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almada, joão francisco de

Nascido em Santana, na ilha da Madeira, a 9 de julho de 1874, era filho de João Francisco de Almada e de Maria Emília Cardoso de Almada. Casou-se a 23 de outubro de 1907 com Ilda Beatriz Pinto Prado de quem teve três filhos: Maria Prado de Almada, Manuel Prado de Almada e António Manuel Prado de Almada. Estudou no Liceu do Funchal e, depois, entrou na Faculdade de Medicina de Coimbra, concluindo a licenciatura a 26 de julho de 1899. De regresso à Madeira, fixou morada em Santana ao ser nomeado subdelegado de saúde do concelho, por alvará de 17 de junho de 1905. Depois, a 21 de outubro de 1905, assumiu as funções de médico municipal da Câmara Municipal do Funchal, passando a residir na cidade, onde desenvolveu um importante trabalho como médico. Da sua ação como médico ao serviço da população madeirense, destaca-se o facto de ter sido o impulsionador da luta contra a tuberculose na Madeira. Assim, a ele se deve a criação do primeiro dispensário de luta antituberculosa, no Campo da Barca, posteriormente designado por Centro Dr. Agostinho Cardoso. Agostinho Cardoso (1908-1979), genro deste médico e também profissional da mesma área, seguiu a mesma linha de luta contra a tuberculose, daí ter o seu nome vinculado ao centro do Campo da Barca. Devemos, ainda, ter em conta a ação de João Francisco de Almada no sentido da instalação do sanatório da Qt. de Santana, no Monte, que foi inaugurado a 8 de dezembro de 1940 e que viria a receber o seu nome a 2 de julho de 1942, por deliberação da comissão executiva da ANT – Assistência Nacional aos Tuberculosos. A par disso, foi diretor clínico do Hospital Princesa D. Amélia e dos manicómios de Câmara Pestana e Casa de Saúde do Trapiche. Acresce, ainda, a sua ação no sentido da mudança do Hospital da Misericórdia do centro do Funchal (das instalações onde depois funcionaria o Governo regional) para o local dos Marmeleiros, no Monte. A sua obra em prol da Madeira e da saúde da sociedade madeirense foi reconhecida em vida, tendo sido agraciado, a 7 de dezembro de 1933, pela comissão administrativa da Câmara Municipal, com o título de cidadão benemérito da cidade do Funchal. Depois, em 1937, recebeu do Governo francês o grau de oficial da Academia, pelo trabalho como presidente da comissão de receção ao cruzeiro médico francês que teve na Madeira, em 1932 e em 1936. João Francisco de Almada faleceu no Funchal a 14 de junho de 1942. A lembrança da sua memória e da sua obra está registada publicamente na designação atribuída ao Hospital Dr. João de Almada e no busto em bronze, obra do escultor Anjos Teixeira, de 1974, que foi inaugurado a 22 de março de 1988 no pátio do referido Hospital (Qt. de Santana, Funchal). É ainda de referir a existência, na Quinta Grande (freguesia do concelho de Câmara de Lobos), desde 9 de julho de 1998, do caminho Dr. João Francisco de Almada, o que se relaciona com o facto de a Qt. do Pomar, na Quinta Grande, ter sido propriedade familiar por via da sua esposa.   Alberto Vieira (atualizado a 13.11.2016)

Ciências da Saúde Personalidades

associações católicas

O direito de associação é um direito próprio do ser humano, reconhecido desde sempre. O facto de o homem se poder associar com outros para alcançar determinados objetivos ou finalidades em vista da sua realização pessoal e comunitária é algo inalienável, que não pode ser eliminado por nenhuma entidade humana. Tanto os filósofos como os teólogos e os juristas têm defendido esse direito da pessoa humana. O magistério pontifício sempre reivindicou para o cidadão o direito de fundar e pertencer a associações no campo civil, social, profissional e religioso. Assim o fizeram Leão XIII (na Rerum Novarum, de 15/05/1891), Pio XI, Pio XII, João XXIII, Paulo VI, João Paulo II, Bento XVI, e Francisco. Na Exortação Apostólica Christifideles Laici, o Papa João Paulo II refere-se “às formas agregativas de participação”, falando de “uma nova era agregativa” dos fiéis leigos: “ao lado do associativismo tradicional e, por vezes, nas suas próprias raízes, brotaram movimentos e sodalícios novos, com fisionomia e finalidade específicas: tão grande é a riqueza e versatilidade de recursos que o Espírito infunde no tecido eclesial e tamanha é a capacidade de iniciativa e a generosidade do nosso laicado” (n.º 29). Muitas outras intervenções deste Papa (em particular no congresso mundial dos movimentos eclesiais, em 1998) demonstram o seu interesse pela promoção da vocação laical e das associações de fiéis. O Papa Francisco, ao receber os participantes de um congresso, afirmou: “Caros irmãos e irmãs, vós trouxestes já muitos frutos à Igreja e ao mundo inteiro, mas trareis outros ainda maiores com a ajuda do Espírito Santo, que sempre suscita e renova dons e carismas, e com a intercessão de Maria, que não cessa de socorrer e acompanhar os seus filhos. Ide para a frente: sempre em movimento. […] Não pareis! Sempre em movimento!” (FRANCISCO, 2014). A formulação jurídica do direito de associação como fundamental não existe no Catecismo da Igreja Católica (CIC) de 1917. Só a encontramos no Código de Direito Canónico (CDC) de 1983, por influência da doutrina e do Concílio Vaticano II, com o contributo anterior de numerosos estudiosos canonistas e teólogos. A limitação do primeiro Código não é tanto a falta de reconhecimento do direito de associação, mas sobretudo a sua não explícita afirmação e o não encorajamento do fenómeno associativo. A nível eclesial, sempre houve movimentos e associações, como comprova a vida e a evangelização da Igreja. Na Constituição da República Portuguesa encontramos vários artigos que caracterizam o fenómeno associativo como um direito fundamental do cidadão português: 46.º, 51.º, 247.º, 253.º, 270.º. O n.º 1 do artigo 46.º é explícito na proteção e defesa do direito de associação: “Os cidadãos têm o direito de, livremente e sem dependência de qualquer autorização, constituir associações, desde que estas não se destinem a promover a violência e os respetivos fins não sejam contrários à lei penal”. Depois dos cânones sobre as associações de fiéis em geral (cc. 684-699), o título ´XIX do CDC de 1917 regulamenta as associações de fiéis em particular (cc. 700-725) com estes tipos: Ordens Terceiras Seculares (cc. 702-706), que são associações approbatae; Confrarias (cc. 707-719), que podem ser constituídas só por formal ereção de decreto (can. 708); Pias Uniões, para as quais é suficiente a aprovação e que também podem ser eretas (can. 708); e ainda Arquiconfrarias e Uniões Primárias. (cc. 720-725). Quanto à aprovação, o CDC de 1917 prevê dois tipos de associações: as associações eclesiásticas, eretas e dirigidas pela autoridade eclesiástica e que adquirem personalidade jurídica; e as associações laicais, dirigidas por leigos, as quais podem ser probatae ou laudatae pela autoridade eclesiástica. Estas não têm o seu ser da autoridade eclesiástica, não são governadas por ela, e portanto não podem chamar-se erectae com personalidade jurídica. Nem sequer têm os seus estatutos e a sua organização interna aprovados por tal autoridade. São dirigidas por leigos, segundo os estatutos; são laicais, não eclesiásticas. Assim, ser associação “laical” não significava que os seus membros fossem só leigos, mas sim que a mesma não tinha sido ereta pela autoridade eclesiástica ou que não tinha sido aprovada juridicamente por esta. Tratava-se de associações constituídas por fiéis por sua própria iniciativa, e por eles governadas para fins espirituais ou caritativos. Mas estas associações não estavam fora da vigilância do Bispo: embora ele não as pudesse governar, olhava pela fé e bons costumes das mesmas. O CDC de 1917 considerava só as associações eclesiásticas, enquanto sujeito típico de direitos e de deveres no ordenamento jurídico eclesiástico, não se ocupando das associações laicais enquanto tal. Eram elas: as associações louvadas, de natureza privada (a autoridade eclesiástica limitava-se a louvar o fim da associação); as associações aprovadas, que entravam na estrutura organizativa da Igreja, mas sem possuir a personalidade jurídica; e as associações eretas, que entravam na estrutura organizativa da Igreja com a atribuição da personalidade jurídica depois da ereção formal. O fenómeno associativo na Igreja foi referido em alguns documentos do Concílio Vaticano II. Veja-se, por exemplo Apostolicam Actuositatem para o direito de associação dos leigos, e Presbyterorum ordinis para o direito de associação dos presbíteros. “A liberdade associativa dos fiéis não é uma espécie de concessão da autoridade, mas brota do Batismo, sacramento que convoca os fiéis leigos à comunhão e missão na Igreja” (Lumen Gentium, n.º 37). O Vaticano II delineou o contexto onde se deve situar o fenómeno associativo e apresentou o seu fundamento eclesiológico: o direito de associação dos fiéis, como modalidade típica de participação na única missão da Igreja. “Na Igreja, a diversidade de ministérios, mas unidade de missão” (Apostolicam ctuositatem, n.º 2); a distinção de ministérios, na única missão, em razão da sua condição ontológico-sacramental. O Concílio não emite uma qualificação jurídica das associações, pois essa não era a sua intenção e função. Descrevendo as várias relações das associações com a hierarquia, oferece uma interessante catalogação das associações nascidas da livre iniciativa dos fiéis: associações simplesmente constituídas por leigos, associações louvadas ou recomendadas, associações explicitamente reconhecidas, associações electas et particulari modo promotae. No fenómeno associativo e nas suas várias manifestações (grupos, agregações, movimentos, comunidades, pias uniões, confrarias, ordens terceiras, institutos, etc.), manifesta-se uma peculiar realização da comunhão eclesial: “Portanto, o apostolado em associação responde com fidelidade à exigência humana e cristã dos fiéis e é, ao mesmo tempo, sinal da comunhão e da unidade da Igreja em Cristo. [...] O apostolado associativo é de grande importância também porque, nas comunidades eclesiais e nos vários meios, o apostolado exige com frequência ser realizado mediante a ação comum. As associações criadas para a ação apostólica comum fortalecem os seus membros e formam-nos para o apostolado. [...] É absolutamente necessário que se robusteça a forma associada e organizada do apostolado no campo de atividades dos leigos” (Apostolicam Actuositatem, n.º 18). Analisando esta problemática à luz do CDC de 1983, pode-se concluir que o can. 215 é fundamental para a formulação jurídica do direito de associação e do direito de reunião na Igreja. Este cânon, que provém do esquema da Lex Ecclesiae Fundamentalis, entretanto não promulgado, configura este direito e confere-lhe uma grande relevância. “Os fiéis podem livremente fundar e dirigir associações para fins de caridade ou de piedade, ou para fomentar a vocação cristã no mundo, e reunir-se para prosseguirem em comum esses mesmos fins” (can. 215). O texto latino não emprega o termo “ius”, mas a expressão “integrum est” (SISTACH, 2012, 509). A liberdade dos fiéis no governo das associações privadas é muito ampla, enquanto nas associações públicas é mais limitada. O can. 299 estabelece que os fiéis têm direito, mediante um acordo privado entre eles, de constituir associações privadas. A causa eficiente desta realidade associativa é a vontade dos fiéis que se associam. O legislador começa por ressalvar que os institutos de vida consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica são de outro género, não sendo consideradas associações. Estes Institutos e Sociedades têm normas próprias (cc. 573-746). As normas consagradas às Associações estão legisladas nos cc. 298-329, na seguinte ordem: can. 298, §1 – associações no interior da Igreja para promoverem finalidades próprias da Igreja; cc. 298-312 – normas comuns para todos os tipos de associações; cc. 312-320: normas sobre as associações públicas de fiéis; cc. 321-326 – normas sobre as associações privadas; cc. 327-329 – normas para as associações de leigos. As finalidades das associações são: fomentar uma vida mais perfeita, promover o culto público ou a doutrina cristã, ou outras obras de apostolado, promover o trabalho da evangelização, exercício de obras de piedade ou de caridade, informar a ordem temporal com o espírito cristão. Podem ser membros destas associações todos os fiéis, clérigos, ou leigos, ou clérigos e leigos. Consoante o tipo dos seus membros, podem ser distinguidas: as associações clericais que, sob a direção de clérigos, assumem o exercício da ordem sagrada e são reconhecidas como tais pela autoridade competente (can. 302); as associações religiosas, que vivem a espiritualidade de um Instituto Religioso e tendem à perfeição cristã, tomando o nome de Ordens Terceiras ou de Associações (can. 303; e ainda as associações laicais, que são formadas por leigos, com as finalidades do can. 298. Devem cooperar com outras associações de fiéis na pastoral, e preparar devidamente os leigos (cc. 327-329). As associações não clericais podem ser presididas por leigos (can. 317, §3). Quando o Bispo dá o seu consentimento por escrito para a ereção de uma casa religiosa, o mesmo vale para a ereção, na mesma casa ou na igreja a esta anexa, de uma associação própria do Instituto (cc. 317, §2; 312, §2). As associações que foram constituídas por privilégio apostólico podem entrar numa Diocese, desde que recebam o consentimento escrito do Bispo diocesano (can.312 §2). Estas associações devem cooperar com as obras de apostolado existentes na diocese, sob a vigilância Ordinário do Lugar (can. 311). Qualquer associação pública ou privada tem de possuir os seus estatutos (can. 94) nos quais se determinam: o nome da associação; o fim ou objetivo da associação; a sede; o governo; o património; as condições de ingresso e pertença; o modo de agir, tendo em conta o meio em que trabalham (can. 304). Todas estas associações devem ser acompanhadas espiritualmente por um Assistente, normalmente presbítero, nomeado pela autoridade eclesiástica competente (cc. 317, §§1-3; 324, §2). A capacidade jurídica das associações está definida no CDC, nos respetivos Estatutos, e nas normas de direito particular e direito próprio. Elas podem intervir eclesial e socialmente, e administrar bens (cc. 319; 325). A supressão das associações deve realizar-se de acordo com o CDC (cc. 320, 326), os Estatutos, e as normas de direito particular e direito próprio. O CDC usa a distinção entre associações públicas e associações privadas, embora na linguagem corrente tenhamos outras denominações: confraria, irmandade, ordem terceira, fraternidade, grupo, movimento, etc. As associações públicas são eretas pela autoridade eclesiástica, para conseguir alguns fins reservados natura sua à hierarquia e outros fins que não tenham sido conseguidos pela iniciativa privada; são constituídas ipso iure pessoas jurídicas públicas e agem nomine Ecclesiae, sob a superior direção da autoridade eclesiástica (can. 116). Todas as suas ações abrangem a autoridade eclesiástica, supondo uma relação de quase identificação com ela. Uma associação não é pública porque tem um fim geral eclesial, porque teve um reconhecimento da autoridade eclesiástica, porque tem um carácter de internacionalidade, mas porque entra a fazer parte da estrutura Hierárquica da Igreja, conseguindo fins propriamente institucionais, como estabelece o can. 301, §1. As relações com a hierarquia – Santa Sé, conferência episcopal, bispo diocesano –estão definidas nos cc. 322 e 312, §1. As associações privadas são constituídas por fiéis mediante acordos privados para conseguir fins espirituais, e no can. 298 prevê-se que a sua atividade se desenvolva sob a sua direção e moderação; podem adquirir personalidade jurídica privada. O conceito “privado” não significa, portanto, “sem importância eclesial”. O critério que distingue associações públicas e associações privadas é dado pelo concurso do critério subjetivo e do critério objetivo: o sujeito da constituição das associações e a sua finalidade específica. As associações e os movimentos não podem descurar a comunhão eclesial: “É sempre na perspetival da comunhão e da missão da Igreja e não em contraste com a liberdade associativa, que se compreende a necessidade de claros e precisos critérios de discernimento e de reconhecimento das associações laicais, também chamados ‘critérios de eclesialidade’” (JOÃO PAULO II, 1988, n.º 30). Os movimentos e associações devem assim seguir critérios de eclesialidade que os introduzam na esfera da comunhão eclesial. Devem ter, pois, a responsabilidade em professar a fé católica. Com efeito, uma clara adesão à doutrina da fé católica e ao magistério da Igreja, que a interpreta e a proclama, é sem dúvida condição indispensável para que uma realidade possa existir como tal na Igreja. Também é necessário encontrar um equilíbrio entre dimensão pessoal e comunitária, entre a pertença à Igreja e a pertença ao grupo, entre empenho de oração e coerência de vida, entre valorização da vocação específica dos leigos e reconhecimento da função eclesial da hierarquia, entre autonomia de vida e atividade de grupo. Outro ponto a ter em conta é a conformidade com as finalidades da Igreja. De facto, desempenham atividades conforme à finalidade da Igreja – ou seja à evangelização – todas aquelas associações que se propõem fins espirituais, religiosos, formativos, pastorais, obras de piedade, de caridade, de misericórdia. A comunhão com os Pastores também é importante. A vontade de uma plena comunhão com o Papa, centro perpétuo e visível da unidade da Igreja universal, e com o bispo, “princípio visível e fundamento da unidade da Igreja particular” (Lumen Gentium 22) traduz-se concretamente na disponibilidade em acolher: os princípios doutrinais e orientações pastorais do bispo da diocese; a sua ação de coordenação pastoral que tem em vista harmonizar a atividade dos fiéis e a conjugá-la com o bem comum da Igreja; a sua presença através de um presbítero; o reconhecimento da legítima pluralidade das formas associativas na Igreja. Pede-se de cada associação uma atitude de respeito, de estima e de abertura em relação aos outros grupos e movimentos; e tal atitude demonstra-se verdadeira se se traduz numa disponibilidade real, no respeito pelos outros, sem constituir uma “capelinha” ou um grupo fechado, e na disponibilidade em colaborar com outras associações. Por último refira-se que o direito canónico de 1983 também prevê os “frutos espirituais” como objetivo a atingir pelas associações e os movimentos. Frutos espirituais são aqueles elementos de relevo sobrenatural que acompanham, a uma certa distância de tempo, a obra de uma associação, movimento, grupo, etc. e representam, em certo sentido, a contraprova dos autênticos dinamismos espirituais que neles e através deles se exprimem: a oração, o estilo de pobreza, a caridade, o florescimento de vocações, a coragem da evangelização (catequese, programas de pastoral) e a identificação com o carisma instituto de vida consagrada. De acordo com o can. 312, as associações eclesiais em Portugal são eretas e/ou aprovadas pelo bispo diocesano ou pela Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), de acordo com a sua natureza. Isto não impede que associações portuguesas possam pedir à Santa Sé a sua aprovação como internacionais e/ou mundiais. Nesse caso, terá de haver documentação e pareceres que apoiem a solicitação. A CEP publicou alguns decretos sobre as normas gerais das associações de fiéis e sobre o estatuto canónico das Misericórdias. A Comissão Episcopal do Laicado e da Família assume responsabilidades pastorais na promoção e coordenação do apostolado das associações e movimentos. A nível diocesano, há também os secretariados e/ou comissões, conforme a decisão do respetivo Bispo.  A nível nacional existe uma estrutura de comunhão e de unidade das diversas associações de fiéis, movimentos eclesiais e novas comunidades de apostolado dos leigos, com a designação de Conferência Nacional das Associações de Apostolado dos Leigos. Trata-se de uma pessoa coletiva privada canónica, com estatutos próprios, aprovados pela CEP a 5 de maio de 2011. As suas finalidades principais são: comunhão entre os seus membros, discernimento cristão das realidades contemporâneas, maior unidade de espírito e de ação. Uma lista pormenorizada das associações existentes em cada Diocese encontra-se no Anuário Católico de Portugal. Focando a atenção na Diocese do Funchal, pode dizer-se que, ao longo da sua história de 500 anos, há inúmeras páginas recheadas de labor apostólico das suas associações: confrarias, irmandades, associações de diverso tipo e movimentos. Sobretudo após o Concílio Vaticano II, os Bispos diocesanos incentivaram o apostolado laical organizado, de modo que os leigos pudessem corresponder à sua vocação e missão. Neste contexto, serão feitas algumas notas sobre o pontificado de D. Francisco Santana, Bispo diocesano de 1974 a 1982, cuja ação foi muito relevante no incentivo e na promoção das associações de fiéis leigos na Madeira, destacando os principais momentos e acontecimentos deste processo. Poucos meses depois da sua entrada solene na Diocese, D. Francisco convocou o Conselho Diocesano do Apostolado dos Leigos, “constituído por quantos, acedendo ao Decreto conciliar sobre o apostolado dos leigos (v. nº 26) e aos apelos do Santo Padre Paulo VI (v. motu proprio de 6 janeiro 1967) receberam e aceitem o convite para colaborarem por esta forma, na dinamização e trabalho pastoral da Igreja diocesana” (CDAL, 1.ª reunião). Seguiu-se o decreto de criação do Conselho Diocesano do Apostolado dos Leigos. As três primeiras páginas contêm uma reflexão sobre o mistério da Igreja, em que o bispo discorre sobre os carismas: “O apostolado dos leigos é participação na própria missão salvadora da Igreja e são especialmente chamados a torná-la presente e ativa, para que seja o ‘sal da terra’. Deste modo, todo e qualquer leigo é, ao mesmo tempo, testemunha e instrumento vivo da missão própria da Igreja” (CDAL, 1.ª reunião, dec., p. 2). E prossegue: “Os leigos da Igreja devem ter consciência, da função utópica (cf. Ernst Bloch) da fé cristã que nada tem de alienante do homem e da atividade humana, mesmo quando intimamente e conscientemente unidos à hierarquia estabelecida pelos Apóstolos segundo a vontade de Cristo e seguindo as práticas religiosas por Cristo instituídas” (Id., Ibid., p. 3). Considera o prelado diocesano que, após vários meses de estudo da comissão preparatória dos documentos conciliares e da situação real da Igreja diocesana, e com base no motu proprio de Paulo VI de 6 de janeiro de 1967 (I e III, 9), e na carta enviada à Diocese pelo Santo Padre em 14 de junho de 1974, é altura de declarar instituído o Conselho Diocesano do Apostolado dos Leigos. Determina ainda “nomear para este Conselho, e por um período de dois anos, se antes nada for determinado em contrário, os leigos adultos e jovens, apresentados pelas diversas Associações e Movimentos católicos e ainda pelas Paróquias, cujos nomes constam de um elenco anexo a este decreto” […] e entende “Determinar que todas as Obras, Movimentos, Associações ou Grupos de leigos, quer sejam de âmbito diocesano, ou mesmo nacional ou internacional enquanto atuarem na Diocese, ou regional, paroquial ou de área menor, reconheçam o Conselho Diocesano do Apostolado dos Leigos como superior na escala hierárquica e como elo de ligação entre si e com o Conselho de Pastoral (a instituir-se), com o Conselho Presbiteral e com o Bispo da Diocese”, bem como “recomendar a urgência de serem convenientemente instituídos, em todas as Paróquias da Diocese, com a colaboração dos respetivos Vigários, os Conselhos paroquiais (CoPar), cujo financiamento se deve articular com este Conselho Diocesano do Apostolado dos Leigos” (Id., Ibid., p. 4). A 24 novembro 1974, tem lugar uma reunião com vários pontos de relevo, como: o decreto de criação do Conselho, apresentação dos membros do Conselho, comentário à alocução do Santo Padre de 02/10/1974, relativa ao papel dos leigos, discussão sobre o funcionamento do Conselho, escolha dos membros do Secretariado, síntese e discussão das respostas ao questionário enviado. Nos apontamentos redigidos à mão por D. Francisco Santana, podemos ler: “Não é uma simples reunião de alguns leigos, não é uma organização ou uma associação que se pretende criar, mas é um Conselho diocesano. Chamo a atenção, desde já, para esta palavra ‘Conselho’ que deve orientar todos os nossos pontos de vista e todo o nosso trabalho. É um Conselho da Diocese” (CDAL, 1.ª reunião, s.p.). A documentação da Comissão Preparatória do Conselho Diocesano do Apostolado dos Leigos, cuja primeira reunião teve lugar nos dias 15 e 16 de junho de 1974, menciona que os seus membros são sete. “Foi uma Assembleia de cristãos da Diocese, no Seminário Maior, que teve como tema de reflexão: ‘As carências de apostolado e a oportunidade de ereção do Conselho diocesano do apostolado dos leigos’. Estiveram presentes cerca de 180 católicos responsáveis, integrados ou não em organizações e movimentos católicos. Concluiu ser oportuna e necessária a criação do ‘Conselho’, tendo eleito uma Comissão preparatória de 7 pessoas. Neste encontro, o médico Dr. Luciano Castanheira fez uma intervenção sobre o decreto Apostolicam Actuositatem do Concílio Vaticano II.” Esta Comissão passou a reunir-se mensalmente. A 8 de agosto de 1974, fez circular o primeiro documento, contendo as bases para a constituição do Conselho diocesano do apostolado dos leigos e pedindo sugestões. O segundo documento é escrito com base nessas críticas e sugestões, que não foram tantas como se esperava (reunião da C.P., 24 novembro 1974, CDAL, 1.ª reunião). Os leigos são envolvidos na organização da Jornada Eucarística Diocesana de 17 junho 1976, com procissão desde o Estádio dos Barreiros até à Sé. Nos anos seguintes repete-se esta efeméride, assim como outras iniciativas do apostolado dos leigos. Destaque-se ainda o documento-base sobre os CoPar, que representou outro impulso para o envolvimento dos leigos na vida eclesial. “Os Conselhos paroquiais são um órgão de pastoral, ordenado para despertar o espírito missionário da Paróquia, por forma a que todos se sintam membros corresponsáveis na comunidade paroquial». Possíveis atividades para estes Conselhos: liturgia, catequese, cultura religiosa, recoleções e retiros, formação humana e cristã da família, entreajuda fraterna, emigrantes, sentido do trabalho humano e condições da sua prestação, formação política social, meios de comunicação social, atividades recreativas e culturais, execução de trabalhos burocráticos” (CDAL, 1.ª reunião). A 22 de junho de 1975, tem lugar uma reunião do CDAL, destinada à análise do documento-base dos CoPar. Na ocasião, o bispo profere uma alocução acerca da missão da Igreja e do papel dos leigos. Entre 1975 e 1978, realizaram-se várias reuniões e assembleias do CDAL, que manifestam o dinamismo do apostolado laical; destaque-se a assembleia realizada em 1978, em que foram abordados os temas evangelização das paróquias madeirenses e a doutrina social da Igreja no contexto madeirense. De notar que, em várias ocasiões, houve jornadas de formação com oradores vindos de Lisboa, que discursaram sobre o papel dos leigos: Mário Pinto, Luís Marinho Antunes, outros (in CDAL, 1ª reunião). De 6 a 8 de dezembro de 1975, o CDAL organizou um Curso de preparação para os monitores dos CoPar. Daqui por diante irão suceder-se diversos encontros em vários lugares da Diocese, a fim de lançar os CoPar. Arciprestado do Porto Moniz (março e abril de 1976); Arciprestado do Funchal-suburbano (julho de 1976); Arciprestado do Funchal-centro e do Funchal-suburbano (julho de 1976; Paróquia da Nazaré (abril de 1976). Os novos CoPar foram constituídos, com aprovação dos nomes, sob proposta dos Párocos (anos 1976, 1977, ss). Existem atas das reuniões dos padres dos Arciprestados acerca do documento “Conselhos Paroquiais”. Para concluir esta nota sobre o papel de D. Francisco Santana na promoção do associativismo laical, refira-se a criação do Movimento Jovens Cristãos da Madeira, que dará um grande impulso à pastoral juvenil, orientando os jovens para a vida cristã, no meio de uma sociedade em grande alvoroço social e político, pouco tempo depois da revolução de 25 de Abril de 1974. No pontificado de D. Teodoro de Faria, o empenhamento dos leigos em vida associativa prosseguiu, pautando-se por caraterísticas próprias. Saliente-se, por exemplo, o congresso de pastoral juvenil de 1986. Um texto de D. Teodoro de Faria, “Os jovens e o futuro da nossa terra” (s.d.), analisa as diversas gerações de fiéis, a fé, a Igreja, a família, a escola, o ensino na UCP, afirmando o primado dos valores espirituais. O congresso foi preparado em diversas fases; a terceira realização foi de 17 a 20 de julho, estando os primeiros dias reservados aos delegados e o último aberto à participação de todos os jovens e familiares. António Carrilho, Bispo diocesano desde 2007, procurou fomentar o apostolado laical, na continuidade dos seus predecessores, com as suas visitas pastorais, agendamento de jornadas diocesanas do apostolado dos leigos, apoio a diversas atividades. As associações na Igreja não se justificam só pela inúmeras vantagens que comporta a ação associada pelo apostolado, mas porque sublinham uma exigência conatural à Igreja e ao ser cristão, a de ser comunhão a todos os níveis e aproveitar todas as oportunidades para construir comunidade. O fenómeno associativo na Igreja só tem sentido quando, consciente dos seus carismas, contribui para o anúncio do Evangelho, incrementa a unidade e a reconciliação e é capaz de ver a Igreja numa perspetiva católica. Os movimentos e associações eclesiais são formas privilegiadas de realizar uma vocação na Igreja, revitalizando a consciência batismal, aprofundando o apelo à santidade que a todos é dirigido e ajudando a configurar caminhos de vida e espiritualidades ao serviço de uma identidade cristã e do crescimento do Reino de Deus. Mas não são a única forma de concretizar a vocação cristã. Por outro lado, há aspetos negativos da experiência das associações e dos movimentos. Os movimentos colhem geralmente um aspeto do Evangelho com a sua espiritualidade. O risco reside nas leituras parciais do Evangelho, na fixação numa mentalidade teológica fechada, na não aceitação dos membros da hierarquia consoante as sensibilidades, na absolutização da própria experiência, entre outros. Evolução histórica das associações e movimentos da Diocese do Funchal (1989-2015): - 1989 (PEREIRA, 1989, II, 412): Ação Católica, Jovens Cristãos da Madeira, Movimento dos Estudantes Católicos Madeirenses, Corpo Nacional de Escutas, Movimento Esperança e Vida, Movimento de Educadores Católicos, Associação Católica Internacional a serviço da Juventude Feminina, Legião de Maria, Associação Católica de Enfermagem e Profissionais de Saúde, Cursos de Cristandade, Obra de Santa Zita, Equipas de Casais de Nossa Senhora, Centro de Preparação para o Matrimónio, Escola de Pais, Movimento de Defesa da Vida, Congregação de Nossa Senhora e Filhas de Santa Maria, Ordem Terceira de S. Francisco de Assis, Conferências de S. Vicente de Paulo, Obra de S. Francisco de Sales, Damas da Caridade, Lactário de Assistência a Crianças fracas, Escola-Creche de Santa Clara, Patronato de Nossa Senhora das Dores, Abrigo de Nossa Senhora de Fátima, Casa do Gaiato do Padre Américo, Associação dos Cooperadores Salesianos. - 2007 (elenco da Agência Ecclesia): Ação Católica dos Meios Independentes (ACI); Ação Católica Rural; Ação Católica dos Enfermeiros e Profissionais de Saúde; Associação dos Cooperadores Salesianos; Associação Portuguesa dos Centros de Preparação para o Matrimónio; Associação de Professores Católicos; Convívios Fraternos; Corpo Nacional de Escutas; Cursos de Cristandade; Equipas de Nossa Senhora; Legião de Maria; Liga Eucarística; Liga Operária Católica; Movimento de Apoio à Grávida; Movimento de Apostolado das Crianças (MAC); Movimento dos Jovens Cristãos da Madeira; Movimento dos Estudantes Católicos Madeirenses; Movimento da Mensagem de Fátima; Movimento dos Educadores Católicos; Movimento Esperança e Vida (MEV); Caminho Neocatecumenal; Obra de Santa Zita; Renovamento Carismático; Sociedade de São Vicente de Paulo; Associação Católica Internacional ao Serviço da Juventude Feminina; Equipas Jovens de Nossa Senhora; Filhas de Maria; Movimento de Defesa da Vida; Movimento dos Trabalhadores Cristãos; Oficinas de Oração e Vida; Movimento dos Focolares e Movimento Apostólico de Schoenstatt. Há ainda os Institutos Seculares, a Companhia Missionária do Coração de Jesus, os Cooperadoras da Família (Obra de Santa Zita) e as Servas do Apostolado. - 2015 (informação facultada pela Diocese do Funchal): Movimentos ligados à vida consagrada: Maria Rivier (Irmãs da Apresentação de Maria), Amigos da Irmã Wilson (Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora das Vitórias), Associação dos Cooperadores Salesianos, Damas da Caridade de S. Vicente de Paulo, Associação de São Vicente de Paulo, Ordem Franciscana Secular, Ordem Terceira do Carmo, Movimento por um Lar cristão (Obra de Santa Zita), Movimento de Apoio à Grávida, Juventude Dehoniana, Juventude Hospitaleira, Juventude Mariana Vicentina, Juventude Salesiana, Casais da Verbum Dei. Movimentos de Leigos: Associação Católica Independente, Ação Católica Rural, Associação Católica Internacional ao Serviço da Juventude Feminina, Equipas Jovens de Nossa Senhora, Equipas de Nossa Senhora, Legião de Maria, Liga Operária Católica, Filhas de Maria, Movimento Esperança e Vida, Cursos de Cristandade, Renovamento carismático, Oficinas de Oração, Jovens Cristãos da Madeira, Convívios fraternos, Corpo Nacional de Escutas (CNE), Movimento de Estudantes Católicos Madeirenses (MECM), Movimento Apostólico de de Schoenstat, Movimento Mensagem de Fátima.    M. Saturino da Costa Gomes (atualizado a 04.10.2016)

Religiões Sociedade e Comunicação Social

acram - associação cultural e recreativa dos africanos na madeira

A Associação Cultural e Recreativa dos Africanos na Madeira (ACRAM), registada no ano 2001 com a designação oficial de ACRA por iniciativa de quatro imigrantes africanos residentes na Região Autónoma da Madeira (RAM), naturais da Guiné-Bissau e de Angola, é uma organização sem fins lucrativos que tem por objetivo: preservar e divulgar a cultura africana na RAM, e promover a integração dos imigrantes africanos na sociedade madeirense. Este objetivo encontra-se consagrado nos estatutos da Associação: “fomentar, defender a unidade e solidariedade entre membros da comunidade africana residentes na RAM. Promover os valores culturais africanos; contribuir para a integração dos membros da comunidade” (“Associação Cultural…”, JORAM, II, 32, 2005, 9). A ACRAM surgiu num período marcado por grandes obras públicas na Região e pelo desenvolvimento do sector da construção civil: finais do séc. XX e inícios do séc. XXI. Este fenómeno originou o aumento significativo da população imigrante, sobretudo indivíduos do Leste europeu, Brasil e continente africano. Os imigrantes africanos residentes na RAM são provenientes de diversos países, com destaque para o Senegal, a Guiné-Bissau, a Guiné-Conacri, Angola, Moçambique, Cabo-Verde, África do Sul, Egipto, Marrocos e a Tunísia. A organização é reconhecida pelo Governo Regional como sendo, segundo o secretário regional dos Recursos Humanos do Governo Regional da Madeira, Brazão de Castro, “um importante parceiro para a integração na Região dos cidadãos de África, particularmente dos países de língua e expressão portuguesa e tem fomentado de uma forma exemplar o diálogo intercultural” (“Associações Constituem…”, AIPA, 96). As relações institucionais da Associação com o Governo Regional remontam à data da sua criação. A ACRAM também tem estabelecido relações com outras instituições da Região, como sejam as escolas, as juntas de freguesia, os consulados, as câmaras municipais, focalizando sempre a consolidação de esforço dentro de uma perspetiva de proximidade, cidadania plena e responsabilidade social. O relacionamento com os governos dos países de origem é muito esporádico. Verifica-se através das embaixadas e dos consulados, ao nível da solicitação de apoios. A ACRAM privilegia a dimensão cultural nas suas relações com a comunidade e com as instituições, promovendo, em colaboração com o Governo Regional, encontros que incluem mostras gastronómicas, exposições de arte africana e espetáculos musicais, e que têm vindo a ganhar cada vez mais adesão dos madeirenses e de todas as comunidades residentes na Região. A Associação também tem participado na semana intercultural, promovida pelo Centro das Comunidades Madeirenses, na qual se celebram os dias dos povos africanos e das mulheres e crianças africanas, promovendo convívios e fortalecendo laços de solidariedade. Estas atividades visam sempre, por um lado, a promoção do diálogo intercultural e a sensibilização para a multiculturalidade, e, por outro lado, a divulgação da cultura africana, as suas musicalidades, os ritmos, a gastronomia, o artesanato, ou seja, “levar um pouco de África” (MANÉ, com. oral, 2015) à comunidade recetora, como afirmam os dirigentes da organização. Estes eventos também têm por objetivo promover o envolvimento de todos indivíduos da comunidade. A promoção dos direitos das minorias étnicas e das suas identidades culturais faz parte das prioridades de intervenção social da ACRAM. A Associação financia-se através de donativos, da angariação de fundos provenientes de convívios e de apoios financeiros específicos do Alto Comissariado para as Migrações, nomeadamente através do Programa de Apoio ao Associativismo Imigrante (PAAI), e ainda de projetos apoiados pelo Fundo Europeu para a Integração de Nacionais de Países Terceiros (FEINPT). A ACRAM conta ainda com a tradicional contribuição dos associados, que nos seus primeiros 15 anos de existência chegaram a cerca de 150, embora nem todos fossem residentes na Madeira. A ACRAM não teve, nesse período, nenhum tipo de apoio financeiro do Governo Regional da Madeira, exceto parcerias com o centro de emprego da Madeira, que disponibilizou técnicos do emprego através de programas de formação. Ao nível do apoio técnico, o Centro das Comunidades Madeirenses do Governo Regional fornece pareceres no que respeita à dinamização das atividades e aprovação dos projetos. Os associados da ACRAM caracterizam-se fundamentalmente por possuírem uma ligação ao continente africano, sejam descendentes de imigrantes, os próprios imigrantes, ou ainda portugueses que residiram provisoriamente em África por motivos familiares ou laborais. No início do séc. XXI, a ACRAM tem-se empenhado também no sentido de mitigar os efeitos perversos das situações de desemprego na comunidade que representa, pois está na sua génese, enquanto organização, a necessidade de fazer face aos problemas com que esta comunidade se defronta, nomeadamente a legalização destes imigrantes, o seu emprego e a sua habitação condigna. Este esforço insere-se no cumprimento do seu mandato estatutário, granjeando à Associação prestígio e reconhecimento por parte dos membros da comunidade africana, das autoridades madeirenses e, de uma forma geral, da comunidade da Ilha. Nos seus primeiros 15 anos de existência, a Associação desenvolveu ainda um leque variado de serviços de apoio a jovens e crianças com dificuldades cognitivas, atuando na prevenção, no serviço social, no desenvolvimento de atividades como a dança, o teatro, as oficinas de expressões, bem como na realização de torneios desportivos, na organização de eventos, na mediação de conflitos e no desenvolvimento de projetos inovadores na área da integração, como é o caso do espaço das hortas urbanas. A organização interveio também nas situações de doença e morte dos membros da comunidade, procurando acompanhar de perto estes momentos e dando apoio, sobretudo nos contactos com os familiares dos países de origem.   João Adriano Conduto Júnior (atualizado a 19.07.2016)

Madeira Global Sociedade e Comunicação Social

darwin, charles robert

Charles Darwin nasceu a 12 de fevereiro de 1809 em Shrewsbury no condado de Shropshire a uns 35 km de Birmingham como quinto filho de Robert Darwin e Susannah Wedgwood (Desmond & Moore, 1992). Ambos os pais advinham de famílias com tradições académicas e comerciantes. O seu pai era um médico abastado, o seu avô paterno Erasmus Darwin foi filósofo e abolicionista, e o avô materno Josiah Wedgwood industrial e também abolicionista. A partir dos 8 anos de idade Darwin atendeu a escola de Shrewsbury (Darwin & Barlow, 1958; Desmond & Moore, 1992) como aluno interno. Em 1825 com 16 anos ingressou na Escola Médica da Universidade de Edimburgo embora não se tenha aplicado muito nas matérias centrais, preferindo a história natural e o museu da Universidade. Isso motivou o pai a mandá-lo para a Universidade Cambridge ao “Christ’s College” em 1827 (Van Wyhe, 2014, p. 20) para prosseguir uma carreira de religioso anglicano. Darwin chegou a Cambridge em janeiro de 1828 aos 18 anos de idade (Van Wyhe, 2014, p. 27). Mas mesmo aqui dedicou grande parte à história natural e caça, embora tenha obtido boas notas nos exames finais. Incitado pelo seu primo mais velho William Darwin Fox (1813-1881) começou a colecionar sistematicamente escaravelhos (Van Wyhe, 2014, p. 42). Foi em Cambridge que Darwin conheceu o então já distinguido mas jovem professor revd. John Stevens Henslow (1796-1861) padre, botânico e geólogo (Barlow, 1967; Walters & Stow, 2001). No seu segundo ano universitário Darwin começou por ser um visitante regular dos serões científicos em casa de Henslow (Van Wyhe, 2014, p. 76) tornando-se seu seguidor e depois amigo. De 1829 a 1831 assistiu à cadeira de botânica por ele lecionada "Botanical Lectures” (Henslow, 1829, p. 77; Van Wyhe, 2014) e ajudou na preparação das aulas práticas e na recolha e herborização de plantas britânicas sendo considerado favorito de Henslow (Van Wyhe, 2014, p. 89). Henslow prestava atenção à variação intraespecífica das plantas, ao contrário do costume praticado na época, identificando cada espécimen com data, local e nome do recolector, prática que influenciou os seus alunos, entre eles Darwin (Kohn et al. 2005). Em janeiro de 1831 Darwin completou o seu Bachelor of Arts (BA) como décimo de 178 candidatos (Hodge & Radick, 2009, p. 27; Van Wyhe, 2014, p. 93). Para obter o título faltava-lhe atingir o número de trimestres residentes obrigatórios, tempo que, sem a pressão das aulas, teve a oportunidade de se aproximar mais ainda de Henslow, jantando com ele regularmente e acompanhando-o em saídas de campo (Van Wyhe, 2014, p. 96). Foi nesta fase que, inspirado pelo relato de viagem de Humboldt (Von Humboldt, 1865), começou a planear com Henslow uma excursão a Tenerife nas ilhas Canárias com a finalidade de ver um ambiente mais tropical (Hodge & Radick, 2009, p. 27; Van Wyhe, 2014, p. 96). Muito embora tenha mesmo iniciado aulas de espanhol a excursão acabou por nunca se realizar. Em meados de agosto de 1831, no regresso de uma excursão geológica ao norte do País de Gales com o famoso professor geólogo Adam Sedgwick, Darwin recebeu uma carta de Henslow oferecendo-lhe o lugar de naturalista a bordo da brigue HMS Beagle numa viagem de levantamento hidrográfico à volta do mundo. De fato Darwin não foi a primeira escolha para essa posição. O convite inicial tinha sido formulado pelo comandante da expedição cap. Robert FitzRoy (1805-1865) ao seu superior hierárquico na marinha Francis Beaufort (1774-1857) o qual o enviou a Cambridge ao professor de matemática e astronomia George Peacock (1791-1858) a fim deste sugerir uma pessoa indicada com experiência nas ciências naturais. Peacock pensou primeiro no próprio Henslow o qual não pôde aceitar, sugerindo o entomólogo pastor Leonard Jenyns (1800-1893) e depois deste também não aceitar, sugerindo Darwin (Van Wyhe, 2013; Van Wyhe, 2014, p. 104). Depois de convencer o seu pai, Darwin aceitou ser o naturalista oficial da expedição, partilhando a cabina com o comandante (Van Wyhe, 2013). A única condição que Darwin impôs para aceitar a nomeação foi a de que possa desistir da expedição a qualquer momento e de que custearia a sua cota parte da alimentação (Fitzroy, 1839, v. 1, p. 19; Van Wyhe, 2013). Darwin manteve assim a sua independência da hierarquia naval, não recebendo salário e custeando também o material de trabalho e envio de espécimes para o Reino Unido. Várias cartas de Darwin (Burkhardt & Et Al., 1985-2014, cartas [117, 118, 120, 121,122, 147, 158]) documentam a intenção de que a primeira paragem programada do Beagle com duração de uma semana seria no Funchal na Madeira. No seu relato da viagem FitzRoy (Fitzroy, 1839, p. 22) enumera as ordens de itinerário que diziam explicitamente que o navio deve aportar “(…) sucessivamente na Madeira ou Tenerife; Cabo Verde; Fernão de Noronha; Estação na América do Sul (…)”. A justificação para que isso não tenha acontecido é também dada por FitzRoy (Fitzroy, 1839, pp. 46-47). Os ventos mudaram subitamente para sudeste acompanhados de vagas grandes e dificultando a passagem do Beagle a sul do Porto Santo e a sua entrada na travessa entre a Madeira e as Desertas. Tinham avistado o Porto Santo no dia 04 de janeiro de 1832, e passaram a poucas léguas da Madeira (1 légua inglesa corresponde a cerca de 3 milhas náuticas). O comandante optou por tomar rumo a Tenerife tendo avistado as Selvagens na manhã seguinte e chegando a Tenerife nesse mesmo dia. Numa carta datada de 6 de setembro de 1831 à sua irmã Susan Elizabeth (1803-1866) (Burkhardt & Et Al., 1985-2014, carta [119]), Darwin reforça a ideia de que ele está livre de abandonar a expedição quando bem entender, mas que se desengane a irmã se pensar que ele irá regressar já a partir da Madeira, pois desde que lhe subsista um pedaço de estômago, ele não irá desistir. De fato Darwin passou muito tempo enjoado a bordo do Beagle, não sendo claro se chegou a ver alguma ilha do Arquipélago da Madeira. Mas mesmo em Tenerife não puderam desembarcar devido a uma quarentena de 12 dias imposta aos navios oriundos do Reino Unido onde havia uma epidemia de cólera (Fitzroy, 1839, p. 48). Nem ancoraram e zarparam imediatamente em direção a Cabo Verde, pisando terra firme pela primeira vez em Santiago/Cabo Verde no Porto da Praia a 16 de janeiro. A restante viagem do Beagle está descrita em muitas obras sendo os relatos originais os de Darwin e FitzRoy (Darwin, 1839; Fitzroy, 1839, v.2). A circunavegação levou o navio a Fernando de Noronha, Baia, Abrolhos, Rio de Janeiro, Buenos Aires e Montevideo, Ilhas Malvinas, Cabo Horn e Estreito de Magalhães, costa pacífica da América do Sul, Galápagos e outras ilhas no Pacífico, Nova Zelândia e Austrália, Ilhas Cocos e Maurícias e regressando pelo Cabo da Boa Esperança, as ilhas de Santa Helena e Ascensão, e de novo Brasil, Cabo Verde e Açores. Chegaram aos Açores a Angra do Heroísmo na ilha Terceira, permanecendo de 19 a 25 de setembro, pararam em S. Miguel para a recolha de correspondência e seguiram em ruma à Inglaterra (Darwin, 1839, pp. 594-598). A 2 de outubro de 1836 o Beagle ancorou em Falmouth após uma ausência de 4 anos e nove meses, chegando pouco depois a Plymouth e Londres (Fitzroy, 1839, p. 638). Darwin desembarcou em Falmouth (Darwin, 1839, p. 598). Regressou a Cambridge e depois Londres para trabalhar em colaboração com outros naturalistas na publicação do vasto espólio que recolheu durante a viagem. A 29 de janeiro de 1839 Darwin casou com a sua prima Emma Wedgwood (Darwin & Barlow, 1958, p. 82; Van Wyhe, 2014, p. 111) e em 1842 tomou residência no meio rural do sudeste de Londres em Down House (Darwin & Barlow, 1958, p. 114). Nunca mais viajou ao estrangeiro. Ao todo Darwin escreveu 16 livros sem contar com reedições (Freeman, 1977, p. 9). A primeira obra em que Darwin se empenhou depois da viagem do Beagle foi a Zoologia da Viagem do Beagle publicada em vários volumes entre 1838 e 1843 (Freeman, 1977, p. 26). Em paralelo trabalhou na narrativa da viagem publicada em 1839 (Darwin, 1839), revista posteriormente (Darwin & Barlow, 1958, p. 116) e publicada como Diário das Investigações (Darwin, 1845). Nesta obra, de índole mais genérica e popular, a Madeira praticamente não é mencionada. Este é o livro mais lido de Darwin e o qual estabeleceu a reputação internacional de Galápagos como arquipélago de Darwin. Darwin depois concentrou-se na geologia com obras ainda hoje importantes sobre a formação dos recifes de corais (Darwin, 1842) ou as ilhas vulcânicas (Darwin, 1844). Nesta última obra a Madeira não é também mencionada, pese o fato de Darwin ter lido e se inspirado nos trabalhos de Charles Lyell (Lyell, 1840) o qual esteve na Madeira e escreveu sobre a sua geologia (Lyell, 1854). Outras obras emblemáticas de Darwin não relacionadas diretamente com evolução são os seus trabalhos sobre cirrípedes (Darwin, 1851; Darwin, 1854), trabalhos sobre botânica como o sobre a fertilização de orquídeas (Darwin, 1862), e uma biografia do seu avô Erasmus (Krause & Darwin, 1879). No entanto, são as obras relacionadas com a teoria da evolução que ficaram mais conhecidas. O livro sobre a variação sobre domesticação (Darwin, 1868) é já um prenúncio da sua teoria. Segundo as palavras de Darwin a viagem do Beagle foi o mais importante evento da sua vida e determinante para toda a sua carreira (Darwin & Barlow, 1958, p. 76). As ilhas Galápagos forneceram das primeiras ideias para a teoria que viria a publicar. O vice-governador da Ilhas Nicholas Lawson tinha-o informado de que as tartarugas diferem de ilha para ilha, e de que ele seria capaz de identificar a ilha da qual cada uma é originária (Darwin, 1845, p. 394). Devido a isso Darwin prestou mais atenção à recolha de espécimes, admiravelmente não aos famosos tentilhões-de-Darwin, mas sim aos mockingbirds, os sabiás de Galápagos (Sulloway, 1982). A ideia de que as espécies não são estáveis tinha emergido (Darwin, 1963, p. 262). Cada ilha do arquipélago alberga um conjunto diferente de espécies. A obra mais importante de Darwin A origem das espécies (Darwin, 1859; Darwin, 2009) foi publicada em 1859, um ano depois da publicação conjunta com Alfred Russel Wallace de um esboço da teoria (Darwin, 1858; Darwin & Wallace, 1858; Wallace, 1858). Darwin tinha passado cerca de 20 anos a recolher sistematicamente informação para fundamentar a sua teoria. É esta recolha sistemática de informação que coloca a Madeira numa posição de vanguarda como fonte de suporte para a teoria. Em dois ensaios inéditos escritos muito antes da publicação da A origem das Espécies (Darwin, 1909 [1842-44]), Darwin esboçou a sua teoria da Seleção Natural pela primeira vez. Aí Darwin somente menciona a Madeira duas vezes: uma para suportar a afirmação de que espécies usualmente migradoras como a galinhola o deixam de ser quando vivem em ilhas oceânicas (Darwin 1909[1842-44], p.120), e a outra para afirmar a dificuldade que mamíferos têm em colonizar ilhas distantes muito embora essas ilhas proporcionem ambientes favoráveis ao seu desenvolvimento como o provam os coelhos introduzidos na Madeira (Darwin, 1909[1842-44], p. 172). A primeira edição da Origem (Darwin, 1859) menciona Galápagos 17 vezes mas a Madeira 20 vezes, os Açores 4, e as Canárias também 4 vezes. A 6 edição que representa o texto final da obra (Darwin, 1876) menciona Galápagos 22 vezes mas a Madeira 32 vezes, os Açores 8, e as Canárias 6 vezes. Esta simples métrica demonstra bem a importância que a natureza da Madeira deteve para aquilo que é a mais importante teoria da biologia com repercussões enormes mundiais, e especialmente sobre a nossa visão da natureza do ser humano. Porque é que a Madeira se destaca como fonte de exemplos insulares? A razão reside em Cambridge e no núcleo de estudantes e académicos em torno do prof. revd. John Stevens Henslow. Henslow. Henslow, um brilhante aluno, educou-se no colégio de St.John em Cambridge e graduou-se em 1818. Em 1822, com apenas 26 anos de idade, foi nomeado professor de mineralogia e em 1822 de botânica, resignando da cátedra de mineralogia 1827 e mantendo a de botânica. Um dos seus alunos foi Richard Thomas Lowe (1802-1874) (Nash, 1990), o qual se tinha matriculado em Cambridge em 1821 graduando-se em 1825. Lowe visitou a Madeira pela primeira vez em 1826 por pouco tempo (Nash, 1990, p. 6), e a segunda vez de 1828-1830 (Nash, 1990, pp. 12, 23). Tomou residência permanente na Madeira, com interrupções entre 1831-1852 sendo capelão anglicano no Funchal entre 1832-1852, mas regressando posteriormente várias vezes. Lowe foi provavelmente aquele naturalista que mais contribui para o conhecimento da flora e fauna da Madeira, tanto marinha como terrestre, tendo publicado inúmeros tratados e estudos sobre a mesma, todos publicados na Inglaterra. Enquanto estudante em Cambridge, ao que parece, não chegou a conhecer Darwin pessoalmente. O segundo aluno de Henslow foi Thomas Vernon Wollaston (Machado Carrillo, 2006) o qual se matriculou em 1841 e se graduou 1845, obtendo ainda o MA em 1845. Foi amigo pessoal de Darwin e de Lowe. Também ele trabalhou na Madeira tendo sido introduzido à ilha por Lowe. Foi um dos grandes entomólogos e malacologistas e os estudos mais detalhados da época sobre a fauna dos coleópteros e dos caracóis terrestres foram produzidos por ele (Wollaston, 1854; Wollaston, 1878). As obras destes dois destacados naturalistas representavam, na altura, o que de melhor se fazia sobre fauna e flora de ilhas, e Wollaston, viajando entre Cambridge e Funchal, levava notícias atualizadas à Inglaterra (Nash, 1990, p. 111). Darwin tinha pois conhecimento detalhado dos estudos sobre fauna e flora da Madeira e não é de admirar que tenha usado esse conhecimento para fundamentar a sua Origem da Espécies. Um levantamento da correspondência de Darwin em que os intervenientes abarcam temas relacionados com a Madeira mostra que o pico das referências se situa entre os anos de 1855-1862 (Dellinger, 2009a). Os exemplos da Madeira citados por Darwin (Dellinger, 2009b) foram variados. Em primeiro lugar realçou a semelhança entre a fauna de insetos da Madeira e da Europa continental (Darwin, 1876, p. 38). Em segundo lugar argumentou que variedades podem sobreviver por muito tempo, usando como exemplo os caracóis subfossilizados das Dunas da Piedade e do Porto Santo (Darwin, 1876, p. 42). Citou também Oswald Heer e a similitude da laurissilva da Madeira com a vegetação da Europa Terciária (Heer, 1857; Darwin, 1876, p. 83). O exemplo de suporte à seleção natural, a parte central da sua teoria da evolução, vem de novo do mundo dos insetos em que cita Wollaston para mostrar que, em ilhas, as formas aladas são em número inferior do que em faunas continentais, e que, quanto mais pequena a área da ilha, a probabilidade de sobrevivência de formas aladas se reduz por serem transportados pelo vento para o mar onde acabam por morrer (Darwin, 1876, p. 109). Darwin argumenta também que o isolamento aumenta a probabilidade das espécies diferirem, dando como exemplo a Madeira em que os escaravelhos e caracóis terrestres diferem bastantes das continentais, enquanto que os caracóis marinhos e as aves do mesmo arquipélago o não fazem (Darwin, 1876, pp. 291, 349). A razão desta diferença é que o meio marinho ou a capacidade de voar grandes distâncias reduzem o isolamento relativo. Para sublinhar isso cita o enxame de gafanhotos que assolou a Madeira em 1844 (Darwin, 1876, p. 327), ou o número de aves terrestres ocasionais avistadas na Madeira (Darwin, 1876, p. 348), justificando que devem ser os ventos que os transportam. Darwin realça também o fato de que ilhas oceânicas albergam menos espécies do que áreas continentais, mas que têm uma maior taxa de endemismos. É aqui que Darwin faz a única comparação direta entre a Madeira e Galápagos, equiparando a proporção de espécies endémicas de caracóis terrestres na Madeira com as aves terrestes em Galápagos (Darwin, 1876, p. 348). No entanto existem diferenças taxonómicas: anfíbios não são encontrados normalmente em ilhas oceânicas muito embora, quando são introduzidos, consigam sobreviver bem nelas com se observa na Madeira (Darwin, 1876, p. 350). O último exemplo da Madeira serve para reforçar o isolamento relativo das espécies de caracóis terrestres do Porto Santo em relação à Madeira. Muito embora grandes quantidades de pedras de cal são transportadas do Porto Santo à Madeira, e muito embora caracóis vivam debaixo de pedras e nas suas fissuras, as faunas de caracóis existentes nas das duas ilhas são distintas (Darwin, 1876, p. 357). A lógica da argumentação na Origem da Espécies, que Darwin chamou de “um longo argumento”, em especial quanto à importância dos exemplos insulares, está bem delineada e analisada em Gould (Gould, 2002, p. 59). Das obras subsequentes de Darwin, a mais destacada foi aquela que, de forma explícita, alargou a sua teoria ao ser humano (Darwin, 1871). Darwin faleceu na sua casa em Down House, condado de Kent, a 26 de abril de 1882, estando enterrado em Londres na Abadia de Westminster (Van Wyhe 2014, p. 118). Embora revolucionária para a época, a teoria de Darwin foi relativamente bem aceite a nível mundial nas duas décadas subsequentes à sua publicação. Em Portugal “(…) a teoria Darwiniana conheceu (…) dificuldades de implantação” (Pereira, 2001, p. 66) recentemente superada com o bicentenário do seu nascimento. Quanto à Madeira ainda falta um estudo historiográfico do impacto de Darwin que inclua toda a sociedade madeirense e não somente os naturalistas estrangeiros radicados na Madeira. No entanto o papel da Madeira como fonte de exemplos para a teoria da evolução está bem estabelecido.   Thomas Dellinger (atualizado a 25.07.2016)

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