folclore da Casa do Povo de Gaula foi fundado a 16 de setembro de 1978, por alturas da festa de N.ª Sr.ª da Luz, padroeira da freguesia de Gaula. A iniciativa de formar um grupo de folclore partiu de um conjunto de jovens, com o apoio do P.e Alfredo Aires de Freitas. Chamava-se “Grupo de Folclore de Gaula”. Em 1987, passa a denominar-se “Grupo de Folclore da Casa do Povo de Gaula”, ao integrar a Casa do Povo de Gaula, recentemente constituída. De 1987 até 2013, o Grupo foi dirigido por M.a de Fátima Vieira Quintal, substituída depois por Manuel Sena, que assume a liderança em 2014. Na sua formação inicial, contava com cerca de 25 elementos, número que foi aumentando ao longo dos anos, até chegar a cerca de 40 elementos em fevereiro de 2016. As suas idades variam entre os 4 e os 64 anos, predominando a faixa etária dos 15 aos 30 anos. O Grupo de Folclore da Casa do Povo de Gaula tem como principal objetivo divulgar e preservar as tradições locais, através das danças, dos cantares, dos trajes e da reconstituição de costumes. Gaula é uma freguesia pertencente ao concelho de Santa Cruz e foi fundada a 13 de setembro de 1509. Supõe-se que a origem do seu nome possa estar associada às novelas de cavalaria que têm como protagonista a figura de Amadis de Gaula. Gaula é conhecida por ser a freguesia dos adelos e das amoras. Antigamente, existiam muitos homens, conhecidos por “adelos”, que se dedicavam ao comércio ambulante, vendendo a crédito pelas freguesias da Madeira, e que eram provenientes de Gaula. Os adelos vendiam, principalmente, tecidos (a metro), mercadoria que já se comercializava na Ilha nos princípios do séc. XVII. Eram tidos como homens bem-educados, bem-falantes e bem vestidos. O seu traje típico é constituído por camisa branca, casaco e chapéu escuros e botas chãs. Além da figura do adelo, característica da freguesia, o Grupo Folclórico da Casa do Povo de Gaula procura representar, na sua indumentária, a variedade cultural típica da sua terra, e testemunhar a vivência dos seus antigos habitantes. Assim, apresenta o “traje de trabalho”, o “traje de cote” (quotidiano), o “traje de romaria” e o “traje domingueiro”, em uso desde o séc. XVIII até princípios do séc. XX, algo que resulta de investigações em livros e gravuras e de recolhas orais junto dos residentes mais idosos da localidade. No traje feminino, sobressaem as saias compridas, listadas ou de cor única. As saias listadas apresentam várias cores: fundo vermelho, com listas de cor verde, amarela e azul (o típico padrão madeirense); verde e branca; castanha e laranja; preta e branca; branca e castanha. As saias compridas de cor única apresentam também cores variadas, podendo ser de tonalidade castanha, vermelha, cor de vinho, branca, rosa, amarela ou ainda preta. Algumas saias lisas têm um ornamento de outra cor na roda, como a saia de cor castanha, debruada a vermelho, ou a saia vermelha, com um apontamento branco. As saias compridas, listadas ou de cor única, são acompanhadas por blusas brancas, abotoadas à frente, junto ao pescoço, com botões dourados, e por coletes, vermelhos ou pretos, bordados. Alguns elementos femininos usam uma capa, que pode ser vermelha, preta ou amarela. A indumentária complementa-se com um ornamento para a cabeça, a carapuça feita em lã, de cor azul, forrada a vermelho, ou vermelha, debruada a azul. Algumas mulheres também usam um lenço branco, por baixo da carapuça, designado popularmente por “cobre nuca” ou “toalha de cabeça”, sendo este o acessório que diferenciava as casadas das solteiras. Os trajes femininos mais simples são compostos de saias compridas de cor única, acompanhadas de blusas com motivos florais e um lenço na cabeça. No traje masculino, imperam as cores escuras ou o branco (em fatos de linho ou de seriguilha). Os homens vestem: calças pretas e colete preto; calção e colete preto; calças brancas e colete preto ou casaco preto; e ainda calção branco largo, com franzido sobre o joelho. A indumentária masculina completa-se com camisa branca em todas as variantes do traje. Na cabeça, os homens usam carapuça azul, chapéu preto ou barrete de orelhas feito com lã de ovelha. Homens e mulheres usam a tradicional bota chã, confecionada com pele de cabra e sola em pele de vaca, nos modelos masculino e feminino (com uma tira vermelha à volta do cano, no caso das mulheres). Como adereços, o grupo ostenta um cesto de bordado, uma cesta de almoço, um garrafão de cinco litros, uma banheira da lavadeira, um aguador e uma foice. A atividade do Grupo Folclórico da Casa do Povo de Gaula tem sido profícua e variada. Na Madeira, regista-se a sua presença em arraiais e em festas tradicionais e religiosas, como nos cantares dos Reis, nas visitas do Espírito Santo, nas missas do parto, nos cantares de Natal, nas festas de Santo Amaro, em Santa Cruz, e nas festas de Natal e fim de ano, no Funchal. Tem participado em diversos eventos culturais realizados na Ilha, como a Festa da Castanha e o Arraial da Ginja, no Curral das Freiras, a Feira das Sopas do Campo, em Boaventura, a Festa da Cebola, no Caniço, a Expo Madeira, no Funchal, entre muitas outras comemorações e festas populares. O Grupo conta também com atuações em unidades hoteleiras e em restaurantes madeirenses, onde usa, sobretudo, o traje típico madeirense, mais conhecido pelo turista. A participação em festivais e encontros de folclore, regionais e nacionais, tem sido uma constante na dinâmica do Grupo, proporcionando-se intercâmbios culturais com outros agrupamentos de folclore e etnográficos. Na Madeira, além da presença regular no Festival Regional de Folclore, destaca-se, em agosto de 2004, a atuação na IV Gala Internacional de Etnografia e Folclore Manuel Ferreira Pio, realizada no Monte, Funchal, que contou também com a participação de grupos de fora da Ilha, v.g., o Grupo Amigos de Punta Rasca (Canárias) e o Grupo Dr. Gonçalo Sampaio (Braga). No âmbito nacional, destacam-se as suas representações em intercâmbios culturais, com os seguintes grupos: Grupo Folclórico e Etnográfico de Fermentelos, em Aveiro (1995 e 2001); Rancho Folclórico “Podas e Vindimas”, em Arruda dos Vinhos (1996); Rancho Folclórico “Os Rurais”, de Água Derramada, no concelho de Grândola, distrito de Setúbal (1997); Grupo Folclórico e Etnográfico de Corredoura, em Guimarães (1998); Grupo de Folclore da Relva, em São Miguel, Açores (1999); e Grupo Folclórico de Fajarda, em Santarém (2002). O Grupo Folclórico da Casa do Povo de Gaula, em colaboração com iniciativas da Junta de Freguesia de Gaula, recriou antigas tradições da freguesia, e.g., em 2011, a representação “Levar Comer aos Hômes”, uma tarefa do quotidiano de Gaula, dos anos 50 e 60 do séc. XX, e, em 2013, a “Reconstituição Histórica de Lavar Roupa nos Lavadouros dos Anos 60 do Século XX”, ambas integradas nas festas da freguesia de Gaula. Do seu repertório musical fazem parte bailados e canções recolhidos na localidade – destacando-se o “Chama-Rita de Gaula”, um dos bailados mais antigos da freguesia, executado em roda, e que apresenta características mouriscas –, bem como temas comuns à ilha da Madeira. Os instrumentos musicais do Grupo incluem os cordofones tradicionais madeirenses (viola de arame, braguinha e rajão), tréculas, ferrinhos, brinquinho, bombo, reco-reco, pandeireta, violino e acordeão. Em 2009, contribuíram para o engrandecimento do acervo musical do folclore madeirense, com a edição do seu primeiro CD, composto de 14 peças musicais, nomeadamente “Brinco de Oito”, “ABC do Amor”, “Chama-Rita”, “Pum-pum, Dá-lhe, Dá-lhe”, “Cantiga dos Reis”, “Bate Viradinho ao Chão”, “Mourisca”, “Os Dez Mandamentos”, “Homenagem ao Sr. Marino Marujo (Mourisca)”, “O Paspalhão”, “Dona Alberta”, “Menina Que Sabe Ler”, “Vamos Saltar ao Pau” e “Minha Terra é a Madeira”. Em setembro de 2015, lançaram o segundo CD (no âmbito das comemorações do seu 37.º aniversário e do arraial de N.ª Sr.ª da Luz), composto de 14 temas, alguns dos quais já editados no primeiro. A título coletivo participam, em 2014, com o tema “Chama-Rita de Gaula”, no DVD O Melhor do Folclore da Madeira, um projeto da Secretaria Regional da Cultura, Turismo e Transportes, que juntou 14 grupos folclóricos madeirenses.   Sílvia Gomes (atualizado a 13.12.2017)

Cultura e Tradições Populares Sociedade e Comunicação Social Madeira Cultural

aragão, antónio

António Aragão Natural de São Vicente, na ilha da Madeira, António Aragão foi uma figura cultural multifacetada do séc. xx. A poesia terá sido a sua área de eleição, mas fez igualmente experiências no âmbito da narrativa e do texto dramático. Também se dedicou a outros planos de intervenção e de estudo, e.g.: a formação do Cine Clube do Funchal para a visualização de cinema cultural. Dirigiu duas instituições madeirenses de relevo: o Museu da Quinta das Cruzes e o Arquivo Distrital da Madeira. Palavras-chave: António Aragão; historiador; promotor cultural; artista; escritor; escrita experimental. Existem algumas fotografias a preto e branco de António Aragão, no n.º 28 da revista Margem, que lhe é dedicado. Nelas, sobressai uma figura de pequena estatura e de porte cuidado, vestida com um casaco de fazenda e tendo a cabeça coberta com uma boina ou boné de cor preta. Na cara barbeada repousam uns óculos de vista (ou de sol) de aros escuros e grossos, não muito grandes, que estavam bastante em moda na déc. de 60 do séc. XX. Aqueles recobrem-lhe o pequeno rosto e possibilitam o seu reconhecimento: dão-lhe a marca da intelectualidade que o diferenciou. Praticamente todas as fotografias se reportam à fase de maturidade da sua vida, englobando, sensivelmente, o período da déc. de 60 à de 90 do séc. XX. Este retrato caricatural não permite adivinhar a sua genialidade criativa, revelada nas múltiplas classificações que lhe foram atribuídas. Através do índice da revista Margem referida, fica sem se saber se foi promotor patrimonial da comunidade local (ou melhor, regional), historiador, arqueólogo, poeta, ficcionista, dramaturgo, criador experimentalista, pintor, escultor, desenhista, cinéfilo, ou, simplesmente, um intelectual interessado em preservar o passado aberto à novidade do futuro, na vivência do seu tempo presente. Além de possuir outros epítetos, não se resumirá a nenhum deles, porque será a soma de todos. A personalidade de António Aragão recorda os artistas renascentistas, devido à sua insaciedade de saber e de inventar; era uma pessoa curiosa, nutrindo vários interesses. O acervo que foi constituindo, e que algumas entidades públicas, além de outras privadas, tentam adquirir, revela esta pluralidade de interesses e a sua curiosidade pela diversidade cultural. As balizas temporais, medidas entre o nascimento a 22 de setembro de 1921, em São Vicente, na ilha da Madeira, e o falecimento a 11 de agosto de 2008, no Funchal, indicam que António Manuel de Sousa Aragão Mendes Correia viveu quase 87 anos; fá-los-ia no mês seguinte à sua morte, depois de uma fase de doença prolongada. Embora haja uma biografia divulgada e reiterada, seria preciso observar muitos detalhes para compreender inteiramente este homem do séc. XX, amante do passado e do futuro, e para evidenciar a sua faceta artística: foi escritor, poeta, pintor, escultor e também historiador e investigador. De facto, António Aragão destacou-se como um importante vulto da cultura portuguesa, não só pela sua vasta formação académica como pela sua criatividade na cultura e na arte, o que lhe permitiu vencer as barreiras da insularidade e afirmar-se nos meios académicos e culturais nacionais e europeus. O seu carácter irrequieto e polémico afastou-o do conformismo criativo. Era assim na investigação histórica, na etnografia, na pintura, na escultura e na arte da palavra. Além de todas as suas potencialidades e capacidades, também possuía uma grande paixão pelo cinema. Aliás, em 1955, contribuiu para a formação do Cine Clube do Funchal, a fim de possibilitar a visualização de obras de cinema alternativas às classificadas como comerciais. Da sua vida pessoal, poucas informações são divulgadas nas biografias existentes. Provavelmente por vontade própria, intentou separar a sua vida privada da sua vida pública. É sabido que se casou, em Roma, com Estela Teixeira da Fonte, de quem teve um filho, Marcos Aragão Correia, advogado de profissão. Sua irmã, Ruth Aragão de Carvalho, formada em ballet na capital portuguesa, casou-se com o ator Ruy de Carvalho. A nível de formação académica, a vida desafogada dos pais permitiu-lhe ir estudar no Liceu Jaime Moniz, o que poucos jovens ilhéus, sobretudo os nortenhos, podiam almejar. Posteriormente, como acontecia com os setimanistas madeirenses, seguiu para o continente e frequentou a Universidade de Lisboa, instituição onde se licenciou em Ciências Histórico-Filosóficas, fazendo depois uma especialização em Biblioteconomia e Arquivística na Universidade de Coimbra. Estudou ainda etnografia e museologia em Paris, sob a orientação do diretor do Conselho Internacional de Museus da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). Finalmente, dedicou-se ao estudo do Restauro de Arte, em Itália, mais precisamente no Instituto Central de Restauro de Roma, tendo usufruindo de um estágio no Laboratório do Vaticano. Tanto em Paris como em Roma, foi bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG). No âmbito do seu percurso profissional, fruto da diversificada e rica formação que tinha adquirido, desempenhou, no plano regional, alguns cargos importantes, tendo dirigido o Arquivo Distrital da Madeira e o Museu Quinta das Cruzes, e sido delegado dos Museus e Monumentos Nacionais na Madeira, associado à Comissão de Arte e Arqueologia da Câmara Municipal do Funchal. Os lugares por onde passou, no domínio laboral, coadunavam-se perfeitamente com os interesses que nutria, quer quanto à museologia, quer quanto à arquivística e à dimensão histórica da sua formação inicial. Notável é a sua atividade enquanto investigador e arqueólogo, da qual derivou vasta e conhecida obra: Os Pelourinhos da Madeira (o seu primeiro livro, de 1959); O Museu da Quinta das Cruzes (1970); Para a História do Funchal. Pequenos Passos da Sua Memória (1979); A Madeira Vista por Estrangeiros, 1455-1700 (1981); As Armas da Cidade do Funchal no Curso da Sua História (1984); O Espírito do Lugar. A Cidade do Funchal (1992). A partir das escavações arqueológicas por si dirigidas no lugar do aeroporto, onde se situava o Convento quinhentista de N.ª Sr.ª da Piedade (Santa Cruz), foi possível proceder ao levantamento da planta geral do Convento franciscano, ao estudo das suas características tipológicas e à exumação de variado espólio, onde se inclui uma vasta diversidade de padrões de azulejaria hispano-mourisca ou mudéjar, proveniente do Sul de Espanha, bem como múltiplos exemplares de azulejaria portuguesa seiscentista e setecentista, e de elementos primitivos em cantaria lavrada: portais do Convento, janelas, arco triunfal da igreja, condutas de águas, lajes tumulares e pavimentos, que passaram a constar nos jardins da Q.ta do Revoredo, Casa da Cultura de Santa Cruz. É de destacar que todos os trabalhos por ele efetuados se encontram devidamente catalogados e documentados com plantas rigorosas, desenhos e fotografias. Também se deve realçar a ação da Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal, que era então o poder executivo do arquipélago, que encomendou e incentivou este trabalho e que, depois de entregue pelo autor, o depositou em grande parte no Museu Quinta das Cruzes. A par da profissão oficial, foi dando realce à sua faceta de artista, como comprovam as suas ilustrações do livro Canhenhos da Ilha de Horácio Bento de Gouveia. Outro exemplo é a sua poesia espacial OVO/POVO, apresentada, em 1977, na XIV Bienal de São Paulo, tendo tido uma exposição em Lisboa, no ano seguinte, e outra em Coimbra, no decorrer de 1980. Outro exemplo ainda foi a exposição PO.EX. 80, que esteve na Galeria Nacional de Arte Moderna, na capital portuguesa, em 1980 e em 1981. A sua vertente artística culminou em 2007, com uma exposição no Museu de Arte Contemporânea de Serralves, tendo, porém, exposto também na Madeira. Pese embora estas facetas, será sempre lembrado e reconhecido pela sua intervenção na literatura de cariz experimental, nomeadamente pela sua colaboração na organização dos dois números da revista Poesia Experimental (1964, 1966). A este propósito, como afirma Rui Nepomuceno: “Em Portugal, o experimentalismo poético e literário ocorreu em Lisboa nos meados dos anos 60, mais precisamente em 1964, com a publicação da ‘Revista Experimental 1’; muito embora desde os finais de 50 já tivesse começado a germinar, como até podemos verificar ao cotejar os trabalhos literários de António Aragão organizados e divulgados naquele decénio, na Madeira” (NEPOMUCENO, 22 fev. 2010). É curioso verificar que a linguística teve um papel preponderante neste movimento e, consequentemente, em António Aragão, algo que Rui Nepomuceno também sugere: “Deste modo, na teorização deste movimento, passaram a assumir grande importância e estatuto determinante os diversos fatores relacionados com a ‘Linguística Moderna’, a ‘Semiótica’, o ‘Estruturalismo’, e, obviamente, os diversos aspetos da ‘Teoria da Forma e da Informação’, de que foram principais intérpretes e seguidores no estrangeiro Abraham Moles, Saussure, Jakobson e, sobretudo, o muito citado Lévi-Strauss” (NEPOMUCENO, 22 fev. 2010); e esta influência tem reflexos em toda a sua criação literária (com particular incidência na linguagem verbal). Por conseguinte, foi pela dimensão literária e artística que António Aragão ganhou renome. Esta ligação com a linguagem manifestou-se em muitas das peças artísticas de António Aragão numa fase de maturidade da vida artística, já que teve um percurso marcado por diversos períodos. As artes plásticas associaram-se, de certo modo, à sua poesia, que usou a linguagem verbal como matéria de jogo em quadros ou em textos e não com o valor que tinha para os linguistas, algo que era próprio da poesia experimental. É preciso lembrar que, além de artista, foi curador de arte contemporânea e promoveu diversas exposições, inclusive na galeria associada à editora Vala Comum, que possuía em Lisboa. Ele próprio contribuiu muitíssimo para a produção de obras de arte de diversas tipologias. O fascínio pela impressão e pelos recortes, com colagens e montagens originalíssimas, acentuou esta veia artística, mais inovadora, se assim se pode dizer, do que a que concebeu em suportes como tela ou pedra. A sua obra vivenciou diversas fases, algo que foi mais notório na pintura. De um período figurativo inicial, com tendência naturalista, passou para uma vertente expressionista com opção pela abstração, por via de uma geometrização e autonomia do traço. Produziu, além de óleos, algumas aguarelas e, em determinada altura, recorreu à laca como material. Na última fase, concebeu composições a partir de colagens, construindo as suas pinturas essencialmente pela destruição do material-base (e.g., jornais). Os quadros, as gravuras, as esculturas e as outras peças concebidas por António Aragão, enquanto desenhista, pintor e escultor, têm merecido um estudo cuidado por parte de peritos. É o caso de Isabel Santa Clara, que releva três obras emblemáticas do artista: “Da obra pública de António Aragão, na qual o autor opta por uma figuração abstratizante, destacam-se, em 1960, o monumento comemorativo do quinto centenário da morte do infante D. Henrique, paralelepípedo com desenho inciso, no Porto Santo; os relevos da fachada da Escola Industrial, depois Escola Secundária de Francisco Franco; e um painel cerâmico no mercado de Santa Cruz, de 1962” (SANTA CLARA, “Artes plásticas”). Todas as obras foram fortemente marcadas pela época em que foram criadas. Assim, das peças mais conhecidas, destacam-se, primeiro, os painéis de cerâmica da Escola Secundária Francisco Franco, no Funchal, onde sobressaem vultos que laboram. Depois, o colorido painel de cerâmica do mercado da localidade madeirense de Santa Cruz, que comunga da representação das ilustrações que António Aragão fez para o já referido livro Canhenhos de Horácio Bento de Gouveia. A terceira referência escultórica, que ficou localizada no Porto Santo, é designada popularmente por “pau de sabão”, pela analogia da forma que possui o bloco de pedra com uma medida de sabão azul. A rigidez do padrão comemorativo ficará para a eternidade a evocar o momento celebrativo e a criatividade de António Aragão. O padrão diferencia-se bastante dos painéis porque contém detalhes regionais, onde se observam trabalhadores, essencialmente agrícolas, mas também pescadores, quase todos sem rosto, que surgem a desempenhar tarefas do quotidiano, reportando uma vida de trabalho árduo. É de realçar igualmente a imagem de S.ta Ana, em cantaria rija, na Câmara Municipal de Santana, 1959. Desenho de António Aragão. 1944. Foto de Rui A Camacho   Óleo de António Aragão datado de 23 de Julho de 1946. Foto Rui A Camacho Na pintura, desde a déc. de 40 do séc. XX, evidenciou-se em diversas temáticas abordadas e na exploração de técnicas diferenciadas. Realizou exposições em Portugal (Galeria Divulgação, Quadrante, Galeria III, Galeria Diferença, FCG – II Exposição de Pintura Portuguesa) e no estrangeiro, nomeadamente em Espanha (Madrid, Sevilha, Barcelona), México, França (Paris) e Itália (Roma e Turim), encontrando-se representado em coleções particulares e oficiais em vários países, nomeadamente na Fundação Serralves, em Portugal. António Aragão concretizou um projeto artístico contemporâneo baseado em novas tecnologias numa casa que lhe pertenceu, situada na Lapa, em Lisboa. O projeto enquadrava uma associação de educação popular com uma galeria de arte vanguardista, ao qual foi atribuído mecenato pela Secretaria de Estado da Cultura. Antes da doença prolongada de que padeceu até à sua morte, António Aragão, de volta ao Funchal, pintou os seus últimos quadros, que constituíram uma série que intitulou Os Monstros e consistiram numa crítica corrosiva ao que considerava ser a hipocrisia dominante na sociedade. As últimas exposições individuais em vida de António Aragão foram realizadas na Madeira e comissariadas por António Rodrigues. A antepenúltima teve lugar em abril de 1996, na Casa da Cultura de Santa Cruz, e integrou 16 dos seus últimos quadros, bem como uma seleção retrospetiva de 13 trabalhos, em diferentes técnicas, realizados nas décs. de 50 e 60 do séc. XX. A penúltima, Exposição Retrospetiva, teve lugar na Casa da Luz, no Funchal. A última exposição de António Aragão antes da sua morte ocorreu no Museu de Arte Contemporânea da Madeira (Forte de S. Tiago, Funchal). Verifica-se que, por um lado, numa dimensão quase de intervenção social, se interessou por representar o povo, as pessoas, que não valem por si próprias porque não se identificam individualmente, mas configuram grupos profissionais; por outro lado, criou pinturas de paisagens, habitadas ou não, e exemplares de natureza morta. Estas últimas reportam-se, sobretudo, ao período inicial da produção artística, que foi mudando e se foi adaptando aos gostos e às vivências inspiradoras do criador. Em síntese, Isabel Santa Clara descreveu muito bem a versatilidade de António Aragão: “Uma vertente experimentalista sacudiu o panorama artístico de forma peculiar nas décadas de 70 e 80. No centro desta atividade está a multifacetada figura de António Aragão, de inesgotável disponibilidade para com os novos talentos, cujas inquietações e inconformismos lograva canalizar para uma profícua experimentação artística. Ganharam força as práticas de poesia visual e de mail art, potenciadas pelas capacidades técnicas, a acessibilidade, a rapidez e a liberdade de produção de múltiplos da eletrografia. Surgiu assim Filigrama, mail art zine editada entre 1981-1983, revista de folhas soltas, que ia sendo sucessivamente alterada na sua composição e enviada pessoalmente através dos circuitos internacionais da mail art, que passavam muito especialmente pelo Brasil” (SANTA CLARA, 2010, 186); tendo colaborado em diversas manifestações de mail art, divulgou os seus trabalhos em revistas da especialidade. Compreende-se a estreita interligação, assim sintetizada, entre a obra artística e a produção escrita do artista-escritor. António Aragão terá sido, na juventude, um dos poetas da Tertúlia Ritziana, e, em 1946, com cerca de 25 anos, viu o seu conto “Pressentimento” obter um prémio: o 2.º lugar nos Jogos Florais promovidos pelo Ateneu Comercial do Funchal. Em 1952, colaborou com Jorge de Freitas, com Florival dos Passos, com Rogério Correia e com Herberto Helder, entre outros, no caderno de poesia Arquipélago, e, em 1956, foi editor da revista literária Búzio, impressa e publicada a suas expensas, em que colaboraram, além do próprio, Edmundo Bettencourt, Herberto Helder, Eurico de Sousa, Jorge Sumares, José Escada, Esther de Lemos e David Mourão-Ferreira. A sua vasta obra foi publicada essencialmente no Funchal e em Lisboa, uma obra em que se encontram frequentemente textos criados em conjunto com outros autores. Dos seus trabalhos – livros inteiros, revistas ou composições singulares –, tanto de carácter científico como criativo, referenciamos, em seguida, alguns. São vários os seus textos na déc. de 60, designadamente no âmbito da ficção literária, incluindo a poesia e o teatro; participou em ações coletivas e antologias literárias. Em 1962, escreveu o Poema Primeiro; em 1964, o Romance de Iza Morfismo, e também, com Herberto Helder, Cadernos de hoje (uma antologia de poesia experimental); em 1965, colaborou no suplemento especial do Jornal do Fundão sobre poesia concreta com “Visopoemas” e “Ortofonias” (com Ernesto M. de Melo e Castro); em 1966, compôs Hidra I, Folhema 1 e Folhema 2; em 1967, Operação I; em 1968, Mais exactamente P(r)o(bl)emas; em 1969, “Hidra 2”. Na déc. de 70, publicou, para além da já mencionada monografia O Museu da Quinta das Cruzes, Poema Azul e Branco e o romance Um Buraco na Boca, em 1971; também neste ano, participou na Antologia da Novíssima Poesia Portuguesa. Em 1972, dirigiu a edição de Arquivo Histórico da Madeira. Boletim do Arquivo Distrital do Funchal, e, em 1973, colaborou na Antologia da Poesia Concreta em Portugal. Em 1975, publicou Os Bancos antes da Nacionalização; em 1976, colaborou na Antologia da Poesia Visual Europeia; e, em 1979, produziu Antologia da Poesia Portuguesa 1940-1977 e a já referida obra Para a História do Funchal. Pequenos Passos da Sua Memória. Nos anos 80, manteve o ritmo alucinante de escrita e de publicações. Assim, em 1981, apresentou não só o livro A Madeira Vista por Estrangeiros, 1455-1700, como também a peça de teatro Desastre Nu, que ganhou o 2.º prémio do Concurso de Peças de Teatro Inéditas promovido pela Secretaria de Estado da Cultura em 1980. Também neste ano, escreveu Metanemas e tornou-se um dos fundadores de Filigrama. Em 1982, publicou igualmente o opúsculo de carácter panfletário Pátria. Couves. Deus. Etc. e, ainda neste ano, Joyciana (com Alberto Pimenta, Ernesto M. de Melo e Castro e Ana Hatherly). Em 1983, compôs Líricas Portuguesas. Antologia e, no ano seguinte, iniciou as eletrografias: O Elogio da Loura do Ergasmo nu Atlânticu, Céu ou Cara Dente por Dente e Merdade My Son, realizadas em 1984, 1985 e 1987, sendo publicadas em 1990. Em 1984, com Alberto Pimenta, deu à estampa Os 3 Farros. Descida aos Infermos (uma curiosa troca de correspondência entre os dois autores), além de ter publicado As Armas da Cidade do Funchal no Curso da Sua História. Ainda em 1984, numa divulgação em dois discos LP, resultado de trabalhos de investigação no campo etnográfico, ganharam visibilidade as suas recolhas de música tradicional das ilhas da Madeira e do Porto Santo, empreendidas na década anterior com Jorge Valdemar Guerra e com o músico Artur Andrade. Em 1985, fez uma exposição itinerante com Poemografias e, em 1987, apareceu uma nova edição, revista e aumentada, de Para a História do Funchal. Já com mais de 70 anos, ainda manteve alguma produção, tendo sido publicados, em 1992, O Espírito do Lugar. A Cidade do Funchal, anteriormente mencionado, e o livro de contos Textos do Abocalipse, que colocaram várias questões, nomeadamente políticas. Além destes títulos, em 1993, foi reeditado o romance Um Buraco na Boca, que recria de algum modo a linguagem verbal, desafiando as convenções da norma. Escreveu ainda para várias publicações: Comércio do Funchal; Línea Sud, Nápoles; Letras e Artes, Lisboa; Expresso; Colóquio-Artes, FCG, Lisboa; Diário de Notícias, Lisboa; Comércio do Porto; Espaço Arte, Instituto Superior de Artes Plásticas da Madeira; e Diário de Notícias da Madeira. A nível internacional realça-se a sua participação em vários fóruns de natureza cultural e artística: Sevilha, 1980; em 1982, Itália e Brasil; 1983, Cuenca; 1984, Comuna de Milão, Itália; 1984, São Francisco, EUA, e Barcelona; 1985, Israel e Nova Iorque; 1986, México e Sevilha; 1987, México e França; 1989, Itália e Paris; 1990, Siegen, Alemanha, México e Washington; e 1992, Madrid. Em suma, as décs. de 60, de 70 e de 80, destacando-se, decerto, o ano de 1981, foram um período muito fértil, marcando toda a sua carreira. Quando se observa detalhadamente a listagem dos títulos, para se quantificarem as publicações não literárias e as literárias, verifica-se que estas se sobrepõem àquelas. Portanto, foi, indubitavelmente, um escritor insaciável e incansável, sendo-o mais de poesia do que de ficção ou de teatro. Contudo, os seus trabalhos não literários, quase todos dedicados à Madeira e ao Funchal, são referências incontornáveis para quem se dedica às temáticas de que trataram. António Aragão faleceu no Funchal, a 11 de agosto de 2008. A sua família doou ao Arquivo Regional da Madeira, posteriormente Arquivo Regional e Biblioteca Pública Regional da Madeira, grande parte do seu espólio histórico. No entanto, o legado do seu acervo artístico ao país e, particularmente, à Madeira foi reconhecido ainda em vida pela Câmara Municipal do Funchal, que atribuiu o seu nome a uma via citadina. Obras de António Aragão: Os Pelourinhos da Madeira (1959); Poema Primeiro (1962); Romance de Iza Morfismo (1964); Visopoemas (1965); Ortofonias (1965); Hidra I (1966); Folhema 1 (1966); Folhema 2 (1966); Operação I (1967); Mais exactamente P(r)o(bl)emas (1968); Hidra 2 (1969); O Museu da Quinta das Cruzes (1970); Poema Azul e Branco (1971); Um Buraco na Boca (1971); Os Bancos antes da Nacionalização (1975); Antologia da Poesia Portuguesa 1940-1977 (1979); Para a História do Funchal. Pequenos Passos da Sua Memória (1979); Desastre Nu (1981); A Madeira Vista por Estrangeiros (1981); Metanemas (1981); Joyciana (com Alberto Pimenta, Ernesto M. de Melo e Castro e Ana Hatherly) (1982); Pátria. Couves. Deus. Etc. (1982); Líricas Portuguesas. Antologia (1983); Os 3 Farros. Descida aos Infermos (1984); As Armas da Cidade do Funchal no Curso da Sua História (1984); O Elogio da Loura do Ergasmo Nu Atlânticu, Céu ou Cara Dente por Dente (1990); Merdade My Son (1990); O Espírito do Lugar. A Cidade do Funchal (1992); Textos do Abocalipse (1992).   Helena Rebelo Miguel Fonseca (atualizado a 14.07.2017)

Artes e Design Cultura e Tradições Populares História da Arte Património Literatura Madeira Cultural Personalidades

bibliotecas

As primeiras bibliotecas de que temos notícia na Madeira estão intimamente ligadas às instituições de ensino, estando estas, por sua vez, dependentes da religião e Igreja Católicas e situadas em espaços como o da Sé, as grandes igrejas, os conventos, os recolhimentos e determinadas escolas paroquiais. É provável que também existissem bibliotecas em casas nobres, onde assessoravam professores particulares que aí ensinavam. O Seminário Diocesano do Funchal, instituído em 1566, e o Colégio de S. João Evangelista, fundado no Funchal em 1570 pela Companhia de Jesus, que hegemonizou o ensino na Ilha (conhecido depois como o Colégio dos Jesuítas, onde foi instalada a Reitoria da Universidade da Madeira (UMa)), criaram as suas bibliotecas, conforme afirma Alice Mendonça: “Encontramos na Madeira algumas instituições como o Paço Episcopal, a Sé, o Seminário e os vários Conventos do Funchal que possuíam as suas próprias livrarias, dotadas de livreiros e encadernadores e na transição entre os sécs. XVII e XVIII” (MENDONÇA, 2006, 85). Nos primórdios da colonização, as bibliotecas (livrarias) existentes na Madeira estavam incluídas e anexadas ao sistema de ensino e de aprendizagem assegurado pela Igreja, sendo a Companhia de Jesus, através do Colégio dos Jesuítas, a expressão desse domínio. Em 1759, por ordem do marquês de Pombal, são reformadas as ordens religiosas e concretiza-se a expulsão dos Jesuítas, seguindo-se a confiscação dos seus bens, depois integrados na Fazenda Régia. Nesta sequência de factos marcantes da era pombalina, as escolas anexas às ordens religiosas e as que seguiam a doutrina e o método jesuíticos tiveram, paulatinamente, de aderir ao ideário pombalino e iluminista. Refere a mesma autora que, em 1772, ao criar um novo imposto – o Subsídio Literário –, no reino e nas ilhas dos Açores e da Madeira, o marquês de Pombal pretendia atingir o objetivo de anular o poder do ensino dos Jesuítas e transferi-lo para a competência do Estado. O imposto começa a ser cobrado em 1775, financiando as aulas de Ler, de Escrever e de Contar, de Gramática Latina, de Língua Grega, de Retórica e de Filosofia, que, com o devir do tempo, são lecionadas na igreja de São João Evangelista do Colégio do Funchal e, em 1789, passam a acumular com as aulas do Seminário. As cadeiras de Ler, de Escrever e de Contar são também lecionadas em Santa Cruz, São Vicente, Machico, Porto Santo, Calheta, Campanário, Ribeira Brava e Ponta do Sol. As cadeiras mencionadas e lecionadas eram acompanhadas das bibliografias adequadas, tendo as bibliotecas do Colégio dos Jesuítas (com ou sem os Jesuítas), do Seminário e dos conventos existentes assumido papéis determinantes nesse contexto. De acordo com o Elucidário Madeirense, os acervos das bibliotecas (livrarias) dos conventos, extintos por decreto de 28 de maio de 1834, foram incorporados na Biblioteca Municipal do Funchal (BMF) em 1863. A instituição do ensino superior ocorreu na Madeira no séc. XIX, através da antiga Escola Médico-Cirúrgica do Funchal, fundada em 1816 (mas só oficialmente criada em 1836, iniciando atividade no ano seguinte) e encerrada em 1910. Localizada no antigo Colégio dos Jesuítas, a sua biblioteca era rica, constituída por “mais de duas mil obras”, que foram depois transferidas para a BMF (COSTA et al., 1992, 21). O perfil do seu acervo diz respeito à gestão hospitalar, anatomia, farmacologia, cirurgia e mais assuntos relacionados com a saúde, a medicina, as curandices e outros, tendo muitos destes livros sido oferecidos pelo Dr. Nathaniel Lister, médico inglês. Os regimes liberal e republicano deram ênfase à instrução escolar, mas, regra geral, privilegiaram o livro único, pelo que as bibliotecas escolares eram desnecessárias. Em 1819, Joseph Phelps, comerciante de origem britânica que se fixou na Madeira e construiu a firma vinícola Phelps Page & Co., dedicou-se, também, a promover a instrução dos madeirenses, criando a Escola Lancasteriana, com o apoio de sua mulher, Elisabeth Phelps. A Ir. Mary Wilson, que chegou à ilha da Madeira em 1881, como enfermeira de uma doente britânica, dedicou-se posteriormente à catequese das crianças, aos doentes e à educação da juventude, formando, nos finais do séc. XIX e princípios do séc. XX, várias escolas no Porto Santo, no Arco de São Jorge, em Santana, no Santo da Serra, em Machico e em Câmara de Lobos. Em 1838, o médico Robert Kalley dedicou-se ao ensino primário, atividade que manteve durante os 10 anos seguintes. É presumível que estas escolas, cujo método de ensino não se identificava com o método nacional, tivessem beneficiado de pequenos fundos documentais para apoiar a aprendizagem dos alunos. O Elucidário Madeirense refere a existência da Biblioteca do Seminário Episcopal, cujo acervo era constituído por obras de Teologia, originárias na sua maior parte, a partir de 1788, do então recém-extinto Colégio dos Jesuítas. As bibliotecas escolares As bibliotecas escolares do séc. XX foram o espelho da realidade do ensino e da aprendizagem no país. Numa escola que privilegiava a memória, em que o professor omnipotente e enciclopédico debitava as aulas e os alunos escreviam os apontamentos/palavras ditas pelo professor, as bibliotecas escolares não faziam grande sentido, constituindo o livro único, os apontamentos e as sebentas o acervo destas. E se nalgumas escolas existiam bibliotecas, estas eram o elo mais fraco da gestão escolar, uma vez que beneficiavam de um espaço inadequado, ficando, regra geral, ancoradas num vão de escada ou numa sala imprópria e exígua, sem pessoal adequado; raramente possuíam máquina fotocopiadora (os alunos utilizavam a máquina fotocopiadora de outros serviços) e o professor responsável pela biblioteca era, regra geral, um professor que sofria de problemas de saúde (não podia ouvir ruídos nem levantar-se, porque as maleitas da doença não o permitiam). Aos alunos, era-lhes exigido somente que reproduzissem as ideias, os conceitos e o saber do professor. Existia uma correspondência entre o ensino, o sector empresarial e o funcionalismo público, em que a linha de montagem não exigia inovação e criatividade. Neste contexto, não fazia sentido o Estado empenhar-se e investir nas bibliotecas escolares e voltadas para a cidadania, tanto mais que a Fundação Calouste Gulbenkian desempenhava o papel de Ministério da Cultura, e antes dela as bibliotecas conventuais e dos seminários, como já referido, cumpriam a função da promoção do livro, da leitura e do conhecimento. Com a instauração do regime democrático, em 1974, e com a conquista da autonomia regional, em 1976, o ensino e a aprendizagem abrem-se a novas teorias e novos modelos já praticados na maioria dos países europeus e noutros cantos do mundo. Refiram-se alguns momentos mais relevantes deste processo, como o novo quadro legislativo sobre o ensino, assente na lei n.º 46/86 – Lei de Bases do Sistema Educativo, em que a biblioteca escolar passa a preencher um espaço central, com valor, ocupando o segundo lugar no capítulo dos recursos educativos. Outros diplomas se lhe seguem, e, em 2005, a nova versão consolidada, a lei n.º 49/2005, de 30 de agosto, mantém a mesma posição das bibliotecas escolares como recursos educativos privilegiados, a exigirem especial atenção. Associam-se-lhes o Manifesto da Biblioteca Escolar, de 1999, atualizado sucessivamente, e as Directrizes para Bibliotecas Escolares, de 2006, documentos publicados pela IFLA/UNESCO, com o primeiro a definir a biblioteca escolar como um recurso que fornece informação, permite a construção do conhecimento e desenvolve nos alunos competências que servirão para a aprendizagem ao longo da vida e da cidadania. Para além destes, existem diversos documentos vinculativos internacionais e nacionais, bem como inúmeras instituições, que se dedicam à investigação e ao estudo da nova biblioteca escolar, considerando-a importante para que crianças, os jovens e os adolescentes desenvolvam o gosto pela leitura e a imaginação. Em Portugal, a Rede de Bibliotecas Escolares (RBE), lançada em 1996, e o Plano Nacional de Leitura são, igualmente, projetos que devem ser considerados relevantes. Com a introdução destas novas medidas, a realidade do ensino altera-se radicalmente: o professor passa a ser considerado um agente educativo com novas competências (orientador, professor, investigador, monitor) e o aluno um agente ativo que, mantendo a função memória, procura também outras competências (aprender, comunicar, conhecer, partilhar, ser), recorrendo, para o efeito, a informação na biblioteca, nas mediatecas escolares e nas bases de dados que correm nas redes virtuais. As bibliotecas escolares passam, assim, a ser o coração da escola, um “direito irrenunciável” (ITURBE, 1998, 11), sendo através delas que a informação de apoio ao ensino corre transversalmente na escola. A literatura e os projetos curriculares e educativos valorizam o papel do professor bibliotecário e do bibliotecário escolar, que, em conjunto, orientam o aluno no processo de pesquisa da informação e na metodologia a aplicar nos seus trabalhos individuais ou em grupo, anulando o “aluno Wikipédia”. A informação e o conhecimento passam a ser as máquinas inorgânicas e imateriais que vieram substituir as máquinas da linha de montagem. Nasce o aluno e o trabalhador do conhecimento. Tal como refere Jean Piaget, o conhecimento não é estático, é construído através de um processo que está sempre em devir. Lev Vygotsky defende que os alunos constroem o conhecimento individualmente e em simultâneo com os outros. A educação deixa de ser monocultural e linear e privilegia a educação intercultural. Jürgen Habermas propõe a razão crítica, argumentativa, reflexiva, prática e teórica, em lugar da razão acrítica e estática. Esta literatura e legislação simbolizam uma visão pró-ativa e regeneradora para a biblioteca escolar, que colabora na nova aprendizagem, centrada no aluno, sendo para ele que tudo e todos convergem. A Região Autónoma da Madeira (RAM) formou os seus assistentes especialistas no âmbito das bibliotecas, e em 2006/2007 foi criada na UMa a pós-graduação em Ciências Documentais (Arquivo, Biblioteca e Documentação), com o intuito de formar o número suficiente de bibliotecários para garantir a modernização das suas bibliotecas. De entre as inúmeras bibliotecas escolares da Região (veja-se o portal da Biblioteca Pública Regional da Madeira (BPRM), o Órgão Coordenador do Programa da RBE na RAM, e o portal da Secretaria Regional da Educação e Recursos Humanos (SRERH)), salientam-se duas, pré e pós-autonomia: a do então Liceu Jaime Moniz e a da Escola Industrial e Comercial do Funchal. A Biblioteca da Escola Secundária Jaime Moniz O antigo Liceu do Funchal data originalmente de 12 de setembro de 1837, tendo dado origem, em 1919, ao Liceu Jaime Moniz. Mudou diversas vezes de instalações, mas o edifício onde existia no começo do séc. xxi foi inaugurado a 28 de maio de 1946 e compreendia a biblioteca escolar, sendo, portanto, uma construção do Estado Novo. Em 1980, passa a designar-se Escola Secundária Jaime Moniz. A biblioteca da Escola Jaime Moniz situa-se no 3.º andar da Escola Secundária Jaime Moniz. Foi herdeira do espólio do Liceu do Funchal, que incluía o livro antigo e deu origem ao Fundo Antigo, composto por um total de 632 monografias, de que se destaca uma obra de Ovídio datada de 1725 e intitulada Metamorphoseon Libri XV: Expurgati. O acervo da biblioteca do antigo Liceu constitui um espólio que caracterizou o ensino no arquipélago e as interações sociais e culturais relevantes durante os sécs. XIX e XX, tendo sido, por razões de conservação, colocado à guarda da BPRM, através de um protocolo celebrado entre as duas instituições. Com o advento das tecnologias da informação e comunicação (TIC), a biblioteca modernizou-se, aderindo ao programa PORBASE (Base Nacional de Dados Bibliográficos) e beneficiando das redes computacionais para acesso à Internet. Em 2015, encontravam-se registados 37.867 títulos na base de dados, e estavam referenciados 55.478 nos livros de registos da biblioteca, havendo ainda espólio por indexar. A biblioteca integrava também uma hemeroteca e uma coleção de jornais. Continuamente enriquecida com a doação de livros por parte dos professores, destacavam-se as doações efetuadas pelos familiares da Dr.ª Margarina Morna e do Dr. Jorge Pestana, antigos professores da escola, que contribuíram para o enriquecimento da biblioteca. Quer o fundo antigo, quer o fundo geral podem ser consultados no site da BPRM. O universo de utilizadores da biblioteca é constituído por alunos, professores e funcionários da escola, investigadores e alunos do ensino secundário em geral, que têm ao seu dispor vários serviços. Assim, nas primeiras décs. do séc. XXI, para além da consulta e do empréstimo de livros, a biblioteca facultava apoio pedagógico aos alunos na realização de trabalhos de pesquisa, promovia concursos nos âmbitos da leitura e da escrita, com a colaboração da BPRM e de outras entidades, e organizava conferências. Promovia ainda outros momentos de aprendizagem, com a colaboração de professores e alunos, sobre conteúdos programáticos e realizava exposições variadas e outras atividades ligadas ao quotidiano escolar. Os recursos humanos eram todos qualificados e a coordenação da biblioteca era da responsabilidade de professores. A Biblioteca da Escola Secundária de Francisco Franco A Escola Secundária de Francisco Franco foi construída em 1958, sendo então denominada Escola Industrial e Comercial do Funchal. É uma construção do Estado Novo, pelo que a sua arquitetura obedece ao ideário político e educativo desse período. A 11 de janeiro de 1979, o Governo Regional da Madeira (GRM) decreta que a escola deverá ter como patrono uma figura ilustre da região, passando a chamar-se Escola Secundária de Francisco Franco, em homenagem ao escultor madeirense. Construída igualmente em 1958, a ampla biblioteca desta escola tinha, em 2015, um acervo de cerca de 12.000 unidades documentais, 700 revistas e 600 unidades de material não livro (MNL) (DVD, CD áudio e CD-ROM), cujo perfil estava virado para o apoio ao ensino e à aprendizagem. A Sala Dr. Vasco Mendes, criada em homenagem à memória desse antigo professor da escola, valorizou o acervo e as atividades letivas: as obras aqui expostas constituem o espólio do antigo docente e da sua família, que, através da filha, Maria da Luz S. Pereira Mendes, doou este acervo à biblioteca. A escola não se alheou do paradigma informático, que favoreceu naturalmente a biblioteca, permitindo a coabitação dos dois ambientes: o clássico e o neomoderno. Contava com uma ampla sala de leitura, uma videoteca, uma mediateca, uma ludoteca e um polo cultural, onde se realizavam diversas atividades, dentre as quais se destacavam o espaço de leitura, recitais de poesia, debates e encontros culturais. Aqui, os professores podiam também lecionar as suas aulas, uma vez que se tratava de um espaço integrado na biblioteca, beneficiando da utilização de fontes impressas e eletrónicas. De acordo com as normas gerais de utilização, os alunos podiam realizar as seguintes atividades: pesquisar em documento livro (papel) ou documento virtual (Internet); estudar; fotocopiar documentos consultados; requisitar livros para leitura domiciliária; ler a imprensa diária regional; consultar revistas de especialidade; digitalizar documentos; visionar filmes e jogar. Para o tratamento técnico da informação, a Classificação Decimal Universal (CDU) era o único instrumento utilizado para o sistema de cotagem, permitindo distribuir o acervo em regime misto no acesso às estantes. Esta era a única biblioteca escolar que, em 2015, tinha no seu quadro de pessoal não docente um técnico superior com formação pós-graduada na área das ciências documentais, três assistentes técnicos com formação no âmbito de biblioteca e documentação, e dois professores coordenadores. A informação corria transversalmente na escola através do seu site oficial. Restantes bibliotecas escolares: pós-autonomia Segundo informação proveniente da SREHR, entre 2012 e 2013 existiam na RAM os seguintes totais de estabelecimentos de ensino, distribuídos pelos níveis de escolaridade em vigor: no ensino público, 142, e no ensino privado, 65. A maioria destes estabelecimentos de ensino foi construída depois de 1976. Sobre estes, pode afirmar-se o seguinte, para o período indicado: 1) Todas as escolas do ensino público dos 2.º e 3.º ciclos e secundárias, sem exceção, beneficiavam de bibliotecas escolares; 2) Todas as escolas do ensino básico do 1.º ciclo, as creches, os estabelecimentos de ensino pré-escolar e os infantários possuíam uma sala (se não no próprio espaço, pelo menos em espaço anexo), que dava origem à ludoteca, com materiais diversos que contribuíam para desenvolver e compreender a leitura, a imaginação e o desenvolvimento de competências cognitivas das crianças e dos jovens, com atividades que iam desde a promoção da leitura à realização de trabalhos lúdicos e manuais, nomeadamente palestras com o apoio de um animador de biblioteca, que assegurava entre duas a três horas de atividades semanais com todas as turmas da escola. Este cenário era semelhante ao ensino particular. No entanto, não se tratava, tecnicamente, de bibliotecas, dado que não estavam organizadas de acordo com os princípios das ciências documentais e tecnológicas; 3) Os estabelecimentos de ensino beneficiavam de rede computacional, que se estendia à biblioteca escolar ou aos espaços anexos; 4) As bibliotecas escolares, tecnicamente assumidas como bibliotecas, beneficiavam de pessoal qualificado no domínio das ciências documentais; eram geridas por uma equipa de professores coordenadores, que faziam interagir o programa da biblioteca com os curricula. Baú de Leitura O Baú de Leitura foi um projeto escolar implementado na RAM em 2001, cujo objetivo principal era promover hábitos de leitura e de escrita junto dos alunos de todos os níveis de ensino. Cada escola possuía um baú de livros que, mensalmente, ia de escola em escola, sendo alvo de atividades de animação da leitura durante a permanência em cada escola. Juntamente com os livros, um kit com propostas lúdicas concebido por cada dinamizador permitia a partilha de atividades; este kit tinha como missão implementar o gosto pela leitura nas crianças e nos jovens e promover o intercâmbio entre bibliotecas escolares. Todos os estabelecimentos de ensino público e privado do pré-escolar, do 1.º, 2.º, 3.º ciclos e do secundário podiam beneficiar deste projeto, razão pela qual algumas escolas do pré-escolar, os infantários, as creches e as EB1 não possuíam bibliotecas escolares tecnicamente organizadas. Contudo, o projeto podia ser dinamizado pelos animadores socioculturais de biblioteca, professores, educadores de infância e técnicos bibliotecários, que desenvolviam diversas atividades de natureza lúdica relacionadas com o livro, das quais se mencionam as mais frequentes: tertúlias literárias, atividades de escrita criativa, investigação temática, dramatizações, gincanas, concursos, visitas de estudo, intercâmbios culturais, atividades de expressão artística e plástica, visionamento de filmes, audição de histórias, encontro de escritores e comemorações de efemérides. A sede de coordenação do projeto situava-se na Escola Básica e Secundária da Calheta, sob a tutela da SREHR. No caso do 1.º ciclo/PE, o Baú de Leitura era coordenado por um coordenador geral e pelos coordenadores concelhios. Ao nível das escolas do 2.º e 3.º ciclos e do secundário, o projeto era coordenado por duas coordenadoras gerais. As bibliotecas infanto-juvenis: O Jardim e a Biblioteca de Educação Permanente A Árvore A 5 de maio de 1979, foi inaugurada no concelho do Funchal a biblioteca infantil, sendo esta a primeira biblioteca da Rede de Bibliotecas Infanto-Juvenis (RBIJ) O Jardim, designação que a passa a identificar a partir de 1982. Já a 31 de março do mesmo ano havia sido inaugurado um atelier de leitura infantil e lançada uma experiência museológica de campo que esteve na génese da referida rede de bibliotecas. Maria Margarida Macedo Silva foi a fundadora e diretora deste projeto. Profissional competente, inovadora e criativa, construiu uma obra muito avançada para uma realidade ainda atrasada do ponto de vista dos hábitos de leitura e culturais, lançando sementes que cresceram nas crianças que tiveram acesso às bibliotecas O Jardim e às suas atividades informativa e formativa. Para Margarida Silva, a leitura promovia o pensamento, a reflexão, o espírito crítico e a metacognição, princípios orientadores da nova escola, na qual as bibliotecas deveriam funcionar como autênticos laboratórios dessa aprendizagem. Criada em 1979, a RBIJ é resultado da ausência das bibliotecas escolares, tanto mais que, à data, a RAM não beneficiava de uma rede suficiente de infraestrutura escolar. Assim, as bibliotecas infanto-juvenis O Jardim foram bibliotecas escolares criadas fora do espaço físico da escola, que se mantiveram ao longo de cerca de 16 anos. Existiu um projeto para a criação de uma biblioteca infanto-juvenil O Jardim na ilha de Jersey, mas que nunca foi concretizado. A RBIJ teve o seu termo entre 1993 e 1995, tendo o seu acervo sido incorporado nas bibliotecas das escolas então construídas. Apresenta-se uma tabela com as bibliotecas que constituíram a rede infanto-juvenil O Jardim. [table id=76 /] As bibliotecas da rede O Jardim tinham uma agenda de formação exigente e planificada, que envolvia docentes do ensino primário, estagiários(as) do Magistério Primário, educadoras de infância e de outros níveis de escolaridade, bem como discentes da Escola de Magistério Primário. Apresentam-se alguns exemplos das agendas de trabalho da RBIJ O Jardim e da Biblioteca A Árvore, de que falaremos adiante: criação de clubes de leitura, dedicados a escritores portugueses; momentos de poesia e musicais; encontros com a Região, seguidos de debate; criação do projeto Fazendo Artes na Alfabetização, com recurso à linguagem dos cartazes, à confeção de grelhas para enriquecimento de vocabulário, à utilização da “roda de palavras” e do teatro de bonecas, passando pela construção e organização de ficheiros de alfabetização e ficheiros de leitores; iniciação de leitores na investigação literária e jornalística; criação de uma oficina de artesanato e de bonecos e realização de teatro de mesa para conhecer Gil Vicente; exposições; e a criação do Museu do Livro Escolar, passando por debates com autores madeirenses. No que diz respeito à educação permanente, refere Margarida Silva que “os meses de férias foram os mais produtivos, e estamos certos de que preenchendo tempos livres, sob este aspeto informal, abrimos pistas à juventude madeirense para uma Educação Permanente” (SILVA, 1999, 123). As atividades eram executadas com a participação dos bibliotecários como animadores, trabalhando em grupo. Porém, a RBIJ O Jardim tornou-se insuficiente para os utentes de uma faixa etária superior, pelo que em 1982 é criada a Biblioteca de Educação Permanente A Árvore, que funcionou paredes meias com O Jardim de Santo António, numa linha interdisciplinar e de partilha entre a escola e a comunidade, como refere Margarida Silva: “Se ‘O Jardim’ Biblioteca Infantil é um complemento da Escola (não o seu substituto), a ‘A Árvore’, Centro de Educação Permanente, não substitui os cursos de alfabetização, apenas constitui uma forte motivação fazendo a ligação Escola-Comunidade” (Id., Ibid., 37-38). A biblioteca A Árvore seguiu os conceitos da UNESCO no que diz respeito à Educação Permanente, depois designada por “educação ao longo da vida”. A Biblioteca da Escola do Magistério Primário Criada em 1943, a Biblioteca da Escola do Magistério Primário era constituída por um acervo cujo perfil convergia para o ensino e aprendizagem dos futuros professores do ensino primário. Totalizava 4.193 unidades documentais, de acordo com o livro de registos, sendo o pedagogo Jean Piaget o autor de eleição. A Biblioteca da Escola Superior de Educação A Escola Superior de Educação, criada a 12 de novembro de 1985, funcionou no antigo Colégio dos Jesuítas, tendo a sua biblioteca herdado o acervo da biblioteca da antiga Escola do Magistério Primário, que totalizou 4.175 unidades documentais, de acordo com o livro de registo. A sua extinção ocorreu em 1989, através do dec.-lei n.º 391/89, de 9 de novembro, e o seu acervo foi integrado na Biblioteca da UMa. A Biblioteca da Universidade da Madeira (UMa) A Biblioteca da UMa foi fundada aquando da criação da mesma Universidade, em 1988, pelo dec.-lei n.º 319-A, de 13 de setembro desse ano. Correspondia a um espaço físico lacónico cujo acervo era constituído pelos acervos das escolas que estiveram na génese da Universidade: o da Escola do Magistério Primário (com 4.193 unidades documentais), o da Escola Superior de Educação (com 4.175) e o das extensões universitárias (cujo acervo totalizava 4.020 unidades). O acervo era orientado para os âmbitos científicos das Ciências da Educação e das Políticas de Ensino e da Aprendizagem, num total de cerca de 12.378 unidades documentais, e encontrava-se verdadeiramente desatualizado e empobrecido face às novas teorias que emergiam nos referidos domínios científicos, não satisfazendo as necessidades informacionais dos cursos que iam sendo desenhados e consolidados na nova estrutura de ensino superior. Além disso, os recursos humanos afetos à biblioteca eram reduzidos, com horários descontínuos, desadaptados aos diplomas laborais em vigor e destituídos de qualificações, características que deram origem a uma biblioteca doméstica, empírica, personalizada e estagnada cientificamente. Em 1992-1993, ano em que a Biblioteca da UMa integrou recursos humanos qualificados, surgiu um novo lema, baseado na máxima “Transformar tudo e todos”. Formar e reconverter recursos humanos, atualizar o acervo, disponibilizá-lo em regime de livre acesso e tratá-lo, em termos técnicos e informáticos, de acordo com normas internacionais que permitissem a transferência da informação sem obstáculos – o que culminou com a construção do catálogo informatizado, através do programa Mini Micro CDS/ISIS (PORBASE) –, aceder à Internet (em 1993), desenvolver as figuras do empréstimo domiciliário e do EIB (Empréstimo Inter-Bibliotecas, nacional e internacional – foi aberto um canal com The British Library) e cooperar com a Biblioteca Nacional de Portugal (BNP), com vista a alimentar o catálogo bibliográfico nacional (PORBASE) e integrá-lo no universo dos seus cooperantes, foram os objetivos que alimentaram a nova visão, concretizados com sucesso. A transformação foi acompanhada pelo Grupo de Docentes para a Biblioteca, e esta recebeu a designação de Centro de Documentação e Informação. A partir de setembro de 1997, quando a Biblioteca da UMa beneficiou de um espaço físico mais adequado no edifício universitário do Campus da Penteada, ao desenvolvimento científico, técnico e cultural que contribuiu para o inevitável progresso da tríade ensino/aprendizagem/investigação, correspondeu um novo lema: “Integrar e flexibilizar tudo e todos”. Atualizar as metodologias documental e informática, modernizar a sala de leitura, dotando-a de rede local e de computadores que permitissem ao utilizador realizar as suas pesquisas, agilizar processos documentais e assegurar uma abordagem mais flexível com o utilizador interno e a abertura à sociedade civil foram metas atingidas com êxito. A biblioteca assumiu várias designações, em conformidade com as alterações dos seus estatutos: Centro de Documentação e Informação, em 1993; Serviços de Documentação e Informação, em 1996; Sector de Documentação e Arquivo, Unidade de Documentação Arquivo, em 2008; e, em 2013, Unidade de Biblioteca e Arquivo. Com o lema: “Informar para formar rumo à cognição, à criação do conhecimento”, a entrada no séc. XXI conduziu à criação de uma biblioteca verdadeiramente científica, em que os acervos (documental e digital) se foram construindo em interação com os professores e investigadores da academia, relação que representou o ícone de uma nova cultura organizacional e informacional, onde todos participavam e assumiam a responsabilidade da adequação dos acervos aos curricula lecionados na UMa e ao ideal europeu, razão pela qual se lhe associou o acervo do Centro de Documentação Europeia (CDE). A reestruturação do lema reforçou a implementação de uma atitude informacional orientada para a academia e exógena a ela, isto é, tanto para o utilizador interno, como para o externo. Em 2014, o acervo documental, em suporte papel, totalizava 121.216 unidades documentais, distribuído pelas seguintes coleções: 59.000 monografias; 27.842 fascículos de publicações periódicas; 6612 MNL (cassetes, disquetes, CD-ROM e DVD); 3822 trabalhos académicos (dissertações de mestrado e teses de doutoramento); 6552 monografias CDE; 16.038 publicações periódicas CDE e 1350 MNL CDE – total adquirido por via da compra e raramente por via da oferta; e a coleção digital, que continha milhares de documentos digitais de carácter científico. Os utilizadores da biblioteca eram constituídos maioritariamente pelos elementos da academia, concretamente pelos utilizadores internos: alunos, professores, investigadores e funcionários. Estimava-se em cerca de 3000 os utilizadores inscritos na unidade de biblioteca, número que correspondia à população da academia. Simultaneamente, a biblioteca estava aberta a utilizadores externos, distribuídos essencialmente por investigadores, mestrandos, doutorandos e população em geral, que procurava neste sector informação científica, em particular a digital e o serviço de EIB, para desenvolver os seus trabalhos de investigação. Em 2013, a Biblioteca da UMa contava com 11 profissionais qualificados no âmbito das ciências documentais: um doutorado neste âmbito; um mestre no âmbito da gestão do marketing; um técnico superior bibliotecário; três assistentes especialistas qualificados, com o curso de biblioteca, arquivo e documentação; dois assistentes administrativos; e três assistentes operacionais. O apoio informático era fornecido pelos serviços informáticos da UMa. Nos anos anteriores, diversos alunos haviam tido funções na biblioteca, tendo dois deles, da área da engenharia informática, ficado nos quadros de pessoal. A adesão às bases de dados científicas, tais como a Web of Knowledge, ocorreu em 2002; à Biblioteca do Conhecimento Online (B-On), que contém cerca de 17.500 títulos de publicações periódicas de reconhecido mérito científico internacional, em 2006; à Plataforma DeGóis e às bases de dados científicas SPORTDiscus e JSTOR, em 2009. A Biblioteca aderiu ao projeto de acesso aberto comunitário (Digital Repository Infrastructure Vision for European Research (DRIVER), depois OpenAIRE) também em 2009, com o Repositório Institucional da UMa (designado DigitUMa), em maio de 2010; ao Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP), também em 2010; e o acesso à eLibraryUSA, em 2013. Os diversos links direcionados para os catálogos e bases de dados nacionais e internacionais eram as mais proeminentes bases de dados do acervo digital. Em maio de 2010, o DigitUMa foi integrado no RCAAP, sustentado pelos princípios do Open Access Initiative, contando com centenas de milhares de documentos científicos (digitais) produzidos nas academias portuguesas. Constituído pelos repositórios ou bibliotecas digitais das universidades públicas portuguesas, e na qualidade de repositório nacional, o RCAAP seguiu as diretrizes técnicas do projeto DRIVER, depois assumido por OpenAIRE, repositório europeu fundado pela Comissão Europeia que tem como principal objetivo a reunião num só acesso livre de toda a produção científica europeia, alimentada pelos repositórios nacionais e/ou institucionais. O paradigma clássico de comunicar a investigação, um modelo contraditório, moroso, caro e individualista, deu origem a outro paradigma, assente em princípios que privilegiam a divulgação do conhecimento científico produzido nas universidades, à escala global, e através da Internet, de acordo com o movimento internacional conhecido por Open Acess Initiative (OAI), ou Acesso Livre ao Conhecimento (AL), ou Open Access (OA), que se concretiza na disponibilização livre na Internet de cópias gratuitas da produção cientifica avaliada por pares (peer-reviewed), bem como de relatórios técnicos, dissertações de mestrado, teses de doutoramento e outros documentos de trabalho. Em síntese, os documentos existentes no DigitUMa tornaram-se passiveis de ser pesquisados e consultados a nível nacional no RCAAP e a nível europeu no OpenAIRE. Deste modo, a europeização/internacionalização/webização da UMa foi afirmada à escala global, através do depósito dos conteúdos científicos produzidos pelos professores/investigadores, discentes e funcionários da UMa. Até 2006, os recursos documentais foram tecnicamente tratados no ambiente PORBASE 5, adquirido à BNP. Este software tornou-se inadequado, uma vez que não era interoperável com os softwares da UMa, atrasando as mais diversas exigências qualitativas da gestão organizacional da informação. Nesse ano, a Biblioteca passou a beneficiar de uma plataforma informática integrada, interoperativa e escalável, adquirida com o apoio de fundos comunitários, expressão máxima da sua webização. Dois softwares constituíram a referida plataforma: o Aleph, responsável pela gestão integrada da documentação e que interage com os diversos interfaces existentes na academia, deu origem ao catálogo informatizado e integrado, conhecido por BibUMa. O segundo software, designado por Digitool, foi o responsável pela gestão de conteúdos académicos ou científicos, tendo desenvolvido o DigitUMa. Em maio de 2010, o Digitool foi substituído pelo software DSPACE, em regime de open source. Os softwares utilizados são idênticos aos das bibliotecas universitárias portuguesas e de inúmeras bibliotecas universitárias internacionais, permitindo a adesão da Biblioteca da UMa ao grupo USE.pt, grupo no qual as bibliotecas universitárias portuguesas têm assento. Em 2015, a FCCN/FCT (Fundação para a Computação Científica Nacional, da Fundação para a Ciência e a Tecnologia) era a fundação portuguesa que reunia as bibliotecas portuguesas, entre as quais a Biblioteca da UMa, concretizando projetos avançados no âmbito das TIC, da política do OAI em 2002 e de programas financeiros europeus, entre outros, e projetando as bibliotecas universitárias portuguesas à escala global. Enquanto a PORBASE, sediada na BNP, projetou, em 1993, a biblioteca para Portugal, o OAI, em 2002, e a FCCN/FCT e a USE.pt, em 2013, projetaram-na para o mundo webizado. A Biblioteca oferecia os seguintes serviços: técnicos, digital (gestão das bases de dados) e de referência (incluindo a gestão do catalogo, o atendimento, a sala de leitura, os empréstimos, o marketing documental – que compreendia a formação de utilizadores nas unidades curriculares e na própria Biblioteca, uma formação muito solicitada pelos docentes, uma vez que incide no Processo de Pesquisa de Informação no catálogo e nas bases de dados mais relevantes; visitas de estudo de alunos das mais diversas escolas da RAM e de grupos de cidadãos; a realização de um workshop anual; lançamentos de livros; diversos seminários; e agenda cultural). Os empréstimos (domiciliário, permanente e interbibliotecas) eram realizados pelo serviço de referência, juntamente com o serviço digital. Todos os documentos podiam ser objeto de empréstimo, com exceção das publicações periódicas e das obras de referência, podendo também o utilizador externo beneficiar do empréstimo domiciliário. Os produtos que a Biblioteca disponibilizava eram os seguintes: BibUMa, DigitUMa, B-On, Web of Knowledge, RCAAP, OpenAire, a eLibraryUSA, ColCat (Catálogo Coletivo, que permite a pesquisa integrada), PORBASE, Facebook e Webpage, que ofereciam aos membros da academia inúmera informação científica, técnica e cultural. Se em 1992-1993, a Biblioteca beneficiou da ligação à rede computacional, que permitiu o acesso à Internet; em 2006, a rede sem fios expandiu-se na UMa, em particular na Biblioteca. A fácil usabilidade dos computadores portáteis pelos utilizadores na Sala de Leitura desenvolveu a interação entre as fontes eletrónicas e as fontes impressas. Podemos concluir que a Unidade de Biblioteca estava em condições de acompanhar o progresso científico promovido na UMa e de atuar como espaço transversal de informação científica, técnica e cultural na academia, sendo um dos epicentros da Universidade e uma biblioteca científica na RAM. Era igualmente uma porta aberta para o exterior e para a sociedade científica. Essa era a contribuição da Biblioteca da UMa para a RAM e para a sociedade de economias de informação e do conhecimento, sustentadas pelos fundamentos filosóficos da razão comunicativa, argumentativa e crítica de Jürgen Habermas. A Biblioteca do Centro de Estudos de História do Atlântico (CEHA) As instalações do CEHA, situadas na R. das Mercês, no Funchal, desde 1 de outubro de 2009, permitiram oferecer serviços à população madeirense, bem como aos estudiosos nacionais e estrangeiros que visitam este Centro. A biblioteca do CEHA tem fundos documentais próprios, que se formaram através do intercâmbio com diversas instituições. Em 2013, contava com um total de 1121 livros e 111 publicações periódicas, enquanto a biblioteca de Alberto Vieira, fundo documental doado ao Centro em 2010, registava um total de 4846 livros e 317 publicações periódicas. A biblioteca e o fundo documental de Alberto Vieira contemplavam bibliografia especializada sobre a história da Madeira e demais ilhas do mundo, com especial destaque para o espaço Atlântico (Madeira, Açores, Canárias, Cabo Verde, São Tomé e Santa Catarina), com fundos especiais, em diversas línguas, sobre a história da escravatura, da ciência e técnica, da autonomia, do açúcar e do vinho. Em 2015, previa-se que a biblioteca do CEHA não tardasse a ficar totalmente disponível em formato digital; parte do acervo de história da Madeira já se encontrava disponível. O CEHA disponibilizava ainda um conjunto de publicações para empréstimo domiciliário, no total de 653 títulos. O acesso ao catálogo fazia-se através da BPRM. A Biblioteca do Conservatório – Escola das Artes Eng.º Luiz Peter Clode A biblioteca do Conservatório – Escola das Artes Eng.º Luiz Peter Clode localiza-se no 1.º andar do edifício do Conservatório. A avaliar pelo registo no livro de tombo, o livro mais antigo nela depositado datava de maio de 1957, embora se encontrassem diversos exemplares integrados com datas anteriores, sem que se soubesse exatamente quando. Presume-se, assim, que a Biblioteca foi criada por volta de 1957, tendo tido o primeiro funcionário com a categoria de bibliotecário/catalogador em 1978. Em 2015, esta biblioteca não dispunha de acervo em suporte digital. O catálogo foi concebido no programa Access da Microsoft, mas estava nesta data a ser construído no ambiente PORBASE, com o apoio da BPRM. Teria 4859 obras em geral e 5787 partituras, algumas do séc. XIX. O seu acervo fazia desta biblioteca uma biblioteca escolar e simultaneamente uma biblioteca especializada em obras musicais. Os seus utilizadores eram os alunos, professores e funcionários do Conservatório, encarregados de educação e outros familiares dos alunos. A Biblioteca estava também aberta à comunidade em geral, sendo frequentada por leitores (por vezes estrangeiros) que necessitavam de consultar partituras, utilizadores da UMa e outros interessados em música. Segundo o site do Conservatório, anexa à biblioteca, funcionava a mediateca, que dispunha de 8700 CD, 59 DVD, 50 vídeos e cerca de 3000 LP, aquisições feitas pela escola e através de doações de particulares, das quais uma das mais valiosas foi a de John Ranalow. A sala possuía uma aparelhagem áudio, que permitia aos alunos a audição e gravação de música, e de uma televisão, para visionamento de documentários musicais. A biblioteca contava com uma responsável, mestre em Ciências da Informação e Documentação, vertente de Biblioteconomia, e um funcionário do Conservatório, que zelava pela abertura do espaço. A Biblioteca da Direção de Serviços de Educação Artística e Multimédia (DSEAM) Criada em setembro de 2004, a biblioteca da DSEAM tinha um total de acervo em papel de cerca de 22.000 documentos, dos quais aproximadamente 18.500 já estavam, em 2015, catalogados em Catwin e disponibilizados na rede PORBASE (cooperante efetivo) e no seu site. Com aproximadamente 250 utilizadores registados, os principais utentes eram os professores, educadores, investigadores e colaboradores da própria DSEAM e alunos universitários. Os serviços que oferecia à comunidade eram: documentação especializada em música (teoria e prática), educação e artes, embora tivesse um catálogo razoável nas áreas de literatura, ciências sociais e história; biblioteca online (catálogo), onde se incluíam aproximadamente 4000 documentos digitais; e portal de recursos digital, incluindo os mesmos 4000 documentos (disponibilizados em Pacwin, mas também no Portal de Recursos Educação Artística). A biblioteca contava com pessoal com formações de curta duração na BN e no Arquivo Regional da Madeira (ARM); um dos colaboradores tinha realizado um estágio no Centro de Estudos Musicológicos da BN. Em 2015, esta equipa era coordenada pelo Dr. Paulo Esteireiro, que também estagiara no Centro de Estudos Musicológicos, em contexto curricular da Universidade Nova de Lisboa, e frequentara várias ações de formação na BN, nas áreas da indexação, catalogação e Catwin. A biblioteca tinha o maior número de documentação musical manuscrita (partituras) catalogada na Madeira (4400 partituras históricas). As partituras históricas madeirenses estavam organizadas em aproximadamente 15 coleções, de acordo com a sua proveniência. A biblioteca tinha partituras de bandas filarmónicas, orquestras e grupos de bandolins, orquestras de salão e de igreja, música vocal sacra variada, música para piano, música para viola, etc. Para além disso, dispunha também de um extenso acervo na área do vídeo e áudio (CD). O Centro de Informação e Documentação (CID) O CID, integrado, em 2015, no Departamento de Ciência e Recursos Naturais da Câmara Municipal do Funchal (CMF), era composto por dois núcleos documentais: a Biblioteca Professor Luiz Saldanha da Estação de Biologia Marinha do Funchal, e a Biblioteca do Museu de História Natural do Funchal (MHNF). A Biblioteca Professor Luiz Saldanha da Estação de Biologia Marinha do Funchal deve a sua designação à figura deste professor e oceanógrafo de prestígio internacional, que doou à Biblioteca o seu espólio científico, para servir de apoio à investigação. Foi criada a 28 de setembro de 1999, integrada na Estação de Biologia Marinha do Funchal. Encontravam-se depositados na Biblioteca Professor Luiz Saldanha três espólios ou acervos de elevada relevância para a comunidade científica, a saber: o espólio Professor Günther Edmund Maul, composto por monografias (algumas delas com uma certa raridade), revistas, correspondência científica, relatos de viagens, manuscritos, etc., alargando-se a todas as áreas da história natural; o espólio Professor Luiz Vieira Caldas Saldanha, composto por monografias, revistas, correspondência científica, desenhos, postais, etc. (grande parte do espólio cobre as áreas da biologia marinha, oceanografia e ictiologia); e o espólio Professor Doutor Armando Almeida, composto essencialmente por trabalhos científicos abrangendo áreas das ciências do mar, concretamente ecologia costeira e ictiologia. A partir de 1933, o segundo núcleo documental formou a Biblioteca do Museu de História Natural do Funchal, que está em contacto permanente com outras bibliotecas, centros de documentação de universidades e outras instituições científicas em todo o mundo, com o objetivo de trocar e divulgar informações, enriquecendo assim o seu património cultural científico. O engrandecimento do acervo documental desta biblioteca efetuava-se de três formas: compra, oferta e permuta. Esta última era feita através da edição de duas publicações científicas, o Boletim do Museu Municipal do Funchal e o Suplemento do Boletim do Museu Municipal do Funchal, que contêm trabalhos científicos de grande relevo nas diversas áreas da história natural da Macaronésia. Para além destes, publicava ainda a revista Bocagiana, destinada não só à descrição de espécies novas, mas também à divulgação de artigos carenciados de publicação urgente. Estas revistas eram distribuídas gratuitamente a diversas instituições de investigação científica, universidades e bibliotecas a nível mundial. Em 2015, os utilizadores do CID eram essencialmente estudantes do nível secundário e superior, docentes e investigadores. O acesso era livre, podendo os utilizadores (internos e externos) consultar as bibliotecas de acordo com a área de interesse, quer na Biblioteca da Estação Biologia Marinha do Funchal, quer na Biblioteca do MHNF. O total do acervo do CID correspondia, nesta altura, a aproximadamente 13.000 documentos (monografias, revistas e MNL). Para além do suporte em papel, o Centro assegurava ainda o acesso eletrónico em suporte digital. Duas bases de dados permitiam o acesso aos documentais digitais: Prisma (módulo de catalogação e gestão de monografias e de publicações em série) e Procite/Endnote. O CID facultava o acesso à informação de carácter científico e técnico da Biblioteca da Estação de Biologia Marinha do Funchal, nas áreas, em particular, da biologia marinha, oceanografia e pesca, e da Biblioteca do MHNF nas restantes áreas, como biologia terrestre, história natural da Macaronésia e geologia. Estimava-se que muito em breve o Centro estaria disponível para prestar o serviço de empréstimo interbibliotecas. Contava com acesso eletrónico à informação científica em linha, ou através de suporte digital, e a consulta do catálogo bibliográfico. O CID beneficiava de recursos humanos qualificados no âmbito das ciências documentais. O Centro de Documentação da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira (ALRAM) O Centro de Documentação da ALRAM foi criado, em simultâneo com o edifício da Assembleia, a 4 de dezembro de 1987, designando-se, à época, biblioteca da Assembleia Legislativa Regional. Em 2015, era composto por dois sectores – o arquivo e a biblioteca, de acordo com a estrutura orgânica da ALRAM – e assumia a designação de Centro de Documentação, ao qual competia: a) recolher, organizar, tratar, armazenar e difundir a informação nacional e estrangeira nas várias áreas do conhecimento; b) produzir e difundir cadernos de informação, ou outros produtos, adequados aos temas em apreciação nos vários órgãos da ALRAM; c) recolher, selecionar, tratar e conservar todos os documentos referentes aos deputados e a atos e factos da ALRAM; d) recolher, registar, catalogar, indexar e zelar pela conservação de todas as espécies do espólio documental da ALRAM; e) prestar informações sobre a bibliografia e documentação existentes no acervo e facultar o respetivo acesso, nos termos do regulamento interno; f) promover e colaborar em atividades de divulgação do património documental e propor a edição e difusão de publicações com interesse para a ALRAM e as que respeitam à história do Parlamento, em estreita colaboração com o Departamento de Relações Externas e para a Comunicação Social; g) gerir o acervo e o funcionamento da biblioteca da ALRAM; h) organizar e assegurar a manutenção do Arquivo Histórico-Parlamentar e o arquivo corrente de todos os serviços da ALRAM. O seu acervo era, nesta data, constituído pela produção documental que resulta das atividades legislativas, por coleções de monografias, publicações periódicas e bases de dados, cujos perfis se adequam às atividades parlamentares. O Centro de Documentação beneficiava de pessoal qualificado, conferindo qualidade ao tratamento e à disseminação da informação legislativa e parlamentar. As Administrações Pública e Local, os Laboratórios e os Museus Nas Secretarias Regionais do GRM existiam, em 2015, centros de documentação e informação que beneficiavam de núcleos documentais ao serviço dos seus funcionários. Os laboratórios existentes na RAM, que têm assegurado estudos relevantes para a Região (a saber: o Laboratório Regional de Engenharia Civil, o Laboratório de Metrologia da Madeira Dr. José Agostinho Gomes Pereira de Gouveia, o Laboratório de Saúde Pública, o Laboratório Regional de Controlo de Qualidade da Água, entre outros), bem como os museus e o Jardim Botânico da Madeira, beneficiavam, nesta data, de bibliotecas, algumas com núcleos documentais antigos, ricos e variados, que apoiavam e valorizavam as atividades dos seus funcionários que se dedicavam à investigação. O Centro de Documentação Europeia (CDE) (UMa) O CDE (específico e não completo) foi alojado na Biblioteca da UMa em 1995, altura em que a Universidade se lançou a uma candidatura comunitária para a sua aquisição. A UMa forneceu o espaço físico, o pessoal qualificado e as ferramentas informáticas, desde o hardware ao software, enquanto a UE, através da Comissão Europeia e da representação da Comissão Europeia em Portugal, forneceu o acervo documental, quer em suporte papel, quer em suporte digital. O Centro tinha por objetivo divulgar o ideário comunitário junto da academia, razão pela qual se realizavam eventos e inúmeras exposições nesse âmbito. Em 2015, o seu acervo estava estimado em 23.940 unidades (cujas referências se encontravam no catálogo da Biblioteca da UMa), distribuído pelas seguintes tipologias documentais: 6552 monografias, 16.038 fascículos de publicações periódicas, 1359 unidades de MNL. Estavam também disponíveis milhares de documentos digitais, que podiam ser acedidos através do portal da Europa. A Biblioteca de Assuntos Europeus – Casa da Europa da Madeira Integrada na Casa da Europa da Madeira, o seu acervo era constituído por publicações de carácter específico relacionadas com questões europeias, quer em suporte papel, quer em suporte digital, através das bases de dados que a UE colocava ao dispor do cidadão. O Centro de Informação Europe Direct A RAM beneficiava de um Centro de Informação Europe Direct Madeira (CIED Madeira), criado em 2013 e localizado no Edifício Casa da Cultura, na freguesia de Câmara de Lobos. O Centro dependia hierarquicamente da representação da Comissão Europeia em Portugal e destinava-se à população em geral. Relativamente ao seu acervo, contava com 196 unidades, em atualização em 2015, distribuídas por: 103 publicações; 27 revistas/newsletters; 46 panfletos/brochuras; e 20 cartazes/posters. Era objetivo do CIED Madeira prestar um serviço de proximidade adaptado às necessidades locais/regionais, permitindo ao público em geral obter informações, orientações, assistência e respostas a perguntas sobre a UE no que respeita ao seu funcionamento, prioridades, legislação, políticas, programas e possibilidades de financiamento, mas também, e fundamentalmente, aos seus direitos enquanto cidadãos europeus. O Centro disponibilizava igualmente na sua sede um conjunto de publicações sobre as mais diversas temáticas de intervenção da UE. O CIED Madeira organizava sessões informativas para o público em geral, e em particular para as escolas da área de abrangência do Centro e para alunos das diversas faixas etárias. Nestas sessões, eram tratados temas de interesse que iam ao encontro de possíveis necessidades de informação sobre a UE, de carácter mais geral ou mais específico, consoante os objetivos da ação. As apresentações para o público escolar tentavam, através de jogos e da distribuição de material publicado pela UE, estimular o interesse para as questões europeias. A Biblioteca da Direção Regional de Juventude e Desporto (DRJD) O Ponto Jovem, nome pelo qual foi designada a biblioteca da DRJD, foi criado a 15 de março de 2013 na sequência da integração do sector da juventude na DRJD, criada pelo dec. reg. regional n.º 14/2012/M, de 26 de junho. Este espaço já tinha tido outras denominações, sucessivamente alteradas de acordo com as restruturações orgânicas dos serviços. Sendo o grosso dos seus utilizadores os jovens e o público em geral, a biblioteca oferecia os seguintes serviços à comunidade: espaço para consulta e leitura de documentação; espaço multimédia (Loja de Juventude), onde os utilizadores tinham ao seu dispor a rede sem fios gratuita, 12 postos com computadores e posto braile equipado com linha e impressora braile, para utilizadores invisuais; espaço para utilização de equipamento informático pelo utilizador; espaço para realização de trabalhos individuais e/ou em grupo; balcão de informação, no qual eram prestados os seguintes serviços: prestação de informações em áreas de interesse juvenil; divulgação de atividades, eventos e classificados de interesse juvenil; obtenção e renovação do Cartão Jovem; e o Ponto Oficial de bookcrossing. Além destes serviços, a biblioteca facultava igualmente à comunidade o acesso aos conteúdos em suporte digital disponibilizados na Internet, através dos postos existentes no espaço, bem como aos conteúdos em suporte papel, disponíveis no local para consulta presencial. O total do acervo em suporte papel era, em 2015, de cerca de 1500 títulos. A coleção de monografias estava distribuída pelos seguintes assuntos: ciências sociais; desporto; geografia; história (da arte, do mundo, de Portugal e da Madeira); literatura (infantil, juvenil e portuguesa); e obras de referência para consulta (dicionários e enciclopédias). A coleção de publicações periódicas era constituída pelos seguintes títulos: Jornal da Madeira; Revista Demografia Federada; Revista Flor de Lis; Revista Islenha; agendas culturais de diversos municípios do país; e revistas em braile (Visão, Visão Júnior e Ativa). Os recursos humanos afetos à Biblioteca eram constituídos, nesta data, por duas técnicas de biblioteca e documentação. A Teatroteca Fernando Augusto Inaugurada a 30 de novembro de 2005, a Teatroteca Fernando Augusto – Biblioteca de Teatro, no Funchal, reunia o espólio recolhido pelo TEF Companhia de Teatro (Teatro Experimental do Funchal), e a biblioteca de teatro de Élvio Camacho, com cerca de 1500 livros do acervo pessoal do encenador e dramaturgo Fernando Augusto, doado ao ator. A Teatroteca estava aberta a todos os leitores, artistas e grupos de teatro interessados na matéria. A Biblioteca John dos Passos O Centro Cultural John dos Passos foi inaugurado em setembro de 2004, na Ponta do Sol, contando com duas secções ou unidades documentais: a Biblioteca John dos Passos e a Sala Dr. John Randolph dos Passos (reservados). Compostas, em 2015, por cerca de 5500 livros, estas duas secções/unidades documentais tinham um catálogo presencial. A Biblioteca era de acesso livre e o seu fundo documental variado, quer a nível temático, quer a nível da nacionalidade dos autores, não sendo composto apenas pelas obras de John dos Passos, mas também por bibliografia estrangeira, nacional e regional (monografias, publicações periódicas, cartazes e material multimédia). Contudo, o acervo mais importante encontrava-se na sala de reservados e reunia a obra deste escritor norte-americano de ascendência madeirense, traduzida em 18 línguas, e ainda alguns estudos sobre a sua vida e obra. De acesso restrito, esta sala era reservada aos estudiosos que pretendessem pesquisar e investigar a vida e obra do escritor, que, em português, contava com traduções de oito dos seus livros: Três Soldados; Manhattan Transfer; Paralelo 42; 1919; Dinheiro Graúdo; Aventuras de um Jovem; Fadado para Vencer; Os Melhores Tempos: uma Biografia não Oficial e Portugal: Três Séculos de Expansão e Descobrimentos. A Biblioteca John dos Passos possuía, à data, os seguintes serviços: serviço de referência; serviço de apoio à investigação (referente à vida e obra de John dos Passos); serviços educativos; serviço de empréstimo; e serviço de fotocópias. Para além de prestar serviço à camada estudantil, servia também docentes, investigadores e população em geral. Ao longo do ano, realizavam-se diversas atividades dirigidas aos alunos das escolas do concelho da Ponta do Sol, tais como: a hora do conto; peddy-papers; visitas guiadas em português e inglês; exposições temáticas; seminários; conferências; celebração de efemérides; e elaboração de material didático, entre outras atividades. As Bibliotecas Itinerantes e Fixas da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) As bibliotecas itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) surgiram em 1953 com a criação (da iniciativa de Branquinho da Fonseca, bibliotecário-arquivista e escritor) de uma biblioteca circulante no Museu-Biblioteca Condes de Castro Guimarães, em Cascais, que tinha por objetivo cobrir o território nacional e arquipelágico com as bibliotecas circulantes. Contudo, foi em 1958 que a FCG criou o Serviço de Bibliotecas Itinerantes (SBI), pelo mesmo Branquinho da Fonseca, que permaneceu no SBI até 1974, ano da sua morte. Nesse ano, foram colocadas em circulação 15 bibliotecas itinerantes na região de Lisboa e litoral. Portugal vivia uma conjuntura politicamente desmotivada para a promoção da leitura, do livro, do ensino e da aprendizagem, privilégio dos segmentos populacionais mais abastados de então. Era difícil promover a leitura junto das populações isoladas e pobres e reduzir os índices de incultura e de analfabetismo que caracterizavam o país, incluindo a população do arquipélago da Madeira. A solução passou pela utilização de serviços móveis, ou seja, pela utilização de uma carrinha, que transportava os núcleos documentais das bibliotecas itinerantes, com cerca de 2000 livros, em estantes de regime de acesso aberto, privilegiando a figura do empréstimo domiciliário e a gratuitidade do mesmo e levando mais longe as ideias e o saber. As estantes destas carrinhas tinham a seguinte disposição: as prateleiras de baixo estavam reservadas aos livros infantis; as do meio à literatura, ficção e biografias; e as de cima aos livros menos pedidos (filosofia, poesia e ciências). Nelas trabalhavam dois funcionários: o auxiliar e o encarregado e responsável pela biblioteca. A FCG criou parcerias com as autarquias, no sentido de partilha das obrigações: o fornecimento do acervo bibliográfico, o biblio-carro, o pagamento dos honorários do pessoal, o combustível, as despesas de manutenção e conservação e outras ficavam a expensas da FCG, enquanto as autarquias concediam instalações para o depósito dos livros e contribuíam com despesas pontuais, ou seja, o apoio logístico. As bibliotecas itinerantes não satisfaziam as exigências de utilizadores mais letrados, com grau mais elevado de exigência intelectual e cultural, pelo que foi necessário complementá-las, na déc. de 60, com outra tipologia de biblioteca: as fixas. Em 1963, a Madeira beneficiou da primeira biblioteca itinerante, com sede no Funchal. No arquivo da FCG, não existe documentação sobre a criação e a extinção da maior parte das bibliotecas que fizeram parte das redes de bibliotecas criadas pela Fundação. Contudo, através das datas-limite da documentação existente e do livro publicado pela FCG no seu 25.º aniversário, em 1983, bem como do Boletim Cultural, n.º 2 de 1984, deduz-se a existência das seguintes bibliotecas itinerantes no arquipélago: [table id=77 /] Na déc. de 70 do séc. XX, o projeto do SBI tornou-se insustentável no âmbito da gestão financeira da FCG, e em 1972 a Fundação chegou a tentar concluir a rede de bibliotecas itinerantes e fixas, ideia reforçada após o 25 de Abril de 1974. Contudo, entre 1981 e 1996, David Mourão Ferreira deu novo impulso à animação da leitura e à difusão literária e cultural, privilegiando atividades que garantissem maior rentabilidade intelectual e cultural: exposições, debates, encontros com autores, leitura de contos e poesia, lançamento de livros e de novos autores, entre outras atividades. O SBI foi reestruturado e, em 1983, passou a designar-se Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas da FCG (SBIF). O arquipélago da Madeira passou então a contar com as seguintes bibliotecas fixas: [table id=78 /] A estas acrescentamos ainda os postos de leitura criados nos bairros sociais:  a Biblioteca Municipal Calouste Gulbenkian – Penteada (1988) e a Biblioteca Municipal Calouste Gulbenkian – Nazaré (1989). Assim, de acordo com as diferentes tipologias, a FCG criou no Arquipélago da Madeira um total de: 3 bibliotecas itinerantes; 11 bibliotecas fixas; e diversos postos de leitura nos bairros e complexos sociais acima referidos. É de destacar a Biblioteca Fixa n.º 48, no Funchal, inaugurada a 10 de julho de 1964 (data que não está de acordo com a data do quadro fornecido pela FCG, que refere 1961), que estava localizada no edifício da CMF, onde permaneceu até 1985. Até 1987, a Biblioteca funcionou provisoriamente no Teatro Municipal Baltazar Dias. De 1987 a 1995, mudou de instalações para o edifício da R. Elias Garcia. Após este período, regressou ao Teatro Municipal Baltazar Dias até 2011, ano em que a documentação começou a ser incorporada na BMF e na nova Biblioteca de Santo António do Funchal. A promoção do livro e da leitura através da rede de bibliotecas itinerantes, e mais tarde das bibliotecas fixas, durante o regime salazarista foi uma iniciativa arrojada mas coerente, que transformou a FCG no “Ministério da Cultura” português, que incluía o arquipélago da Madeira. As bibliotecas itinerantes não transportavam somente livros, mas promoviam a leitura, o nascimento de ideias e do saber, motivando a aprendizagem da leitura em muitos cidadãos iletrados. As bibliotecas fixas funcionaram como bibliotecas públicas, tendo como público-alvo o cidadão mais letrado que procurava informação e conhecimento. Em suma, as bibliotecas da FCG promoveram uma verdadeira revolução cultural, uma vez que tudo é transportável, incluído o conhecimento. Em 1987, o Programa Nacional de Leitura Pública, que tinha por objetivo criar e desenvolver bibliotecas públicas modernas e adequadas às linhas orientadoras do Manifesto da UNESCO sobre as Bibliotecas Públicas, terá debilitado o serviço e objetivos do SBIF da FCG. Contudo, em 1993, este é reestruturado e adaptado à nova temporalidade, passando a designar-se Serviço de Bibliotecas e Apoio à Leitura (SBAL), que em 2002 foi completamente extinto. O acervo das bibliotecas fixas foi integrado nas bibliotecas municipais que foram sendo criadas em todos os municípios. A Biblioteca do Hospital Dr. Nélio Mendonça A biblioteca do Hospital Dr. Nélio Mendonça, no Funchal, surgiu três anos após a inauguração do Hospital, em 1976, e ficou localizada no piso 0 do mesmo. Tratava-se de uma biblioteca tradicional especializada na área da Saúde, tendo como principal objetivo auxiliar o trabalho de pesquisa dos profissionais de saúde da instituição e servir um vasto leque de utentes: médicos, enfermeiros, investigadores, técnicos de saúde, alunos de pré e pós-graduação em Medicina e Enfermagem, administradores e gestores hospitalares. Até 2013, esta biblioteca disponibilizava os seguintes serviços: leitura e empréstimo; referência e pesquisa de informação; difusão de informação; e sala multimédia. Integrada no espaço da biblioteca, existia uma sala polivalente destinada a conferências, reuniões e cerimónias oficiais, entre outros eventos. Eram competências da Biblioteca: apoiar proativamente todas as especialidades do Serviço de Saúde da RAM, E.P.E (SESARAM); promover uma maior acessibilidade à informação, apoiando e formando o utilizador; cooperar em redes e projetos através de métodos e tecnologias de informação utilizados universalmente pela biblioteconomia; gerir aquisições e atualizações dos recursos bibliográficos, preferencialmente eletrónicos (bases de dados, ejournals, ebooks); promover uma correta política de aquisições de recursos bibliográficos para o SESARAM, procedendo à avaliação de propostas de aquisição, avaliando a pertinência dos recursos e fazendo prospeção de mercado de fornecedores, para obtenção da melhor relação custo/qualidade; e apoiar e promover a produção científica e a divulgação da informação. À data, o seu acervo bibliográfico era composto por: obras de referência (cerca de 50 exemplares); monografias (cerca de 200 livros); e publicações periódicas, na sua maioria técnicas e científicas (mais de 200 títulos de revistas registados online). A partir de 2009, a Biblioteca adquiriu maioritariamente publicações periódicas com acesso online, que, desde 2013, disponibilizou juntamente com o acesso à base de dados online. A Biblioteca contava com pessoal qualificado: gestão e coordenação da Biblioteca: diretor do serviço de formação e investigação do SESARAM, E.P.E.; responsabilidade técnica da Biblioteca: técnico superior do SESARAM, E.P.E.; assistente Técnica com formação na área das bibliotecas; assistente técnica de apoio administrativo à Biblioteca. A Biblioteca Pública Regional da Madeira (BPRM) A pintora Sara Maria de Portugal da Silveira Henriques de Freitas foi fundadora e primeira diretora da então sala de documentação contemporânea, inaugurada em 1979, no edifício seria posteriormente instalada igualmente a Direção Regional dos Assuntos Culturais (DRAC), com o objetivo de prestar apoio educativo às extensões universitárias criadas na RAM com o processo da autonomia. Em 2003, foi instituída oficialmente a BPRM, sucedendo à biblioteca de documentação contemporânea, pelo dec. reg. regional n.º 14/2003/M, de 23 de maio (Orgânica da SRTC). Alicerce conceptual da BPRM foi o conjunto de disposições legais que a tornaram beneficiária do depósito obrigatório de todas as obras publicadas no país, nomeadamente por força do dec.-lei n.º 74/82, de 3 de março. Esta instituição fez inicialmente parte da DRAC, passando, a 19 de junho de 2007, passa para a tutela da Secretaria Regional de Educação e Cultura (SREC), onde se manteve até 2011. A 9 de novembro desse ano, mudou novamente para a tutela do Turismo, com a nova designação de Secretaria Regional da Cultura, Turismo e Transportes (SRCTT). Em 2009, a BPRM comemorou 30 anos de serviço público, instituindo o dia 26 de outubro como seu dia. Por força da port. n.º 50/2016, de 19 de fevereiro, que define a orgânica da Direção Regional da Cultura, a BPRM e o ARM foram fundidos numa só entidade, que passou a ser designada por Arquivo Regional e Biblioteca Pública da Madeira (ABM). O ABM – a Biblioteca – foi criado como um espaço com diferentes ambientes e acervos, espaço de cultura, conhecimento, lazer e informação, aberto a todos os cidadãos. Tinha por objetivos: tratar, conservar e divulgar os seus diferentes acervos de cultura, nomeadamente o acervo bibliográfico do Depósito Legal; preservar e divulgar a língua e cultura portuguesas a diferentes públicos; e promover o livro, a leitura, a informação e o conhecimento. Com o objetivo de ser a mais completa biblioteca da RAM, tinha como valores: inovação, transparência, ética, responsabilidade e melhoria contínua; equidade no tratamento, abertura e disponibilidade à diferença; adequação e rapidez de resposta; e cultura de projetos. O ABM – a Biblioteca – era, na RAM, a instituição pública empenhada na conservação do património documental, o que advém do estatuto de recetora do Depósito Legal, que lhe permite receber da BNP pelo menos um exemplar de todas as publicações editadas em Portugal, acrescentando-lhe a característica de pró-especializada em diversas áreas temáticas. O facto de ser beneficiária do Depósito Legal potenciou a sua missão e alargou os seus objetivos, especialmente perante a RAM e os madeirenses, na preservação da sua história, língua e cultura. Foi a partir de 1982 que a Biblioteca se constituiu mais fortemente como fonte de informação científica e técnica e assumiu definitivamente o seu perfil patrimonial, com a responsabilidade de preservar e divulgar a produção documental de origem intelectual, nacional e regional. A Biblioteca era também depositária do acervo bibliográfico da biblioteca da Escola Secundária Jaime Moniz, disponibilizado online em catálogo para consulta através da colaboração do ABM. Relativamente ao seu acervo, estima-se que, em 2015, o total fosse de mais de 294.405 documentos, com um crescimento anual de 10%: 192.649 exemplares de monografias (correspondentes a 172.676 títulos) e 121.729 exemplares de publicações periódicas (correspondentes a 4088 títulos). A maior parte dos fundos documentais era contemporânea e generalista, embora possuísse algumas coleções de obras mais antigas. Os fundos documentais eram: fundo geral – monografias e periódicos; Reservados – livros raros, primeiras edições, documentos em mau estado de conservação; iconográfico – mapas, cartazes, postais; cartografia – mapas, séries cartográficas, atlas; leitura para deficientes visuais – recursos braile e recursos áudio; multimédia – DVD, CD, CD-ROM; fundo local – memória local e coletiva da RAM. A aquisição dos documentos era feita principalmente através do Depósito Legal, mas também por compra ou por oferta de particulares e instituições da administração pública. Destes, destacava-se a biblioteca Mário Sardinha, pelo valor e a raridade das espécies bibliográficas, assim como as bibliotecas da escritora Carmo Rodrigues e de Fátima Dionísio e Avelino Costa, e a biblioteca António Montes, acervo importante por integrar um número considerável de títulos que completaram as coleções anteriores à criação da Biblioteca. A maior doação particular foi a da biblioteca Rebelo Quintal (2013). António Rebelo Quintal (1931-2013) reuniu, ao longo de anos, milhares de livros e revistas, constituindo principalmente uma grande biblioteca jurídica, considerada por muitos a melhor da RAM e provavelmente uma das melhores do país. Alguns dos referidos documentos foram oferecidos por distintas personalidades, mas a maior parte foi adquirida em livrarias nacionais e estrangeiras. O ABM é o órgão coordenador da Rede de Bibliotecas Públicas da RAM, pelo dec. leg. regional n.º 15/2002/M, de 22 de agosto, e pelo dec. reg. n.º 10/2002/M, de 13 de março, e é o órgão coordenador do Programa da Rede de Bibliotecas Escolares, de acordo com o Programa da RBE (Gabinete RBE do Ministério da Cultura). Até à instalação e ao desenvolvimento de bibliotecas municipais no âmbito da Rede Regional de Bibliotecas Públicas (RRBP), a então BPRM disponibilizou às escolas de todos os graus de ensino da Região consultoria técnica nas áreas de arquitetura (no caso de escolas em construção ou com áreas em reconstrução e adaptação), mobiliário, fundos documentais e tratamento técnico documental. A Rede Regional de Bibliotecas Públicas (RRBP) A 24 de fevereiro de 2002, foi celebrado um protocolo entre o Instituto Português do Livro e das Bibliotecas (IPLB) e a Direção Regional dos Assuntos Culturais (DRAC), da Secretaria Regional de Turismo e Cultura (SRTC) da RAM, no sentido de estabelecer a cooperação técnica e financeira entre estas entidades para a conceção e o desenvolvimento de uma rede de bibliotecas públicas na Região e, assim, concretizar a extensão da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas à Madeira, num total de 11 concelhos. A RRBP da RAM foi criada pelo dec. leg. regional n.º 15/2002/M, de 13 de agosto, e regulamentada pelo dec. leg. regional n.º 10/2003/M. Entretanto, fruto do trabalho conjunto entre o IPLB e a DRAC, foi definido um programa-base destinado a regular e orientar as candidaturas dos municípios, que foi apresentado oficialmente a 3 de novembro de 2003, data que correspondeu à abertura do período para a apresentação das candidaturas por parte dos municípios. Foram cinco os municípios a apresentar candidatura: Funchal, Machico, Câmara de Lobos, Porto Moniz e São Vicente, tendo sido selecionados os quatro primeiros. No caso de Machico, a obra das novas instalações da biblioteca já se encontrava concluída, pelo que não seria comparticipada pelo IPLB: o município concorreria apenas a apoios para aquisição de mobiliário e equipamento, fundos documentais e informatização. As quatro candidaturas aprovadas foram homologadas pelo secretário regional do Turismo e Cultura a 11 de novembro de 2004. O passo seguinte consistiu na assinatura de um protocolo de intenções entre os municípios com as candidaturas aprovadas, a DRAC e o IPLB, protocolo exigido pelo Instituto de Fundos Comunitários (IFC) para aprovar as candidaturas das autarquias a financiamento comunitário. Os protocolos de intenções foram celebrados a 8 de novembro de 2006, exceto no caso de Machico, assinado a 8 de março de 2007. Relativamente ao investimento a realizar, foi definido que a comparticipação do IPLB seria de 30% (em todas a rubricas: obra, equipamento, fundos documentais e informatização) dos custos definidos como elegíveis e que o IFC teria a comparticipação de 70%. A Biblioteca Municipal de Machico foi inaugurada a 3 de março de 2008 e a Biblioteca Municipal de Câmara de Lobos a 3 de maio de 2009. O processo de candidatura da BMF foi encerrado por inviabilidade de reabilitação ou construção de um novo espaço. O Porto Moniz não pôde avançar com a construção do edifício por falta de verbas. Ao abrigo do protocolo DRAC/municípios, a BPRM continuou a prestar apoio especializado na área da biblioteconomia aos municípios que o solicitem.   A Biblioteca de Culturas Estrangeiras (unidade integrada no ABM) Integrada no ABM, e tutelada pela DRAC (atual Direção Regional da Cultura) desde 2011, a Biblioteca de Culturas Estrangeiras constituiu-se uma instituição pública regional que conta com o apoio das embaixadas dos países representados. O projeto para esta biblioteca tinha o intuito de proporcionar, especialmente aos estudantes, uma informação mais profunda e de fácil acesso a outras culturas. A recetividade e o envolvimento dos consulados e das embaixadas revelaram excelentes resultados. Criada em 1987, na sequência da doação de uma coleção de livros pelo Governo da Venezuela à RAM, a Biblioteca marcou o início de um espaço que iria envolver outros países num projeto posteriormente denominado Biblioteca de Culturas Estrangeiras, o qual foi aprovado em 1993, tendo recebido, desde então, personalidades de destaque na área da política, das letras, da história, das ciências e das artes. Com um acervo que resulta essencialmente de doações, englobava em 22015 várias salas de leitura: as salas Simón Bolívar, American Culture Corner, Zwanayo, Sir Winston Churchill, France, Deutschland e Italia. Além dos livros em língua estrangeira das salas mencionadas, a Biblioteca possuía também uma vasta coleção de livros em russo, norueguês, finlandês e sueco. Do seu acervo fazeiam parte monografias, publicações periódicas, material multimédia e cartazes pertencentes às diversas salas de leitura, e com informação cultural, histórica e literária dos diferentes países representados. A Biblioteca tinha como principais objetivos promover ações de carácter cultural, tendo em vista a divulgação das culturas dos países representados. Deste modo, pretendia alargar a outras culturas um valor acrescido à cultura da RAM, educar e informar, proporcionando também, especialmente aos estudantes, um profundo e fácil acesso a informação de outras culturas. Todos os núcleos existentes na Biblioteca abrangiam as diversas áreas do conhecimento, tendo cada sala o seu catálogo organizado segundo autor/título/assunto, seguindo as normas da CDU e da Dewey Decimal Classification. Embora a Biblioteca fosse na sua maioria consultada por estrangeiros, residentes ou visitantes da RAM, os seus leitores eram também alunos e professores de escolas (1.º, 2.º e 3.º ciclos e secundário), estudantes universitários, das áreas de línguas e culturas estrangeiras, e o leitor madeirense. A Biblioteca dispunha de vários serviços: leitura presencial; empréstimo domiciliário; serviço de referência e informação; acesso à Internet; relações públicas e dinamização cultural; serviço de fotocópias; acesso ao catálogo presencial e online e ao fundo de documentos reservados.   A Biblioteca Municipal do Funchal (BMF) A 13 de janeiro de 1838, foi criada a BMF por deliberação camarária, sob a presidência de Sérvulo Drumond de Meneses, ocupando à época uma sala na CMF. A 19 de setembro de 1929, a Biblioteca muda de instalações para o Palácio de S. Pedro, no Funchal. Em agosto de 2009, muda novamente de instalações, desta feita para um piso do Edifício 2000, situado na Av. Calouste Gulbenkian, sem que tivesse beneficiado do programa da RRBP da RAM. Dos seus bibliotecários mais importantes até 2015, merecem destaque Carlos Azevedo de Meneses, que trabalhou na Biblioteca até à sua morte, aos 65 anos, e Adolfo César de Noronha, mais tarde nomeado diretor, o grande impulsionador não só da biblioteca, mas também do museu. Os recursos humanos da BMF possuíam, em 2015, qualificações adequadas ao desempenho documental e tecnológico. Assim, além de organizar, preservar, conservar e divulgar a herança pública que constitui o acervo desta biblioteca, a BMF tinha como missão: facilitar o acesso à informação de forma igualitária e democrática; ser um suporte para a educação e investigação quer a nível individual, quer a nível de instituições; oferecer meios e serviços destinados a satisfazer as necessidades individuais, educativas e de investigação dos utilizadores; fornecer a informação de forma célere e eficaz, recorrendo para o efeito às TIC; e cooperar, sempre que possível, com outras organizações. As atividades mais relevantes para os munícipes passavam pela Hora do Conto, e as conferências e visitas guiadas à BMF. O seu acervo contava, a esta data, com cerca de 300.000 obras, algumas do séc. XIX, incidindo sobre a história, geografia, biologia e outras vertentes do conhecimento relativas à ilha da Madeira. Quanto aos periódicos, possuía 95 títulos de jornais regionais desde 1821, dentre os quais se destacavam A Aurora Litteraria, A Chronica, A Cruz: Semanário Catholico, A Discussão e O Patriota Funchalense. Havia coleções que se destacavam: a coleção Hinton; as coleções de William e Alfredo Reid; a coleção de obras sobre a ilha da Madeira; e a coleção do historiador Joel Serrão. Na coleção digital, incluía-se o Diário de Notícias desde 1900 a 1922, cerca de 300 digitalizações de monografias de temática Madeira e outras que se encontravam em mau estado de conservação. Segundo o Elucidário Madeirense, a BMF incluiria no seu acervo a coleção da Escola Médico-Cirúrgica do Funchal; ao longo dos anos, todavia, esta coleção dispersou-se e em 2015 a Biblioteca ainda não a reunira na globalidade. Beneficiou do acervo da biblioteca fixa da FCG n.º 48, do Funchal, cujo acervo foi incorporado na BMF e na Biblioteca de Santo António do Funchal. A BMF tinha sob a sua alçada as bibliotecas dos bairros da Penteada, inaugurada em 1988, e da Nazaré, em 1989, que pertenceram à FCG, e a biblioteca de Santo António, inaugurada a 6 de julho de 2013. A BMF foi depositária de uma coleção verdadeiramente madeirense, rica e heterogénea, quer em monografias, quer em jornais (possuindo, e.g., um título de um jornal insular datado de 1821, após a revolução liberal).   A Biblioteca Municipal da Calheta  Inaugurada em 1996, a Biblioteca Municipal da Calheta – Casa das Mudas foi construída tendo por base a biblioteca fixa n.º 75 da FCG, Casa da Cultura, instalada na Calheta desde 1973 (a FCG refere a data de 1980) até 2002, ano em que se torna uma unidade orgânica da Câmara Municipal da Calheta, beneficiando do apoio e do empenho financeiro desta. A Biblioteca é constituída por três pólos de leitura, assim distribuídos: pólo do Arco da Calheta (1991), depois designado por Biblioteca Municipal do Arco da Calheta; pólo do Paul do Mar (2001), depois designado por Biblioteca Municipal do Paul do Mar; e pólo do Jardim do Mar (2002), depois designado por Biblioteca Municipal do Jardim do Mar. Em 2015, o seu acervo em suporte papel estava estimado em 9000 obras e o MNL era constituído por 76 DVD, 7 jogos e 2 CD. Os serviços e os produtos prestados eram disponibilizados aos utilizadores pelo bibliotecário, dentro do espaço da Biblioteca. Para além da oferta de obras nas diversas áreas do saber, contava com uma área de leitura/estudo, equipada com ligação sem fios.   A Biblioteca Municipal de Câmara de Lobos A Biblioteca Municipal de Câmara de Lobos, uma biblioteca pública, municipal, do tipo BM2, possuía em 2015 dois pólos de leitura: um no Estreito de Câmara de Lobos e outro no Curral das Freiras. Desde meados da déc. de 60 até 1980, Câmara de Lobos recebeu com periodicidade mensal a biblioteca itinerante da FCG. Numa parceria entre a FCG e a Câmara Municipal (a FCG fornecia os equipamentos e materiais e a Câmara os recursos humanos e o espaço), a 1 de outubro de 1980 abriu a biblioteca fixa n.º 12, no Lg. do Poço, mudando de instalações, em 2004, para a Casa da Cultura de Câmara de Lobos. As negociações com o ex-IPLB para a instalação de uma nova biblioteca, virada para o futuro e para a comunidade, resultaram na inauguração, a 3 de maio de 2009, da nova Biblioteca, o único projeto de raiz aprovado na RAM no âmbito da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas. Este novo espaço passou a ser a base da rede de bibliotecas do concelho e a base técnica, orientada para a uniformização dos serviços e para a informatização de todos os dados referentes ao fundo documental a nível central, que, posteriormente, se distribui pelos polos do Estreito de Câmara de Lobos (que começou, de igual modo, como uma biblioteca fixa da FCG, em 1982, e passou para um novo edifício em 2006) e do Curral das Freiras (aberto em 2010). A rede de bibliotecas do concelho de Câmara de Lobos possuía, em 2015, mais de 35.000 documentos em papel, cerca de 500 documentos sonoros, mais 1500 documentos audiovisuais e 200 CD-ROM.   A Biblioteca Municipal de Machico Em 1964, com o apoio da FCG, foi instalada uma biblioteca nos paços do concelho da Câmara Municipal de Machico, no salão do 1.º andar. A 14 de setembro de 1964, foi inaugurada a biblioteca fixa n.º 74 da FCG, embora a biblioteca itinerante da FCG de São Vicente servisse, também, a população deste concelho. Anos passados, e para responder às necessidades dos leitores, a Biblioteca foi transferida para uma maior área da Câmara. Assim, a 3 de março de 2008 é inaugurada a Biblioteca Municipal de Machico no Edifício Fórum Machico, passando a contar com um espaço digno ao serviço de toda a comunidade. O município concorreu ao programa da RRBP (IPLP/DRAC) apenas para apoios à aquisição de mobiliário e equipamento, fundos documentais e informatização. Em 2015, a Biblioteca disponibilizava cerca de 18.500 livros para todas as idades, distribuídos em regime de livre acesso às estantes. Existia uma coleção de livros que se encontrava resguardada, cujo interesse residia sobretudo na área da literatura e dos estudos literários portugueses, que exigia um pedido de pesquisa aos técnicos. Para além dos livros, a Biblioteca contava também com MNL, em particular CD de todo o género de música, filmes vários e CD-ROM (num total de cerca de 50 unidades), sobre muitas áreas do conhecimento, promovendo aos munícipes o empréstimo domiciliário, serviços de fotocópias, digitalização de documentos, atividades de promoção de leitura, entre outros. Em 2013, foi inaugurada uma extensão desta Biblioteca no Museu da Baleia.   A Biblioteca Municipal da Ponta do Sol Criada em 1963 a partir da biblioteca fixa n.º 77 da FCG, cujo acervo absorveu, a Biblioteca Municipal da Ponta do Sol era um serviço público que tinha por finalidade facilitar o acesso à cultura, à informação, à educação e ao lazer, contribuindo para elevar o nível cultural e a qualidade de vida dos madeirenses. Como centro de recursos educativos, a Biblioteca tem como principais objetivos: estimular o gosto pela leitura e fomentar a compreensão do mundo; criar condições para a fruição da criação literária, científica e artística, proporcionando o desenvolvimento da capacidade crítica do indivíduo; conservar, valorizar, promover e difundir o património escrito, em especial o respeitante ao fundo local, o qual irá contribuir para o reforço da identidade cultural da região; e difundir documentação e informação útil e atualizada, em diversos suportes e relativa às várias áreas do saber, satisfazendo, assim, as necessidades dos utilizadores e dos diferentes grupos sociais.   A Biblioteca Municipal do Porto Moniz A Biblioteca Municipal do Porto Moniz foi inaugurada a 22 de julho de 1988 e instalada na sede da Câmara Municipal, no rés-do-chão. Anteriormente, ocupava um espaço no edifício onde estava instalada a antiga Câmara. O município de Porto Moniz beneficiou da biblioteca fixa n.º 83 da FCG, instalada por volta de 1964, que foi a base da Biblioteca Municipal, que contou com o apoio financeiro da Câmara; esta candidatou-se ao programa da RRBP, mas não foi possível avançar com a construção do edifício por falta de verbas. Em 2015, o seu acervo estava estimado num total de 10.474 volumes, sendo composto por monografias e revistas que se enquadravam no perfil do utilizador do município. O empréstimo de livros, a leitura de revistas, o apoio aos leitores e a existência de terminais informáticos com ligação à Internet eram os principais serviços e produtos que a Biblioteca oferecia à comunidade de utilizadores.   A Biblioteca Municipal do Porto Santo A Biblioteca Municipal do Porto Santo teve a sua génese na biblioteca da FCG n.º 78, criada em 1960 (data que não está de acordo com a data fornecida pela FCG; 1964 é a data mais provável) e desativada em 2003, e esteve instalada, de 1960 a 1990, no rés-do-chão da Câmara Municipal do Porto Santo. Em 1990, passou outro edifício da Câmara até 1994, ano em que transita para um antigo quartel do exército, até 1998. Neste ano, regressa ao segundo espaço da Câmara Municipal, que não foi construído de raiz, nem beneficiou do apoio financeiro da RRBP, mas apenas do apoio financeiro camarário. A Biblioteca dispunha, em 2015, um acervo em papel de 23.545 exemplares, distribuído por monografias, publicações periódicas, vídeos, CD-ROM e DVD. Não possuía catálogo online, mas promovia as leituras domiciliárias e presenciais. Para além disso, realizava eventos culturais, tais como: hora do conto; palestras e conferências; lançamento de livros; concursos, entre outros. Os seus utilizadores eram sobretudo turistas, alguns investigadores e estudantes.   A Biblioteca Municipal da Ribeira Brava A Biblioteca Municipal da Ribeira Brava teve a sua génese na biblioteca fixa da FCG n.º 82, inaugurada a 30 de setembro de 1964 e desativada em 2003. A construção da Biblioteca foi possível graças à sensibilidade para as questões da cultura e da literacia dos representantes autárquicos. Totalmente remodelada e inaugurada a 20 de novembro de 2001, a Biblioteca Municipal possuía em 2015 um acervo de obras e documentos em suporte papel no total de 15.694, disponível a todos os munícipes. Os serviços que prestava aos leitores eram: leitura de monografias e das publicações de diários e jornais; acesso a computadores e rede sem fios; exposições e atividades culturais de apoio à educação e promoção do desenvolvimento cultural do concelho.   A Biblioteca Municipal de Santa Cruz A Biblioteca Municipal de Santa Cruz teve por base a biblioteca fixa n.º 73 da FCG, a segunda biblioteca fixa de que a Madeira beneficiou e a primeira num concelho rural, inaugurada em julho de 1964 e instalada no edifício do Tribunal, tendo mudado de espaço físico diversas vezes. Em 1991, com o apoio da Câmara Municipal de Santa Cruz, e não do programa financeiro da Rede de Leitura Pública, foi inaugurado um edifício para a Biblioteca na Q.ta do Revoredo. Em 2015, a Biblioteca prestava um serviço inteiramente gratuito, com livre acesso às estantes, quer para leitura presencial, quer domiciliária, e tinha ao dispor dos utilizadores um considerável fundo bibliográfico, constituído por livros e diários regionais, entre outros, estimado em cerca de 20.000 unidades. Em 2000, a FCG entregou a biblioteca à Câmara Municipal, aumentando o seu acervo. As suas instalações incluíam, à data, a receção, uma sala infanto-juvenil, duas salas abertas ao público adulto e ainda um anfiteatro ao ar livre, espaços que convidavam à leitura e à realização de eventos.   A Biblioteca Municipal de Santana A Biblioteca Municipal de Santana teve a sua génese na biblioteca fixa da FCG n.º 76, fundada por volta de 1964 e desativada em 2010, cujo acervo foi incorporado na Biblioteca com o empenho financeiro da Câmara Municipal de Santana. Em 1997, o edifício da Câmara foi alvo de um projeto de ampliação, que não beneficiou do programa financeiro da Rede de Leitura Pública, e se revelou uma obra de cariz moderno, que incluiu a construção do salão nobre e da Biblioteca Municipal; esta última começou a funcionar, em janeiro de 2010, nas instalações da Casa da Cultura de Santana. O seu acervo era constituído, em 2015, por documentos em suporte papel, e estimado em 18.000 títulos, distribuídos por monografias, publicações periódicas e MNL.   A Biblioteca Municipal de São Vicente Inaugurada em 1986, a Biblioteca Municipal de São Vicente ocupou um espaço no edifício da Câmara Municipal de São Vicente, sendo um serviço cultural da Câmara que não beneficiou do programa financeiro da Rede de Leitura Pública. Nasceu da biblioteca itinerante BI50 e da biblioteca fixa FCG n.º 175, designada Biblioteca Municipal Calouste Gulbenkian de São Vicente, inaugurada a 22 de janeiro de 1987 e desativada em 2002. A FCG doou os seus acervos ao município, ou seja, à Biblioteca Municipal, que em 2013 contava com um total de 21.998 unidades em suporte papel e 12.724 unidades em suporte digital. A Biblioteca disponibilizava diversos serviços e produtos aos munícipes: a consulta de um vasto número de documentos, impressos e multimédia, para além de empréstimo domiciliário, quer de livros quer de documentos audiovisuais, e serviço grátis de fotocópias. Disponibilizava ainda outros apoios, nomeadamente: serviço na área da animação cultural, procurando dar respostas às necessidades de informação, cultura, lazer e educação a todos os munícipes; aconselhamento à leitura e apoio a trabalhos escolares, apoiando também, quando solicitadas, as bibliotecas escolares. No concelho de São Vicente, ficavam situadas a Biblioteca Municipal de Boaventura, pertencente à Casa do Povo de Boaventura, e a Biblioteca Municipal da Ponta Delgada, pertencente à Casa do Povo da Ponta Delgada, servindo ambas as respetivas populações locais.     Iolanda Silva (atualizado a 25.02.2017)    

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energia elétrica

Antes de se poder usar eletricidade para a iluminação, o azeite era o combustível mais utilizado para esse fim. Até ao final do séc. XIX, os madeirenses utilizaram velas ou candeeiros alimentados a azeite (e posteriormente a petróleo) para a iluminação. À noite, as ruas e os espaços públicos mergulhavam numa completa escuridão. “De longe em longe, um traço de luz coado pelas vidraças das habitações ou uma lanterna guiando algum transeunte noctívago, vinham quebrar momentaneamente as trevas em que a cidade [do Funchal] se achava sepultada” (SILVA e MENESES, 1998, II, 268). A iluminação pública do Funchal surgiu em 1846, numa iniciativa do governador civil José Silvestre Ribeiro, que mandou colocar alguns candeeiros a azeite em pontos centrais da cidade, como forma de melhorar a segurança da população madeirense. A esta iniciativa juntaram-se outras de carácter privado, de pessoas abastadas e de alguns britânicos estabelecidos no Funchal, que contribuíram para a iluminação das ruas com candeeiros instalados nas suas próprias habitações. Os candeeiros teriam dois ou três bicos e tinham como combustível o azeite, o óleo de peixe ou de purgueira. Em 1849, chegaram a existir cerca de 70 candeeiros para a iluminação da cidade do Funchal. Mais tarde, em 1870, a Câmara do Funchal assumiu os encargos com a iluminação e instalou candeeiros em mais alguns pontos da cidade. “Da extremidade de umas hastes de ferro horizontais, de pouco mais de um metro de comprimento, pendiam os candeeiros, sendo os mais antigos amarrados a uma corrente, que, ao longo da haste e da parede, se vinha prender numa fechadura que era aberta para fazer subir ou descer o depósito do combustível e assim proceder-se à sua limpeza e também acender-se ou apagar-se o candeeiro. Depois passaram a estar fixos na extremidade de varas de ferro, sendo preciso o auxílio de escadas para todo o serviço de iluminação” (SILVA e MENESES, 1998, II, 138). Por esta altura, o petróleo começou a ser utilizado como alternativa ao azeite, por gerar uma chama mais intensa. Acompanhando o desejo de progresso que se verificava noutras cidades europeias, houve algumas tentativas, aliás sem sucesso, de mobilização para a implementação da iluminação pública do Funchal a gás. No entanto, o passo decisivo, em termos de progresso, deu-se com a instalação da luz elétrica. A 22 de maio de 1895, a Câmara fez uma concessão ao engenheiro portuense Eduardo Augusto Kopke para a iluminação pública do Funchal. Passado um ano, este engenheiro transferiu o seu contrato para a empresa inglesa The Madeira Electric Lighting Company Limited, conhecida na Madeira como Companhia da Luz Elétrica. Esta empresa implementou a primeira rede de iluminação elétrica e procedeu à instalação da Central Térmica do Funchal, para a produção de energia elétrica. Em 1897 inaugurava-se a luz elétrica no Funchal. A primeira central tinha apenas um grupo gerador a vapor, com potência de 35 cv. No período de 20 anos que se seguiu à inauguração da Central Térmica do Funchal, o uso da energia elétrica foi-se tornando essencial no quotidiano dos madeirenses. O objetivo do contrato de concessão com a empresa inglesa foi totalmente cumprido. Existiam “em toda a cidade e subúrbios 14 arcos voltaicos e 1400 lâmpadas, estendendo-se a mesma iluminação até o Lazareto, quinta Reid, no Caminho do Meio, Conceição, em S. Roque, Quinta do Leme, em Santo António, Nazaré, em São Martinho, e Confeiteira, no Monte” (SILVA e MENESES, 1998, II,269). Para dar resposta às exigências do crescente consumo de eletricidade, a empresa inglesa ampliou, por diversas vezes, a pequena central elétrica do Funchal, já conhecida como Casa da Luz. Em 1925, foi alargado o prazo do contrato de concessão à Madeira Electric Light Company, de 45 para 50 anos. A empresa construiu uma nova central, num espaço contíguo ao anterior, onde foram instalados, ao longo de 11 anos, 6 grupos eletrogéneos. A potência total nominal era, então, de 1890 kW. Mas a Segunda Guerra Mundial trouxe muitas dificuldades à empresa inglesa no que diz respeito ao abastecimento de combustível. Um pouco por toda a Ilha, nasciam iniciativas privadas para a produção hidroelétrica, com vista a responder às necessidades de energia elétrica em locais mais remotos. Entretanto, o Governo português enviou à Madeira uma missão técnica, liderada pelo Eng.º Rafael Amaro da Costa, para estudar o aproveitamento das águas da Ilha para rega e energia elétrica. Foi aprovado em 1943 o plano dos novos aproveitamentos hidráulicos da Madeira e constituída a Comissão Administrativa dos Aproveitamentos Hidráulicos da Madeira (CAAHM), que se instalou no Funchal em 1944 e deu imediatamente início à execução do novo plano. Findo o prazo do contrato de concessão à empresa inglesa, e apesar do seu manifestado interesse em não a renovar, aquele foi novamente alargado por mais cinco anos. Em abril de 1949, o município do Funchal assumiu a substituição das funções da Madeira Electric Lighting Company pelos Serviços Municipalizados de Eletricidade. A produção e o fornecimento de energia elétrica do arquipélago, essenciais para o seu desenvolvimento, são assim transferidos para o sector público. Nos anos 50, foram atribuídas à CAAHM as funções de produção, transporte e distribuição de energia elétrica em toda a Ilha. Em 1953, começaram a funcionar as centrais hidroelétricas da Serra de Água e da Calheta, que garantiram energia elétrica a zonas rurais. A Ribeira Brava foi a primeira vila a receber energia elétrica. A aprovação do plano de eletrificação rural, que se veio a estender à ilha do Porto Santo, alargou a rede elétrica a todo o arquipélago. No Funchal, foi construída a sede da CAAHM, na Av. do Mar, e reequipou-se a sua central térmica com novo grupo eletrogéneo de 1000 kW. Edificou-se a Central Térmica do Porto Santo, que foi inaugurada a 9 de agosto de 1954. O consumo crescente de energia elétrica esteve na origem da construção de uma nova sala de máquinas, que ficava localizada a leste da anterior, onde foram colocados três grupos, um de 5145 e dois de 4320 kW. Na déc. de 70, conquistada a autonomia para a Madeira, o Governo regional transformou a CAAHM, então responsável pela produção, transporte e distribuição de eletricidade, numa empresa pública, a Empresa de Electricidade da Madeira (EEM). A EEM lançou-se a grandes obras com vista à eletrificação de toda a ilha da Madeira: foi construída a Central da Vitória, em 1980; a rede de baixa tensão estendeu-se por 456 km; e foram instalados 786 postos de transformação e 8498 focos de iluminação pública. Foram também criados mais três grupos de 5145 e 4329 kW para dar resposta à maior necessidade de consumo derivada do acelerado ritmo de desenvolvimento socioeconómico da Região. A produção de energia hidroelétrica, a partir de 1951, e a produção de outras energias renováveis, em finais do séc. XX, fizeram do arquipélago da Madeira um exemplo de inovação na diversificação de fontes de energia e de sustentabilidade energética. Nos anos 90, a EEM passou a sociedade anónima de capitais exclusivamente púbicos (dec. leg. regional n.º 14/94/M, de 3 de junho).   Casa da Luz O edifício sede da EEM, situado na Av. do Mar, foi sempre conhecido pelos madeirenses como Casa da Luz. Este edifício foi construído em 1956, tendo sido projetado pelo Arqt. Chorão Ramalho. Nele funcionam os serviços administrativos e técnicos da EEM e a subestação do Funchal. É frequente ouvir a população falar da necessidade de ir à Casa da Luz para tratar de demandas administrativas relacionadas com a conta da eletricidade. Neste edifício estava situada a Central Térmica do Funchal, que foi desativada em 1989, após um século de funcionamento. Para não deixar cair no esquecimento o esforço de muitos madeirenses que, desde o fim do séc. XIX, se empenharam nos primeiros passos da eletrificação da ilha da Madeira, foi inaugurado o Museu Casa da Luz, a 24 de novembro de 1997, por altura das celebrações do centenário da introdução da eletricidade na Ilha. Este Museu, situado no antigo espaço da Central Térmica do Funchal, ocupa cerca de 2000 m2 de exposição e concentra uma valiosa coleção de materiais e equipamentos, que contam a história da eletricidade na Madeira.     Ana Londral Cátia Teles (atualizado a 23.03.2017)

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