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archer, maria emília

Maria Archer. Foto - Wikimedia  Escritora e jornalista, Maria Emília Archer Eyrolles Baltasar Moreira (nome artístico: Maria Archer) nasceu em Lisboa, a 4 de janeiro de 1899, e faleceu na mesma cidade, em 1982. Durante a sua infância e juventude viajou com os pais, João Baltazar Moreira Junior e Cipriana Archer Eyrolles Baltasar, para diversas partes do país e de África, tendo vivido na Ilha de Moçambique (1910-1913) e, de 1916 a 1918, na Guiné Bissau, em Bolama e Bissau. Casa-se, em 1921, com Alberto Passos, e vai viver para o Ibo, Moçambique, regressando à Europa cinco anos depois. A futura escritora vai, então, habitar em Vila Real, de onde o marido era natural. Divorcia-se após 10 anos de matrimónio e em 1932 une-se aos pais, que na altura viviam em Angola. É em Luanda que publica o seu primeiro romance, Três Mulheres (1935), num volume que continha igualmente A Lenda e o Processo do Estranho Caso de “Pauling”, texto de Pinto Quartim Graça. No mesmo ano, dá à estampa África Selvagem. Folclores dos Negros do Grupo “Bantu”. A educação de autodidata, que fez que tivesse completado a 4.ª classe só no final da juventude, em muito deve ter beneficiado das viagens que contribuíram para a sua formação como escritora e para a carreira que escolhe como colaboradora na imprensa. Em 1935, volta à metrópole e decide viver em Lisboa, fazendo conferências e entrevistas como jornalista. Dedica-se, igualmente, à escrita de teatro e de romances. A preferência pela temática ligada a África e a receção positiva de África Selvagem levam-na a escrever diversos volumes da Coleção Cadernos Coloniais, da Editorial Cosmos, entre os quais Sertanejos, Singularidades dum País Distante, Ninho de Bárbaros e Angola Filme, e o romance Viagem à Roda de África. Em 1945, publica Aristocratas, romance que a leva ao corte de relações com a família, que considerou a história um retrato dos vários parentes. Viaja para o Brasil em 1955, depois de ser considerada suspeita pela Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE) ao decidir escrever um livro sobre o julgamento do Cap. Henrique Carlos Galvão. Tal livro, Os Últimos Dias do Fascismo Português, viria a ser publicado no Brasil em 1959. Já antes, no entanto, várias das suas obras, e.g., Casa Sem Pão, de 1947, tinham sofrido a censura e sido apreendidas. No Brasil, escreveu para diversos jornais, como O Estado de S. Paulo e Portugal Democrático, e publicou vários livros, entre os quais Terras onde Se Fala Português, em 1957. Este livro tinha sido publicado em Portugal, com o título Roteiro do Mundo Português, em 1940, com 2.ª edição revista e ampliada em 1950, e republicado no mesmo ano, em Luanda, com novo título, Herança Lusíada; o livro publicado no Brasil apresenta um prefácio pela própria, bem como um “Prefácio à Edição Brasileira”, por Júlio Gouveia, incluindo igualmente o texto com que Gilberto Freyre tinha contribuído para a 2.ª edição, agora com o título “Prefácio à Edição Portuguesa”. No volume publicado no Brasil, Terras onde Se Fala Português, Maria Archer apresenta uma edição especialmente feita para o público brasileiro, como declara no “Prefácio da Autora ao Leitor Brasileiro”, incluindo informações que julga de interesse. Sem finalidade erudita, nas suas palavras, e sem o tom “massudo dos compêndios” (ARCHER, 1957, 11), a escritora pretende que todos os leitores se “sintam partícipes da grande comunidade mundial da língua portuguesa” (Id., Ibid., 12). O mesmo tom de união entre os povos e as raças do mundo português adota Júlio Gouveia, ao terminar o seu prefácio advogando um mundo de amanhã feito de paz e harmonia. As sugestões do lusotropicalismo a que a autora aludira no prefácio para justificar a vontade de olhar para o mundo de língua portuguesa de forma a “marcar a sua unidade” (Id., Ibid., 10) e despertar nos jovens o sentido ecuménico da língua portuguesa complementam-se com o “Prefácio à Edição Portuguesa”, de Gilberto Freyre. O sociólogo afirma faltar pouco ao livro de Maria Archer para ser um ensaio de lusotropicalismo de “todo consciente da unidade na diversidade, que parece dar à simbiose lusotrópico definido carácter de área – área suscetível de ser considerada e estudada sociologicamente sob o critério dos modernos ‘area studies’” (FREYRE, 1957, 16). Considera ainda que ela seria a Margaret Mead portuguesa, caso tivesse aliado às capacidades literárias o conhecimento académico e científico. Fruto da experiência de Maria Archer como viajante, Terras onde se Fala Português inclui a descrição do arquipélago da Madeira, no interior do capítulo dedicado a Portugal, complementada com comentários sobre a história, a paisagem, a economia e aspetos sociais do Porto Santo e da Madeira. Em Roteiro do Mundo Português a escritora referira apenas brevemente, no capítulo “Começa, para os portugueses, a miragem africana…”, os episódios relacionados com o descobrimento das ilhas, integrando-os na grande epopeia portuguesa da expansão. Justifica-se, tendo em mente a sua intenção de louvar o espírito aventureiro dos Portugueses, o carácter de deslumbramento e de promessa que marca a descrição do achamento. A chegada a Porto Santo corresponde à conquista dos medos, o “exconjuro dos demónios, e também a espada pronta para exterminar os monstros” de um mundo desconhecido. O assombro pela constatação de uma terra fértil, com plantas e árvores semelhantes às da Europa, abre aos navegadores as portas para um “horizonte limpo onde se não vislumbrava traição da natureza ou do inferno” (ARCHER, 1950, 15). O território adquire, deste modo, uma profunda significação simbólica da forma de suplantar os medos e de abrir caminhos para a viagem para sul: “O mar Tenebroso deixava de existir, de se impor, a oeste de Portugal” (Id., Ibid., 16). Na edição brasileira, Maria Archer tem o cuidado de situar o arquipélago do ponto de vista geográfico e da sua constituição. Depois de uma breve incursão nos primeiros tempos do povoamento e da governação, passa a descrever as duas ilhas habitadas. Porto Santo é considerado um território pequeno e pobre, sem qualquer relevo comercial, panorâmico ou histórico. De chão arenoso, dá bons produtos agrícolas. A vila Baleira (que designa por “Babeira”; mais à frente também se referirá a Machico como “Moxico”) é de um pitoresco arcaico e desusado. Já a ilha da Madeira é considerada de forma diferente: célebre pela beleza paisagística, os vinhos e os bordados “feitos por mãos de fadas” (ARCHER, 1957, 39), nasceu e encontra-se na encruzilhada marítima de três continentes e, por isso, é visitada pelos turistas de todo o mundo. A autora é muito específica em relação à extensão da terra, ao número de habitantes, à altura das montanhas, ao clima, à horografia e à produção agrícola, da qual destaca o vinho. Refere também a cana sacarina, usada à época apenas como produto comestível e não para fabrico de açúcar, e conta a história da sua implantação na ilha e do seu declínio, na concorrência com o Brasil. O mar da Madeira exerce forte atração na escritora, com as praias de calhau escuro, as águas temperadas, a pesca e a presença dos lobos-marinhos. Tendo em conta o clima e a natureza, compreende o facto de a Madeira ser uma famosa estação balnear de inverno para os europeus. O Funchal, no entanto, é considerado uma cidade antiga e antiquada, resistente à modernização (Id., Ibid., 42): o arquipélago pobre não permite inovação, ainda que as quintas, dispostas em anfiteatro, primem pelos seus jardins, e que monumentos como a antiga Fortaleza de S. Lourenço e a Sé, assim como as muitas capelas e conventos da Ilha, mereçam uma visita. Para a autora, as paisagens são o verdadeiro deslumbramento da Ilha – e nomeia o Paul da Serra, o Rabaçal e o Monte. De Machico, sublinha a existência de um bairro típico, Banda d’Além, que desenvolveu uma gíria tão cerrada como um dialeto. Em conclusão, se a Madeira é, de facto, um jardim, a Ilha é pobre e a população, que cresceu muito, vive apertada, não havendo uma economia sólida que permita alimentá-la. Só o vinho é exportável e os bordados são um negócio lucrativo apenas para os comerciantes e não para as bordadeiras. O turismo está mal explorado e não dá lucros compensadores. Daí a emigração para a América do Sul e do Norte. Revela ainda que são tantas as bordadeiras a emigrar para o Brasil que, em São Paulo, já se tinha desenvolvido uma indústria similar. O arquipélago, visto de perto por Maria Archer, inspira-lhe sensações contraditórias: se, por um lado, se admira com a beleza paisagística, de fortes sugestões, por outro, acentua a pobreza da população e a falta de investimento e aproveitamento; se se surpreende com o vasto anfiteatro do Funchal, também olha para a cidade como antiquada e arcaica. E se o bordado é feito por “mãos de fadas”, as mulheres que a ele se dedicam acabam por ter de emigrar pelo fraco rendimento do seu trabalho. Em conclusão, em resposta à beleza do lugar encontra má governação e falta de planeamento. Exceção feita para as festas de passagem de ano, que, no remate do texto, diz serem famosas. Em 1979, regressa a Portugal, já doente, e acaba por encontrar repouso no lar Mansão de S.ta Maria de Marvila, no qual residirá até à data do seu falecimento. Obras de Maria Archer: Roteiro do Mundo Português (1940); Herança Lusíada (1950); Terras onde Se Fala Português (1957).   Luísa Paolinelli (atualizado a 14.12.2016)

Literatura

aluviões

De acordo com o Dicionário da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa, o termo “aluvião” pode significar inundação muito grande, grande cheia ou enxurrada. Este é o significado atribuído na ilha da Madeira. A rede hidrográfica da Madeira, composta por ribeiras que se desenvolvem da cordilheira montanhosa central para a costa, em vales profundos, estreitos e de declive acentuado, com regime de escoamento intermitente e torrencial, quando associada a eventos de precipitação intensa dá origem a inundações repentinas designadas por aluviões, correntes de detritos ou debris flow. Estas cheias caracterizam-se por concentrações elevadas de material sólido, incluindo blocos de grandes dimensões, que conferem ao escoamento um enorme poder destrutivo. As características geológicas e geomorfológicas das bacias hidrográficas, e das respetivas ribeiras, potenciam a ocorrência de fluxos muito significativos de materiais sólidos, os quais constituem o componente mais perigoso das aluviões. Esta produção de sedimentos é desencadeada pela ação da precipitação e da consequente ocorrência de escoamentos líquidos que mobilizam grandes quantidades de material sólido com elevado potencial geomórfico. A produção dos fluxos de material sólido resulta de diferentes processos, tais como a erosão distribuída nas vertentes, a erosão em sulco e ravinamento, movimentos de massa, e a erosão fluvial nos fundos e margens dos leitos das ribeiras. Segundo a bibliografia, ocorreram no arquipélago da Madeira, desde o início do séc. XVII até 2013, 42 aluviões de intensidade significativa, constituídas por cheias rápidas e violentas com transporte de concentrações elevadas de material sólido. É de destacar, neste contexto, o ano de 1803, no qual se verificaram inundações catastróficas em toda a Ilha, particularmente na região sudeste, entre o Funchal e Machico, tendo perecido cerca de 1000 pessoas. Em consequência desta aluvião, as ribeiras da cidade do Funchal foram canalizadas, sob a direção do Brig. Reinaldo Oudinot, entre 1804 e 1806, continuando uma considerável extensão desta obra a cumprir, no início do séc. XXI, a sua função de canalização dos cursos de água. Já no séc. XXI, merece destaque o dia 20 de fevereiro de 2010, em que, na sequência de um prolongado período chuvoso na ilha da Madeira, aliado a um cenário meteorológico adverso, se gerou uma aluvião excepcional que atingiu, com elevada intensidade, alguns concelhos da vertente Sul da Ilha, em particular o Funchal e a Ribeira Brava. São de lamentar 51 vítimas mortais, bem como os elevados danos materiais e a destruição de muitas infraestruturas públicas e privadas. O quadro que apresentamos (fig. 1) compila os registos históricos de aluviões ocorridas no arquipélago da Madeira entre o início do séc. XVII e o ano de 2013, e as suas principais consequências. [table id=75 /] Sucessivos eventos da mesma natureza têm ocorrido por toda a ilha da Madeira desde o início da sua história geológica, há cerca de sete milhões de anos, até a atualidade. Testemunhos de fluxos concentrados ou torrentes de escoamento bifásico com uma fase sólida muito abundante são visíveis em todos os complexos vulcânicos que constituem a Ilha. Como diz Susana Nascimento, “trata-se de espessos depósitos de enxurrada, bastante compactados e cimentados que se encontram intercalados nos complexos vulcânicos. [...] Formado em clima caracterizado por abundantes e concentradas chuvadas, estes depósitos conglomerático-brechóides, são constituídos por, aproximadamente, 95 % de clastos, em geral mal calibrados, com dimensões que vão, desde escassos milímetros, até cerca de 2 metros” (NASCIMENTO, 1990, 36). O fenómeno das aluviões na Madeira tem sido referenciado em vários trabalhos de carácter mais ou menos científico. Ao abordar os cursos de água da ilha da Madeira, Eduardo Pereira, em Ilhas de Zargo, sublinha a quase ausência de caudal das ribeiras na estação do verão, sendo que no inverno “crescem torrencialmente, transbordam das margens e arrastam das montanhas toneladas de penedos, rolando-os e batendo uns contra os outros num ruído sinistro e aterrador, ao mesmo tempo que arrebatam terrenos de cultura, derrubam pontes e chegam por vezes a causar enormes prejuízos em habitações, pessoas, terras e animais” (PEREIRA, 1989, I, 283) Orlando Ribeiro, ao comentar o regime das águas na ilha da Madeira, refere algumas “inundações catastróficas” que assolaram a Ilha. Tais calamidades estão associadas a “chuvas excepcionais [...] frequentemente desastrosas, que enchem as ribeiras, arrastam blocos com algumas centenas de quilos, destroem pontes, danificam casas, inundando a parte baixa das aglomerações situadas à beira-mar, e pondo em perigo bens e pessoas” (RIBEIRO, 1985, 33). Merece ainda destaque a descrição feita por Cecílio Silva de um cenário de aluvião num texto intitulado “Eu Tive Um Sonho”, publicado no Diário de Notícias da Madeira. Traumatizado pelo estado de desertificação das serras do interior da ilha da Madeira, nomeadamente da região a norte do Funchal, que constitui a cabeceira das bacias hidrográficas das três ribeiras que confluem para a capital, aliado a recordações da infância passada junto à margem de uma dessas ribeiras (Santa Luzia), o mundo dos seus sonhos, frequentemente tomado por pesadelos sempre ligados às enxurradas invernais e infernais dessa ribeira, descreve: “Tive um sonho […], subia a escadaria do Pico das Pedras, sobranceiro ao Funchal. Nuvens negras apareceram a Sudoeste da cidade, fazendo desaparecer o largo e profundo horizonte, ligando o mar ao céu… […] De repente, tudo escureceu. Cordas de água desabaram sobre toda a paisagem que desaparecia rapidamente à nossa volta. […] Repentinamente, como começou, tudo parou; as nuvens dissiparam-se, o vento amainou e a luz voltou. Só o ruído continuava cada vez mais cavo e assustador. Olhei para o Sul e qualquer coisa de terrível, dantesco e caótico se me deparou. A Ribeira de Santa Luzia, a Ribeira de S. João e a Ribeira de João Gomes eram três grandes rios, monstruosamente caudalosos e arrasadores. […] As águas efervescentes, engrossando cada vez mais em montanhas de vagas espessas, tudo cobriram até à Sé – único edifício de pé. Toda a velha baixa tinha desaparecido debaixo de um fervedouro de água e lama. [...] Acordei encharcado. Não era água, mas suor. Não consegui voltar a adormecer…” (SILVA, DN, 13 jan. 1985). O impacto que as aluviões têm no imaginário coletivo dos madeirenses é por demais evidente, ou não fossem estas um dos principais perigos naturais que os habitantes da Ilha enfrentam, sendo responsáveis pela maioria dos prejuízos, humanos e materiais, provocados por catástrofes desde o início da ocupação humana.   Susana Prada Celso Figueira (atualizado a 14.12.2016)

Física, Química e Engenharia Geologia

zona franca ou centro internacional de negócios da madeira

A criação da Zona Franca da Madeira (ZFM), que veio também a ser designada por Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM), resultou de um conjunto de circunstâncias e causas de natureza diversa, sendo umas remotas e outras próximas: por um lado, as aspirações ancestrais dos madeirenses, fundadas na existência de um porto franco de consumo existente nas ilhas Canárias, e, por outro, o movimento que, sob a égide da Associação Comercial e Industrial do Funchal (ACIF), conduziu, face à situação da economia da Madeira na década de 70 do séc. XX, à reflexão do modelo de zona franca mais adequado e consentâneo com as características geográficas, geológicas, morfológicas, económicas e sociais da Madeira. Este desiderato havia já sido ensaiado através da lei n.º 265, de 24 de julho de 1914, que autorizou o Governo a adjudicar a construção e a exploração duma zona franca na Madeira que seria instalada no local julgado mais conveniente por uma comissão técnica, durante 60 anos. Na zona franca, seriam permitidas todas as operações de beneficiação, empacotamento e transformação dos géneros do arquipélago da Madeira em outros produtos comerciáveis, com a exceção do vinho, beneficiando de isenção de direitos para embarcar, desembarcar e depositar aqueles géneros, isenção que não abrangia o cacau e o azeite não destinado a conservas. A zona franca ficava sujeita ao regime fiscal dos armazéns gerais francos, aprovado pelo dec. de 27 de maio de 1911, e a sociedade adjudicatária garantia as suas obrigações legais e contratuais nos termos previstos pela lei de 13 de junho de 1913, que havia autorizado a construção e a exploração de um porto franco em Lisboa. Esta iniciativa legislativa não foi prosseguida e, na déc. de 1970, a ACIF levou a cabo as providências necessárias ao apuramento e à definição do modelo da zona franca mais adequado à Madeira com base nesta dicotomia: uma zona franca comercial ou de consumo, como a das Canárias, ou uma zona franca empresarial, como na Irlanda e nas ilhas do Canal. Para esse efeito, a ACIF promoveu, em 1974, a realização de um estudo da viabilidade e oportunidade da criação de uma zona franca, sustentado em inquérito destinado a recolher a opinião de largos sectores da população sobre o projeto, tendo sido consultados todos os organismos oficiais, os representantes dos vários sectores da vida económica da Região, bem como outros profissionais de diversas atividades. Neste inquérito, a área abrangida pela zona franca admitia três hipóteses: um porto franco, uma zona franca extensiva a toda a ilha da Madeira, ou uma zona abrangendo todo o arquipélago da Madeira. Assente em participação ativa e relevante das entidades consultadas e nos resultados desse inquérito, a ACIF assegurou a elaboração de um estudo prévio, cujo texto provisório foi colocado à apreciação e discussão em 1975, através da consulta às entidades e aos profissionais já auscultados no inquérito anteriormente realizado. O texto preliminar e provisório desse estudo foi publicado na íntegra na imprensa diária, tendo, assim, o debate sido alargado a toda a população. O texto definitivo do estudo prévio resultou da inserção dos contributos obtidos através das diligências efetuadas, contendo uma análise das vantagens advenientes da criação da zona franca – então referenciada como regime de franquia aduaneira –, bem como um projeto de diploma legal e respetivo regulamento atinentes ao correlato regime. Este estudo foi apresentado, em 1975, à então Junta de Planeamento da Madeira, a qual entendeu que, dada a natureza e a importância de que o projeto se revestia, devia o mesmo ser objeto de aprofundamento através de uma entidade internacional especializada na matéria. A ACIF, tendo em consideração que o estudo em causa devia abranger uma perspetiva global, integrada e de longo prazo da economia regional, obteve propostas de três empresas especializadas: a americana International Finance Consultants, a britânica M. L. H. Consultants Ltd e a alemã Agrar und Hydrotechnik, cujos representantes se deslocaram à Madeira para a prestação de esclarecimentos sobre as propostas apresentadas, em reuniões em que também participaram os vogais para o Planeamento e Finanças e para a Indústria, Agricultura e Pescas da então Junta Regional da Madeira. Em 1976, a realização do estudo foi adjudicada à sociedade International Finance Consultants, a qual apresentou o estudo em 1977, tendo o mesmo sido objeto de ajustamentos face ao pedido formulado em 1978 pelo Governo da República de adesão do país à então Comunidade Económica Europeia. Com base neste estudo e nas diligências efetuadas junto do Governo da República, foi, em 1980, criada a Zona Franca da Madeira visando satisfazer uma velha aspiração dos Madeirenses e tendo como pressupostos a especial situação geoestratégica da Madeira, onde se conjugam as características específicas da economia regional com a sua peculiar configuração sócio-política, de molde a facultar o aparecimento de novos sectores voltados para o desenvolvimento económico e social da Região. Na iminência da criação da zona franca, o conselho do Governo regional procedeu à definição da localização e demarcação da área onde a mesma seria instalada, tendo a escolha recaído na freguesia do Caniçal, em território que se delimitava, devido aos princípios e orientações do ordenamento territorial da zona litoral, entre o Garajau e a Ponta de São Lourenço, pela pertença de imóveis afetáveis da Região na referida freguesia, pela localização do aeroporto, pela melhoria do eixo rodoviário que o liga ao Funchal, e pela previsível construção de viadutos previstos sobre as ribeiras em Santa Cruz e no Porto Novo. Em 1988, o Governo regional voltou a pronunciar-se sobre os critérios de implementação da Zona Franca Industrial, tendo em consideração os interesses legítimos do agregado populacional do Caniçal, a localização definitiva das instalações escolares e desportivas, a existência de um porto de pesca e os campos agrícolas experimentais do Governo. Nessa primeira data, ficou assente que seriam definidos posteriormente o regime jurídico-fiscal aplicável, a natureza, o âmbito territorial e as características da zona franca, bem como a regulamentação da atividade nela desenvolvida, tendo em consideração os condicionalismos resultantes das negociações encetadas para a adesão de Portugal à então CEE. Essa definição foi efetuada em 1982, ficando determinado que poderiam ser autorizadas, na zona franca, todas as atividades de natureza industrial, comercial ou financeira, sendo os pedidos de instalação das empresas apreciados e decididos com base em dois parâmetros fundamentais: a idoneidade da firma impetrante e o interesse económico da atividade a desenvolver. Nessa mesma data, ficou a zona franca industrial definida como um enclave territorial onde as mercadorias que nele se encontram são consideradas como não estando no território aduaneiro para efeito de aplicação de direitos aduaneiros, de restrições quantitativas e de mais imposições ou medidas de efeito equivalente. A zona franca deveria ser exteriormente resguardada por uma vedação, de harmonia com o disposto no Código da Reforma Aduaneira, e disporia de uma estância aduaneira e de um posto fiscal próprios, que vieram a ser criados em 1990. A regulamentação operada teve em atenção as normas comunitárias concernentes ao funcionamento de zonas francas e ao denominado regime de aperfeiçoamento ativo, em subordinação ao princípio de conformação das disposições legais aplicáveis à zona franca ao ordenamento jurídico comunitário. Nesse mesmo ano, foi constituída a comissão instaladora da ZFM, composta por dois representantes do Governo regional da Madeira e dois representantes – um efetivo e um suplente – da ACIF. O período compreendido entre 1982 e 1985 foi dedicado à conceção e definição do regime fiscal da zona franca e da sua administração e exploração em regime de concessão. Assim, em 1985, foi aprovado um regime fiscal que se traduziria num sistema contratual de usufruição dos benefícios fiscais, fortemente inspirado pelo regime constante do Código de Investimento Estrangeiro então vigente, mas, que, por não corresponder à proposta apresentada pelo Governo regional ao Governo da República, foi substituído, seis meses depois, por novo decreto-lei, que consagrou o princípio da usufruição automática dos benefícios e incentivos fiscais e financeiros pelas empresas, logo após o seu licenciamento no âmbito da zona franca. Na conceção do regime de incentivos foi tido em consideração o disposto no Tratado de Roma relativamente ao desenvolvimento regional e as regras de salvaguarda da distorção da concorrência no seio da Comunidade Económica Europeia. Paralelamente, a Assembleia Regional da Madeira aprovou o regime de administração e exploração da ZFM, autorizando o Governo a adjudicar, em regime de concessão e com dispensa da realização de concurso, a sua gestão a uma entidade privada nacional ou estrangeira, na qual a Região Autónoma da Madeira (RAM) viesse a participar ou à qual viesse a associar-se. A previsão da existência de uma comissão para assegurar uma simplificação dos procedimentos administrativos, bem como um desburocratizado acompanhamento e fiscalização das atividades licenciadas, foi uma antevisão do gabinete da Zona Franca criado no ano seguinte com esse escopo e essa missão funcional, com a concomitante extinção da comissão instaladora da Zona Franca. O prazo da concessão foi estabelecido em 30 anos, sem prejuízo da sua eventual renovação ou prorrogação, ficando o Governo regional autorizado a regular as condições de exercício das atividades, quer da concessionária quer dos utentes da zona franca. Nesse mesmo ano de 1986, foi regulado o exercício de atividades financeiras através das denominadas sucursais financeiras exteriores, tendo o Governo regional procedido, em 1987, à regulamentação das condições de instalação e funcionamento daquelas sucursais. O exercício destas atividades foi alargado, em 1994, quer às instituições constituídas de raiz quer às sucursais financeiras internacionais, as quais podiam realizar operações com residentes, faculdade que se encontrava vedada às sucursais financeiras exteriores. Em 1987, o Governo regional da Madeira adjudicou a administração e a exploração da zona franca à Sociedade de Desenvolvimento da Madeira, S.A., e aprovou o Regulamento das Atividades Industriais, Comerciais e de Serviços Internacionais no âmbito institucional da ZFM. No reconhecimento da proeminência económica e social, contributiva do desenvolvimento da Região, e da concomitante necessidade de uma gestão célere, proficiente e atempada, considerada como pressuposto e condição essencial para uma maior simplicidade e eficiência do processo decisório, o Governo regional não só rejeitava e removia os processos de antanho, os quais recorriam a desnecessárias complexidades e delongas processuais, desencorajadoras do investimento prosseguido por entidades caldeadas em regimes mais simplificados, como também fundamentava a opção por uma gestão empresarial em termos privados da zona franca. O diploma em causa estabeleceu o regime de licenciamento das atividades em consideração, as competências da concessionária nesse licenciamento, na aprovação dos projetos de instalação e funcionamento das empresas industriais e na fiscalização das obras com base em licença emitida pela concessionária, assim como o regime de uso dos imóveis por via da subconcessão do domínio público em autoconstrução ou de direito de uso em pavilhões construídos pela concessionária, os quais, finda a concessão, revertem gratuitamente para a RAM. Em 1988, os princípios de simplificação, desburocratização e de celeridade fundamentaram a criação da Conservatória do Registo Comercial Privativa da Zona Franca da Madeira e do Cartório Notarial também privativo da zona franca, cujo início de funcionamento foi fixado para o dia 1 de abril de 1989, tendo sido estabelecido que os atos praticados por aqueles serviços privativos se encontravam isentos de qualquer taxa ou emolumento. Os mesmos princípios determinaram, em 1989, a criação da IV Série do Jornal Oficial, destinada exclusivamente às empresas licenciadas na zona franca – cujas publicações, não exigidas em regimes europeus congéneres, foram também isentas de pagamento de taxas –, a autorização da constituição, em 1994, das sociedades comerciais por quotas e anónimas unipessoais e, em 1995, o reconhecimento da faculdade de as sociedades licenciadas usarem palavras ou parte de palavras estrangeiras ou de feição estrangeira na composição das suas firmas ou denominações. Estes princípios, pioneiros no país quer em relação à autorização das sociedades unipessoais, mais tarde autorizadas só para o tipo por quotas, quer em relação à simplificação administrativa e à prática e objetivos empresariais, permitiram que, na sua conceção, a ZFM constituísse o primeiro exercício unitário, integrado e coerente de internacionalização da economia portuguesa. Nesse mesmo sentido, em 1988, tendo em consideração que muitos dos investidores seriam oriundos de países com ordenamentos jurídicos diversos do sistema português, designadamente dos países da common law, e reconhecendo a necessidade de dotar a ZFM de instrumentos mais eficazes na captação do investimento direto estrangeiro, foi autorizada a instituição de instrumentos de trust, instituto jurídico até à data inexistente no ordenamento jurídico português. Este regime de propriedade fiduciária, envolvendo uma relação tripartida entre o settlor ou instituidor, o trustee e os beneficiários ou a causa específica por eles prosseguida, que nos regimes romano-germânicos encontram fronteiras com as fundações, o usufruto, o mandato sem representação e o fideicomisso ou a fidúcia, permitiu à zona franca disponibilizar aos seus utentes um meio jurídico que lhes era facultado noutros regimes e jurisdições congéneres. Em 1989, foi criado o quarto sector de atividades, acrescentando-se à Zona Franca Industrial, aos serviços financeiros e aos serviços internacionais o Registo Internacional de Navios da Madeira (MAR), o qual foi criado visando a prossecução de dois fins: em primeiro lugar, estancar os processos de saída de navios do registo convencional português para registos de conveniência (flagging-out) e, em segundo lugar, atrair novos armadores e navios, oferecendo condições de custos semelhantes às apresentadas pelos registos mais competitivos. Nesse sentido, o MAR foi dotado de uma somissão técnica, composta por um representante do membro do Governo responsável pelo sector dos transportes, um representante da RAM e um representante da Inspeção Geral de Navios. Adentro das condições indispensáveis à atratividade do MAR, a Lei do Orçamento do Estado para 1989 procedeu à consagração da isenção do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) para os tripulantes embarcados nos navios matriculados no MAR e o próprio diploma que procedeu à sua criação não só aplicou aos navios o regime fiscal da zona franca, como também permitiu às partes que designassem a lei que regula a constituição das hipotecas, tendo o aprofundamento do regime de graduação dos privilégios creditórios determinado o recesso da Convenção Internacional para a Unificação de Certas Regras Relativas aos Privilégios e Hipotecas Marítimos, assinada em Bruxelas em 10 de abril de 1926, que se havia tornado um impedimento à adesão dos armadores devido às objeções colocadas pelos credores hipotecários em relação à graduação dos seus créditos. Paralelamente, foi facultado aos tripulantes dos navios o acesso ao regime do seguro social voluntário. A reforma fiscal operada em 1989, com a extinção da contribuição predial e industrial, da sisa e do imposto profissional, e a concomitante criação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), do Imposto Municipal sobre os Imóveis (IMI) e do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas (IMT), determinou que o regime fiscal da ZFM ficasse, em grande parte, plasmado no Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), então aprovado. Nesse sentido, o primeiro regime fiscal (regime i) da zona franca, que vigorava desde 1986, passou a constar do EBF e permitiu o licenciamento de atividades até 31 de dezembro de 2000, usufruindo as empresas que as desenvolvessem da isenção de IRC até 31 de dezembro de 2011. O regime ii, com uma taxa de tributação em IRC de 1 %, 2 % e 3 %, respetivamente nos anos de 2003-2004, 2005-2006 e de 2007 a 2011, entrou em vigor a 1 de janeiro de 2003, permitindo o licenciamento de atividades até 31 de dezembro de 2006, com o usufruto desse benefício pelas entidades que as prosseguissem até 31 de dezembro de 2011. O regime iii, com uma taxa de tributação em IRC de 3 %, 4 % e 5 %, respetivamente nos anos de 2007-2009, 2010-2012 e de 2013 a 2020, entrou em vigor a 1 de janeiro de 2007, permitindo o licenciamento de atividades até 31 de dezembro de 2013, prazo que, de acordo com a legislação comunitária adrede posta em vigor, foi prorrogado, por duas vezes, até 31 de dezembro de 2014, com usufruição dos benefícios fiscais até 31 de dezembro de 2020. As empresas licenciadas no CINM são contribuintes fiscais portugueses para todos os efeitos, pendendo sobre elas as obrigações gerais a que se encontram adstritos os contribuintes em geral, e pagam uma taxa de instalação aquando do licenciamento, e uma taxa anual de funcionamento, através de depósito nos cofres da concessionária nos termos previstos na lei e no contrato de concessão. Os resultados obtidos pela aplicação destes regimes são de natureza qualitativa e quantitativa. Os primeiros, já referidos, permitiram que o CINM constituísse o primeiro exercício político-económico de internacionalização da economia portuguesa, rasgando novos rumos para o ordenamento jurídico português, introduzindo princípios e regras de simplificação administrativa e desburocratização do processo decisório e de licenciamento e exercício de atividades no âmbito do CINM. Do ponto de vista quantitativo, pela aplicação do regime i, constata-se que, em 2000, se encontravam licenciadas cerca de 5900 entidades, congregando 2900 empregos diretos e indiretos, e com o registo de 264 embarcações no MAR. A remuneração média dos quadros qualificados que trabalhavam no CINM era superior em cerca de 60 % à média da Região. Os capitais sociais agregados das sociedades ascendiam ao equivalente a 8600 milhões de euros e os investimentos efetuados pela concessionária na construção e manutenção das infraestruturas internas da ZFI eram de cerca de 18,7 milhões de euros, tendo os utentes investido mais de 143 milhões de euros nas suas unidades industriais. Nesta data, o CINM erigia-se já como um dos pilares fundamentais da economia da Região com um contributo de cerca de 20 % para a formação do respetivo PIB. Em 2000, com o procedimento formal de investigação instaurado pela Comissão Europeia, por força da entrada em vigor das Orientações sobre os Auxílios de Fiscalidade Regional, cujo início de prazo não coincidia com o fim da vigência do regime i, e com a aprovação do regime ii, que só entrou em vigor a 1 de janeiro de 2003 e que introduziu limites máximos (plafonds) ao benefício fiscal usufruído em IRC pelas entidades licenciadas no CINM, verificou-se não só um hiato de dois anos sem licenciamento de atividades, como um retrocesso na atratividade do regime e na adesão dos investidores. Esse retrocesso foi acelerado pela interrupção, em 2010, do processo negocial para revisão e aumento dos plafonds, que havia sido iniciado em 2009, junto da Comissão Europeia, o qual veio a ser retomado em 2011, com conclusão favorável em 2013. Também contribuiu para o agravamento desse retrocesso a revogação do benefício da isenção de dividendos aos sócios e acionistas das empresas licenciadas, benefício que, de acordo com a Comissão Europeia, não se encontrava sujeito a limitação temporal. O referido retrocesso foi reconhecido em 2012 pela Assembleia Legislativa da Madeira que, tomando as suas questões como causas e fundamentos, solicitou ao Governo da República a reabertura do processo negocial dos plafonds, no cumprimento dos deveres para-constitucionais que impendem sobre os órgãos de soberania para assegurarem a rentabilidade e competitividade internacional do CINM. Desse modo, em finais de 2014, encontravam-se licenciadas 1868 entidades, com a criação de cerca de 3000 empregos diretos, estando matriculadas 323 embarcações no MAR. Os capitais sociais agregados das entidades licenciadas ascendiam a 6,4 mil milhões de euros e os investimentos em infraestruturas e equipamentos na ZFI eram de 24 milhões de euros pela concessionária e de 200 milhões pelos utentes. José António Câmara (atualizado a 11.10.2016)

Direito e Política Economia e Finanças História Económica e Social

beneden, barão charles van

Escritor. Publicou Au Nord Ouest de l'Afrique: Madère, Les Îles Canaries, Le Maroc, em Bruxelas em 1882. Colaborando na revista belga La Jeune Wallonie, deu à estampa a narrativa Voyage aux Îles Sauvage e as comédias Les Titularisés e Le Mariagicide. Considerava, afetuosamente, a Madeira como sendo a sua terra adotiva. Palavras-chave: literatura; dramaturgia; comédia.   Nasceu na Bélgica, a 4 de julho de 1854, e faleceu no mesmo país, em dezembro de 1929. Fixou-se no Funchal, estabelecendo moradia no arquipélago durante muitos anos, na Qt. dos Cedros, em Santo António e, em fins do séc. XIX, na ilha do Porto Santo. Contraiu matrimónio na Madeira com D. Isabel Constança, filha da 3.ª viscondessa e 1.ª condessa de Torre Bela (D. Filomena Gabriela Correia Brandão Henriques de Noronha, em títulos de Correias e Uzeis, e de Russel Manners Gordon, 1.º conde de Torre Bela, pelo seu casamento, em título de Gordon), de quem não teve filhos. Apesar de ser um súbdito belga, o barão Charles van Beneden considerava afetuosamente a Madeira como a sua terra adotiva. Apreciado como distinto escritor no país de origem, era famoso pelos seus conhecimentos de literatura. Publicou várias obras, nomeadamente Au Nord-Ouest de l'Afrique: Madère, les Îles Canaries, e Maroc, em Bruxelas, em 1882. Colaborador na revista belga La Jeune Wallonie, publicou a interessante narrativa Voyage aux Îles Salvages, que ocupa 50 páginas da mesma revista e que vem acompanhada de excelentes gravuras. Há quem afirme que nas comédias deste autor Les Titularisés e Le Mariagicide se encontram incarnadas em várias personagens algumas pessoas conhecidas na sociedade funchalense (SILVA e MENESES, 1978, 264). Existe um estudo bibliográfico de 1911 sobre Charles van Beneden (Etude Bibliographique sur Charles van Beneden), da autoria de Joseph Chot, com 116 páginas, publicado em Bruxelas pela Dechenne.Existe um estudo bibliográfico de 1911 sobre Charles van Beneden (Etude Bibliographique sur Charles van Beneden), da autoria de Joseph Chot, com 116 páginas, publicado em Bruxelas pela Dechenne. Obras de Charles van Beneden: Au Nord-Ouest de l'Afrique: Madère, les Îles Canaries, le Maroc (1882); Entre Névropathes (1888); Généalogie (1891); Le Mariagicide: Comédie Humaine en Cinq Actes et Six Tableaux (1898); Michel Côme (1899); Les Titularisés (1902); Une Interview au Transformisme (1905); Attale: Tragédie en 5 Actes (1908); La Floche du Soldad (1908); Clara Camacho (1908); La Peste de Trigalet: Tragi-Comédie en Trois Actes et Quatre Tableaux (1908); Pendant Dix-Sept Ans (1911); L’Empire de Belzébuth (1920).   António José Borges (atualizado a 10.10.2016)

Literatura

azevedo, antónio bon de sousa schiappa de

Regente florestal de formação, desempenhou importantes funções silvícolas no distrito do Funchal nos finais do séc. XIX e início do séc. XX. Nasceu em Lisboa em 1870, no seio de uma família distinta, sendo o seu avô materno o Ten.-Gen. Pedro Paulo Ferreira de Sousa, primeiro barão de Pernes. Foi para a ilha da Madeira em finais do séc. XIX, onde casou com uma madeirense, filha de José António de Almada, passando a viver no Funchal. Desempenhou um importante papel na área florestal, tanto na ilha da Madeira como na ilha do Porto Santo. Na primeira, foi responsável pela preservação das manchas de floresta natural que se encontravam ameaçadas na época; na segunda, foi responsável pelos primeiros trabalhos de reflorestação daquele espaço, que estava há séculos desprovido de um coberto florestal. Fruto da riqueza existente na floresta indígena da Madeira e do Porto Santo, iniciou-se, após a descoberta destas ilhas, um processo de delapidação do coberto florestal existente com os objetivos de exploração de madeira e carvão, implementação de áreas agrícolas e constituição de pasto para os animais que, de forma asselvajada e desregrada, se alimentavam em zonas serranas. Deste modo, o coberto florestal indígena foi bastante afetado e delapidado na ilha da Madeira, chegando mesmo a desaparecer na ilha do Porto Santo. A falta de técnicos e de pessoas conhecedoras da flora e da floresta madeirense, bem como das consequências da sua devastação, fez com que esta situação se perpetuasse e agravasse durante séculos. A situação na ilha do Porto Santo ainda era mais grave, piorando consideravelmente em meados do séc. XVIII e levando quase à completa desertificação da Ilha. O conhecimento e os principais estudos sobre a floresta madeirense pertenciam, nessa época, a naturalistas estrangeiros que, por diversos motivos, passavam na Madeira ou iam até esse arquipélago atraídos pela riqueza da sua flora e fauna e dos inúmeros endemismos existentes. Segundo Rui Carita, os naturalistas estrangeiros que mais se evidenciaram na época com trabalhos de divulgação da fauna e flora desse território foram o reverendo inglês Thomas Lowe, que preparou os álbuns com que a Madeira participou na célebre exposição internacional de Londres, em 1851, e que forneceu as informações a Charles Darwin, e o padre alemão Ernesto Schmitz, que, tendo-se radicado no Funchal em 1874, depois se naturalizou português e foi o fundador do primeiro museu de história natural da Madeira. A crescente importância que a floresta ia adquirindo, assente no seu papel imprescindível na captação da água, quer de regra, quer de consumo, e na sustentação dos solos, levou, desde os meados do séc. XIX, à criação de departamentos governamentais que se debruçaram sobre os trabalhos de reflorestação e preservação da floresta das ilhas da Madeira e Porto Santo. Nos finais desse século, a Madeira passou a possuir técnicos portugueses habilitados nessa área, sendo o mais notável o regente florestal António Bon de Sousa Schiappa de Azevedo, que focou a sua ação principalmente na ilha do Porto Santo. A erosão e desertificação nesta ilha era de tal forma grave que Schiappa de Azedo, escolhendo o cume do pico Castelo para iniciar, em 1921, o seu trabalho de reflorestação, teve que armar o terreno e constituir muretes em pedra para suporte e sustentação da pouca terra que existia na encosta, conseguindo assim solo e condições para plantar árvores. Tratou-se de uma obra notável, visível no terço superior da encosta do pico. Para este trabalho, Schiappa de Azevedo utilizou nas suas plantações essencialmente o Cupressus macrocarpa e o Pinus radiata. Após a sua morte, o seu trabalho foi continuado, tendo-se arborizado a parte alta do pico Castelo utilizando a metodologia de plantação por si desenvolvida. Na ilha da Madeira, os frondosos Cupressus macrocarpa que se encontram na ribeira das Cales junto àquela que se tornaria a estrada regional n.º 103 foram mandados plantar também por Schiappa de Azevedo, tendo infelizmente algumas destas árvores sido afetadas de forma irreversível pelo grande incêndio de 2010, que devastou toda aquela zona. António Bon de Sousa Schiappa de Azevedo possui uma estátua com o seu busto no pico Castelo em homenagem ao trabalho efetuado no combate à desertificação e à reflorestação naquela ilha. A estátua foi inaugurada em julho de 1957. Fig. 1 – Fotografia do busto de Schiappa de Azevedo existente no cimo do pico Castelo no Porto Santo. Fotografia de Manuel António Filipe.   António Bon de Sousa Schiappa de Azevedo faleceu no Funchal a 17 de dezembro de 1926.   Manuel António Marques Madama de Sousa Filipe (atualizado a 10.10.2016)

Biologia Terrestre Botânica Ecologia

alves, mário

Empregado bancário e poeta. Nasceu às 08.00h do dia 1 de março de 1897, na freguesia de São Pedro, Funchal, tendo sido batizado a 25 do mesmo mês e ano, na igreja matriz daquela paróquia. Era filho legítimo de Alexandre Alves, sargento de artilharia, e de Maria Amélia Correa Alves, doméstica, recebidos na igreja paroquial de N.ª Sr.ª da Graça do Estreito, concelho de Câmara de Lobos, Diocese do Funchal, a 23 de setembro de 1894, e moradores na freguesia de São Pedro, à R. da Pontinha. Era neto paterno de José Alves e de Antónia da Silva Alves; e neto materno de José Martinho Pinto Correa e de Leocádia de Jesus. Veio a contrair matrimónio com Maria Ferreira Alves, de cujo enlace nasceu Mário César Alves. Foi funcionário bancário, tendo trabalhado no Banco Nacional Ultramarino, na secção de correspondência da filial do Funchal. A poesia era uma das suas grandes paixões, tendo publicado poemas, de forma regular, em distintos periódicos, de que é exemplo o Eco do Funchal. Colaborou ainda com o Correio Desportivo, O Desporto, o Diário da Madeira, o Diário de Notícias, A Esperança, O Jornal, o Mocidade, o Sport do Funchal e o Trabalho e União. Chegou a submeter alguns dos seus poemas a concursos literários, como foi o caso dos Jogos Florais da Madeira, aberto nas colunas do Eco do Funchal, em 1942, no qual obteve, na categoria de Quadra, o 2.º prémio, Cravo de Prata, com a composição: “Trazes nas faces, que pintas,/ De dois corações o geito./ De sobra te dão as tintas/ O que te falta no peito.”   Ricardo Pessa de Oliveira (atualizado a 22.09.2016)

Literatura Personalidades