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30 Jan 2017 por "Maria"

Jornalista, folclorista e regente musical, Carlos Santos nasceu no Funchal a 22 de Julho de 1893 e destacou-se na sociedade madeirense pelos estudos que desenvolveu sobre o folclore regional e que ficaram registados nos livros Tocares e Cantares da Ilha: estudo do folclore da Madeira, Trovas e Bailados da Ilha e o O Traje Regional da Madeira. Foi igualmente figura de destaque no meio musical, tendo sido fundador e regente de diversos grupos musicais prestigiados no panorama regional. Foi membro do Instituto Português de Arqueologia, História e Etnografia e do Centro de Cultura Musical do Rio Grande do Norte (Brasil).

Na área do jornalismo, Carlos Santos foi, a partir de 1927, colaborador no periódico O Jornal, tendo ascendido ao cargo de chefe de redação em 1932, lugar que manteve até ao seu falecimento. Os seus artigos de opinião refletem algumas das mudanças sociais e culturais vividas na Madeira, neste período, maioritariamente no domínio da arte musical e do teatro, tais como: a nova influência do jazz nas danças de salão e a inicial resistência a esta música norte-americana; a defesa de um nacionalismo musical centrado no culto da música tradicional; a queda da prática musical amadora devido à difusão dos discos e da telefonia; a divisão entre um público voltado para o entretenimento e um público conservador, defensor do «bom gosto» e do «culto do espírito»; o culto dos grandes mestres (Beethoven, Chopin e Vianna da Motta, entre outros) como modelos musicais e símbolos de requinte; e, por fim, uma crítica ao materialismo e ao sentimentalismo. Um dos aspetos que a crítica musical de Carlos Santos destacava era a sua preocupação detalhada com as nuances da interpretação musical, provavelmente devido ao facto de ter sido também um músico exímio e um regente premiado de vários grupos.

No domínio musical, começou por estudar, como autodidata, braguinha e bandolim, fundando por volta de 1913 o seu primeiro grupo de bandolins, designado por Grupo Musical Carlos Santos. Com este grupo atuou em diversos espaços do Funchal, tais como o Salão Teatro D. Amélia e o Colégio Alexandre Herculano, e a bordo da embarcação Gavião, numa excursão ao porto santo.

Em 1927, foi convidado a dirigir o grupo de bandolins 6 de Janeiro, tendo posteriormente alterado o nome do grupo para Círculo Bandolinístico da Madeira. À frente deste grupo ganhou, em 1929, o primeiro prémio num concurso de orquestras de bandolim, realizado no Teatro Dr. Manuel de Arriaga, que contou com a presença do maestro Francisco Lacerda como presidente do júri. O Círculo Bandolinístico da Madeira teve grande impacto na época, tendo realizado duas digressões aos Açores e apresentado vários concertos no Teatro Municipal.

Ao longo da sua atividade como bandolinista e regente de orquestras de bandolins, Carlos Santos destacou-se pelo nível de exigência e por cultivar um repertório composto principalmente por obras de compositores contemporâneos de referência para o bandolim, entre os quais se destacam Mario Macciocchi (1874-1955), Gabriel Pierné (1863-1937), Luigi Casazza (1848-1940), Camille Cannas (?-1947), Giorgio Miceli (1836-1895). Este espírito inovador e esta constante procura pelo repertório mais moderno e escrito originalmente para bandolim, valeram-lhe, em 1929, a medalha de ouro de L' Estudantina de Paris, periódico especializado no bandolim.

Na década de 1930, os seus interesses voltaram-se para a música de cariz tradicional e começou a realizar estudos etnográficos, com base em pesquisas fundamentadas, que foram imprescindíveis para a fundação de grupos de folclore madeirense. Para a qualidade destas investigações, terá contribuído a sua amizade com o pianista madeirense Joaquim dos Santos Freitas, discípulo de Viana da Mota, com quem estudou ciências musicais. O resultado destas investigações ficou compilado nos três livros acima citados sobre o folclore madeirense, que se tornaram uma referência para os estudos etnográficos regionais.

Paralelamente às investigações etnográficas, Carlos Santos começou a dirigir grupos musicais folclóricos, com o propósito de preservar e divulgar as músicas do folclore regional, uma atividade cultural que não pode ser desligada das políticas culturais promovidas na época pelo Estado Novo, que incentivaram a criação de grupos folclóricos por todo o país. Em 1938, foi convidado para dirigir o Grupo Folclórico dos louros (conhecido também como Os Folcloristas dos louros) e, no ano seguinte, foi convidado para ensaiar um grupo de rapazes da Mocidade Portuguesa, com o propósito de representar a Madeira no 1.º Congresso da Mocidade Portuguesa, em Lisboa. Nesse mesmo ano decide fundar o seu próprio grupo folclórico, designado por Grupo Folclórico e Cultural Carlos Santos.

Aproveitando as comemorações dos centenários da independência e da restauração de Portugal (1139/1640/1940), o recém-criado grupo de folclore realizou no Teatro Dr. Manuel de Arriaga, o espetáculo Visão Lírica da Ilha da Madeira, constituído por um conjunto de bailados e canções típicas da Madeira, num total de dezasseis números musicais: canções da ceifa, baile corrido, canção da carga, dos borracheiros, do berço, da sementeira, charamba, mourisca, bailes da Ponta do Sol, dos Canhas, das Camacheiras, pesado e bailinho de oito. O grupo teve uma longevidade considerável, tendo perdurado até 1949, altura em que Carlos Santos optou por se dedicar apenas ao Grupo de Folclórico da Casa do Povo da Camacha, para o qual havia sido convidado no ano anterior.

Na direção do Grupo da Camacha, atingiu grande sucesso em eventos internacionais. Primeiramente, apresentou-se com o grupo no Concurso Internacional de Danças e Canções, em 1949, em Madrid, onde obteve o 2.º lugar na sua modalidade (Danças populares – Agrupamentos mistos) e a faixa de honra, pela originalidade do grupo.

Dois anos mais tarde, em 1951, o Grupo da Camacha voltou a participar num concurso no estrangeiro, desta vez no Festival Internacional de Folclore de Biarritz (frança), tendo na mesma viagem realizado apresentações em Saragoça, Madrid e Lisboa.

Em data incerta, possivelmente em 1955, abandona a direção do Grupo da Camacha e, apesar de debilitado de saúde, dedica os últimos anos de vida a ensaiar novos grupos na Ponta do Pargo, em Boaventura, na Ponta do Sol e no Livramento-Monte. Carlos Santos faleceu em 1955 e foi sepultado no Cemitério das Angústias, em São Martinho.

Obras de Carlos Maria Santos: Tocares e Cantares da Ilha: estudo do folclore da Madeira (1937); Trovas e Bailados da Ilha (1942); O Traje Regional da Madeira (1952).

Bibliog.: CLODE, Luiz Peter, Registo Bio-Bibliográfico de Madeirenses cs. XIX e XX, Funchal, Caixa Económica do Funchal, 1983; ESTEIREIRO, Paulo, 50 Histórias de Músicos na Madeira. Funchal, Associação de Amigos do Gabinete Coordenador de educação Artística, 2008; FERNANDES, Danilo, “Agostinho Sabino de Freitas Menezes (1903-1983), Mestre de Ofício Violeiro”, MORAIS, Manuel (coord.), A Madeira e a música, Estudos (c. 1508-c. 1974), Funchal, Empresa Municipal Funchal 500 Anos, 2008, pp. 543-544; Id., “Carlos Maria dos Santos (1893-1955), Da Investigação à Divulgação do Folclore Madeirense”, in Ibid., pp. 545-564; PINTO, Rui Magno, “Fenónemos de Interacção entre turismo e Folclore no Arquipélago da Madeira”, Revista Xarabanda, n.º 16, 2006, pp. 13-24; SANTOS, Carlos M., Tocares e Cantares da Ilha – Estudo do Folclore da Madeira. Funchal, Empreza Madeirense Editora Lda, 1937Id., Trovas e Bailados da Ilha - Estudo do Folclore musical da Madeira, Funchal, Edição da Delegação de turismo da Madeira, 1942; Id., O Traje Regional da Madeira, Funchal, Junta Geral do Distrito Autónomo do Funchal, 1952; [SANTOS, Rui], “A Biografia de Carlos Santos”, in Revista Xarabanda, n.º especial, 1993, pp. 2-4.

Paulo Esteireiro

(atualizado a 18.02.2016)

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