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teive, belchior de

Último filho varão de Gaspar de Teive e de Ana de Brito e neto de Diogo de Teive, que instituiu o morgado dos Teives, uma família nobre da Ribeira Brava, Belchior de Teive nasceu no Funchal. Em 1608, contraiu matrimónio com D. Mariana Telo de Gusmão, filha de Pedro Telo de Gusmão, alcaide-mor de Sevilha, e de Mariana Ponce de Leão. O casal teve sete filhos: Gaspar de Teive Telo e Gusmão, Fernando de Teive, Pedro de Teive, Duarte de Teive, Filipa de Teive, Ana de Teive e Gusmão e Antónia de Teive. Desconhecem-se os aspetos potencialmente interessantes da infância e juventude de Teive que, em 1581, era lente da Universidade de Salamanca, regendo uma das cadeiras da faculdade de direito, embora não saibamos onde e em que data se formou. Henrique Henriques de Noronha, no seu Nobiliário Genealógico, informou que fora lente em Salamanca aos 26 anos, o que não é corroborado por nenhuma outra fonte. Mais tarde, exerceu, em Coimbra, o magistério universitário, que abandonou em 1607, para servir Filipe III. Logo nesse ano, ao serviço do monarca, esteve em Portugal como superintendente geral da fazenda pública. Recorde-se que, em 1599, se havia formado uma junta de arbítrios ou junta da fazenda castelhana – que estava acima do conselho da fazenda – e, possivelmente, no ano seguinte, outra para Portugal. Teive esteve totalmente ao serviço de Castela e de Filipe III de quem foi conselheiro privado, adiantado de Castela, cargo que correspondia ao de governador general da armada e superintendente dos ofícios da armada. Também desempenhou funções na magistratura, nomeadamente como alcaide do crime da chancelaria de Valladolid e presidente da casa dos alcaides. Foi genealogista e deixou inédita uma genealogia da casa de Lerma. Morreu em 1622.   Isabel Drumond Braga (atualizado a 09.12.2017)

Personalidades

teixeira, virgílio

Homenagem ao ator Virgílio Teixeira Galã do cinema dos anos 40, 50 e 60 do século XX, Virgílio Gomes Delgado Teixeira nasceu no Funchal a 26 de outubro de 1917. Desportista, fluente em inglês e de boa figura, Virgílio Teixeira, filho de Gastão Teixeira, comerciante e ex-emigrante em Demerara, começou por ser guarda-redes de futebol – alinhou pelo Sporting da Madeira e pelo Marítimo – e era bom em saltos acrobáticos e ténis. O seu primeiro contacto com a indústria do cinema – além dos filmes que ia ver – aconteceu numa partida de ténis com o realizador inglês Thorton Freeland, que passava férias na Madeira. Para não humilhar o adversário, Virgílio Teixeira deixou-o ganhar. O realizador não terá gostado mas, mesmo assim, disse ao madeirense para fazer as malas e o acompanhar até Londres, onde teria a porta aberta para uma carreira no cinema. Assim teria sido, se a situação política e a aproximação da Segunda Guerra Mundial não tivessem dificultado o seu percurso, pelo que o futuro ator regressou a casa. Em 1941, mudou-se para Lisboa e, por falar bem inglês, arranjou emprego na American Export Line, a única empresa que, na altura, fazia a ligação marítima entre a América e a Europa. Pouco tempo depois, mudou-se para uma companhia aérea, mas acabou por ser despedido por causa das noitadas. Vendo-se sem trabalho, penhorou os fatos e os sapatos numa tentativa de se manter pela capital; em desespero, pediu dinheiro ao pai que, em vez de um cheque, lhe mandou uma passagem para o Funchal. Virgílio Teixeira recusou e a decisão de ficar em Lisboa acabou por lhe abrir as portas do mundo do cinema. O convite para entrar em Ave de Arribação (1943) aconteceu pouco tempo depois, mas a fama só chegaria com Zé do Telhado (1945), a versão portuguesa do ladrão que rouba aos ricos para dar aos pobres. Este papel valeu-lhe o prémio de melhor ator do ano de 1945 e a sua vida no cinema estava apenas no começo; sem nunca ter estudado representação, o rapaz da Madeira iniciava uma carreira onde iria somar 92 participações em filmes, uma telenovela, séries televisivas e 2 papéis no teatro, ao lado de Carmen Dolores e de Eunice Muñoz. Antes de se mudar para Espanha - no fim dos anos 40 –, Virgílio Teixeira selou o seu estatuto de galã ao contracenar com Amália Rodrigues no filme Fado, História de Uma Cantadeira; a cena onde Júlio Guitarrista ensina a fadista Ana Maria é das mais célebres do cinema português. Viveu 12 anos em Espanha, e fez tantos filmes que chegaram a pensar que era espanhol; com efeito, o Sindicato Nacional do Espetáculo do país vizinho considerou-o, em 1955, um ator genuinamente espanhol. A conjuntura – o facto de os filmes rodados em Espanha ficarem mais baratos à indústria americana – permitiu-lhe contactar com atores, atrizes e realizadores de nome internacional, sobretudo americanos, abrindo-lhe portas em Hollywood. Virgílio Teixeira fez de Ptolomeu em Alexandre, o Grande (1956) e de general russo em Dr Jivago (1965) – e estes são apenas dois dos filmes em que participou. Virgílio Teixeira privou com atores como Ava Gardner, Lana Turner, Sofia Loren, Richard Burton, Tyrone Powell e Rita Hayworth. Nos cartazes dos filmes, o seu nome aparecia como Virgilio Texera ou John Texera. Em 1966, regressou à Madeira afirmando “Eu vim embora de Hollywood porque estava a sentir que aquilo ali começava a ser uma autêntica selva”. (SILVA, 2006, 60), mas, ao longo dos anos, continuou a participar em filmes, nomeadamente A Mulher do Próximo (1988), de José Fonseca e Costa Em 1984-85, entrou na telenovela Chuva na Areia, onde fazia o papel de homem rico mas, pesar de ter representado em mais alguns papéis, esta já não era a sua principal atividade, pois vivia dos negócios; foi também agente da Ibéria, delegado das Páginas Amarelas, da Rádio Televisão Comercial e da Sociedade Portuguesa de Autores. Teve uma curta passagem pela política, como vereador do PSD na Câmara Municipal do Funchal no início dos anos 80. Foi homenageado pela TVE e pelo Governo Regional da Madeira, sendo condecorado pelo Presidente da República com a comenda de oficial da Ordem do Infante D. Henrique. Morreu no Funchal, com 93 anos, a 5 de dezembro de 2010.   Marta Caires (atualizado a 08.12.2017)

Cinema, Vídeo e Multimédia

teixeira, tristão (vaz)

(finais do séc. XIII – c. 1470) Tristão Teixeira, também conhecido por Tristão da Ilha, de ascendência documentalmente desconhecida, foi companheiro de Zarco e primeiro capitão do donatário de Machico. Dele diz Noronha que “Viveo 80 anos, governou 50 e faleceu em Silves em 1470” (NORONHA, 1994, 38) o que, mesmo que não certificado por documentos, não deve andar longe da verdade, na medida em que o faz chegar à Madeira por volta dos 30 anos, idade compatível com a atribuição da capitania, antecedida de um passado como escudeiro do Infante D. Henrique e participante na tomada de Ceuta e no cerco de Tânger onde foi armado cavaleiro pelo mesmo Infante (BARROS, 1552, Déc. I, Lº I, cap. III, 33). Segundo Azurara, que considera Tristão Teixeira “homem assaz ardido mas não tão nobre (…) como João Gonçalvez” depois do descerco de Ceuta, os dois cavaleiros ofereceram os seus serviços ao Infante, pois eram “homens mancebos e pera muyto”, e consideravam que o seu tempo era mal-empregado se não “trabalhassem alguma cousa per seus corpos” (AZURARA, 1841, 388 e 385). Assim, encomendou-lhes o Infante a tarefa de demandarem terras da Guiné, para o que lhes forneceu uma barca, a qual, por ter encontrado vento contrário, veio dar ao Porto Santo, onde os cavaleiros ficaram por alguns dias, após o que regressaram ao reino. Na segunda viagem que fizeram àquela zona do atlântico, Zarco e Teixeira dirigiram-se à Madeira a cujo reconhecimento procederam. A maior ilha do arquipélago foi, então, dividida em duas porções, uma das quais, com sede em Machico ficou à responsabilidade de Tristão Teixeira. A 8 de maio de 1440, por carta do Infante D. Henrique, a administração do território que ia “desde alem do rio do Caniço até à Ponta do Tristão” é doada a Tristão Teixeira sob a forma de capitania, legitimando-se, assim, uma situação preexistente (MH., vol. XIV, doc. 71). Este mesmo documento será, posteriormente, em 1452, reconfirmado por D. Afonso V (M. H., vol. XIV, doc. 109). Se pouco se sabe da ação do capitão à frente dos destinos do seu território, há, por outro lado, informação de ter participado em outras viagens marítimas, narradas por Azurara que, em 1445 integra o capitão de Machico, bem como Garcia Homem, genro de Zarco, numa armada que escalou a Madeira a caminho das costas de África. Essa armada deteve-se em Canárias, a tentar obter “alguma presa” para serviço do Infante, o que, não tendo sido possível, determinou o regresso de algumas caravelas, entre as quais as duas idas da Madeira (AZURARA, 1841, 414). Um outro registo documental que respeita à vida de Tristão Teixeira é o do perdão que D. Afonso V lhe outorga, em razão de o capitão ter claramente excedido a sua jurisdição, quando mandara “talhar membro” a Diogo Barradas, homem degredado do reino que acolhera em sua casa e violara uma filha sua. Barradas apresentou queixa ao rei, na sequência do que o capitão teria sido preso e degredado para S. Tomé (FRUTUOSO, 2008, 116). Uns anos depois, em 1452, porém, mediante o pagamento de uma quantia avultada, o monarca deliberou perdoá-lo, após o que ainda governou a capitania por vários anos (AZURARA, vol. IX, doc. 117). Do seu falecimento, sabe-se que ocorreu no Algarve em data que será, eventualmente, próxima da já apontada.   Cristina Trindade Paulo Perneta (atualizado a 07.12.2017)

História Política e Institucional Personalidades

teixeira, irineu novita

Irineu Novita Teixeira. Foto: arquivo pessoal do autor Nascido no Funchal a 9 de agosto de 1915, foi um filósofo, geógrafo e urbanista madeirense. Fez a formação primária num colégio interno na Parede, Cascais. Voltou posteriormente à ilha da Madeira, onde frequenta o Liceu do Funchal, na época situado na R. do Bispo. Aí conclui a sua formação secundária, sendo colega e amigo de contemporâneos como o poeta Florival dos Passos e o ator Virgílio Teixeira. Após concluir os estudos secundários na Ilha, regressa ao continente, matriculando-se na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, onde faz as primeiras cadeiras do curso de geografia. No seio dessa comunidade académica frequenta várias tertúlias e trava conhecimento com figuras como Álvaro Cunhal e Bento de Jesus Caraça (seu professor), que muito o influenciam, levando-o a interessar-se pelas temáticas sociais e pela política. Com o objetivo de se formar como engenheiro geógrafo, ruma à faculdade de engenharia do Porto. Após o falecimento do seu pai, em 1938, e tendo de gerir imediatamente os negócios familiares na vila da Ponta do Sol, retorna à Madeira sem concluir as duas cadeiras que lhe faltavam para se licenciar como engenheiro geógrafo, nunca abandonando, no entanto, um profundo interesse pelas temáticas do urbanismo e do ordenamento do território. Depois de um ano a ordenar e a gerir negócios familiares, em 1939 imigra para o Brasil, de onde era originária a sua mãe e onde tinha toda a família materna. Nesse país interessa-se e adere ao Movimento Georgista Brasileiro, que aí divulgava as ideias de transformação social de Henry George (1839-1897), filósofo norte-americano que advogava a reforma da sociedade por via do acesso à terra e do estabelecimento de um imposto único sobre as propriedades territoriais. Tornou-se amigo de Monteiro Lobato (1882-1948), fundador do dito movimento, envolvendo-se também nas várias campanhas levadas a cabo por ele. Após a morte de Monteiro Lobato, afasta-se do movimento, desiludido com a falta de interesse dos novos responsáveis pelas questões urbanísticas. Inicia então, entre finais de 1948 e inícios de 1949, a sua própria campanha por um novo tipo de urbanismo e de cidade. Em tal campanha baseia-se não só na sua experiência formativa e vivencial como geógrafo e empresário agrícola, mas também nas ideias georgistas e na obra do urbanista futurista espanhol Arturo Soria y Mata (1844-1920), que propunha uma cidade linear, ao longo dos caminhos de ferro e das estradas, unindo inextricavelmente campo e cidade e naturalizando o meio urbano. Durante muitos anos expandiu e aprofundou a sua campanha, colaborando em jornais e revistas e editando opúsculos, defendendo a existência de uma agricultura urbana nas cidades já existentes e interessando-se ainda pela promoção e “empoderamento” das mulheres no seio das sociedades, bem como pela erradicação da pobreza por meio do livre acesso à terra e à agricultura. Em 1964, após o advento da ditadura militar no Brasil, as condições para desenvolver o seu trabalho tornam-se mais difíceis, sendo-lhe vedada, em virtude da censura militar, a colaboração em periódicos. Aproveita para viajar bastante pelo Brasil, visitando comunidades agrícolas comunitaristas e universidades várias. Na Baía, fica amigo do filósofo Agostinho da Silva, com o qual se corresponderá posteriormente. Em 1971, regressa a Portugal. Inicia colaboração em periódicos regionais como o Diário de Notícias, o Eco do Funchal e o Templário, iniciando depois do 25 de Abril uma colaboração semanal no Jornal da Madeira que durou vários anos. Colabora também em periódicos nacionais como o jornal A Batalha e a revista Singularidades. No Funchal, expõe gravuras e modelos visuais relativos às suas propostas em hotéis e locais privados, sendo entrevistado pelo Diário de Notícias. Corresponde-se igualmente com personalidades como o filósofo Agostinho da Silva, o arquiteto urbanista Gonçalo Ribeiro Teles, o urbanista canadiano Louis Antoine Dernui e o ex-presidente da Assembleia da República António de Almeida Santos. Com o intuito de aprofundar e divulgar as suas ideias, viaja pelo mundo, percorrendo a Espanha, a Alemanha, os EUA e o Canadá, onde participa em simpósios e grupos de trabalho e de estudo, visita correspondentes e consulta arquivos e bibliotecas. Na sua atividade cívica foi ainda membro fundador do extinto Partido da Solidariedade Nacional e membro da Federação Mundial de Estudos do Futuro (WFSF). Cessando a sua colaboração regular no Jornal da Madeira em finais dos anos 90, continua a estudar, pesquisar e escrever sobre um novo modelo de cidade e sobre o futuro da civilização até à sua morte, deixando uma obra extensa, em grande parte inédita. Morreu no Funchal, a 15 de dezembro de 2009. O seu espólio e acervo foram entregues ao Arquivo Regional da Madeira em 3 de fevereiro de 2010.   Miguel Santos (atualizado a 09.12.2017)

Personalidades

sumagre

O sumagre, Rhus coriaria L., é um arbusto da família das Anacardiáceas, plantas que são valorizadas pela riqueza de resinas e taninos. É também conhecido como sumagre comum, sendo a variedade siciliana a mais divulgada. A sua importância comercial resulta da sua utilização no curtume de peles, devido ao valor elevado de taninos que contém, tendo também sido usado na alimentação, em substituição do limão e do vinagre em saladas, e na medicina popular. Em Portugal, a sua utilização foi mais frequente na curtimenta e no tingimento. No caso da curtimenta, poderia ser substituído pela casca de carvalho, de acácia, de albata, de azinho e, ainda, pelo entrecasco de sobro, mas com valores inferiores de taninos, uma vez que o sumagre chega aos 30 %, enquanto nas demais cascas o valor é inferior a 19%. Na Madeira, é de assinalar também a utilização das cascas de faia, vinhático, aderno e carvalho. No entanto, em 1850, o governador civil, José Silvestre Ribeiro, proíbe a sua utilização, uma vez que havia disponibilidade de sumagre para tal função. Em Câmara de Lobos, temos notícia da sua utilização na pintura dos barcos, dando uma cor castanha, quase preta. Por outro lado, em infusão com o pastel, uma planta tintureira, origina as cores amarelo, ruivo e dourado. O sumagre é uma planta da região mediterrânea que mereceu uma valorização económica desde tempos muito antigos. Está documentado o uso das suas sementes na culinária, em países como o Líbano, a Síria, a Turquia ou o Irão. Em Portugal, cultivou-se na Terra Quente e vale do Douro, em Trás-os-Montes e Alto Douro, na Beira Interior, no Alentejo, no Algarve e nas ilhas da Madeira e dos Açores. A atestar a sua presença na Madeira, existe o sítio do Sumagre no Arco da Calheta e em S. Vicente, sendo ainda possível encontrar a planta no Caniço, no Cabo Girão e na zona do Pináculo. Para além disso, há algumas referências à sua existência nas ilhas Selvagens. Na Madeira, as folhas do sumagre, depois de secas, eram trituradas em atafonas de mó de pedra, sendo comercializadas em pó. Data da segunda metade do século XVI a informação mais significativa que temos sobre o sumagre: “Há nesta ilha da Madeira muito sumagre, que serve para curtir couro, principalmente o cordovão, porque o faz muito brando e alvo. E este sumagre se planta em covas pequenas, como quem planta rosas e vinhas; tem a haste como feito, e a rama semelhante ao mesmo feito; dá-se em terras altas e frescas; colhe-se cada ano cortando-se rente com a terra, para não secar a soca dele, e poder tornar a arrebentar, por ser planta que dura muitos anos na terra: é novidade de muito proveito, porque multiplica tanto que se enchem dele os campos, como roseiras, e lavra a raiz por baixo da terra, e o que se dá na ilha é muito fino: e apanhada a rama, que é o dito sumagre, se deita ao Sol, e seca se mói em engenho de água, assim como se mói o pastel nesta ilha, e se faz em pó, e moído o carregam para diversas partes em sacas e pipas” (FRUTUOSO, 1979, 139-140). Nas posturas da câmara do Funchal do séc. XVI, um título é dedicado à regulamentação da cultura e transformação do sumagre, com pena pesada de 10 cruzados aos infratores: “toda a pessoa que tiver sumagral lhe não colhera mais de uma novidade em cada um ano no tempo que se costuma recolher e não colhera do dito sumagral outra novidade no dito ano, posto que o dito sumagre seja viçoso e se possa tirar, porquanto essa segunda novidade se chama redolho e é falso e dana todo o couro que se com ele curte. [...] o dito sumagre é mercadoria importante da terra e deve ser negociada verdadeiramente” (SILVA, 1995, 279). Ainda noutra postura se estabelecem regras sobre a sua laboração e comércio: “nenhum moedor de sumagre nem senhorio de engenho poderão comprar sumagre a nenhum lavrador para (o moer) e vender a nenhum mercador nem pessoa outra alguma, salvo se tiver de sua lavra e colheita por ser muito em prejuízo do Povo e do dito sumagre que é mercadoria importante à terra e deve ser negociada verdadeiramente” (Id., Ibid.). A Madeira exportou, por intermédio das alfândegas do Funchal e Santa Cruz, vários produtos em que se incluía o sumagre. Este era um dos mais importantes produtos fornecidos pelo mercado madeirense com saída fácil nas Canárias, tendo contribuído para o desenvolvimento da indústria de curtumes em Gran Canaria. Uma primeira remessa de que temos conhecimento foi solicitada em 1569. A partir de 1570, o movimento deste produto assume alguma dimensão nas transações dos dois arquipélagos. Em 1571, Anton Solis e Juan de Cabrejas, vizinhos de Gran Canaria, criaram uma companhia para comerciar o sumagre da Madeira. Muitas outras companhias foram criadas com a mesma finalidade, o que atesta a importância do produto no comércio com a ilha espanhola. Em 1597, sabemos da saída de uma embarcação com sumagre e couros para Tavira. Em 1656, nas listas dos produtos saídos da alfândega do Funchal que eram taxados, figura o sumagre, sujeito a meio tostão por arroba. Depois disso, em 1727, há referência à saída do mesmo para Lisboa, para ser utilizado na tinturaria. Já em 1865, Eduardo Grande informava que este recurso estava em decadência e parecia haver perdido valor na exportação. Os curtumes, ligando-se ao fabrico do calçado e de outras peças, eram muito importantes na vida da população da Madeira. O curtimento das peles foi uma atividade muito importante na ilha, utilizando-se, para o efeito, peles locais ou importadas de Cabo Verde e do Brasil. Esta atividade nunca foi deficitária em matéria-prima, havendo o suficiente para o consumo interno e exportação. A indústria existiu desde os primórdios da ocupação da ilha, estando documentado um pouco por todo o seu território, sendo, no entanto, de salientar a sua importância na Ribeira Brava, Ponta de Sol e Câmara de Lobos. Nesta última localidade, persistiu até ao séc. XX. A indústria de curtumes tinha como objetivo fundamental prover as necessidades da ilha, mas também exportava, nomeadamente para o continente português. Desta forma, uma postura do séc. XVI determinava que nenhuma pessoa tiraria courama ou calçado para fora da Ilha sem licença da câmara. O município de Machico apostou, em 1780, na reanimação desta indústria e, na segunda metade do séc. XIX, o incremento da pecuária contribuiu para o reforço da atividade. Em 1863, temos notícia de 61 oficinas, em que trabalhavam 532 surradores e curtidores. Aqui é evidente uma acentuada concentração na Calheta e Ponta de Sol, que surgem, respetivamente, com 17 e 19 oficinas. Em 1908, mantinham-se as 61 oficinas de curtir couros, passando para 38 em 1910, o que demonstra a redução de tal matéria-prima. O curtimento dos couros fazia-se, por norma, no seio das ribeiras, usando-se, para o efeito, o sumagre, mas também a casca de aderno e faia. Nas ribeiras da Tabua e Serra de Água, surgem algumas construções consideradas popularmente como mouriscas, que parecem ter a ver com esta atividade, apresentando algumas similitudes com o que ainda hoje se encontra em Marrocos. As intervenções do município contra a poluição das ribeiras, nomeadamente do Funchal, eram constantes, pois os pelames e alcaçarias poluíam as águas. No séc. XVII, foram dadas pela câmara seis cartas de surradores no Funchal. Para evitar a situação de poluição das águas das ribeiras, estes foram obrigados a exercer a sua atividade na foz das ribeiras.   Alberto Vieira (atualizado a 09.12.2017)

História Económica e Social

souza, ernesto wenceslau de (e. tarolo)

Ernesto Wenceslau de Souza nasceu no Funchal a 28 de setembro de 1879. Tipógrafo de profissão, colaborou em diversa imprensa regional como nos títulos Cruz, Esperança, Voz do Operário e Direito. Escreveu o Poema Anti-Puniceo, obra publicada no Funchal, em 1904, que dedicou ao poeta madeirense Alfredo França e que continha poemas de temática essencialmente amorosa, selecionando um destinatário feminino, como se percebe por alguns dos títulos como “Às almas puras”, “À minha noiva”, “A uma rapariga do campo”, “Resposta da minha vizinha” ou “A uma rapariga morena”. Utilizava uma linguagem simples, embora com recurso a estereótipos frequentes na época. As estrofes são sobretudo quadras e quintilhas e os versos decassilábicos. O seu protagonismo no universo da cultura madeirense atinge o seu auge ao assumir a responsabilidade editorial do jornal A Pátria, hebdomadário literário publicado nos anos de 1906 e 1907, com uma breve interrupção no início deste ano. Assim, comprometia-se, no primeiro editorial, de 15 de abril de 1906, intitulado “A Pátria”, a desenvolver o meio acanhado da literatura na Madeira, e exaltava, em simultâneo, a singularidade da “Pérola do Oceano”, “ninho de amores e fonte de poesia, que certamente não terá rival, tanto no clima como na sua população, que é meiga e dócil” (A Pátria, 15 abr. 1906, 1). Este jornal literário pretendia igualmente concretizar o objetivo de dar voz aos que se iniciavam nos caminhos da literatura e, por outro lado, prestar tributo aos que se destacavam nas letras, nomeadamente a escritoras madeirenses. É visível também o propósito de divulgação cultural e literária, evidenciado através de artigos sobre personalidades culturais de índole nacional e não apenas madeirense, bem como de textos de reflexão sobre temas como a educação. Ernesto Wenceslau de Souza assinava frequentemente os seus trabalhos como E. Tarolo, nome pelo qual ficou conhecido no âmbito da sua intervenção literária e cultural. Faleceu no Hospício da Princesa D. Amélia a 25 de dezembro de 1913.   Obras de Ernesto Wenceslau de Souza: Poema Anti-Puniceo, (1904).   Carla Ferreira (atualizado a 09.12.2017)

Personalidades