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andrade júnior, francisco de

Francisco de Andrade Júnior nasceu em 1806, no dia 6 de junho, no Funchal, cidade onde recebeu a sua instrução inicial, cursando os estudos que então aí existiam, e onde morreria a 23 de fevereiro de 1881. Após a criação, em 1836, do ensino liceal, por decreto de 17 de novembro desse ano, que determinava a existência de um liceu na capital de cada distrito do continente e das ilhas, terminando assim a dispersão da lecionação das aulas pelo país, Francisco de Andrade Júnior foi nomeado, por decreto de 4 de setembro de 1838, professor de Gramática Portuguesa e Latina e de Clássicos Portugueses e Latinos no Liceu Nacional do Funchal (fundado em setembro de 1837 no edifício das antigas Aulas do Pátio), cargo que exercia já interinamente, por carta do Conselho Provincial de Instrução Pública de 23 de março do mesmo ano. Professor respeitado, considerado um dos mais distintos do Liceu do Funchal (posteriormente, a Escola Secundária Jaime Moniz), aí desempenhou também a função de reitor, de 1866 – sucedendo a Marceliano Ribeiro de Mendonça, autor da obra Principios da Grammatica Applicada á Lingua Latina (1835) – até ao ano da sua morte, sendo também, e por inerência do cargo de reitor que exercia, comissário dos estudos do distrito do Funchal, com responsabilidades de vigilância e direção das escolas do ensino primário e secundário com subordinação ao Conselho Superior de Instrução Pública. Neste âmbito, é da sua autoria o Relatorio sôbre as Escholas Municipaes de Instrucção Primaria do Concelho do Funchal, Seguido de um Projecto de Lei ácerca da Creação e Frequência das Escholas (1849). Além de desempenhar estes cargos, Francisco de Andrade Júnior, que foi também vereador na Câmara Municipal do Funchal, dedicou-se ao estudo da gramática da língua portuguesa, sendo autor das obras Principios de Grammatica Portuguesa, editada em 1844, Grammatica Portuguesa das Escholas Primarias, cuja primeira edição data de 1849, sendo reeditada cinco vezes até 1879, e Grammatica das Grammaticas da Lingua Portuguesa…, publicada em 1850.   Aida Sampaio Lemos (atualizado a 22.09.2016)

Educação História da Educação Personalidades

andrade, osvaldo da conceição vieira de

Oficial do exército português. Nasceu no dia 6 de fevereiro de 1891, tendo recebido o batismo a 18 de abril do mesmo ano, na igreja paroquial de São Pedro, concelho e Diocese do Funchal. Era filho legítimo de António José de Andrade, natural da vila de São Vicente, negociante e proprietário, e de sua mulher Juliana Teodolinda Vieira, natural da freguesia de São Pedro, Funchal, que haviam contraído matrimónio a 6 de outubro de 1887. Era neto paterno de Francisco José de Andrade e de Silvéria Teresa de Jesus; e neto materno de Manuel Vieira e de Joana Constância Vieira. A 13 de maio de 1936, casou-se com Jeannette Albertine Tellapier, na 2.ª Conservatória do Registo Civil de Lisboa. Em 1917, tomou parte, como aspirante a oficial de artilharia, na revolta militar de 5 de dezembro, liderada por Sidónio Pais. Pouco depois, a 31 de agosto de 1918, já alferes de artilharia, partiu para França integrado no Corpo Expedicionário Português (CEP). Incorporado no 11.º Corpo de Artilharia Inglesa, participou na tomada de Lille e na de Tournai, em outubro e em novembro de 1918, respetivamente, tendo regressado a Portugal a 21 de março de 1920. Anos mais tarde, cooperou de forma ativa na preparação do golpe militar de 28 de maio de 1926, liderado pelo Gen. Gomes da Costa, que pôs fim à Primeira República; e em setembro de 1931, esteve envolvido, segundo relatório da Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, datado de 1935, no movimento de revolta militar: chegou a estar a postos para sair com um destacamento para a revolução, mas isso acabou por não suceder. Ao longo da carreira, desempenhou distintas e importantes missões de serviço, tendo sido ajudante de campo do ministro de Guerra Cor. Fernando Freiria e do Gen. Passos e Sousa durante o período em que este foi governador militar de Lisboa. Aquando da sua morte, encontrava-se na situação de reserva, prestando serviço na Secretaria do Ministério da Guerra. Foram vários os louvores registados na sua caderneta militar e também várias as condecorações com que foi galardoado. Em 1920, recebeu um louvor pela competência e o empenho evidenciados durante a Primeira Guerra Mundial. Em 1922, foi agraciado com o grau de Cavaleiro da Ordem Militar de Cristo. Em 1925, quando era tenente de artilharia de campanha, foi condecorado com a medalha de prata de serviços distintos da Sociedade Portuguesa da Cruz Vermelha, com a legenda “Revolta Militar de Lisboa, 18-IV-1925”. No ano seguinte, numa altura em que já ascendera a capitão de artilharia, foi-lhe atribuído o grau de Cavaleiro da Ordem Militar de Avis e, em 1930, o grau de oficial da mesma Ordem. Não obstante, o seu processo do CEP contém uma advertência, posteriormente riscada, segundo a qual teria sido punido com a pena de repreensão por ter agredido e insultado o clarim no dia 5 de março de 1919, aquando da distribuição de uma refeição. Além do distinto percurso militar, destacou-se noutras áreas. Enquanto residente na ilha da Madeira, foi redator do jornal O Direito e, posteriormente, do Diário de Notícias, periódico onde trabalhou alguns anos. Mais tarde, em Lisboa, foi um dos fundadores e diretores da Casa da Madeira, fundada a 18 de março de 1931, cuja primitiva direção era presidida por Daniel Rodrigues de Sousa. A propósito desse grémio, Osvaldo de Andrade concedeu uma longa entrevista ao Diário de Notícias do Funchal, publicada na primeira página do jornal, a 27 de março de 1931, na qual deu a conhecer o novo organismo e os seus desígnios. Nos anos seguintes, permaneceu na direção da Casa da Madeira, tendo sido reeleito primeiro secretário para os biénios 1935-1936, 1937-1938 e 1939-1940. Por outro lado, em 1933, integrou, juntamente com Carlos Meireles da Silva Carvalho, inspetor de saúde, e Manuel Gonçalves Monteiro, subdiretor da Alfândega de Lisboa, a comissão administrativa que substituiu os corpos gerentes da Cruzada das Mulheres Portuguesas, após divergências no seio daquela associação. Durante as cerca de três décadas que morou na capital, visitou a Madeira numa única ocasião, em janeiro de 1948, na companhia da esposa, para uma vilegiatura de algumas semanas – efeméride que não deixou de ser noticiada pela imprensa periódica local, como foi o caso do Diário da Madeira. Morreu em Lisboa, na sua residência, na manhã do dia 17 de janeiro de 1951, vítima de doença prolongada.   Ricardo Pessa de Oliveira (atualizado a 22.09.2016)

História Militar Personalidades

alves, mário

Empregado bancário e poeta. Nasceu às 08.00h do dia 1 de março de 1897, na freguesia de São Pedro, Funchal, tendo sido batizado a 25 do mesmo mês e ano, na igreja matriz daquela paróquia. Era filho legítimo de Alexandre Alves, sargento de artilharia, e de Maria Amélia Correa Alves, doméstica, recebidos na igreja paroquial de N.ª Sr.ª da Graça do Estreito, concelho de Câmara de Lobos, Diocese do Funchal, a 23 de setembro de 1894, e moradores na freguesia de São Pedro, à R. da Pontinha. Era neto paterno de José Alves e de Antónia da Silva Alves; e neto materno de José Martinho Pinto Correa e de Leocádia de Jesus. Veio a contrair matrimónio com Maria Ferreira Alves, de cujo enlace nasceu Mário César Alves. Foi funcionário bancário, tendo trabalhado no Banco Nacional Ultramarino, na secção de correspondência da filial do Funchal. A poesia era uma das suas grandes paixões, tendo publicado poemas, de forma regular, em distintos periódicos, de que é exemplo o Eco do Funchal. Colaborou ainda com o Correio Desportivo, O Desporto, o Diário da Madeira, o Diário de Notícias, A Esperança, O Jornal, o Mocidade, o Sport do Funchal e o Trabalho e União. Chegou a submeter alguns dos seus poemas a concursos literários, como foi o caso dos Jogos Florais da Madeira, aberto nas colunas do Eco do Funchal, em 1942, no qual obteve, na categoria de Quadra, o 2.º prémio, Cravo de Prata, com a composição: “Trazes nas faces, que pintas,/ De dois corações o geito./ De sobra te dão as tintas/ O que te falta no peito.”   Ricardo Pessa de Oliveira (atualizado a 22.09.2016)

Literatura Personalidades

adelaide de inglaterra

Adelaide foi a rainha consorte do Reino Unido e de Hanover pelo seu casamento com Guilherme IV de Inglaterra em 1818, do qual enviuvou em 1837. Nasceu a 13 de agosto de 1792 em Meiningen, na Turíngia, Alemanha, filha de Jorge I, duque de Saxe-Meiningen, e de Luísa Leonor de Hohenlohe-Langenburg. A 11 de julho de 1818, casou-se com Guilherme, duque de Clarence, filho de Jorge II de Inglaterra, tornando-se rainha consorte após a ascensão de Guilherme ao trono em 1830, sucedendo a seu irmão mais velho, Jorge IV. As tentativas de Adelaide produzir um herdeiro ao trono foram sempre complicadas, culminando em abortos ou crianças que pouco sobreviveram depois do parto. Ao contrário do marido, que desprezava as cerimónias religiosas, Adelaide levava-as muito a sério, sendo louvada pela dignidade, a serenidade e a graciosidade com que participava nelas. Era amada pelo povo britânico pela sua piedade, modéstia, caridade e pelo seu trágico historial de gravidez. Apesar da sua própria incapacidade de gerar um herdeiro, e da manifesta hostilidade entre o rei e a cunhada, a duquesa viúva de Kent, Adelaide foi sempre bondosa e gentil para com a sobrinha, a futura rainha Vitória. Adelaide era também descrita como puritana e moralista, recusando-se a ter na corte mulheres de duvidosa virtude, e proibindo os decotes, que haviam estado muito em voga nos tempos de Jorge IV. Embora em público fosse discreta e não se manifestasse politicamente, tentou por vezes influenciar o marido, sendo declaradamente conservadora. Com a morte de Guilherme IV, a 20 de junho de 1837, Adelaide tornou-se a primeira rainha viúva desde Catarina de Bragança, sobrevivendo ao marido durante 12 anos. Em 1847, em atenção ao seu precário estado de saúde, foi aconselhada pelos médicos, como último recurso, a passar o inverno num clima temperado, e escolheu a Madeira. Era então governador civil do distrito do Funchal José Silvestre Ribeiro, que preparou à visitante uma brilhante receção. A fragata da marinha de guerra britânica Howe ancorou no porto do Funchal na tarde do dia 1 de novembro de 1847, sendo recebida por salvas de canhão do forte e da cidade, assim como de um brigue português que se encontrava ao largo. A comitiva real, composta por sua irmã, a duquesa Ida, pelo príncipe Eduardo e pelas princesas de Saxe-Weimar, seus sobrinhos, foi recebida na praia, pelas 14.00 h, por cerca de 4000 pessoas em ambiente festivo. O caminho por onde passariam foi coberto de flores e ramos de mirtilo, sendo cumprimentados pela população com o maior respeito. Após visitar o aposento que lhe havia sido preparado, a cerca de meia milha da praia, a rainha voltou para o Howe, jantando e dormindo a bordo. No dia seguinte, desembarcou na Pontinha, e ali recebeu a homenagem de todas as autoridades locais, que a acompanharam à sua residência, para onde foi de liteira e as outras senhoras em palanquins. A comitiva compunha-se da dama de honor Miss Seymour, dos camaristas Cor. Cornawall e esposa, do capelão, o Rev. G. F. Hudson, do médico, o Dr. David Davis, do secretário e esmoler, T. T. Bedford, do secretário do duque, M. Hartey, e de 32 criados. O seu cunhado Bernardo, duque de Saxe-Weimar, e o sobrinho Gustavo juntar-se-lhe-iam em meados desse mês. A rainha instalou-se na Qt. das Angústias, então propriedade da família Monteiro, transformada temporariamente em paço real. Apesar de se encontrar num estado de total invalidez, levando uma vida de absoluto retiro, a sua caridade não cessou. A 4 de janeiro de 1848, ofereceu ao governador civil do Funchal um cheque de 100 libras para ajudar os pobres, sendo por várias vezes contactada durante a sua estadia com vista à obtenção de contributos monetários e doações. José Silvestre Ribeiro alertou-a, com sucesso, para a importância da ponte do Ribeiro Seco, que então se encontrava em construção na Estrada Monumental. A rainha pretendeu mesmo custear a conclusão da ponte, mas a importância era tão grande, que acabou por renunciar ao seu primitivo desejo, limitando-se a conceder um subsídio avultado por intermédio do cônsul britânico, Henry Veitch. Foi igualmente contactada pela comunidade presbiteriana da Ilha, com vista à obtenção de fundos para a construção da sua igreja, vendo-se, neste caso, impedida de ajudar devido à adesão desta comunidade à Igreja Livre Escocesa em 1843. A rainha e a real comitiva contam-se ainda entre os beneméritos da escola Lancasteriana de Raparigas, fundada no Funchal pela família Phelps. Após cinco meses de permanência na Ilha, embarcou no dia 11 de abril de 1848 no mesmo navio que a conduzira à Madeira, conservando as mais gratas recordações dos dias que passara, como atesta a peça de prata em forma de serpentina, primorosamente lavrada, que enviou ao conselheiro José Silvestre em 1849, tendo gravada a inscrição: “Presented to his Excellency Senhor José Silvestre Ribeiro H. M. Majesty's Counsellor and Civil Governor of the Province of Madeira. In grateful recollection of his civility and kind attention during her residence in Madeira by A. R..” [Oferecida a S. Ex.cia o Sr. José Silvestre Ribeiro, conselheiro de Sua Majestade e governador civil da província da Madeira, em grata recordação da sua cordialidade e amabilidades durante a sua residência na Madeira, por A. R.]. A peça apresenta, num dos lados, a coroa real inglesa e, no outro, o nome da rainha Adelaide. A estadia na Madeira não parece ter surtido qualquer efeito na saúde de Adelaide e, no outono de 1849, era evidente que a rainha estava a morrer, nunca abandonando o seu quarto do priorado de Bentley, num estado de saúde extremamente debilitado. Adelaide expirou a 2 de dezembro desse mesmo ano, sendo sepultada na capela de São Jorge em Windsor. A cidade de Adelaide, capital da Austrália do Sul, foi nomeada em sua honra aquando da sua fundação em 1836.   Paulo Perneta (atualizado a 14.09.2016)

Madeira Global Personalidades

aljube

“Aljube” era a designação da prisão eclesiástica, que existiu em todas as dioceses portuguesas e não só, desde tempos muito antigos. A sua instalação no Funchal ocorreu com a chegada das primeiras diretivas do Concílio de Trento, em 1562, e com a vigência de D. Fr. Jorge de Lemos (c. 1510-1574), o primeiro bispo residente que a Madeira conheceu (Lemos, D. Fr. Jorge de). Situava-se, sensivelmente, naquele que veio a ser o Lg. João Gago e na rua que logo recebeu o nome “do Aljube”, durando todo o Antigo Regime. Saliente-se, no entanto, que o aljube servia de cárcere a todos aqueles que não fosse possível deter de outro modo, mas não aos eclesiásticos, que na generalidade eram presos na torre da Sé. Área da Sé com o Aljube-1804     Área da Sé com o Aljube-1805   Fr. Jorge de Lemos empreendeu uma vasta campanha de correção dos abusos resultantes da não residência de um prelado no Funchal, facto que permitira a instalação de um clima de pouca observância dos preceitos religiosos, muito especialmente dentro do novo quadro tridentino. Da veemência desta intervenção, adveio a fama de o bispo ser rigoroso e severo nas punições. O seu empenho na correção dos desmandos traduziu-se numa larga produção legislativa que acentuava a necessidade de as justiças secular e religiosa se auxiliarem mutuamente. Entrava-se, progressivamente, no período da Contrarreforma e, a 18 de fevereiro de 1558, o gabinete de D. Sebastião, à frente do qual se encontrava o cardeal D. Henrique e depois se haveria de colocar o P.e Martim Gonçalves da Câmara (c. 1539-1613), fazia publicar um alvará onde se ordenava que o corregedor da capitania do Funchal, o provedor dos resíduos e o juiz de fora se disponibilizassem para acudir ao bispo sempre que as pessoas condenadas, em visitação, a penas até 2$000 réis se recusassem a cumprir o castigo. Logo de seguida, a 12 de março, o gabinete régio promulgou uma nova determinação que obrigava o corregedor e outros oficiais de justiça na Madeira a prestarem ao prelado toda a ajuda e auxílio requeridos. Em 1564, o gabinete régio voltou a publicar outro alvará, insistindo que incumbia aos oficiais judiciais seculares punirem qualquer pessoa que afrontasse a justiça eclesiástica. Aljube e Câmara do Funchal -1870.   A produção de toda esta legislação demonstra bem a vontade régia de colocar os mecanismos de justiça mais diretamente dependentes da coroa ao serviço da administração eclesiástica, a quem, em contrapartida, era solicitado auxílio para intervir, nas pregações e visitações, caso fossem detetados devedores à Fazenda régia, mostrando bem a perfeita consciência da importância da Igreja, localmente representada pelos bispos, como instrumento do reforço da autoridade do poder central. O prelado era apresentado pelo Rei e pago pela Fazenda régia, sendo entendido como o número dois da hierarquia insular, pelo que, faltando futuramente o representante local do rei, aquele viria a assumiria o lugar, inclusivamente, com funções militares, embora tal ocorresse apenas alguns anos depois. Frestas das escadas da torre da Sé Deve-se, assim, ao bispo D. Fr. Jorge de Lemos a montagem do aljube. O edifício foi adquirido a 5 de março de 1562, a Mendo Ornelas de Moura e a sua mulher, moradores no Caniço. Consistia em umas “casas”, “com dois sobrados”, acima da “sé desta cidade, defronte da porta travessa da banda de cima, que partia duma parte com casas de Tristão de França e pela outra, com as dos herdeiros de Francisco Vieira (antigo prioste) e pela banda do norte, com os herdeiros de Tristão Vaz e da outra, com a rua pública”, tendo custado 80$000 réis, tudo “pago em dinheiro de contado” (ANTT, Cabido da Sé do Funchal, maç. 2, docs. 45 e 46). Com esta aquisição, ampliou-se a cerca da sé para norte e montaram-se as escadas no edifício, datando de 15 de abril de 1562 a autorização camarária para se fazer na “rua do concelho a escada do aljube” (Id., Ibid., doc. 46). A 6 de julho de 1562, por alvará régio, foi criado o lugar de aljubeiro, com uma remuneração anual de 4$000 réis e, a 12 de junho, foi ordenado “um acrescentamento de 2$000 ao dito aljubeiro, para ter de seu ordenado 6$000” (BNP, Índice do Registo da Provedoria..., 71v.-72). Nos anos seguintes registaram-se inúmeras prisões no aljube, essencialmente de populares, condenados por crimes diversos, como mancebia e prostituição.     Pormenor do Aljube e Câmara do Funchal -1870.   Pontualmente, no entanto, chegaram a estar ali presos (e por vezes na torre, por falta de espaço disponível) outros indivíduos, como vereadores e funcionários de justiça. Essa situação verificou-se, e.g., na vigência de D. Fr. Manuel Coutinho (1673-1742) (Coutinho, D. frei Manuel) ou de D. Gaspar Afonso da Costa Brandão (c. 1710-1784). Foi em Oitocentos que a ocupação das prisões da cidade, incluindo o aljube, conheceu a sua máxima ocupação, com as alçadas de 1823 e de 1828, no contexto dos conflitos entre liberais e absolutistas. O aljube veio a ser demolido nos finais do séc. XIX, em data que não conseguimos apurar, mas ainda surge em fotografias da déc. de 70 dessa centúria. A sua memória perdura ainda na rua com o seu nome e, embora ao longo do liberalismo e do rotativismo tenha sido uma das artérias a que Câmara tentou atribuir mais vezes outras designações, nenhuma outra persistiu.   Rui Carita (atualizado a 17.08.2016)

Direito e Política

alfenim

Tradicional em alguns países, a confeção de alfenim está documentada em Portugal desde os sécs. XV e XVI e sabe-se da sua presença em festas e romarias populares. Há uma longa tradição desta arte da doçaria, que acompanha o processo de expansão da cana-de-açúcar do Mediterrâneo para o Atlântico, tendo a ilha da Madeira sido um espaço-chave da sua divulgação para outras ilhas atlânticas, bem como para as Américas Central e do Sul. Durante os sécs. XV e XVI, o fabrico de alfenim ocupou muitos madeirenses e foi uma importante fonte de receita das famílias. Nos inícios do séc. XXI, não há qualquer referência ao fabrico habitual de alfenim na Madeira. Palavras-chave: açúcar; Brasil; doçaria; festas do Divino Espírito Santo; tradições populares.   “Alfenim” é um nome que provém do termo árabe “fanid”, com origem no persa “panid”, com o significado de branco. No latim, aparece como “alphanicum”, “alfenid”, “alpenid” ou “alfanix”; no italiano, como “penito”; no espanhol, como “alfeñique” (sendo, no México, “alfenique”); em francês, como “penides”, “épénide”, “penidon”, “penoin”; popularmente, é conhecido como “peningue”. O primeiro registo do termo na Madeira é de 1469, com a grafia “alfinij”. No séc. XVI, aparece referido em Gil Vicente e em Jorge Ferreira de Vasconcelos. Naidea Nunes refere que, na Madeira, “alfenim” aparece na documentação com as designações: “alfinij” (1469), “alffiny” (1488), “alfenjm” (1490, 1517), “alfenj” (1498), “alfeny” (1517), “alfynjm” (1523), “alfenij” (1579), e conclui que é “um termo muito antigo, do árabe fânid, que em catalão teria a forma affenic, adquirindo, em castelhano, a forma alfenique, que surge nas Canárias com a grafia alfinique (1540)” (NUNES, 2003, 159). O Nordeste do Brasil, uma das mais importantes regiões açucareiras do país, foi durante muito tempo terra de alfenim, tendo depois perdido a importância nesse domínio. Segundo Naidea Nunes, “no Brasil, o termo alfenim apenas existe no Nordeste, onde foi conservado, provavelmente por se tratar da primeira região açucareira brasileira. Nos restantes estados do Brasil, como podemos ver, apenas encontrámos as denominações rapadura mole, puxa e puxa-puxa ou rapadura puxa-puxa, para denominar o mesmo conceito” (NUNES, 2010, 56). Todavia, a arte do alfenim espalhou-se por todo o Brasil e, nos começos do séc. XXI, persiste nos estados da Paraíba, do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina, de Minas Gerais, do Ceará, de Pernambuco, de Goiás e do Rio Grande do Norte. Esta tradição encontra-se em Pirenópolis, associada às festas do Divino, e na cidade de Montanhas, no estado do Rio Grande do Norte, ligada às festas do dia de Reis, bem como noutras localidades, como a cidade de Goiás, onde as doceiras realizam pequenas esculturas em forma de flores, pássaros, peixes e chapéus. Gilberto Freyre, em Açúcar. Uma Sociologia do Doce…, documenta a presença do alfenim no Nordeste do Brasil como um vestígio da doçaria portuguesa de influência árabe. À data da primeira publicação do livro, em 1932, a tradição do fabrico de grande parte desta doçaria estava em vias de desaparecer. No entanto, nos começos do séc. XXI, por força das tradições em torno das festas do Divino, o costume de fabrico do alfenim persiste em muitas localidades brasileiras. Na Sicília, conserva-se a tradição dos doces de alfenim e de maçapão, principalmente no dia de Todos os Santos, em que as crianças recebem, como alegado presente dos antepassados, várias figuras de açúcar. A tradição do alfenim encontra-se também no México, com a elaboração de caveiras para o Dia dos Mortos, a 1 de novembro, em que se combinam elementos indígenas com costumes europeus. Os nauatles faziam figuras, normalmente caveiras, como oferenda aos seus mortos. Com a chegada dos Espanhóis, surgiram as figuras de caveiras em alfenim. A esta figuração, as freiras juntaram as cenas relacionadas com a época natalícia. Assim, o alfenim assume várias formas: caveiras, ataúdes, anjos, cruzes, miniaturas de animais ou de fruta, pratos com comida, canastras com flores, etc. Esta tradição persiste no México, tanto na Cidade do México como nos estados de Puebla e Oaxaca. Além disso, na cidade de Toluca, v.g., celebra-se, a 2 de novembro, a festa do alfenim. A produção de alfenim está também documentada na Argentina, na Bolívia, na Colômbia, no Peru e no Equador. Em Portugal, a confeção de alfenim está documentada desde os sécs. XV e XVI e sabemos da sua presença em festas e romarias populares. Ganhou importância no quotidiano da sociedade portuguesa a partir da divulgação do açúcar, desde meados do séc. XV. A Madeira, como espaço de produção de açúcar, especializou-se na arte da doçaria, domínio em que transpôs o seu perímetro, chegando aos Açores, às Canárias e ao Brasil. A partir do séc. XV, tanto em Portugal como em importantes cidades europeias, o consumo e a divulgação do açúcar passarão pela confeção de manjares nobres, sob a forma de doces – como o alfenim, a alféola (um doce semelhante ao caramelo), conservas e cascas de fruta cristalizada. Na Madeira, ficou célebre a doçaria conventual que fez as delícias de Ingleses, de Franceses e de flamengos. A par disso, o fabrico das figuras de alfenim fez de muitas mulheres madeirenses autênticas escultoras da doçaria. O alfenim fazia parte da mesa da Coroa e das casas nobres, e era, no séc. XVI, servido à nobreza em salvas de prata por ocasião das festas do Divino em todo o espaço português, tradição que teve continuidade na Madeira, nos Açores, e que chegou ao Brasil. Das mesas do reino, o alfenim passou às das ilhas e delas ao Brasil, acompanhando o processo de expansão da cultura da cana sacarina e do fabrico do açúcar. No Atlântico, o alfenim foi primeiramente produzido na Madeira, afirmando-se como o doce mais nobre, servido na casa das famílias importantes, e usado como dádiva nas festas do Divino. A oferta de doces está relacionada com uma atitude de gratidão ou mesmo de empatia. É uma tradição muçulmana que os Portugueses assimilaram. Vasco da Gama ofereceu alfenim madeirense ao samorim de Calecute. As freiras do Convento de S.ta Clara presenteavam os visitantes com alfenim e com outros doces. Há uma longa tradição desta arte da doçaria, que acompanha o processo de expansão da cana-de-açúcar do Mediterrâneo para o Atlântico, tendo a ilha da Madeira sido, como já ficou dito, um espaço-chave da sua divulgação para outras ilhas atlânticas, bem como para as Américas Central e do Sul. São vários os testemunhos denunciadores da mestria dos madeirenses no fabrico destes doces. Já em 1455 Cadamosto menciona a feitura de “muitos doces brancos perfeitíssimos”, aludindo certamente ao alfenim (ARAGÃO, 1981, 37). A primeira referência documental a esta arte da doçaria data de 1469, quando se diz que esta atividade era indústria importante para a sobrevivência de muitas famílias, uma vez que ocupava “molheres de boas pesoas e muytos pobres que lavraram os açuquares bayxos em tamtas maneyras de conservas e alfeni e confeitos de que am grandes proveytos que dam remedio a suas vidas e dam grande nome a terra nas partes onde vam”. Durante os sécs. XV e XVI, o fabrico de alfenim ocupou efetivamente muitos madeirenses e foi uma importante fonte de receita das famílias. Esta era fundamentalmente uma indústria feminina e de fabrico caseiro, mas sabe-se que havia homens que exerciam o ofício de doceiro ou confeiteiro, pois a sua atividade estava regulamentada nos Regimentos dos Oficiais Mecânicos da Cidade de Lisboa. A atividade estava vedada a estrangeiros e mestres de açúcar – apenas os “vizinhos e naturaes da ilha” podiam fazer conservas, alfenim e confeitos. De acordo com um documento de 9 de março de 1490, “em toda essa ylha nom posa fazer nemguem conservas, alfenim, comfeytos nem outra nenhüa fruyta daçucaar soomente os vizinhos e naturais da dyta ylha” (MELO, 1973, 198-199, 241). Em 1494-1495, a Casa Real portuguesa recebeu 71 arrobas de confeitos; entre estes, havia 29 arráteis de alfenim. A crónica de Damião de Góis apresenta D. Manuel como um grande apreciador da doçaria madeirense: “Nas vesporas do Natal consoava publicamente em sala, com todo o Estado de porteiros de maçareis darmas trombetas, atabales, charamellas, e em quanto consoava davam de consoar a todolos senhores, fidalgos e cavalleiros, e escudeiros que estavam na salla, na qual se ajuntavam naquelle dia todos os que andavam na Corte por saberem o gosto que el-Rei levava em fazer este banquete, que todo era de frutas verdes e dasucar, e de conservas, que lhe traziam da ilha da madeira, depois desta consoada” (GÓIS, 1911, 92). Desde o séc. XVI, no Japão, aparecem referências ao fabrico de alfenim (aruheitou) e outras doçarias, como confeitos (komfeiton). A primeira referência ao alfenim é de 1569; no decurso das centúrias seguintes, há notícias do seu consumo, tendo sido sempre, ao longo dos séculos, um dos doces nanbam, de oferta em momentos especiais. Tenha-se em conta que ficou célebre o alfenim madeirense que Vasco da Gama levou para oferecer ao samorim de Calecute. Pela rota da Índia deverá ter chegado ao Japão a arte da confeitaria madeirense, onde persiste nos começos do séc. XXI. Os estudos de Miyo Arao reforçam a ideia da influência portuguesa na confeitaria de Tóquio e estabelecem uma ponte com a Madeira, tendo em conta que muitos dos doces produzidos na Madeira aparecem na culinária do Japão. Além disso, não se pode esquecer que, nos sécs. XVI e XVII, a Madeira era um dos principais centros produtores de alfenim e daí deverá ter partido a técnica de fabrico que, depois, se vulgarizaria noutros espaços, como o Japão. A fama alcançada pela arte da doçaria madeirense está testemunhada na embaixada enviada por Simão Gonçalves da Câmara ao Papa. O facto mais memorável é referido pelos cronistas. Jerónimo Dias Leite diz que “leuou muitos mimos e brincos da ilha, de conseruas, e ho sacro palacio todo feito de asucar e hos Cardeaes hião todos feitos de alfenij […] ho que foi tudo metido em caixas embrulhadas com algodão, que forão mui seguros e sem quebrar” (LEITE, 1947, 37). Escreve Gaspar Frutuoso: “E tão generoso foi, que, tendo seu filho Manuel de Noronha, Bispo que foi de Lamego, em Roma, que servia de secretário do Papa Leão, despachou da ilha um criado seu, por nome João de Leiria, homem muito honrado, prudente, e gentil-homem, o qual mandou a Roma visitar o Papa com um grande serviço, que, além de um cavalo pérsio, que lhe mandou de muito preço, que levava de cabresto um mourisco muito gentil, homem e alto de corpo, vestido em uma marlota de girões de seda; levou mais muitos mimos e brincos da ilha de conservas, e o sacro palácio, todo feito de açúcar, e os cardeais iam todos feitos de alfenim, dourados a partes, que lhe davam muita graça, e feitos de estatura de um homem, o que foi tudo metido  em caixas emborulhados [sic] com algodão, com que foram mui seguros e sem quebrar até, dentro, a Roma, coisa que, por ser a primeira desta sorte que se viu em Roma, estimou-a muito o Papa, e cada uma peça por si foi vista pelos cardeais e senhores de Roma, sendo presente o Papa, que louvava muito o artifício, por ser feito de açúcar, e muito mais louvava o Capitão que lhe tal mandava, largando muitas palavras perante todos em louvor deste ilustre Capitão” (FRUTUOSO, 1979, 248-250). Mas sobre esta embaixada, segundo Luciana Stegagno Picchio, não consta qualquer documento na Cúria Romana, ao contrário do que aconteceu com outras. Terá sido mera invenção dos cronistas, para exaltar a figura do capitão do Funchal, Simão Gonçalves da Câmara? Atente-se na situação, a ter acontecido. Seriam 72 os cardeais feitos em alfenim e em tamanho natural, o que poderia significar mais de 5000 kg de açúcar. Por outro lado, deve ter-se em conta o próprio processo de fabrico das figuras e a dificuldade em transportá-las intactas até Roma. Será que podemos afirmar que a dita embaixada madeirense nunca existiu e que os testemunhos de Jerónimo Dias Leite e de Gaspar Frutuoso são pura invenção? Em 1550, D. Isabel Mendonça, mulher do referido capitão-donatário, tinha a seu cargo o abastecimento da Casa Real, tendo enviado para Lisboa, em 1551, 105 arrobas de conserva, 24 arrobas de fruta seca e 8 arrobas de alfenim. Em 1567, Pompeo Arditi dá conta da “conserva de açúcar” que se fazia no Funchal, “de ótima qualidade e muita abundância” (ARAGÃO, 1981, 130). Em finais do séc. XVI, Gaspar Frutuoso dava conta de “ricos e esquisitos manjares de toda sorte, como os sabem muito bem fazer as delicadas mulheres da ilha da Madeira, que (além de serem comumente bem assombradas, muito formosas, discretas e virtuosas) são estremadas na perfeição deles e em todolas invenções de ricas coisas, que fazem, não tão somente em pano com polidos lavores, mas também em açúcar com delicadas frutas” (FRUTUOSO, 1979, 264). Esta tradição perpetuou-se na Ilha para além dos tempos áureos da produção açucareira local (segundo Hans Sloane, em 1687, o madeirense produzia o “açúcar indispensável aos gastos caseiros e ao fabrico de doces, indo ainda comprá-lo ao Brasil” (ARAGÃO, 1981, 158)). Outro testemunho a atestar a abundância deste doce na Madeira é o facto de, a 29 de julho de 1593, o chamado fogo do céu, que queimou parte da cidade do Funchal, dando origem às ruas da Queimada de Cima e Queimada de Baixo, ter queimado alfenim, que havia sido feito com 5000 pães de açúcar. Nos inícios do séc. XXI, não há qualquer referência ao fabrico habitual de alfenim na Madeira (embora ainda haja quem se lembre das pombas do Divino, por ocasião das festas do Espírito Santo). No entanto, em algumas ilhas dos Açores e em alguns estados do Brasil a tradição do alfenim continua viva, alimentada pela persistência das festas em honra do Divino Espírito Santo.    Alberto Vieira (atualizado a 28.09.2016)

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